Legislação Informatizada - DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DE 01/02/2021 - Publicação Original
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DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DE 01/02/2021
Esclarece sobre o papel da Mesa Diretora no processo eleitoral.
Suas Excelências, membros titulares da Mesa Diretora, Senhor Deputado Marcos Pereira, Primeiro-Vice-Presidente; Senhora Deputada Soraya Santos, Primeira-Secretária; Senhor Deputado Expedito Netto, Terceiro-Secretário; e Senhor Deputado André Fufuca, QuartoSecretário, subscrevem o documento datado de 29 de janeiro deste ano, ora submetido à esta Presidência pela Secretaria-Geral da Mesa. O referido documento veicula suposta decisão da Mesa Diretora, por meio da qual determina diversas providências relacionadas à eleição da Mesa e "nega referendo" ao registro da decisão da Executiva Nacional do PSL que impõe a dezessete de seus deputados a sanção de desligamento temporário da bancada.
Registro, preliminarmente, que esta Presidência já teve a oportunidade de elucidar de que maneira compreende o papel da Mesa Diretora no processo eleitoral, ressaltando que, nos termos do Regimento e da prática incontroversa desta Casa, a autoridade para despachar blocos, registros de candidatura e os demais expedientes relacionados ao desenvolvimento da eleição é da Presidência, e não da Mesa, cuja competência recursal, inclusive, limita-se às questões relacionadas ao ordenamento de pessoal e administrativo, a teor do art. 15, XVI, do RICD. Vale o mesmo para a decisão do registro da sanção aplicada pelo PSL a seus parlamentares: não se trata de decisão tomada ad referendum da Mesa, e não pode por ela ser cassada. A Mesa, todavia, dirige os trabalhos durante a sessão preparatória de eleição (o que era mais visível nos tempos do voto em cédula) e organiza todo o conjunto de decisões de escopo administrativo que estão relacionadas ao pleito. Não por outra razão, esta Presidência submeteu ao Colegiado a consulta do Partido Progressistas que, entre outras coisas, definiu o modelo exclusivamente presencial para a votação, e decidiu o cronograma de todas as etapas preparatórias do pleito de forma coletiva. Colocando entre parênteses, contudo, essa questão de fundo, sobre o escopo da competência da Mesa nas eleições, atenho-me a um problema de procedimento. O ato supostamente praticado pela maioria dos membros titulares da Mesa é desprovido de validade jurídica, o que impede que a Presidência adote qualquer providência com base nele, conforme passo a expor.
À Mesa, na qualidade de Comissão Diretora, incumbe a direção dos trabalhos legislativos e dos serviços administrativos da Câmara. Nos termos do § 3º do art. 14 do Regimento Interno (RICD), suas reuniões podem ser ordinárias e extraordinárias. As extraordinárias são convocadas pelo Presidente ou por quatro de seus membros efetivos.
Afora o requisito da competência para a convocação de reuniões extraordinárias, cuja clareza do dispositivo regimental dispensa maiores considerações, e que esta Presidência vem respeitando e acatando invariavelmente, há outros aspectos formais a serem levados em conta, entre eles, a necessidade de anúncio da reunião com antecedência, designação do dia, hora, local e objeto da reunião, bem como a prévia notificação de todos os membros da Comissão (RICD; Capítulo IV - Das Comissões; art. 46, § 5º). Em que pese não ser exigida a antecedência mínima de vinte e quatro horas, não são dispensados os demais requisitos formais, inclusive a antecedência razoável e a prévia notificação de todos os membros. Tais requisitos são, a rigor, pressupostos de validade dos atos decisórios.
Não há dúvida, pois, de que a competência expressa no § 3º do art. 14 do RICD, relativa à maioria de quatro membros efetivos, diz respeito tão somente à possibilidade de convocação de reunião extraordinária, não alcançando a condução dos trabalhos e tampouco o processo de tomada da decisão (modo como votam os membros). A mera possibilidade de convocação de reuniões extraordinárias não autoriza que a maioria de membros efetivos da Comissão Diretora substitua a Mesa Diretora, vez que os demais comandos regimentais que regulam o processo decisório continuam aplicáveis.
