Financiamento da educação superior ganha destaque em audiência sobre relação comunidade universitária-governo

Representante do MEC apresentou linhas gerais de programa para ampliar autonomia financeira das universidades públicas federais
16/07/2019 00h00

O coordenador-geral de Planejamento e Orçamento da Diretoria de Desenvolvimento da Rede de Instituições Federais de Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), Weber de Sousa, defendeu, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, a importância da ampliação da autonomia econômica e financeira das universidades e institutos federais, objeto de programa a ser lançado pelo governo nos próximos dias. Na ocasião, parlamentares e representantes da comunidade universitária manifestaram preocupação com o financiamento público da educação superior e apontaram a necessidade de uma maior interlocução do MEC com a sociedade.

A audiência – promovida em conjunto pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; e de Educação – foi proposta pelas deputadas Margarida Salomão (PT-MG) e Sâmia Bomfim (Psol-SP), com o objetivo de debater as relações institucionais entre a comunidade universitária e o governo federal. Nesse contexto, o desconhecimento em relação ao conteúdo do programa em elaboração pelo MEC ganhou destaque na fala dos palestrantes. “Não há política pública que tenha longa vida se não for construída coletivamente pela comunidade e pela sociedade. A melhor proposta é aquela construída com os atores que no dia a dia vão implementá-la”, ressaltou o secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduino.

Parceria com setor produtivo

Segundo Weber de Sousa, o programa a ser lançado pelo Ministério da Educação vai possibilitar que as universidades firmem parcerias para o desenvolvimento de projetos com o setor produtivo – pessoas físicas e jurídicas – e recebam os recursos relativos a essas iniciativas fora do orçamento da União. “O MEC hoje tem a importante missão de ampliar a autonomia financeira e econômica das universidades, estabelecendo um marco legal que aproxime cada vez mais as universidades e os institutos federais do setor produtivo, com bases conceituais e legais que permitam segurança jurídica para esses projetos serem desenvolvidos”, ressaltou.

A deputada Margarida Salomão citou a Emenda Constitucional 85/2015, “que constitucionalizou a inovação tecnológica no país”, ao lembrar que já existe uma estrutura legal para a realização de parcerias entre entidades públicas e privadas. Ela defendeu a necessidade de que os recursos sejam complementares. “A agregação desses novos valores não deve de forma alguma subestimar o papel imprescindível do financiamento público da educação superior”, alertou.

Na visão do 2º vice-presidente da Regional Norte II do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Emerson Monte, o financiamento das universidades públicas será o principal debate a ser travado para o próximo período. Ele manifestou preocupação com a “paulatina redução dos investimentos”, a manutenção do teto de gastos estabelecido pela Emenda Constitucional 95/16 e o contingenciamento de recursos orçamentários. “O contingenciamento permanece, apesar das manifestações públicas. Ou seja, o governo não escuta aqueles que constroem as universidades, aqueles que dependem da educação pública”, avaliou.

Para a deputada Sâmia Bomfim, entre as medidas que precisam ser debatidas pela sociedade, estão cortes orçamentários “embasados não em justificativa técnica ou administrativa, mas em concepções políticas e ideológicas que, inclusive, negam o caráter crítico e reflexivo que é próprio das universidades, especialmente das universidades públicas”.

Eficiência

Weber de Sousa manifestou a expectativa de que, como aconteceu no ano passado em relação ao contingenciamento de recursos, os limites de empenho possam ser ampliados no segundo semestre. “Tenho certeza de que vai acontecer neste ano. Não vamos ter nenhum tipo de interrupção nas atividades”.

Gustavo Balduino lembrou que “a grande pesquisa de ponta não se faz com prédio sujo, nem com laboratório sem funcionamento”. Ele enfatizou que o parâmetro de eficiência das universidades públicas não pode ser o mesmo de uma empresa ou de uma universidade privadas. “Dentro dos parâmetros próprios das instituições públicas que fazem pesquisa, nós aceitamos e brigamos para melhorar nossa eficiência sempre. Nós não queremos gastar menos; queremos gastar mais e render mais para a sociedade”, assinalou.

O coordenador-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), Antônio Alves Neto, destacou o papel da universidade como instituição pública de ação social. Ele ressaltou que os recursos destinados às universidades públicas não representam gasto para o governo, mas investimento. “Em qualquer país sério, de primeiro mundo, quando há uma crise, o primeiro investimento é na educação, na universidade, porque a universidade é um dos espaços que resolvem os problemas sociais do pais”, acrescentou.

Cobrança de mensalidade

A garantia de uma universidade pública e gratuita foi outra preocupação apresentada pelos representantes da comunidade universitária. O diretor da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Cássio Borges, revelou apreensão não apenas com a possibilidade de congelamento do orçamento das universidades em patamares baixos, mas também com a ampliação da cobrança de mensalidade na pós-graduação. “Entendemos que é uma medida que compromete não só as pesquisas, mas o funcionamento das universidades e o desenvolvimento nacional”, afirmou.

Segundo Weber de Sousa, o programa que será apresentado pelo governo não interfere no financiamento básico da União, nem altera a natureza pública das universidades. O representante do MEC garantiu que a cobrança de mensalidade não é abordada no projeto. “A própria Constituição determina a gratuidade nos estabelecimentos de ensino públicos”, observou.

Weber lembrou, no entanto, que o Supremo Tribunal Federal já estabeleceu a legalidade da cobrança por cursos de pós-graduação lato sensu e defendeu que, mais cedo ou mais tarde, será preciso realizar o debate sobre pagamento de mensalidade na graduação e pós-graduação stricto sensu, “sem necessariamente interferir na gratuidade para aqueles que não podem pagar e no caráter público das instituições”.

Contratações

Em relação às contratações, Weber de Sousa afirmou que, de acordo com o que estabelece a Constituição, o modelo vai continuar sendo o concurso público. No entanto, no âmbito dos projetos desenvolvidos com recursos complementares, haverá a possibilidade de contratação de profissionais pelo regime celetista, como já ocorre hoje em projetos financiados por meio de fundações de apoio e de organizações sociais.