Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927, DE 22 DE MARÇO DE 2020 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927, DE 22 DE MARÇO DE 2020

Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências.

EM nº 00081/2020 ME

Brasília, 22 de março de 2020.

     Senhor Presidente da República,

     1. Submetemos à sua apreciação, proposta de Medida Provisória que dispõe sobre medidas trabalhistas para enfrentamento da emergência em saúde pública de importância internacional em razão da infecção humana pelo novo coronavírus (Covid-19), antecipa o calendário de pagamento do abono anual ao beneficiário da Previdência Social, e altera o prazo de validade da certidão expedida conjuntamente pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, referente a todos os tributos federais e à dívida ativa da União por elas administrados.

     2. A Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, dispõe sobre as medidas urgentes necessárias à prevenção, controle e contenção dos riscos, danos e agravos à saúde pública. No entanto, o evento é complexo e demanda o esforço conjunto de todos, não apenas do setor de saúde, para que os impactos sejam minimizados até que o estado de emergência se encerre.

     3. As medidas de isolamento e de quarentena necessárias à contenção da transmissão do vírus e, consequentemente, à redução no número de casos da doença Covid-19 e de mortes, provocam um forte impacto no setor produtivo e nas relações de trabalho, considerando as normas trabalhistas vigentes. Como forma de mitigar os danos à economia, são apresentadas uma série de medidas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservar o emprego e a renda durante esse período.

     4. A edição de uma Medida Provisória se justifica em função da necessidade de implementação de medidas urgentes e imediatas de isolamento dos trabalhadores em suas residências, com a manutenção, na medida do possível, dos vínculos trabalhistas, com segurança jurídica.

     5. Primeiramente, vale salientar que os efeitos das disposições contidas nesta Medida Provisória serão limitados ao período de decretação do estado de calamidade pública pelo Decreto Legislativo n º 6, de 20 de março de 2020.

     6. Durante esse período de calamidade, as medidas constituirão, para fins trabalhistas, hipótese de força maior, nos termos do art. 501 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Isso implica admitir que a pandemia do novo coronavírus é um acontecimento inevitável, em relação à vontade dos empregadores, e para o qual não concorreram, direta ou indiretamente. Além disso, a medida estabelece que os acordos individuais têm preponderância sobre os demais instrumentos normativos, respeitados os limites estabelecidos na Constituição Federal, visando garantir os vínculos empregatícios.

     7. Estão sendo propostas medidas de flexibilização das relações e obrigações trabalhistas e meios para propiciar a implementação de isolamento e de quarentena dos trabalhadores, minimizando o impacto sobre os empregados e empregadores.

TELETRABALHO

     8. A necessidade de isolamento nas próprias residências impõe a necessidade de adoção, em larga escala, das tecnologias de informação e comunicação para garantir a manutenção da prestação de serviços. O teletrabalho, nas atividades possíveis e havendo os meios necessários, é a forma de trabalho mais adequada ao estado de emergência atual, uma vez que possibilita o exercício do trabalho fora das dependências do empregador.

     9. Pelas regras da CLT, a prestação de serviços na modalidade de teletrabalho precisa estar expressa no contrato individual de trabalho. Da mesma forma, a alteração do regime de teletrabalho para o presencial deve ser registrada em aditivo contratual. Pela medida, o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho para teletrabalho, trabalho remoto ou qualquer outro tipo de trabalho à distância, mesmo na ausência de acordos individuais ou coletivos, sendo desnecessário o registro prévio desta alteração no contrato individual de trabalho. Ainda ficam incluídos nessa medida a permissão de teletrabalho para estagiários e aprendizes.

ANTECIPAÇÃO DAS FÉRIAS INDIVIDUAIS E CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS

     10. Em relação às férias, a medida flexibiliza os prazos para aviso, gozo e pagamento dos períodos de férias, de forma a facilitar o cumprimento do período necessário à contenção da transmissão e remissão da doença causada pelo coronavírus. Além de reduzir a circulação e a aglomeração de pessoas nos ambientes de trabalho, configura-se como uma alternativa aos setores ou atividades nos quais não se aplica o teletrabalho.

APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS

     11. A antecipação de feriados não religiosos federais, estaduais e municipais poderá ser uma alternativa adotada para permitir a liberação dos trabalhadores ou a compensação do saldo em banco de horas. Os feriados religiosos também poderão ser antecipados, desde que haja concordância manifestada pelo empregado.

BANCO DE HORAS

     12. Diante da necessidade de interrupção de diversas atividades, fica admitida a adoção de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, flexibilizando-se o período de compensação para até 18 meses, dada a incerteza do cenário provocado pela pandemia. Ficaram mantidos a necessidade de acordo, individual ou coletivo, escrito, e o limite de prorrogação de jornada em 2 horas diárias.

SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO

     13. Em relação ao cumprimento das normas regulamentadoras de segurança e saúde do trabalho, ficam afastadas as obrigações referentes aos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, que deverão ser realizados até sessenta dias após o fim do estado de emergência. A medida é necessária para evitar a sobrecarga dos serviços de saúde e a exposição dos trabalhadores ao risco de contágio. Fica mantida a obrigação de realização de exames demissionais em função dos riscos jurídicos envolvidos na rescisão de contrato de trabalho. Ainda assim, o exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional, mais recente, tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias, visando não sobrecarregar os serviços de saúde e não expor os trabalhadores a algum risco.

     14. Ainda, fica suspensa a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos previstos nas Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho, que deverão ser realizados em até noventa dias do fim do estado de emergência.

DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO

     15. Há, ainda, a possibilidade de o empregador suspender o contrato de trabalho por até quatro meses para participação do trabalhador em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, de maneira remota, por meio de acordo individual com empregado ou grupo de empregados. Poderá ser concedida uma ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, com valor a ser definido livremente entre empregador e empregado.

DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FGTS

     16. A obrigação de pagamento de FGTS poderá ser suspensa, para as competências de março, abril e maio de 2020. O pagamento das obrigações deverá ocorrer a partir de julho de 2020, em até seis parcelas. Ademais, o recolhimento das competências março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência de atualização, multa e demais encargos previstos na legislação.

     17. Também fica suspensa a prescrição dos débitos relativos a contribuições de FGTS pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias a contar da publicação dessa medida.

OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA

     18. Ao final da proposta de Medida Provisória, estão estabelecidas disposições de caráter geral, como a aplicabilidade da norma para os trabalhadores temporários, rurais e empregados domésticos.

     19. Durante o período de estado de calamidade pública, mediante acordo individual escrito, mesmo para as atividades insalubres e jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis horas de descanso, será permitido aos estabelecimentos de saúde: prorrogar a jornada de trabalho, adotar escalas de horas suplementares entre a 13ª e a 24ª hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa, devendo ser garantido o repouso semanal remunerado. As horas suplementares computadas em decorrência dessa decisão poderão ser compensadas em até dezoito meses, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra.

     21. Fica estabelecida que a contaminação pelo novo coronavírus não será considerada ocupacional, desde que comprovado o nexo causal, e que os acordos e convenções coletivas vencidos ou prestes a vencer poderão ser prorrogados até noventa dias após o fim do estado de emergência.

     22. Ademais, durante o período de cento e oitenta dias a Auditoria Fiscal do Trabalho deverá ter atuação preponderantemente orientadora.

ANTECIPAÇÃO DO PAGAMENTO DO ABONO

     23. A proposta também antecipa o cronograma de pagamento do abono anual. Conforme art. 40 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, o abono anual é calculado, no que couber, da mesma forma que a Gratificação Natalina dos trabalhadores (décimo terceiro salário), tendo por base o valor da renda mensal do benefício do mês de dezembro de cada ano, sem especificar o mês de pagamento. Desde 2006, esse pagamento é realizado, via de regra, em duas parcelas, sendo a primeira para a competência agosto (com pagamento em setembro).

     24. O dispositivo contido na presente proposta estabelece que, excepcionalmente para o ano de 2020, o pagamento da primeira parcela seja feito na competência abril (realizado nos cinco últimos dias úteis desse mês e no início de maio); e a segunda parcela junto com o pagamento dos benefícios da competência maio (que acontece nos cinco últimos dias úteis desse mês e no início de junho). O objetivo dessa medida é incrementar a renda dos beneficiários que fazem jus ao abono durante esse grave momento econômico, por meio da injeção de 47,2 bilhões na economia do país. Ressalte-se que, na hipótese de cessação programada do benefício antes de 31/12/2020, o valor do abono anual será proporcional, bem como o encontro de contas entre o valor recebido pelo beneficiário e o efetivamente pago, na hipótese da cessação antes da data programada para os benefícios temporários, ou antes de 31/12/2020, para os benefícios permanentes.

     25. A presente Medida Provisória também visa permitir que, excepcionalmente, por ato conjunto da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, no que se refere a todos os tributos federais e à dívida ativa da União por elas administrados, em caso de calamidade pública, seja estendido o prazo de validade da certidão de regularidade de débitos.

     26. A redação atual do §5º, do art. 47, da Lei nº 8.212, de 1991, estabelece de forma rígida em cento e oitenta dias o limite máximo de validade das certidões de regularidade fiscal. Em um contexto de emergência, à semelhança do ora vivenciado, tal restrição não se justifica. Pelos termos ora propostos, em tal cenário, os órgãos da administração tributária federal poderão atribuir à certidão de regularidade fiscal prazo de validade adicional, presumindo a boa-fé do contribuinte e assegurando o exercício de atividades sem embaraços àqueles que, antes da situação de crise, estavam em situação de regularidade.

     27. Por fim, a proposta estabelece que as disposições de natureza trabalhista da Medida Provisória não se aplicam às atividades essenciais previstas no art. 10 da Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, com exceção das que abrangem: suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho e diferimento do recolhimento do FGTS.

     28. Espera-se que as medidas ora apresentadas contribuam para conter o avanço do novo coronavírus permitindo, por meio de várias medidas de flexibilização das relações trabalhistas, a permanência dos trabalhadores em isolamento em suas residências, sem a necessidade de rompimento dos vínculos empregatícios. Além disso, espera-se contribuir para a diminuição de despesas obrigatórias e fixas das empresas nesse momento de redução abrupta e drástica de faturamento em razão da retração do consumo e da emergência em saúde pública que afeta o mundo inteiro. A preservação da economia também está endereçada pela medida de antecipação do pagamento de abono salarial, com benefício aos grupos mais vulneráveis (idosos, doentes e inválidos), e pela possibilidade de prorrogação de certidões negativas de débito de tributos federais e da dívida ativa, eliminando potencial óbice ao acesso a crédito em um momento de dificuldade para as empresas.

     29. São essas, Senhor Presidente, as razões que justificam o encaminhamento da presente Medida Provisória à sua apreciação.

     Respeitosamente,

PAULO ROBERTO NUNES GUEDES


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 220320200


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 220320200 (Exposição de Motivos)