Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 996, DE 25 DE AGOSTO DE 2020 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 996, DE 25 DE AGOSTO DE 2020

Institui o Programa Casa Verde e Amarela.

EMI nº 00029/2020 MDR ME

Brasília, 20 de Agosto de 2020

     Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

     1. Submetemos à sua superior deliberação proposta de Medida Provisória que cria o Programa Casa Verde e Amarela e dá outras providências.

     2. Em essência, o Programa proposto tem natureza abrangente e pretende abarcar todas as ações com benefício de natureza habitacional sob o escopo de trabalho da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério do Desenvolvimento Regional.

     3. A título de contextualização, importa pontuar que, historicamente, a falta de alternativas habitacionais gerada por fatores como o intenso processo de urbanização, a baixa renda das famílias, a apropriação especulativa da terra urbanizada e a pouca abrangência das políticas de habitação levaram um contingente significativo da população brasileira a viver em condições inadequadas.

     4. As experiências em programas habitacionais evidenciam a interação virtuosa entre a habitação e outros campos de políticas públicas, notadamente economia, educação, saúde, meio ambiente e assistência social. Os investimentos no setor habitacional impulsionam o setor da construção civil e fomentam a criação de novos postos de trabalho formais e a geração de renda. Além disso, têm potencial redutor das taxas de incidência de doenças relacionadas à inadequação habitacional, entre elas a tuberculose, de matriz semelhante à COVID-19, pandemia que no momento assola o Brasil e o mundo. Esses fatores combinados bem justificam a instituição do arcabouço legal, ora proposto, em caráter emergencial.

     5. O déficit habitacional, acumulado ao longo de décadas, representa um passivo de 6,35 milhões de moradias, que agregado à demanda habitacional futura, correspondente à quantidade de moradias que deverão ser acrescidas ao estoque habitacional para acomodar o crescimento populacional futuro e a formação de novas famílias, resulta no desafio de produção média de cerca de 1,23 milhão ao ano até 2030.

     6. Ao déficit propriamente dito, deve-se acrescentar as habitações inadequadas, isto é, que carecem de um ou mais requisitos de habitabilidade, como serviços de infraestrutura urbana (água, esgoto, energia elétrica ou coleta de lixo) e unidade sanitária interna, ou que apresentam má conservação, problemas de regularização fundiária e adensamento excessivo (mais de 3 moradores por dormitório). As estimativas são de que em 2014, no Brasil, existiam cerca de 960 mil domicílios próprios com adensamento excessivo, cerca de 7,7 milhões de domicílios sem esgotamento sanitário, e cerca de 940 mil domicílios sem cobertura adequada.

     7. Os indicadores aqui apresentados não são exaustivos do panorama das necessidades habitacionais que acometem o País, pois outros critérios, de difícil mensuração a partir dos dados atualmente existentes, concorreriam para o incremento dos números em referência. Contudo, o diagnóstico disponível embasa, por si, a criação de instrumentos jurídicos de emergência pela União, os quais se revelem dotados de amplo espectro de atuação e abrangência nacional.

     8. É importante, portanto, que se enfrente o quadro das necessidades habitacionais por meio de um conjunto de iniciativas destinado ao incremento do estoque de moradias, via produção de novas unidades ou requalificação de imóveis para utilização como moradia, e ao tratamento do estoque existente, por meio de programas de urbanização de assentamentos precários, regularização fundiária e melhoria habitacional.

     9. Diante da complexidade e da escala dos desafios postos no setor, o Programa Casa Verde e Amarela justifica sua relevância pela necessidade de corrigir erros do passado com o aprimoramento dos programas habitacionais existentes e a diversificação do catálogo de opções ofertado, tendo em vista as realidades diversas sobre as quais a política habitacional deve incidir.

