Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 868, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2018 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 868, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2018

Atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, para atribuir à Agência Nacional de Águas competência para editar normas de referência nacionais sobre o serviço de saneamento; a Lei nº 10.768, de 19 de novembro de 2003, para alterar as atribuições do cargo de Especialista em Recursos Hídricos; a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para aprimorar as condições estruturais do saneamento básico no País; e a Lei nº 13.529, de 4 de dezembro de 2017, para autorizar a União a participar de fundo com a finalidade exclusiva de financiar serviços técnicos especializados.

EM nº 00017/2018 MCidades

Brasília, 17 de Dezembro de 2018

     Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

     Encaminho à elevada apreciação de Vossa Excelência minuta de Medida Provisória que altera as Leis nº 9.984, de 17 de julho de 2000, para atribuir à Agência Nacional de Águas competência para editar normas de referência nacionais sobre o serviço de saneamento; a Lei nº 10.768, de 19 de novembro de 2003, para alterar as atribuições do cargo de Especialista em Recursos Hídricos; a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para aprimorar as condições estruturais do saneamento básico no País; e a Lei 13.529, de 4 de dezembro de 2017, para autorizar a União a participar de fundo que tenha como finalidade exclusiva financiar serviços técnicos especializados no setor de saneamento.

     Apesar dos 11 anos de vigência da Lei nº 11.445/2007, a população brasileira ainda enfrenta graves problemas de acesso aos serviços públicos de saneamento básico. Enquanto a cobertura por rede de abastecimento de água é relativamente alta, com exceção para o meio rural e cidades de pequeno porte, a cobertura de domicílios por rede coletora de esgoto e por coleta e destinação ambientalmente adequada de lixo está ainda longe do ideal no Brasil.

     Pelos dados do Sistema Nacional de Informações de Saneamento Básico (SNIS), 96,4 % dos domicílios urbanos são abastecidos com água por rede de distribuição ou por poço ou nascente com canalização interna, mas apenas 67,1% dos domicílios rurais são atendidos por este tipo de abastecimento. Portanto, 92,9 % dos domicílios brasileiros, urbanos e rurais são abastecidos por água. O índice de perda de água na distribuição no Brasil também chama da atenção: 38,1 % segundo dos dados do SNIS.

     Em relação aos domicílios rurais e urbanos servidos por rede coletora ou fossa séptica para esgotamento sanitário são 73,1%, segundo o SNIS, embora o índice de tratamento do esgoto coletado não ultrapasse os 44,9%. A expansão desordenada dos grandes centros urbanos agrava a coleta e o tratamento do esgoto sanitário, acrescido da praticamente ausência da coleta ou tratamento no meio rural brasileiro.

     As deficiências quanto a esses serviços de saneamento básico são melhor qualificadas ao se considerar outros problemas subjacentes. A existência da rede coletora de esgoto, por exemplo, não garante que o esgoto seja corretamente tratado antes de sua disposição, afetando a qualidade do corpo hídrico que o recebe.

     Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento para 2015 indicam que a proporção de esgoto tratado encontrava-se em 45%, quando se considera o esgoto gerado, e 74%, quando se considera o esgoto coletado. Outras vezes, há rede de coleta de esgoto e estrutura para seu tratamento, mas a inexistência de obrigação ou mecanismo de incentivo para conexão à rede faz com que essa seja subutilizada e sub-remunerada, com consequências para a saúde, o meio ambiente e para a sustentabilidade do serviço.

     Trata-se de um setor altamente monopolizado, onde as estatais tem forte predomínio e a iniciativa privada participa, timidamente, em apenas 6% dos municípios assistidos. O setor de saneamento básico no país acumula índices preocupantes de cobertura, comprometendo a saúde da população, principalmente daquela menos assistida pelas políticas públicas, e necessita de respostas ousadas e factíveis.

     Não se pode conviver com 35 milhões de brasileiros sem acesso a água de qualidade, 104 milhões sem esgoto tratado adequadamente, num país considerado a 9ª economia do mundo e subjugada a 123º no ranking mundial de serviços públicos de saneamento ambiental. Um país que necessita, com urgência, investimentos que superam R$ 22 bilhões por ano até 2033, para universalizar a cobertura de água e esgoto em todo o seu território e evitar a morte prematura de mais de 15 mil pessoas por ano por doenças de veiculação hídrica ou causadas pela ausência de saneamento.

     Também não se pode mais conviver com uma realidade em que foram cancelados de 2007 até hoje 160 contratos, no valor equivalente a R$ 3,5 bilhões do Orçamento Geral da União, somente no Ministério das Cidades, porque os Estados e as concessionárias públicas não conseguiram executar os empreendimentos previstos, basicamente obras de saneamento ou elaboração de projetos executivos de engenharia.

