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Debate avalia risco para ensino superior após eventual fusão de Kroton e Estácio

Parlamentares temem que o negócio diminua a concorrência no setor, principalmente na modalidade a distância; juntas, as empresas teriam quase 1,2 milhão de alunos

11/05/2017 - 16:42  

Lúcio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a compra da Estácio Participações pelo Grupo Kroton, que envolveu denúncia de espionagem industrial entre as entidades e ainda possíveis fraudes no Programa de Financiamento Estudantil. GRUPO KROTON, Leonardo Augusto L. Lara
O diretor jurídico da Kroton Educacional, Leonardo Lara, defendeu a operação

Audiência pública da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS) discutiu a fusão entre os dois maiores grupos de ensino superior do País: a Kroton Educacional e a Estácio Participações.

Alguns deputados temem que o negócio diminua a concorrência no setor, principalmente na modalidade a distância. Juntas, Kroton e Estácio teriam quase 1,2 milhão de alunos.

A fusão está sendo analisada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão do Ministério da Justiça encarregado de zelar pela livre concorrência no mercado.

Tecnicamente, a operação é chamada de incorporação de ações, mas o mercado trata como a criação de uma gigante do setor. Kroton e Estácio ocupam, respectivamente, o primeiro e segundo lugares no segmento do ensino superior e atuam nas modalidades presencial e a distância.

A Kroton está presente principalmente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste e controla as universidades Anhanguera, Fama, LFG, Pitágoras, Unic, Uniderp, Unime e Unopar. Já a Estácio possui unidades em todos os estados, e a principal marca é a Universidade Estácio de Sá, com sede no Rio de Janeiro.

Condições
A operação deve ser julgada pelo Cade até meados deste ano. Dois anos atrás, o órgão já tinha imposto uma série de condições para que a Kroton adquirisse a Faculdade Anhanguera, justamente para evitar concentração no setor e garantir a concorrência.

Em fevereiro, a Superintendência Geral do Cade considerou a fusão arriscada, com potencial para diminuir a competição no mercado de educação. O grupo resultante ficaria com quase metade do mercado nacional, teria o monopólio em 114 cidades e número de alunos três vezes maior do que a da futura segundo colocada no ranking, a Universidade Paulista (Unip).

Representante da Kroton no debate na Câmara, o diretor jurídico Leonardo Lara defendeu a fusão. “Com certeza não haverá no futuro monopólio no ensino superior por parte da Kroton após a conclusão da operação com a Estácio”, disse.

Segundo ele, dos mais de 5.500 municípios no País, a Kroton opera, no segmento de cursos presenciais, em apenas 76, número que subiria para 107 com a fusão. “Em apenas 18 municípios haveria algum tipo de sobreposição entre as operações da Krtoton e as da Estácio”, avaliou.

Lara negou ainda o temor manifestado por entidades ligadas a professores e funcionários no Rio de Janeiro, de que a fusão implicaria em demissões. “A sede da Estácio não sairá do Rio, e também não há motivo para dizer que haverá dispensa de funcionários”, afirmou.

AUREO
O deputado Áureo disse que vai propor uma CPI para investigar o setor

Concentração
Na avaliação do Cade, a fusão vai gerar sobreposição em cursos de graduação e pós-graduação presenciais e a distância, além de cursos preparatórios presenciais e on-line para concursos e para a prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O parecer conclui que a operação geraria ainda concentração excessiva no mercado de educação superior a distância, tanto no cenário nacional quanto no municipal.

“Além disso, colocaria a Kroton em posição de líder inconteste do mercado, com quase 50% de market share, muito distante de seus principais concorrentes. No cenário nacional, em 12 dos 16 mercados gerava concentrações superiores a 45%. No cenário municipal, dos 527 mercados com sobreposição, em 474 a concentração ultrapassa os 50% de market share; em 322 chega a 80%; e em 114 provocaria um monopólio”, diz o documento.

Autor do requerimento para a audiência pública, o deputado Áureo (SD-RJ) não ficou satisfeito com as explicações da Kroton e disse que vai propor uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o caso. A compra da Anhanguera pela Kroton já tinha sido aprovada com dificuldade, segundo o parlamentar, e a operação atual é ainda mais concentradora no mercado.

“O Cade já havia sinalizado que aquela [a Anhanguera] seria a última grande aquisição da Kroton. Mesmo assim a Kroton trabalhou para fazer uma oferta hostil e está tentando incorporar a Estácio. A combinação das duas empresas vai criar um gigante do setor, três ou quatro vezes maior que a segunda colocada”, disse.

Tendência mundial
Durante o debate na Câmara, a fusão dos dois grupos foi encarada como natural pelos deputados Alex Canziani (PTB-PR) e Walter Ihoshi (PSD-SP). Para ambos, é um fenômeno que ocorre no mundo todo. “Quando você junta duas instituições, ganha competitividade e produtividade”, disse Canziani.

A operação também foi defendida por representantes de duas entidades ligadas ao ensino superior, a Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) e a Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup). “Os atos de concentração não são ilícitos e anticoncorrenciais. São negócios jurídicos privados, regulados pelo Estado, e o Cade está de olho neles”, disse Elizabeth Guedes, vice-presidente da Anup.

Reportagem - Antonio Vital
Edição - Ralph Machado

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