Política e Administração Pública

Restrições a habeas corpus, penas e uso de prova ilícita são criticados na comissão de combate à corrupção

Participantes da audiência pública também destacam a necessidade de mudar o processo eleitoral e tipificar crimes de corrupção na iniciativa privada

23/08/2016 - 11:26  

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Especialistas que participam de audiência pública da comissão especial encarregada da análise do projeto que altera a legislação de combate à corrupção (PL 4850/16) criticaram pontos da proposta, como as restrições ao habeas corpus e a permissão de uso de provas ilícitas em alguns casos.

Segundo o juiz Marcelo Semer, do estado de São Paulo, as medidas que constam no projeto, elaboradas pelo Ministério Público, têm viés acusatório e ferem o ordenamento jurídico brasileiro em diversos pontos.

Ele criticou a possibilidade de prisão preventiva sem o devido fundamento, o aumento de penas sem levar em consideração a proporcionalidade das penas para outros crimes e a definição das penas de acordo com o tamanho do prejuízo.

“A proposta tem um viés acusador, cria tipos penais, aumenta alguns outros, abre espaço para uso de provas ilícitas, fragiliza o habeas corpus e parte da premissa errada de que não é possível combater o crime sem ilegalidade”, disse. Para Semer, a proposta “se adequa ao velho lema de que os fins justificam os meios”.

De acordo com o juiz, a proposta fere garantias individuais e dispositivos constitucionais. Ele criticou limites aos recursos dos réus e à concessão de habeas corpus.

“Não ficou claro o que é recurso abusivo. Ou o recurso está na lei ou não. Abusivo, no meu entender, é criar obstáculos para os recursos. Criar obstáculos aos embargos infringentes é incabível. Todo o arcabouço legal brasileiro é no sentido de não condenar em caso de dúvida. Os embargos infringentes não chegam a 5% do total. Não há estatística que demonstre que eles atrasam os processos. Aqui simplesmente se restringe direitos”, afirmou Semer.

O juiz também criticou a previsão, contida no projeto, de que prova ilícita pode ser considerada se tiver sido obtida de boa-fé. “O projeto dissolve o princípio da prova ilícita. E é uma contradição o conceito de prova ilícita de boa-fé. Permite provas ilícitas para contraditar álibi, ou seja, há um forte estímulo para a produção de provas ilícitas. O policial pode cometer crime para provar a mentira do réu. Mas o crime do policial é pior que o do réu”, ressaltou.

Omissões
Outro convidado, o sociólogo Alberto Carlos de Almeida, autor do livro “ A Cabeça do Brasileiro”, disse que o projeto não atinge as causas da corrupção.

“O projeto não ataca a fonte: o processo eleitoral. Enxuga o gelo em vez de impedir que ele derreta. Se a gente não atacar a fonte, que é o problema da legitimidade do sistema político, não vai adiantar nada”, alegou.

Almeida elogiou a iniciativa de discutir o combate à corrupção, mas destacou a necessidade de aperfeiçoar o sistema eleitoral, de maneira a garantir legitimidade à representação popular.

Heleno Torres, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), apontou outra omissão na proposta: a tipificação de crimes de corrupção na iniciativa privada.

“É preciso também discutir corrupção privada, como cartelização de mercado ou atos que ferem a concorrência, e ampliar os tipos penais em relação a licitações”, defendeu o Torres.

A audiência ocorre no plenário 9.

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Reportagem - Antonio Vital
Edição - Marcia Becker

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