Ministro aponta ensino médio como desafio

18/09/2007 00h00

 


Em seminário internacional sobre o ensino médio diversificado, promovido ontem pela Comissão de Educação e Cultura, o ministro da Educação, Fernando Haddad, disse que esse nível de ensino é o maior desafio para o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado pelo governo no início deste ano. No plano, o governo assume o compromisso
de ampliar até 2010 de 140 para 354 o número de entidades descentralizadas da rede
federal e tecnológica. O projeto é aumentar de cerca de 230 mil para cerca de 700 mil o número de vagas nessas escolas.

O presidente do Conselho Consultivo da Faculdade Pitágoras e articulista da revista Veja, Cláudio de Moura Castro, avaliou que o principal problema do ensino médio ofertado
no Brasil é a multiplicidade de objetivos. Segundo o economista, o curso tenta, ao mesmo
tempo, preparar os estudantes para o vestibular e para o mercado de trabalho, “mas não faz nem uma coisa nem outra”.

Castro citou resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), de 2003, que coloca o Brasil entre piores do mundo em compreensão de leitura. Segundo a pesquisa, os filhos de operários europeus, com 15 anos de idade, são mais capacitados a ler documentos internos de empresas do que estudantes da mesma faixa etária da elite brasileira.

Famílias abastadas
Cláudio de Moura Castro afirmou que o governo joga dinheiro fora quando investe em
escolas técnicas de ensino médio, com oficinas caríssimas. Ele argumentou que há pesquisas
segundo as quais os alunos desses cursos são provenientes de famílias abastadas, “que poderiam pagar a melhor escola particular na cidade, mas preferem estudar de graça”.

O deputado e ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza (PSDB-SP) afirmou que o ensino
médio precisa ser diversificado para que os alunos possam escolher diferentes trajetos ao
longo dos estudos. Na proposta de Paulo Renato, os alunos poderiam escolher carreiras profissionais específicas ou estudos preparatórios para carreiras acadêmicas. “Hoje, o nosso ensino médio é extremamente homogêneo, e seus objetivos, muito abrangentes”, disse.

O presidente da Comissão de Educação e Cultura, Gastão Vieira (PMDB-MA), afirmou que a comissão já havia advertido o Ministério da Educação de que a estratégia de fazer do
ensino médio uma mera preparação para o vestibular era um “equivoco”.

Resultados
O ministro da Educação, Fernando Haddad, admitiu que as principais medidas do governo
federal para melhorar o ensino médio foram ações indiretas, das quais se esperavam
resultados colaterais. “Aumentamos o acesso ao ensino superior, com programas como o
Prouni [Programa Universidade para Todos], entendendo que essas ações pudessem robustecer o ensino médio, mas indicadores têm mostrado que os resultados [nesse sentido] não foram satisfatórios,” disse.

 

Gastão Vieira: plano deverá incorporar sugestões do seminário

 


No encerramento do seminário, o presidente da Comissão de Educação, deputado Gastão Vieira, afirmou que as contribuições do encontro serão incorporadas ao Plano de
Desenvolvimento da Educação. Segundo ele, o ministro da Educação, Fernando Haddad, anunciou que o governo vai enviar o projeto ao Congresso nos próximos dias.

Na opinião do professor João Batista de Oliveira, que fez um resumo das principais pontos do seminário, a política educacional brasileira deve levar em consideração pontos como a idade dos alunos do nível médio e a diversificação tanto na oferta de cursos quanto nas opções de currículos. “Em países como a Alemanha ou a Suíça o público deste nível de ensino tem entre 15 e 16 anos. Com essa idade, apenas 15% dos alunos brasileiros estão nesse estágio”, destacou.

Em todos os países que participaram do encontro, conforme disse Oliveira, os currículos não oferecem mais que sete disciplinas, com possibilidades de o aluno fazer as próprias escolhas.
“Isso reflete a sabedoria de entender que, a partir de uma certa idade, se os jovens não tiverem opções, simplesmente abandonam a escola”, justificou Oliveira. No Brasil, ao contrário, informou, enfatiza-se cada vez mais na “educação geral”, com a inclusão de mais disciplinas acadêmicas nos currículos.

Infância
No dia 15 de outubro a Comissão de Educação e Cultura realiza o último seminário da série para discutir a educação infantil – de zero a seis anos. Segundo Gastão Vieira, o Brasil
ainda não tem uma política para a infância. Podemos tomar a iniciativa e propor uma, se o governo não o fizer”, afirmou.

 

Pesquisadores apresentam experiências de outros países

 


O pesquisador finlandês Pasi Sahlberg, da European Training Foundation (sediada na Itália), afirmou que a excelência que seu país alcançou no nível médio baseou-se em alguns princípios: ensino médio universal, com financiamento do governo; ensino fundamental de qualidade como base para o médio; flexibilidade do currículo, que é baseado em módulos; e orientação vocacional para evitar escolhas erradas e perda de tempo pelos alunos. Além disso, na Finlândia, os estudantes concluem cursos de sua livre escolha, em vez de séries. Lá, cerca de 55% dos estudantes do ensino médio fazem cursos genéricos, e o restante faz cursos profissionalizantes.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, afirmou que a presença de especialistas de outros países é ideal para que as autoridades brasileiras da área de educação sintetizem experiências de sucesso e as apliquem aqui.
“Chega de aprender com os próprios erros. É melhor aprender com os erros dos outros”, disse.

Para o representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny, o País deveria desenvolver um sistema de educação mais integrado. Ele aconselhou que, em vez de esperar soluções de longo prazo, cada brasileiro comece hoje mesmo a contribuir para melhorar a educação”.

Aprendizagem e estágio
No seminário, o presidente do Conselho Consultivo da Faculdade Pitágoras, Cláudio de Moura Castro, criticou a legislação brasileira sobre aprendizagem e estágio. A legislação trabalhista prevê várias restrições para estagiários
e aprendizes, que não podem, por exemplo, trabalhar com certas máquinas em fábricas nem podem ter uma relação de subordinação com chefes, sob pena de a empresa ser multada pelo Ministério do Trabalho.

Estados Unidos

O professor da Universidade Católica de Brasília Cândido Alberto Gomes ressaltou que a experiência norte-americana recente reflete a necessidade de integração entre ensino geral e profissionalizante. Segundo ele, como apenas 25% dos estudantes do país chegam à universidade, o governo criou duas novas alternativas de educação
nesse nível: uma mais voltada ao nível técnico e outra que propõe uma formação mais ampla.

As pesquisas, informou Cândido Gomes, mostram que as inovações aumentaram o tempo de permanência dos alunos na escola e melhoraram os níveis de emprego e renda dos alunos com mais riscos de evasão. “Tudo isso
nos mostra a urgência de se atender às necessidades do mundo do trabalho. O país que não o fizer ficará para trás”, defendeu.

Alemanha

O modelo alemão, segundo explicou o professor da Universidade de Constanza, Thomas Deissinger, é desenhado de forma que o próprio sistema direciona as possibilidades de desenvolvimento educacional do aluno. Aos 10 ou 11 anos, ele é encaminhado a três tipos de escola - de educação geral (leva diretamente à universidade), intermediária e inferior.

Ao final da intermediária, o estudante pode seguir para dois tipos de ensino médio – o técnico profissionalizante e o dual, em que uma parte da formação é oferecida na escola e outra nas empresas. De acordo com Deissinger, ao final do nível médio, mais de 40% dos estudantes podem optar pela universidade. No entanto, a maioria prefere a formação dual, que hoje atende a 60% da demanda.

Jornal da Câmara