Legislação Informatizada - DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DE 02/12/2015 - Publicação Original
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DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DE 02/12/2015
Deixa de receber denúncia de crime de responsabilidade apresentada pelo Senhor Luis Carlos Crema, contra a Presidente da República, Dilma Roussef.
LUIS CARLOS CREMA ofereceu denúncia contra a Presidente da República, DILMA VANA ROUSSEF, atribuindo-lhe a prática de crimes de responsabilidade.
Afirma o DENUNCIANTE, inicialmente, que o Tribunal de Contas da União "constatou e comprovou irregularidades gravíssimas nas contas públicas de 2014 da presidente". Assim, tendo a Corte de Contas demonstrado várias irregularidades em decisão fundamentada, restaria inequívoco que a DENUNCIADA autorizou e consentiu com atos ilegais, omitiu-se em corrigir tais atos quando informada e se eximiu de efetivar a responsabilidade de seus subordinados.
Um desses atos irregulares teria sido a omissão de registro de passivos da União decorrentes do atraso de repasses ao Banco do Brasil, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, que totalizaram cerca de R$ 40.000.000.000,00. Essa conduta, segundo o DENUNCIANTE, contraria a Constituição Federal, o art. 1º, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal, além de encontrar tipificação específica nos itens 1, 3 e 7 do art. 9º, nos itens 2, 4, 6 e 7 do art. 10 e nos itens 1 e 3 do art. 11 da Lei nº 1.079/50.
Ainda segundo o DENUNCIANTE, também no exercício financeiro de 2014 foram realizadas operações de crédito ilegais junto à Caixa Econômica Federal e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, o que também constitui violação do art. 37, caput, da Constituição Federal, e art. 1º, § 1º, art. 32, § 1º, inc I, art. 36, caput, e art. 38, inc. IV, alínea 'b', da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Outro ato supostamente criminoso praticado pela DENUNCIADA, segundo o DENUNCIANTE, foi a execução de despesas sem autorização orçamentária, irregularidade também apontada pelo Tribunal de Contas da União no exercício financeiro de 2014, o que importa em violação do art. 167, II, da Constituição Federal e do art. 32, § 1º, inc. V da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ainda em relação ao exercício financeiro de 2014, alega o DENUNCIANTE que o Tribunal de Contas da União identificou não ter havido contingenciamento de despesas discricionárias da União, o que, inclusive, foi objeto de amplo debate nacional quando, no último trimestre do ano, o governo enviou ao Congresso projeto de lei alterando a meta de superávit, tendo condicionado expressamente a liberação de emendas parlamentares à aprovação da matéria.
Por fim, afirma o DENUNCIANTE que houve a inscrição irregular de restos a pagar de despesas do programa "Minha Casa Minha Vida" em flagrante violação ao art. 37, caput, da Constituição Federal, art. 36, caput, da Lei 4.320/64, art. 67, caput, do Decreto nº 93.872/86 e art. 1º, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ao final, além de pedirem para que a Câmara dos Deputados autorize a instauração de processo por crime de responsabilidade contra a DENUNCIADA, solicitaram a oitiva desta, juntaram documentos e solicitaram a notificação do Tribunal de Contas da União, para que forneça cópia dos respectivos processos.
A denúncia obedecia apenas parcialmente aos requisitos formais previstos nos artigos 14 e 16 da Lei nº 1.079/50 bem como faltava a descrição específica da conduta da DENUNCIADA que, em tese, configuraria cada um dos crimes a ela imputados, requisito material essencial ao prosseguimento do processo. Assim, determinei a notificação do DENUNCIANTE para que no prazo de 10 dias procedesse às adequações necessárias ao prosseguimento do processo.
Relatados, passo a decidir.
Inicialmente, insta observar que apenas em parte os requisitos formais previstos no artigo 14 e 16 da Lei nº 1.079/50 foram atendidos.
O DENUNCIANTE providenciou o recolhimento de firma em sua assinatura e comprovou estar no gozo de seus direitos políticos, entretanto, não cuidou de pormenorizar cada uma das condutas da DENUNCIADA que importam no cometimento de crime de responsabilidade nem demonstrou a participação direta ou indireta da Presidente da República nos atos descritos.
Ora, tenho insistido sempre que, a despeito da crise moral, política e econômica que assola o Brasil, a gravidade institucional que representa o início de um processo por crime de responsabilidade contra a Presidente da República demanda o apontamento de um ou mais fatos concretos, uma ou mais condutas específicas da DENUNCIADA que, ao menos em tese, configure um ou mais tipos penais previstos na Lei nº 1.079/50.
Com efeito, em relação aos crimes eventualmente praticados pela DENUNCIADA contra a lei orçamentária, o DENUNCIANTE vale-se do recente julgamento das contas de 2014 e das chamadas pedaladas fiscais do governo pelo Tribunal de Contas da União. Entretanto, é de se notar que a decisão acerca da aprovação ou não dessas contas cabe exclusivamente ao Congresso Nacional, tendo a Corte de Contas apenas emitido seu parecer, o qual não obriga a Câmara dos Deputados nem o Senado Federal.
A denúncia vem lastreada em oito fundamento, sendo que penas em um o DENUNCIANTE aponta ato de responsabilidade direta da DENUNCIADA que, em tese configura crime de responsabilidade: a edição do Decreto nº 8.367/2014, frontalmente contrário à Lei de Responsabilidade Fiscal e à Lei nº 12.919/2013 (Lei de Diretrizes Orçamentárias para o ano de 2014).
Porém, ainda que o DENUNCIANTE tenha apontado diretamente um ato da DENUNCIADA que configure em tese, como já dito, crime de responsabilidade, observo que tais atos, como a edição do Decreto nº 8.367/2014, são anteriores ao atual mandato. Assim, inafastável a aplicação do § 4º do artigo 86 da Constituição Federal, o qual estabelece não ser possível a responsabilização da Presidente da República por atos anteriores ao mandato vigente.
Não ignoro a existência de entendimento contrário, especialmente em razão de o dispositivo citado ser anterior à emenda constitucional que permitiu a reeleição para os cargos do Poder Executivo. Porém, não se pode simplesmente ignorar que o constituinte reformador teve a oportunidade de revogar ou alterar o § 4º do artigo 86 e não o fez, estando mantida, portanto, a sua vigência.
Assim, evidenciada a inépcia da denúncia, deixo de recebê-la.
Publique-se. Oficie-se. Arquive-se.
Brasília, em 02 de dezembro de 2015.
EDUARDO CUNHA
Presidente
- Diário da Câmara dos Deputados - Suplemento - A - 3/12/2015, Página 3533 (Publicação Original)