     10. Parte-se da premissa de que a habitação consiste em questão mister nas políticas públicas, ao se projetar como uma forma material de inclusão social. Nessa linha, o Programa proposto tem por finalidade a efetivação do direito constitucional à moradia, com a perspectiva de que, em paralelo ao alcance da melhoria das condições de vida e de habitabilidade das populações urbanas e rurais, o desenvolvimento socioeconômico e a geração de trabalho e renda possam ser fomentados.

     11. Esse é o mote, logo de início, expresso no art. 1º que, além de instituir o Programa e destacar suas finalidades, estabelece o limite de renda mensal das famílias a serem atendidas, estipulado em até R$ 7.000,00 (sete mil reais). Além disso, o dispositivo apresenta o limite de renda a ser observado para a concessão de subvenções econômicas pela União.

     12. Os princípios e objetivos propostos pelo Programa Casa Verde e Amarela estão em harmonia com a legislação federal e os tratados internacionais relativos à moradia dos quais o Brasil é signatário, destacando-se a necessidade de redução das desigualdades regionais, missão precípua do Ministério do Desenvolvimento Regional, considerando as características e realidades de cada local na solução habitacional e no conceito abrangente de moradia, que inclui as dimensões física, urbanística, fundiária, econômica, social, cultural e ambiental.

     13. É seguindo essas diretrizes que o Programa se propõe a atuar na ampliação da quantidade de habitações disponíveis, fundamentalmente ao atendimento da população de baixa renda, na redução das inadequações habitacionais, no estímulo ao aperfeiçoamento tecnológico do processo da construção civil e no auxílio ao desenvolvimento e capacitação dos agentes públicos e privados atuantes na implementação de programas habitacionais.

     14. A Medida Provisória não se dedica, contudo, a estabelecer de antemão metas e prioridades que, com base na avaliação das disponibilidades orçamentárias e financeiras, poderão ser melhor definidas e rotineiramente revisadas por ato do Poder Executivo e por resolução dos órgãos colegiados gestores dos fundos que darão suporte ao Programa, conforme pode ser verificado no art. 4º.

     15. A proposta legislativa inova na organização de fontes de recursos e fundos que, hoje, já cumprem o papel de sustentar programas e ações habitacionais, além de incluir a possibilidade de novos ingressos, sobretudo, de recursos externos e de fontes privadas.

     16. Sobre esse aspecto é importante chamar atenção para o dispositivo contido no art. 17 que cuida de alterar a Lei n. 8.677, de 13 de julho de 1993, que dispõe sobre o Fundo de Desenvolvimento Social (FDS), o qual está elencado como um dos fundos a serem utilizados para implementação do Programa. A proposta de inserção do art. 12-A àquele diploma legal cria a possibilidade de que o cotista do FDS possa reverter os recursos correspondentes à sua cota à implementação dessa política pública ora tratada, por intermédio de doação.

     17. Essa alteração permitirá que, ainda neste exercício, seja possível aplicar, a partir da doação dos cotistas, R$ 500 milhões de recursos da iniciativa privada em ações de regularização fundiária e melhoria habitacional, cujo formato operacional encontra-se em discussão no âmbito do Conselho Curador do FDS.

     18. A Medida Provisória cuida também de recepcionar no novo Programa habitacional medidas contidas na Lei n. 11.977, de 7 de julho de 2009, e aperfeiçoar ou criar dispositivos importantes para corrigir falhas e suprir lacunas identificadas ao longo da última década.

     19. Assim, a proposta ora em apreço cuida não só de estabelecer um marco legislativo mais estratégico e abrangente para o atendimento das necessidades habitacionais do País, mas também de criar condições para viabilizar a execução de operações já contratadas, por intermédio de algumas alterações na Lei n. 11.977, de 2009, no intuito de proporcionar a conclusão e entrega de empreendimentos em curso. Nesse caso, trata-se, em especial, de disponibilizar um conjunto de ferramentas para situações de inadimplência dos beneficiários, tratamento e quitação da dívida decorrente, retomada e destinação dos imóveis e rito a ser adotado sobre os empreendimentos que porventura venham a sofrer turbação ou esbulho.

