Fernando Collor-SF 27-06-2007

SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no último dia 19 de junho, proferi, neste plenário, pronunciamento em que expus minhas preocupações com a atual política externa e de defesa, no contexto do nosso entorno sul-americano. Tive a grata alegria de ver que vários dos ilustres Pares compartilham essas preocupações.
Hoje, quero trazer à reflexão desta Casa problemas advindos da concepção equivocada com que participamos das negociações comerciais multilaterais na Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio. O fracasso, até o momento, da Rodada de Doha, simbolizado pela Reunião de Potsdam, representa, na verdade, o fracasso de uma visão das relações internacionais nos dias atuais.
O Brasil entrou nas negociações da OMC, tendo como base, de um lado, a deformação ideológica de ver a Rodada como luta entre o sul pobre e o norte rico, e, de outro, vê-la como única alternativa de política comercial.
O viés ideológico fez com que passássemos a procurar liderar os países pobres e em desenvolvimento contra os industrializados, em atitude confrontacionista, que não enxergava a falta de homogeneidade de interesses entre os países do sul. A Índia, por exemplo, que tem graves problemas na produção de alimentos, a qual procura incentivar, não compartilha idéias de reduções importantes nas tarifas sobre produtos agrícolas. Esse é o caso também do Paquistão. Ou seja, no âmbito dos países em desenvolvimento, há áreas de conflito e cooperação, e não posição unânime.
Tampouco, Sr. Presidente, tomou-se na devida conta o fato de que os países industrializados têm grandes dificuldades em fazer concessões comerciais. No caso dos Estados Unidos, o lobby agrícola, como é conhecido de todos, é extremamente organizado e atuante. Sua força no Congresso ameaça, inclusive, a renovação do Trade Promotion Authority (TPA), que vence em breve. No caso da União Européia, o protecionismo e os subsídios têm mesmo um aspecto cultural, ou seja, a proteção aos agricultores visa também a mantê-los no campo, a preservar um estilo de vida. Um dos países mais firmemente protecionistas na área agrícola, a França, elegeu um Presidente declaradamente a favor do protecionismo agrícola - como o são de resto os outros dois principais candidatos.
Como as decisões da OMC são consensuais e conhecidas são as dificuldades, como aqui apontadas, não faz sentido a concentração de esforços apenas nas negociações multilaterais. O Brasil apostou na Rodada de Doha, não previu alternativas. E, ao contrário de países como o México, o Chile e os Estados Unidos, não procurou estabelecer acordos bilaterais. Deve-se lembrar que, no nosso âmbito interno, o setor agrícola sempre apoiou mais a Rodada de Doha do que a área industrial, que teme concessões. Essas diferenças, é natural, são mais facilmente administráveis em negociações bilaterais.
Logo ao final da Reunião de Potsdam, tornamos públicas duas posições importantes: a Alca está fora de cogitação e passaríamos a nos dedicar ao acordo União Européia - Mercosul. Há, aqui, falhas estratégicas. Em primeiro lugar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, descartar uma opção comercial torna evidentemente nossa posição negociadora mais fraca. Em segundo lugar, a opção União Européia - Mercosul, em estado latente por longo tempo, apresenta claras dificuldades. De um lado, além da conhecida situação precária do Mercosul atualmente, deve-se lembrar que a Argentina tem posições protecionistas no campo industrial, inclusive em relação ao Brasil. Cabe indagar se os europeus entrariam em negociações sérias com o Mercosul, enquanto persistissem as atuais atitudes da Venezuela e Bolívia. É de se perguntar, então, Sr. Presidente: a União Européia veria o Mercosul como interlocutor válido?
Além de abandonarmos a via dos acordos bilaterais - que, pelos compromissos com o Mercosul, demandam maiores negociações intrabloco -, abandonamos os esforços de promoção comercial em relação aos principais mercados. Embora a quantificação seja difícil, a conquista de poucos pontos percentuais de participação, em mercados como o norte-americano, o asiático e o europeu, representaria grandes ganhos para nossa balança comercial, gerando mais emprego e renda para os brasileiros.
A economia mundial tem estado em fase de desenvolvimento nos últimos anos, e o Brasil tem-se beneficiado, e muito, desse período de bonança, apesar de carências estruturais. No entanto, uma estratégia de política externa não pode confiar apenas em cenários positivos e deve se antecipar, prever políticas para tempos mais difíceis. Considero que devemos, com urgência, sem abandonar a Rodada de Doha, tentar consolidar o Mercosul, envidar esforços de promoção comercial nos principais mercados e promover negociações comerciais bilaterais. Inclusive, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por ocasião do comparecimento do Chanceler à Comissão de Relações Exteriores, em 29 de março deste ano, procurei alertar para os problemas da Rodada de Doha e do Mercosul.
Em síntese, Sr. Presidente, creio que a consolidação do Mercosul, esforços de promoção comercial nos principais mercados e negociações comerciais bilaterais seriam a melhor forma de o Itamaraty contribuir para a aceleração do crescimento.
Como já fiz neste plenário, apelo ao Presidente de República para que volte seus olhos para a área externa, para que determine um aperfeiçoamento, uma correção de rumos que a nivele com os inegáveis êxitos de seu Governo até agora alcançados, tanto no campo social quanto no econômico.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.
Muito obrigado