Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.164, DE 2 DE MARÇO DE 2023 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.164, DE 2 DE MARÇO DE 2023

Institui o Programa Bolsa Família e altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social, e a Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, que dispõe sobre a autorização para desconto em folha de pagamento.

EMI nº 00006/2023 MDS MPO MF

Brasília, 1º de março de 2023.

     Senhor Presidente da República.

     Dirigimo-nos à Vossa Excelência para apresentar a proposta de Medida Provisória para instituir o Programa Bolsa Família; altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; revoga e altera dispositivos da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003; revoga dispositivos da Medida Provisória nº 1.155, de 1º de janeiro de 2023, ou a lei em que for convertida, e dispositivos das Leis nº 14.284, de 29 de dezembro de 2021, e nº 14.342, de 18 de maio de 2022; e dá outras providências.

     A Constituição Federal determina que "Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária".

     A Lei nº 10.835, de 8 de janeiro de 2004, prevê que a renda básica de cidadania "deverá ser alcançada em etapas, a critério do Poder Executivo, priorizando-se as camadas mais necessitadas da população" (§ 1º do art. 1º).

     Os dois dispositivos acima citados, um de natureza constitucional, e outro de caráter legal, deixam claro que a transferência de renda a ser realizada pelo Poder Público aos cidadãos mais pobres é um imperativo da ordem jurídica brasileira. A forma como ocorrerá, no entanto, está sujeita a um regramento legal específico, que estabeleça seus requisitos, critérios, mecanismos de gestão e operacionalização e procedimentos.

     A política federal de transferência condicionada de renda vigente é o Programa Auxílio Brasil, instituído pela Lei nº 14.284, de 2021. Sua inadequação, contudo, já foi verificada e documentada não apenas por órgãos do Poder Executivo e de controle externo, como pelos meios de imprensa e instituições da sociedade civil.

     A finalidade da edição de medida provisória ora proposta é a superação do atual modelo de benefício financeiro a ser pago às famílias beneficiárias da ação de transferência condicionada de renda. A providência é necessária para, dentre outros aspectos: restabelecer a equidade nos valores recebidos pelas famílias; eliminar o incentivo à proliferação de registros familiares unipessoais; melhorar o custo-efetividade do gasto com a política pública em questão; restabelecer instrumentos de controle sobre a gestão e a operação da ação; e aperfeiçoar mecanismos de controle da elegibilidade aos benefícios.

     A substituição do Programa Auxílio Brasil pelo Programa Bolsa Família, conforme se determina na medida provisória proposta, é a providência necessária para que se atinjam três objetivos fundamentais.

     Em primeiro lugar, superar uma política pública normativamente complexa e que está criando distorções de gestão e operacionais em seu propósito de apoiar financeiramente as famílias mais pobres da sociedade brasileira. A cesta de benefícios do Auxílio Brasil foi criada na Lei nº 14.284, de 2021, mas logo abandonada em função da sanção da Lei nº 14.342, de 2022, que estabeleceu um piso de R$ 400,00 (quatrocentos reais) para todas as famílias, independentemente de sua composição, e da promulgação da Emenda Constitucional nº 123, de 2022, a qual estabeleceu o piso de benefício de R$ 600,00 (seiscentos reais), pago entre agosto e dezembro de 2022. As distorções deste modelo foram apresentadas na primeira parte do Parecer de Mérito que sustenta a Medida Provisória ora proposta.

     Segundo, a Medida Provisória ora proposta busca dar seguimento à providência adotada com a adoção da Medida Provisória nº 1.155, de 1º de janeiro de 2023. Além de criar as distorções na implementação da política de transferência condicionada de renda, acima identificadas, a cesta de benefícios do Auxílio Brasil ainda era cercada por incerteza, sobretudo para as famílias. O pagamento mínimo de R$ 600,00 (seiscentos reais) foi garantido pela gestão encerrada em 2022 apenas até o dia 31 de dezembro.

     Com a edição da Medida Provisória nº 1.155, de 2023, a gestão iniciada em 2023 garantiu a continuidade da transferência de R$ 600,00 (seiscentos reais). Busca-se complementar o valor com o benefício adicional de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) decorrente de as famílias possuírem, em sua composição, crianças com até seis anos de idade.

     Em terceiro lugar, a medida provisória busca solucionar a dificuldade de atender à expectativa das famílias beneficiárias, sintetizada pelo benefício de R$ 600,00 (seiscentos reais) como piso da transferência a todas as famílias, adicionado pelo de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) para cada criança de até seis anos, ao mesmo tempo em que satisfaz à necessidade real e urgente de recuperar a lógica de combate às vulnerabilidades específicas de cada família, decorrentes sobretudo de sua composição.

     Restabelecer a lógica do cálculo do benefício financeiro a partir da composição familiar - que abrange número de integrantes e a presença de situações específicas, como gestação e primeira infância, entre outros aspectos - é providência necessária, porém não suficiente, para que o Poder Executivo ofereça uma política condicionada de transferência de renda sustentável, eficaz, equânime e com bom custo-efetividade.

