Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.031, DE 23 DE FEVEREIRO DE 2021 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.031, DE 23 DE FEVEREIRO DE 2021

Dispõe sobre a desestatização da empresa Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - Eletrobras e altera a Lei nº 5.899, de 5 de julho de 1973, a Lei nº 9.991, de 24 de julho de 2000, e a Lei nº 10.438, de 26 de abril de 2002.

EMI nº 00003/2021 MME ME

Brasília, 12 de Fevereiro de 2021

     Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

     1. Submetemos à elevada consideração de Vossa Excelência proposta de Medida Provisória, que dispõe sobre o modelo de desestatização da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - Eletrobras.

     2. A proposta consubstancia a política de capitalização da Eletrobras que vem sendo divulgada desde 2019 como uma das prioridades da agenda energética e econômica deste Governo.

     3. O objetivo desta política é obter novos recursos para que a Eletrobras possa continuar contribuindo para a expansão sustentável do setor elétrico, em novos empreendimentos de geração e de transmissão de energia elétrica.

     4. Observa-se que, em virtude das dificuldades enfrentadas pela Eletrobras nos últimos anos, a sua participação na expansão da oferta de energia elétrica tem sido reduzida. No segmento de geração, a empresa detinha, em 2011, trinta e seis por cento de participação na oferta nacional. Ao final de 2019, essa participação havia caído para trinta por cento. Fenômeno semelhante se observou no segmento de transmissão. A Eletrobras chegou a deter cinquenta e oito por cento da Rede Básica do Sistema, em 2012, e, ao final de 2019, sua participação caiu para quarenta e cinco por cento.

     5. As perspectivas da empresa no segmento também são tímidas. Desde 2015 a Eletrobras e suas subsidiárias não arrematam nenhum Lote nos Leilões de Transmissão. De 2016 a 2019, seja por dificuldades financeiras, seja por decisão da Agência Nacional de Energia Elétrica - Aneel, as empresas do Grupo Eletrobras estiveram impedidas de concorrer. No Leilão de 2020, a empresa participou por meio de suas subsidiárias, mas não arrematou nenhum Lote. Os Leilões de 2016, 2017, os dois de 2018, o de 2019 e de 2020, registraram alto índice de sucesso, com mais de 95% dos Lotes arrematados e deságios médios de 36,7%, 40,46%, 55,26%, e 46,08%, 60,30% e 55,24% respectivamente.

     6. É evidente, pois, que a situação econômico-financeira da Eletrobras restringe sua atuação na expansão da oferta de geração e transmissão de energia elétrica, diminuindo a sua capacidade de competir no mercado no qual é um agente relevante.

     7. Para os brasileiros, por outro lado, levando-se em conta as expectativas de necessidade de investimento na expansão dos parques de geração e de transmissão de energia nos próximos anos, da ordem de R$ 407 bilhões até 2030, é imprescindível que existam no setor empresas pujantes, capitalizadas e de experiência reputada, como pode se tornar a Eletrobras após a conclusão do processo cujo modelo ora se propõe.

     8. Além disso, nota-se que o retorno da concorrência nos Leilões, por meio da participação de um número crescente de empresas, reduz o custo do sistema de transmissão para os consumidores de energia elétrica com garantia dos investimentos em expansão no segmento. A Eletrobras precisa, assim, estar apta a participar, com mais flexibilidade, desse ambiente mais competitivo também em prol dos consumidores

     9. A sociedade na qualidade de acionista, por sua vez, vem recebendo menos dividendos e tributos com os atuais resultados da Companhia que poderiam alcançar outros patamares com a capitalização da Empresa.

     10. A proposta de capitalização da Eletrobras reflete, ainda, o reconhecimento de que o Estado brasileiro deve priorizar gastos em áreas em que a sua atuação é essencial como educação, saúde e segurança pública.

     11. O setor elétrico brasileiro é reconhecido pela sua maturidade e segurança regulatória e institucional, características que garantem as condições para atração do capital privado e prestação de serviços de qualidade à população. Assim, a proposta de capitalização da Eletrobras é um sinal de que a sociedade prefere destacar recursos para as áreas de saúde, educação e segurança em lugar de alocá-los na capitalização de uma Empresa Estatal para realizar investimento no segmento de energia elétrica, coisa que já́ foi provado que o investidor privado, com os incentivos corretos, tem interesse em fazer.

     12. Diante do exposto, resume-se, a seguir, os principais aspectos da proposta legislativa para implementar a desestatização da Eletrobras, ora encaminhada.