É também isento de dúvida que compete ao Presidente, ainda que não tenha sido a reunião extraordinária por ele convocada, presidi-la e tomar parte nas discussões e deliberações, com direito a voto. É o que estabelece o inciso IV do art. 17 do RICD, que trata das atribuições, funções e prerrogativas do Presidente em relação à Mesa.
A ratio da disposição regimental que exige a realização de uma reunião extraordinária reside justamente no fato de que decisões colegiadas pressupõem reuniões convocadas prévia e adequadamente, assistindo a cada membro o direito de se manifestar e, eventualmente, convencer qualquer de seus pares. Não se trata, pois, de mera decisão de cada membro que se soma à dos demais, mas de procedimento deliberativo regrado pelo direito. Trata-se da prerrogativa de participar, influir na decisão colegiada, decidir efetivamente.
Revela-se inválida, portanto, sob o aspecto formal, a manifestação proferida por membros efetivos da Mesa, a título de decisão em nome da Mesa, mesmo em se tratando de matéria considerada urgente, quando não observados os pressupostos de validade formal do processo decisório (que inclui, entre outros, a convocação da reunião e a prévia notificação de todos os membros).
Cumpre consignar que o RICD oferece solução idônea para situações em que se faz necessária a deliberação de matérias inadiáveis e não seja viável a realização de reunião extraordinária. Trata-se de decisão tomada ad referendum da Mesa, cuja competência foi outorgada apenas ao Presidente ou a quem o estiver substituindo. Pela relevância do dispositivo para o esclarecimento do objeto do presente parecer, vale sua transcrição:
Parágrafo único. Em caso de matéria inadiável, poderá o Presidente, ou quem o estiver substituindo, decidir, ad referendum da Mesa, sobre assunto de competência desta.
Por outro lado, não se pode ignorar que além das disposições regimentais, o funcionamento da Casa também se rege pela prática institucional, consubstanciada em costumes e convenções com força normativa.
Com efeito, tem sido aceita, excepcionalmente, a tomada de decisões pela Mesa Diretora sem a realização de reunião, em matérias ordinárias, que congregam o assentimento de todos os membros. Nesses casos, o requisito de aprovação da matéria pela maioria do colegiado se dá pela coleta de assinaturas, assegurada a consulta a todos os titulares. Tal procedimento, no entanto, não é desejável, deve ser excepcional e tem aplicabilidade restrita a situações de consenso quanto à forma decisória, independentemente de divergências quanto ao mérito da matéria.
Nos casos de manifesta discordância dos membros acerca do processo decisório de coleta de assinaturas (sem a realização de reunião), revela-se antirregimentai, por vício formal insanável, qualquer deliberação tomada pela maioria dos membros da Mesa Diretora, ainda que essa verse sobre matéria urgente. A propósito, lembro que a competência que o Regimento Interno outorga à Presidência para mandar todos os atos e decisões à publicação, tornando-os oficiais, está vazada em termos, que deixam bem claro de que forma se constituem as decisões da Mesa: "Art. 17. São atribuições do Presidente, além das que estão expressas neste Regimento, ou decorram da natureza de suas funções e prerrogativas: (...) V - quanto às publicações e à divulgação: a) determinar a publicação, no Diário da Câmara dos Deputados, de matéria referente à Câmara; (...) d) divulgar as decisões do Plenário, das reuniões da Mesa, do Colégio de Líderes, das Comissões e dos Presidentes das Comissões, encaminhando cópia ao órgão de informação da Câmara; (...)".
Tenho procurado, ao longo de meus mandatos à frente da Câmara dos Deputados, atuar de forma transparente e comprometida com a Constituição, as Leis e o Regimento. Não tomo essa decisão em defesa apenas de minhas convicções, mas em defesa das prerrogativas da Presidência da Câmara dos Deputados, que logo estará em outras mãos. Alerto, reiterando meu profundo respeito pelos membros da Mesa que subscrevem o expediente em análise, que ao dar curso ao documento que me foi encaminhado, estaria a criar um precedente que erodiria a autoridade legítima do cargo de Presidente da Câmara dos Deputados. Não posso fazê-lo. Determino o arquivamento do presente documento e a publicação desta decisão, para os fins de direito.
Brasília, 1º de fevereiro de 2021.
RODRIGO MAIA
Presidente
- Diário da Câmara dos Deputados - 3/2/2021, Página 1558 (Publicação Original)