     A focalização do programa no seu público mais vulnerável, em especial as crianças de até 6 anos de idade, está em consonância com diversos estudos que argumentam ser fundamental o amplo desenvolvimento cognitivo e emocional na primeira infância para a plena formação do cidadão, com nítidos reflexos na juventude e na vida adulta. O novo PBF, com a instituição do Benefício Primeira Infância, no valor de R$ 150,00 por criança de 0 a 7 anos incompletos, além do Benefício Variável Familiar, no valor de R$ 50,00 por gestante e criança e adolescente de 7 a 18 anos incompletos, assume relevante papel no combate à pobreza monetária infantil e infanto-juvenil, e, sintonia com as condicionalidades de educação e saúde e do acompanhamento social pela rede do Sistema Único de Assistência Social.

     A recriação do Programa Bolsa Família busca atender ainda às recomendações proferidas pelo egrégio Tribunal de Contas da União, que por meio do Acórdão n° 2.725, de 2022, decidiu:

     ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão de Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

     9.1. recomendar ao Ministério da Cidadania, com fundamento nos arts. 71, inciso IV, da Constituição Federal, 1º, inciso II, e 43, inciso I, da Lei 8.443/1992, c/c o art. 250, incisos II e III, do Regimento Interno, que:

     9.1.1. considere, nos estudos para ajustes e normatização do Programa Auxílio Brasil ou de programa que o venha a substituir, promover pagamentos per capita mais equitativos entre as famílias beneficiárias, de forma a obter melhor equidade e custoefetividade;

     9.1.2. investigue e saneie possíveis distorções na composição familiar dos integrantes do CadÚnico, principalmente em relação aos beneficiários do Auxílio Brasil ou a outro benefício que o venha a suceder;

     9.1.3. promova a atualização cadastral do CadÚnico por meio de cronograma mais célere de revisões, focalizações, averiguações cadastrais e ações de administração de benefícios, prezando pela integralidade e tempestividade na gestão dos benefícios previstos na Portaria MC 746/2022;

     A presente proposta de Medida Provisória mantem o acompanhamento das condicionalidades de educação e saúde como um dos eixos estruturantes do novo Programa, reforçando a sua importância central para a ruptura do ciclo intergeracional de reprodução da pobreza. Além da transferência direta de renda às famílias beneficiárias, promover o acesso à saúde, educação e à convivência familiar e comunitária é fundamental para o desenvolvimento de capital humano, em particular, entre as crianças e adolescentes, visando proporcionar melhores oportunidades para prosperarem e superarem vulnerabilidades históricas.

     A proposta de Medida Provisória também reforça o caráter interfederativo do Programa e a lógica engajamento de Municípios, Estados e o Distrito Federal por meio do acompanhamento de resultados e apoio financeiro baseado no Índice de Gestão Descentralizada. Controle social e transparência são fundamentos, com a participação direta dos Conselhos de Assistência Social. Em casos de conduta dolosa de beneficiários ante o Cadastro Único e ao PBF, procedimentos de cobrança para ressarcimento ao erário serão acionados. No caso de indício de irregularidade por parte de agentes públicos no registro de informações no Cadastro Único, autoridade policial competente será acionada para investigar o comportamento irregular. A Caixa Econômica Federal retomará seu protagonismo como Agente Operador e Pagador, trazendo maior segurança e investimentos na infraestrutura do Programa, mas também se abre possibilidade outras instituições federais apoiarem na operacionalização. O novo Bolsa Família beneficiará em 2023 aproximadamente de 21 milhões de famílias, com orçamento no exercício aproximadamente R$ 175,7 bilhões. Estima-se para o ano de 2023 custos administrativos adicionais da ordem de R$ 850 milhões para apoio aos entes federados e outras ações de gestão, além de R$880 milhões para pagamento de contrato com o agente operador do Programa. Com isso, o impacto orçamentário total previsto é de R$ 177,4 bilhões.

     Para os exercícios subsequentes, estima-se os mesmos patamares de despesas para manutenção do Programa. Desta forma, impactos orçamentários e financeiros da presente proposta de Medida Provisória foram calculados de forma a assegurar o cumprimento dos artigos 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000), do art. 114 da Lei nº 13.898, de 11 de novembro de 2019 (Lei de Diretrizes Orçamentária de 2020 - LDO 2020) e do teto de despesas estabelecido no art. 107 dos Atos e Disposições Constitucionais Transitórios (ADCT) pela Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016.

     A proposta de Medida Provisória também extingue a possibilidade de os beneficiários do Auxílio Brasil, e consequentemente do Bolsa Família, contratarem empréstimos mediante crédito consignado. O mesmo ocorrerá com os beneficiários do Benefício de Prestação Continuada.

     Por esses motivos, Senhor Presidente, propõe-se a extinção do Programa Auxílio Brasil e a recriação do Programa Bolsa Família, nos termos fixados na minuta de medida provisória ora apresentada, na qual submetemos à sua apreciação.

     Respeitosamente,

JOSÉ WELLINGTON BARROSO DE ARAÚJO DIAS,
SIMONE NASSAR TEBET,
FERNANDO HADDAD


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 02/03/2023


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 2/3/2023 (Exposição de Motivos)