Legislação Informatizada - PROCLAMAÇÃO DE 13 DE JULHO DE 1821 - Publicação Original
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PROCLAMAÇÃO DE 13 DE JULHO DE 1821
As Côrtes Geraes e Extraordinarias da nação portugueza aos habitantes do Brazil.
A heroica resolução, que haveis tomado, de seguir a causa da patria, e correr a sorte de seus valorosos filhos, acabou de consolidar para sempre o magestoso edifico da liberdade e da independencia nacional.
Promettendo adoptar a Constituição Politica, que fizerem as Côrtes Geraes e Extraordinarias, vós contrahistes a obrigação de adoptar tambem as Bases, que ellas já decretaram, e que a Nação tem abraçado e jurado como preliminares de sua venturosa regeneração.
Nellas vereis lançados com mão segura, e acautelada os traços fundamentaes desse maravilhoso monumento, que vai ser levantado pelo sublime esforço da constancia e da virtude sobre as ruinas do despotismo, e da arbitrariedade.
Nellas vereis o mais seguro apoio da felicidade dos Portuguezes, porque ellas encerram a declaração autentica dos direitos do homem, a salvaguarda das suas franquezas, e o resumo de suas relações sociaes, intimamente ligados com sua existencia politica.
Uma religião santa, professada e sustentada com o fundamento da moral publica, e como fonte perenne da geral prosperidade. Um Monarcha Constitucional como primeiro Magistrado e chefe da nação, que o escolheu. Direito de successão ao throno para evitar as commoções dos interregnos. Poderes soberanos, emfim, distinctos e separados, mas deveres e obrigações mutuas do Rei para com o seu Povo, e do Povo para com o Rei, são outros tantos principios sanccionados nas Bases, que afiançam a felicidade da nação, elevando-a ao eminente logar, que ella deve accupar entre as grandes nações, e fixando para toda a duração dos seculos a época mais brilhante, e mais gloriosa de seus fastos, e acontecimentos politicos.
Brazileiros! O Congresso não duvidava de vossos sentimentos patrioticos, e liberaes, mas elle respeitava o direito, que só a vós pertencia de manifestar competentemente vossos desejos. Decretou por isso, que vós farieis parte da grande familia Portugueza, logo que tivesseis declarado vossa adhesão ao novo pacto social, que ella acabava de fazer. Assim, quando vós repetistes com tanto enthusiasmo o grito, que resoou do Douro ao Tejo; quando vós fizestes conhecer tão solemne, e espontaneamente a vossa vontade, vós prendestes maravilhosamente em laços indissoluveis um a outro hemispherio; e pela mais depurada e solida politica, vós unistes em um só interesse os interesses de tantos habitantes, separados por centenares, e centenares de leguas.
É preciso comtudo que vossos Deputados venham completar o quadro da representação nacional para auxiliar as Côrtes em suas laboriosas tarefas, e tomar nas deliberações a parte que devem ter. O Congresso irá entretanto continunado a marcha augustam, firme e regular, com que tem principiado a reforma dos abusos, que opprimem a nação.
A liberdade da imprensa, esta irmã gemea da liberdade civil e politica, esta filha querida dos Governos representativos, é hoje o primeiro, e mais apreciavel direito do cidadão Portuguez.
A Inquisição e a Inconfidencia, verdadeiros monstros na ordem social, e horrivel invento dos despotas, e dos tyrannos, já não existem. A humanidade e a razão têm recobrado seus fôros.
Os differentes ramos da publica administração vão tomando uma nova face: a marcha dos negocios já é outra.
Uma severa economia preside a despeza da Fazenda Nacional, que não será mais consumida em disperdicio, ou indiscretas mercês, e não merecidas tenças. O Thesouro Publico, entregue a mãos fieis e vigilantes não será mais a preza de ambiciosos aulicos, nem de perversos conselheiros. Uma judiciosa fiscalisação dá já esperanças de que a nação poderá pagar em poucos annos a divida, que tem reconhecido, sem augmentar mais tributos, e sem faltar ás urgencias diarias. Uma caixa de amortisação com fundos proprios, applicados a este objecto segura os credores do Estado, e restabelece o credito do Governo.
Trata-se da reforma, e reducção do exercito até ao ponto em que seja bastante para fazer a vossa e a nossa segurança, e cuida-se da marinha de guerra a tal ponto arruinada, que só se conhece agora pelos dispendiosos, e quasi inuteis estabelecimentos que della nos restam. Hoje é demonstrada a necessidade de levar ao mais perfeito estado, que fôs possivel, esta parte da força publica.
Não ha com effeito outro meio de restabelecer nosso commercio, conservar o senhorio de nossos mares defender as suas costas e fazer respeitar nossa bandeira, mas as Côrtes têm projectado diminuir neste ramo o apparato, augmentando a realidade.
Os Ministros e empregados publicos são vigiados em sua conducta, e a sua responsabilidade é já effectiva. Muitos têm sido demittidos por indignos dos logares que accupavam.
Fiscalisam-se os salarios; e os ordenados são postos na proporção, que devem ter em um systema constitucional. Não haverão mais officios creados só para empregar homens, e esses quasi sempre indignos de qualquer emprego.
Tem adoptado outras muitas medidas sobre diversos ramos de publico e universal interesse. A agricultura, o commercio, e a industria, como fontes de riqueza nacional, têm merecido do Congresso um particular cuidado e vigilancia.
Muitas destas geraes providencias, que fazem o objecto de differentes decretos das Côrtes, são applicaveis ao Brazil, e portanto vós ides gozar já dos bens, que dellas resultam; mas convem admittir o principio, de não de fazem reformas senão com tempo, e que mais tempo ainda é necessario para lhes dar execução, consistencia e estabilidade.