     13. O modelo de desestatização proposto ocorrerá por meio de aumento do capital social mediante subscrição pública de ações ordinárias, sem que a União acompanhe esta subscrição. A União terá́ sua participação acionária reduzida e deixará de ser acionista majoritário. Para garantir que a União passará a ter participação minoritária na Companhia, o aumento de capital poderá́ ser acompanhado de oferta pública secundária de ações de propriedade da União.

     14. O modelo de desestatização por meio da capitalização da Eletrobras garante à União a sua permanência na Eletrobras desestatizada e diante da real perspectiva futura de aumento do valor da Companhia, a União será́ beneficiada pelo recebimento de dividendos proporcionais a sua participação acionária.

     15. A capitalização da Eletrobras está́ condicionada à renovação dos Contratos de Concessão para as Usinas Hidrelétricas da Eletrobras alcançadas pelo regime de cotas criado pela Lei nº 12.783, de 11 de janeiro de 2013, alterando o regime dessas Usinas para o Regime de Produção Independente de Energia, bem como à prorrogação do Contrato de Concessão da Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Assim, no primeiro caso, as empresas controladas pela Eletrobras deixarão de comercializar compulsoriamente a energia elétrica gerada a um preço fixado pela Aneel para negociá-la livremente no mercado regulado ou no mercado livre. Em contrapartida, as empresas passam a assumir os riscos dessa operação, tais como o risco hidrológico, cabendo a elas adotarem a melhor estratégia de comercialização.

     16. A mudança no regime de comercialização de energia elétrica, mesmo considerando os riscos envolvidos, adiciona valor ao Contrato de Concessão, já́ que a Empresa terá́ flexibilidade para vender sua energia no mercado regulado ou no mercado livre, podendo escolher os seus clientes, a preços e prazos definidos por ela e pelo mercado. Em contrapartida, para mitigar impacto tarifário, propõe-se que metade desse valor adicionado ao Contrato seja revertido à modicidade tarifária, por meio de sua destinação à Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, responsável pelo custeio de vários subsídios presentes nas tarifas de energia elétrica.

     17. O restante do valor adicionado dos novos Contratos de Concessão deverá ser destinado à União, na forma de bonificação de outorga, reconhecendo que a União deve ter retorno financeiro com o novo Contrato de Concessão, observada a sustentabilidade econômico-financeira da Empresa.

     18. Propõe-se, ainda, que o Conselho Nacional de Política Energética - CNPE defina o valor adicionado pelos novos Contratos de Concessão de Geração de Energia Elétrica e fixe os valores a serem destinados à CDE e à União.

     19. Além disso, é condição para a desestatização ora proposta a exigência de modificação do Estatuto Social da Eletrobras de modo a: (i) limitar o poder de voto dos acionistas à 10% do capital votante; (ii) vedar a realização de acordos de acionistas para o exercício de direito de voto, salvo para a formação de blocos com número de votos inferior ao limite de dez por cento do capital votante; e (iii) criar ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva da União, que dará o poder de veto na hipótese de alterações no Estatuto Social.

     20. Essas exigências visam a transformar a empresa em uma corporação, a exemplo de outras empresas mundiais do setor elétrico e de grandes empresas brasileiras. O percentual de dez por cento, além de alinhado com os outros exemplos de corporações do mercado de capitais brasileiro, é condizente com o atual nível de governança da Eletrobras. A importância desse modelo de corporação é evitar que a Eletrobras seja negociada a um agente já estabelecido no setor elétrico, concentrando mercado e inibindo a competição.

     21. Vale destacar que, para evitar o conflito de interesse, é previsto que a União não votará acerca da aceitação dos condicionantes à desestatização submetidos à Assembleia Geral dos acionistas da Eletrobras.

     22. Destaca-se, ainda, como condicionante para a operação objeto dessa proposição a exigência de reestruturação societária para manter sob controle, direto ou indireto, da União as empresas Eletrobras Termonuclear S.A. - Eletronuclear e Itaipu Binacional. Esse movimento decorre do fato de que essas empresas não podem ser controladas pela iniciativa privada. No primeiro caso, há vedação constitucional. No segundo caso, trata-se de Usina que foi constituída por acordo entre o Brasil e o Paraguai e que a Eletrobras figura como braço do Estado. Ainda sobre Itaipu Binacional, a desestatização da Eletrobras pode ensejar a necessidade de alterar o responsável pela comercialização da energia elétrica gerada pela Usina, razão pela qual é previsto que o Poder Executivo possa designar um novo responsável.

     23. A forma da reestruturação societária para manter a Eletronuclear e Itaipu Binacional sob controle da União será́ proposta pelos estudos a serem contratados no âmbito da Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997, que a sugerida Medida Provisória atribui como competência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES. Todavia, a proposta legislativa sugere que seja permitido ao Poder Executivo criar uma nova estatal com a finalidade de ser a controladora das duas empresas mencionadas, caso haja necessidade.

