Alterações extremas no regime de seca e cheia podem levar à extinção árvores de igapós, aponta estudo
Mudança climática, aumento de temperatura, desmatamentos, queimadas e hidrelétricas são ameaças que podem levar à extinção regional de árvores que só ocorrem nos igapós, áreas alagáveis dos rios de águas pretas da Amazônia. O alerta é do pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC) Jochen Schöngart.
De acordo com o pesquisador, eventos extremos alteram o regime de cheia e seca desses ambientes vulneráveis, que abrigam cerca de 600 espécies arbóreas.
Os igapós têm lenta dinâmica por falta de nutrientes nos solos. Para suportar a inundação, as árvores fazem adaptações morfoanatômicas, bioquímicas e fisiológicas, por exemplo, desempenhando um metabolismo anaeróbico durante a fase aquática com reservas de carboidratos que a planta produziu e armazenou durante a fase terrestre (não inundada) para poder tolerar o longo período que ficará inundada.
“Quando essas árvores não saem mais da água, desse ambiente, isso causa mortalidade em grande escala. E nessas topografias você tem espécies endêmicas que são tão bem adaptadas que só ocorrem naquele ambiente e com isso são muito vulneráveis também, como é a Eschweilera tenuifolia, conhecida como macacarecuia ou cuieira”, disse Schöngart, vice-coordenador do Grupo Ecologia, Monitoramento e Uso Sustentável de Áreas Úmidas (Maua), por meio da assessoria do Inpa.
Conforme o pesquisador, a implementação de usinas hidrelétricas muda o regime hidrológico por armazenar mais água nos reservatórios durante a época chuvosa para liberar essa água na seca para ter uma “produção mais ou menos estável”. O resultado é que os níveis máximos anuais ficam menores e os níveis mínimos anuais ficam mais altos, porque a usina libera mais água durante a seca.
“Isso causa problema para essas espécies arbóreas do igapó, porque elas ficam de repente durante vários anos consecutivos inundados e ultrapassa a capacidade de adaptações dessas espécies resultando em mortalidade de grande escala”, disse.
De acordo com dados divulgados pelo Inpa, a hidrelétrica de Balbina já causou impactos de grande escala pela criação do reservatório que inundou uma área de 4.400 km2.
Pesquisas do Grupo Peld/Mauá mostram que mais de 20 anos depois da usina de balbina as árvores em florestas de igapó à jusante da barragem continuam morrendonas topografias mais baixas, aproximadamente 12% dos igapós em até 120 quilômetros depois da barragem são dominadas por árvores mortas, conhecidas como paliteiros. O estudo investigou a conexão entre a represa e as árvores mortas de Macrolobium acaciifolium, conhecida como arapari.
Para futuras instalações de usinas hidrelétricas, o pesquisador sugere que se leve em consideração o reservatório, a região ao redor da usina e as áreas alagáveis à jusante da barragem.
Para Schöngart, uma forma de mitigar os impactos é obrigar os operadores das usinas a simular os pulsos de inundação garantindo que as árvores saiam todos os anos durante alguns meses fora da água para renovar suas reservas e evitar a mortalidade em grande escala.
As adaptações ocorrem em diferentes níveis. As morfoanatômicas são formação de raízes adventícias que permitem que a espécie consiga obter água e nutrientes quando o sistema radicular principal já está em condições de solo encharcado ou inundado.
A formação de aerênquima são cavidades de ar dentro do caule e da raiz, e a planta consegue difundir esse oxigênio capturado pelas lenticelas para as raízes e com isso consegue aumentar a concentração dentro da raiz em condições anóxicas (falta de oxigênio) de solo durante a inundação.
Fonte: G1 Amazonas