Comtudo um meio se offerece muito prompto de certo, para remediar em grande parte vossos males; e é que o Governo de vossas Provincias, regulado de modo, que vosso estado tão imperiosamente exige, seja logo entregue a homens probos e verdadeiramente constitucionaes, que plantem entre vós este venturoso systema, debaixo do plano de moderação, e suavidade, que se tem seguido com tanta energia. Conhecereis então por uma feliz experiencia quaes são as vantagens, que hão de resultar-vos da vossa adhesão á Constituição, que as Côrtes estão fazendo, e vereis quanto é bello e magnifico o futuro, que ella vos apresenta, e afinaça.
É preciso porém ter em grande consideração as circumstancias em que nos achamos. Nenhum Estado pôde substituir sem força physica, e sem força moral: mas aquela é quasi sempre perdida sem esta. Para conservar ambas devemos portanto estreitar cada vez mais nossas relações politicas. Os sentimentos fraternaes que a natureza nos inspira; a consoladora idéa de que temos todos a mesma origem, e a lembrança até de que tem pesado sobre nós as mesmas desgraças, nos persuade de que devemos ter tambem todos a mesma fortuna.
E na verdade que outra cousa é mais conforme a nossos mutuos interesses? Habitando o paiz mais fertil, e mais rico dos que se conhecem, nós não precisamos para sermos venturosos sinão de boas leis, e executadas por um Governo bem organizado, e que saiba tirar todo partido, que offerece nossa vantajosa situação.
Este Governo existe já. Cada dia se vai melhorando o systema administrativo: cada dia augmenta a força da opinião, que reconhece a necessidade de manter a nova ordem das cousas; porque ella dá já em resultado verdadeiros bens de que não tinhamos gozado nunca. Esta é hoje a convicção de todos os Portuguezes: os que a não adquiriram ainda, perderam já este nome.
El-Rei acaba de chegar a este Reino, e a sua entrada em Lisbôa deu nova occasião aos habitantes e ao Congresso de menifestarem o amor, que consagram á sua pessoa, e a veneração, que tem por suas virtudes. Não faltou demonstração alguma publica do respeito, que lhe é devido: e, no meio da maior ordem, e tranquilidade foi geral a satisfação, e alegria da capital ao tornar a ver o seu Monarcha Constitucional. O juramento solemne, que Sua Magestade deu na presença das Côrtes, promettendo observar, e fazer observar as Bases da Constituição, poz o ultimo sello á confiança publica, e acabou de socegar aquelles que se lembravam de duvidar de seus sentimentos, só porque elle chegara cercado desses homens máos, que tão grande parte tiveram nas desgraças da patria. As Côrtes manifestaram a necessidade de os separar para longe de uma cidade, á qual tanto escandalo tem dado. Com isso conseguiram elles tambem escapar a outras demonstrações do desprezo publico, que os acompanhará, todavia, em qualquer parte, em que se acharem.
Tal é, habitantes do Brazil, nossa politica situação; e á vista della, que mais podemos nós desejar? É mantida a nossa liberdade; protegida a nossa segurança, e respeitada a nossa propriedade; que maiores ou que mais solidas vantagens offerecerá portanto qualquer outra fórma de governo? Acaso poderemos nós illudir-vos ainda com essa idéa chimerica de uma liberdade pouco menos que illimitada? Acaso seria possivel conseguil-a sem commoções, sem violencias e sem desgraças? E conseguida, de que nos serviria ella? Seriamos nós porventura mais felizes?
As luzes do seculo registram hoje tão arriscados como indiscretos desejos, e uma desgraçada experiencia tem convencido os homens de que devem viver livres, mas que essa liberdade deve tambem ser exercitada de modo, que se previnam as revoluções violentas, e se mantenha a maior harmonia entre a legislação, e os conhecimentos uteis á humanidade, e necessarios á felicidade dos Povos. É preciso respeitar o voto geral das nações.
Lançai os olhos pela historia, e vereis qual tem sido o resultado das lutas dos partidos, e das facçoes. O estrago, a assolação e a morte, companheiros inseparaveis da anarchia, e da guerra civil, foi sempre, e está sendo ainda hoje a sorte dos paizes, em que as paixões fomentam a desunião e a discordia entre os seus concidadãos.
Habitantes do Brazil! Continuai a imitar a moderação, que nesta época memoravel tem manifestado vossos irmãos. É só no secego, e na união dos sentimentos patrioticos, que se formam os costumes, e se adquirem esses habitos, essencialmente necessarios para a mudança que fizemos. - Não é de outro modo que se fortalece um espirito publico, e um caracter nacional, esta virtude, verdadeira origem de todas as outras virtudes sociaes e civicas; que distigue, e ennobrece os povos civilisados, e de que os Portuguezes não são menos capazes, nem precisam menos.
Brazileiros! Nossos destinos estão ligados: vossos irmãos não de reputarão livres, sem que vós o sejaes tambem: vivei certos disso; e convencei-vos de que os seus Deputados, como representantes de toda a nação, estão promptos a secrificar até a sua propria existencia para que ella seja tão livre e tão feliz, quanto o pode e o merece ser.
Peço das Côrtes 13 de Julho de 1821. - José Joaquim Ferreira de Moura, Presidente. - João Baptista Felgueiras, Deputado Secretario. - Agostinho José Freire, Deputado Secretario.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1821, Página 49 Vol. I pt. I (Publicação Original)