     24. Ainda em relação à reestruturação societária necessária para manter sob controle da União as empresas Eletronuclear e Itaipu Binacional, propõe-se que essa reestruturação também deverá comportar: (i) a gestão dos contratos de financiamento com recursos da Reserva Global de Reversão - RGR celebrados até 17 de novembro de 2016, atualmente sob gestão da Eletrobras, uma vez que os contratos posteriores a essa data foram celebrados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, conforme disciplinado pela Lei nº 13.360, de 17 de novembro de 2016; e (ii) a administração do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica - Procel de que trata a Lei nº 9.991, de 24 de julho de 2000.

     25. A proposta define ainda obrigação às concessionárias cujos contratos de concessão serão afetados pela Medida Provisória em questão de aportes anuais, pelo período de dez anos, no valor de R$ 350.000.000,00 (trezentos e cinquenta milhões de reais), com a finalidade de promover a revitalização do Rio São Francisco. A definição dos projetos a serem executados deverá ser realizada por Comitê̂ Gestor, conforme regulamento. As ações e projetos financiados por esses recursos devem ter foco na recarga das vazões afluentes e no aumento da flexibilidade operativa dos reservatórios, sem prejudicar o uso prioritário e o uso múltiplo dos recursos hídricos.

     26. A proposta também institui a possibilidade de destinação, ao operador da Transposição do São Francisco, de 78,4 MWmed pelo prazo de vinte anos, contados a partir de 2022, pelo preço de R$ 80/MWh, a serem corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA.

     27. Na mesma linha, propõe-se que a concessionária da Usina Hidrelétrica de Tucuruí aporte R$ 295 milhões de reais anuais, pelo prazo de dez anos, para o desenvolvimento de projetos na Amazônia Legal, também a serem definidos por Comitê Gestor, de forma a reduzir estruturalmente os custos de geração de energia nessa Região, considerado o desenvolvimento de projetos de energia renovável ou a partir de combustível renovável, bem como as interligações de localidades Isoladas e Remotas.

     28. Propõe-se, ainda, na mesma toada, obrigação às concessionárias de geração de energia elétrica localizadas na área de influência dos reservatórios das Usinas Hidrelétricas de Furnas Centrais Elétricas S.A., cujos contratos de concessão são afetados por esta Medida Provisória, que aporte R$ 230 milhões de reais anuais, pelo prazo de dez anos, para revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos referidos reservatórios com foco em ações que gerem recarga das vazões afluentes e ampliem sua flexibilidade operativa, sem prejudicar o uso prioritário e o uso múltiplo dos recursos hídricos.

     29. Considerando, ainda, o relevante papel do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica - Cepel, propõe-se que a Eletrobras mantenha o pagamento das suas contribuições associativas por um prazo de quatro anos de forma que se permita àquele Centro de Pesquisas encontrar novas fontes de recursos e que o Poder Executivo tenha condições de promover ações com vistas a garantir que os produtos decorrentes dos serviços prestados pelo Cepel continuem a ser ofertados ao setor elétrico brasileiro.

     30. Adicionalmente, outra medida que se destaca da proposição é relativa a deduções a serem consideradas no cálculo do valor adicionado a ser definido pelo CNPE. Isso diz respeito a valores não reembolsados pela Conta de Consumo de Combustíveis - CCC referentes ao consumo de combustível na Região Norte, limitada ao montante de R$ 3,5 bilhões.

     31. Dessa forma, condiciona-se a efetiva conclusão do processo de capitalização ora proposto à conversão desta Medida Provisória em Lei.

     32. Diante do exposto, entende-se justificada a urgência e relevância da medida pelo fato de o Projeto de Lei apresentado pelo Poder Executivo, em 2019, que trata da capitalização da Eletrobras, se encontrar sem encaminhamento no Congresso Nacional, e, ao mesmo tempo, em que a empresa perde participação no setor elétrico e consequentemente tem seu valor deteriorado.

     33. Além disso, como mencionado, para que o País possa retomar seu projeto de crescimento, haverá a necessidade de investimentos em montante expressivo, notadamente no setor elétrico, os quais a empresa, em sua configuração atual, é incapaz de realizar.

     34. Essas são, Senhor Presidente, as razões que justificam a elaboração da proposta de Medida Provisória que ora submetemos à superior deliberação de Vossa Excelência.

     Respeitosamente,

BENTO COSTA LIMA LEITE DE ALBUQUERQUE JUNIOR
PAULO ROBERTO NUNES GUEDES


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 23/02/2021


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 23/2/2021 (Exposição de Motivos)