Dona Leopoldina, Princesa d’Áustria e Mulher

A arquiduquesa Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena nasceu em Viena, aos 22 de janeiro de 1797, sendo a quinta dos 12 filhos do segundo casamento do último imperador do Sacro Império Romano Germânica, Francisco II (após 1804, Francisco I do Império Austríaco).

A rígida e cuidadosa educação que a Casa d’Áustria dispensava a seus herdeiros nos ajudará a entender as características mais marcantes da impressionante personalidade daquela que viria a ser a primeira imperatriz do Brasil.

O imperador Leopoldo II, avô paterno de Leopoldina, registrou as máximas dentro das quais Leopoldina e seus irmãos foram criados:

                                                      “É preciso inspirar-lhes (aos filhos) a única paixão que devem fomentar, isto é, a da humanidade, da compaixão e da ânsia de fazer a felicidade do seu povo. É preciso despertar o seu sentimento a favor dos pobres (...) Os Príncipes devem convencer-se em primeiro lugar da igualdade dos homens, de que todos têm os mesmos direitos e que eles devem sacrificar àqueles toda a sua existência, suas inclinações e seus divertimentos a qualquer oportunidade(...) (Tritsch, pág. 64, apud Oberacker, pág. 13).

                                                     "Hoje em dia, quando um dos nossos herda o trono, já não se trata, como outrora, de uma propriedade devidamente adquirida – mas sim de um cargo, de uma pesada incumbência e é preciso quebrar-se a cabeça para reinar tanto quanto possível de acordo com os desejos dos seus súditos". (Tritsch, pág. 81, apud Oberacker, pág. 13).

O mesmo imperador ainda sugeria:

                                                      "É preciso começar estudando cabalmente o caráter das crianças, formá-las segundo as suas tendências; mas antes de mais nada é necessário conseguir-se a confiança dos filhos, torná-los sinceros e francos e inculcar-lhes a aversão à mentira, à dissimulação, às artimanhas, às bisbilhotices, et coetera.” (Tritsch, pág. 63, apud Oberacker, pág. 13).

A suprema virtude que se ensinava constantemente aos príncipes era, todavia, a reverência infantil à vigente ordem social e política e, principalmente, aos próprios pais. O respeito quase religioso para com a vontade dos pais e, de mormente, a do pai-imperador, cuja vontade era em todas as questões familiares e políticas a suprema lei, constituía o fundamento da educação da Casa da Áustria.

A começar do momento que assumiam responsabilidades políticas, assim lhes era ensinado, não pertenciam mais a si próprios e sim ao Estado. Daí em diante tinham de esforçar-se por representar dignamente a ideia monárquica, servir ao seu povo, fazendo-o feliz; pondo em segundo lugar todos os desejos e inclinações pessoais. A virtude e a religião garantiriam, em última análise, também a sua felicidade pessoal; dar esmolas e distribuir benefícios valeria mais do que todos os prazeres deste mundo, e nada poderia superar a satisfação interna de ter cumprido com seus deveres da maneira como esperava a Casa de Habsburgo de seus membros.

Por sua vez, a rainha Maria Carolina das Duas Sicílias, avó materna de Dª Leopoldina, em carta remetida à sua filha, a imperatriz Maria Thereza, em 1796, traçou as linhas mestras do que viria a ser a educação das infantas de Áustria:

                                                       “Estou convencida de que para a verdadeira felicidade de nossos filhos é preciso afastá-los do mundo (...). Penso que devemos tratar as nossas princesas severamente e sem nenhum contato com homens, de modo que não possam fazer comparações, achando, portanto, amáveis e unindo-se àqueles que Deus lhes terá reservado.” (Wetheimer, pág. 43, apud Oberacker, pág. 20)

A orientação da rainha Maria Carolina vinha ao encontro da velha tradição familiar dos Habsburgo, segundo a qual o principal papel reservado às mulheres da família era o de serem protagonistas da política de casamentos dinásticos. Essa política resultou nos vastos domínios herdados pela família e foi sintetizada na célebre máxima “Bella gerant alii, tu felix Austria, nube” ("que os outros [países] guerreiem [enquanto] tu, feliz Áustria, concluis casamentos").

Foi dentro desses conceitos e princípios que Dona Leopoldina foi educada. Religião e dever. Pensando sempre no encargo que a Divina Providência lhe entregou: bem gerir seus povos, visando sempre seu bem-estar e felicidade.

Em paralelo a isso, o ambiente doméstico em que as princesas de Áustria foram “escondidas do mundo” era feliz e sadio. O imperador Francisco II era um homem de simplicidade espartana. Severo para consigo mesmo e pontual cumpridor dos seus deveres, não conhecia outros divertimentos e recreios mais agradáveis do que os que lhe proporcionavam o seu ambiente familiar. Falava diversas línguas, mas preferia o dialeto de Viena. De gênio jovial e alegre, estava permanentemente disposto a pilhérias e pronto para gracejos espirituosos. Era homem culto, religioso e caritativo. Gostava muito dos filhos, aos quais muitas vezes se dedicava, brincando com eles. Colecionava livros (que viriam a ser a base da Biblioteca Nacional Austríaca) e retratos da família. Afirmam seus biógrafos que levou uma vida privada exemplar.

Órfã de mãe muito cedo, Dª Leopoldina foi educada, a partir de seus oito anos de idade, por sua madrasta, Maria Ludovica de Habsburgo-d’Este, a terceira esposa do imperador, por quem foi mimada, recebendo grande amor maternal. E a quem Dª Leopoldina dedicou grande afeto e admiração ao longo de sua vida. Não tendo tido filhos próprios, Maria Ludovica adotara, de bom grado, os filhos de sua predecessora “empenhando-se em que todas as crianças da família imperial cumpram os seus deveres; que as pequenas arquiduquesas toquem piano, desenhem e, até ela mesma repete com a arquiduquesa Leopoldina tudo o que até agora estudara”. (Wetheimer, pág. 83, apud Oberacker, pág. 17)

Mulher de educação esmerada, bem mais culta que sua predecessora, Maria Ludovica logo despertou a admiração de Goethe, o príncipe dos poetas alemães, que se comprazia com sua companhia e a quem dedicou várias obras. Goethe, certa feita, declarou a Eckermann: “Nunca tive muito respeito para com as pessoas principescas, caso não encontrasse nelas ao mesmo tempo homens de qualidade e valores.”

Em Schönbrunn, um dos castelos usados pela família imperial como sua residência, Leopoldina, desde cedo apaixonada por botânica e por geologia, gostava especialmente das pinturas existentes nos salões chamados de Bergl, em cujas paredes o pintor Johann Wenzl Bergl realizara, em 1770, uma visão da paisagem tropical. A pintura fora inspirada em uma série de tapeçarias, originalmente encomendadas por Luiz XIV, com paisagens brasileiras.

Outra grande influência na vida de Dª Leopoldina, sua amiga e grande confidente, foi sua irmã mais velha Maria Luisa, a segunda esposa de Napoleão Bonaparte. A troca de cartas entre as duas irmãs foi intensa, acompanhando inteiramente a breve vida de Dona Leopoldina.