     20. Sobre esse ponto, entende-se que é urgente a adoção de medidas de proteção econômica dirigidas à população de baixa renda, que sofre de forma mais significativa os efeitos econômicos da pandemia, seja por estarem em situação de desemprego, momentâneo ou preexistente, seja pela inviabilidade de manutenção de trabalho informal.

     21. Nesse sentido, o referido dispositivo permitirá que o Poder Executivo adote medidas que minimizem o efeito econômico da pandemia, evitando a ampliação na inadimplência e do risco de perda da propriedade pelas famílias beneficiárias.

     22. Destaque-se que os ajustes no ordenamento jurídico em vigor, bem como o Programa habitacional ora proposto, estruturados dentro dos princípios aqui apresentados, de forma geral, podem ter sua implementação iniciada a partir do presente exercício, sem imposição de ônus orçamentários para União para além daqueles que já estão previstos, seja porque se encontram consignados, na Lei Orçamentária do corrente ano, seja porque constam nos planos de metas aprovados pelos correspondentes conselhos gestores dos fundos.

     23. Assim, o ato ora proposto caracteriza-se como relevante e urgente levando-se em conta o cenário de crise econômica posto pelo advento da pandemia COVID-19 e o potencial ainda existente no campo da habitação social para a produção de externalidades econômicas positivas.

     24. O alto efeito multiplicador dos investimentos na construção civil, que tem na edificação de habitações o seu segmento mais importante, em termos de aumento da oferta de postos de trabalho e de dinamização de diversos setores industriais e de serviços, assim como sua elevada participação na formação bruta de capital são universalmente reconhecidos. É esta característica que torna o setor habitacional um costumeiro instrumento das políticas de retomada do crescimento nos países, desenvolvidos ou não, submetidos a processos recessivos ou de desaceleração econômica.

     25. A percepção sobre a fragilidade desses territórios, as chamadas favelas ou comunidades e as precárias condições de moradia versus a propagação do vírus, eleva o sentido de urgência e importância da ação governamental na superação das suas mazelas urbanas e sociais, razão pela qual as Pastas apresentam o Programa Casa Verde e Amarela de que trata a Medida Provisória ora proposta.

     26. A edição por meio de Medida Provisória permite uma arrancada mais rápida na implementação das diversas ações habitacionais e, portanto, reação à crise econômica decorrente da atual situação, em especial, para utilização de recursos privados, provenientes do FDS aqui relatado, que darão amparo a ações de regularização fundiária e melhoria habitacional, com possibilidade de início imediato.

     27. Todos os argumentos expostos confirmam que a edição de Medida Provisória destinada à criação do Programa Casa Verde e Amarela deve ser realizada com urgência para que os seus resultados sejam validados e, consequentemente, ampliados, de modo a atender com eficácia, eficiência e efetividade o maior número de grupos familiares de baixa renda, alvo da política habitacional aqui referenciada. Resta justificado, portanto, o veículo normativo proposto para instituí-lo, para fins de implementação de política pública voltada a atender tanto as necessidades habitacionais do País quanto a urgência de retomada das atividades econômicas.

     28. Entendendo, Senhor Presidente, que o alcance social do ato aqui apresentado, bem assim suas externalidades positivas para a geração de trabalho e renda e da elevação dos padrões de habitabilidade e de qualidade de vida da população urbana e rural, associado aos demais aspectos mencionados quanto à sua relevância e urgência, atestam o atendimento dos requisitos previstos no art. 62 da Constituição e no Decreto n. 9.191, de 1º de novembro de 2017.

     29. Essas são, Senhor Presidente, as razões que fundamentam a proposta que ora submetemos à sua consideração.

     Respeitosamente,

ROGÉRIO SIMONETTI MARINHO
PAULO ROBERTO NUNES GUEDES


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 26/08/2020


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 26/8/2020 (Exposição de Motivos)