     A grande variabilidade de regras regulatórias se consolidou como um obstáculo ao desenvolvimento do setor e à universalização dos serviços. A Constituição Federal atribui a titularidade dos serviços de saneamento básico aos municípios, atribuição acolhida pela Lei nº 11.445/2007, que faculta aos titulares regular diretamente ou delegar a regulação desse setor. Esse arranjo explicitou as diferentes capacidades regulatórias dos diferentes titulares, resultando numa miríade de situações.

     Onze anos após a edição da Lei 11.445, de 2007, o país continua convivendo com um arranjo institucional de 49 agências reguladoras responsáveis pela regulação de 2.906 municípios dos 5.570 existentes, ou seja, 48% dos municípios não possuem nenhum tipo de regulação e num ambiente em que cada município pode ter a sua agência reguladora.

     Um primeiro problema decorrente deste arranjo é que titulares com baixa capacidade regulatória podem afetar negativamente a eficiência e desenvolvimento do setor de saneamento básico ao influenciar na qualidade ou preço dos serviços de forma inadequada. Uma segunda consequência da falta de padronização regulatória é a existência de custos de transação relevantes aos prestadores, públicos e privados, que trabalham para diferentes titulares. Estes são obrigados a se adaptar a regras regulatórias potencialmente muito diferentes na prestação de um mesmo serviço.

     A MP proposta atribui a Agência Natural de Águas (ANA) a competência de elaborar normas nacionais de referência regulatória para o setor de saneamento básico, que servirão como balizadores das melhores práticas para os normativos dos diferentes reguladores de saneamento básico do País. Espera-se assim uma elevação na qualidade das normas regulatórias para o setor de saneamento básico e uma maior uniformização regulatória em todo território nacional, enfrentando os problemas apontados acima.

     Para que a ANA possa exercer suas novas atribuições de maneira adequada, a necessidade de pessoal será suprida por meio de concurso público a ser autorizado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão dos cargos já existentes na lei e que ainda não foram providos e por meio da criação de 26 cargos comissionados técnicos para exercício exclusivo na Agência. Os cargos serão providos mediante autorização na legislação orçamentária.

     Além disso, com o intuito de aprimorar a atuação da ANA na gestão de recursos hídricos, a MP incorpora propostas de alterações pontuais na Lei 9.984/00 que darão maior agilidade administrativa e capacidade de resposta pela Agência em situações de crise.

     Está entre as atribuições da ANA a edição de manuais das melhores práticas regulatórias no sentido de nortear as ações das agências reguladoras, além de promover estudos e pesquisas para reduzir as perdas de água que causam enorme prejuízo para as operadoras.

     Outro problema enfrentado nesta proposta é a coordenação e racionalização das ações federais no setor de saneamento básico. O Governo Federal atua junto aos titulares dos serviços de diversas formas, por exemplo, auxiliando no planejamento das ações e com diversas linhas de crédito para financiar os investimentos. Contudo, como apontado pelo Acórdão TCU nº 3.180/2016 (TC 017.507/2015-5), tal atuação do Governo Federal precisa de maior coordenação. Esse problema é enfrentado com a criação do Comitê Interministerial de Saneamento Básico - CISB, que tem a finalidade de assegurar a implantação da Política Federal de Saneamento Básico e de articular a atuação dos órgãos e das entidades federais na alocação de recursos financeiros em ações de saneamento básico.

     O terceiro ponto tratado pela MP é a adequação das regras de consórcios públicos ao setor de saneamento. A Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005, traz regras gerais para os entes federados se associarem, contudo algumas dessas regras não se mostram adequadas ao setor de saneamento. Destacadamente, a dispensa de licitação para a celebração de contratos de programa reduziu em demasiado a concorrência no setor de saneamento onde, por se tratar se um monopólio natural, os concorrentes competem pelo mercado e não no mercado.

     Segundo a Constituição Federal, compete aos municípios a prestação dos serviços de interesse local, sendo os mesmos, portanto, titulares da prestação dos serviços de saneamento básico. Contudo, tal titularidade foi objeto de disputa entre estados e municípios nos casos em que se constituem regiões metropolitanas até a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a ADI 1842. A mudança proposta na MP incorpora à legislação tal jurisprudência, afirmando que os Municípios e o Distrito Federal possuem a titularidade dos serviços públicos de saneamento básico, mas que, nas situações que caracterizem o interesse comum, o exercício da titularidade será realizado por meio de colegiado interfederativo, formado a partir da instituição de região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião, conforme o disposto na Lei 13.089/2015 (Estatuto da Metrópole).

     Destaca-se também a possibilidade da cobrança dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos, que historicamente têm enfrentado problemas para seu financiamento, em conjunto com os de água e esgoto. Estabelece ainda a possibilidade de participação em Fundo de universalização do saneamento, cujos recursos inicialmente serão investidos em elaboração de projetos executivos, permitindo que mais municípios possam se beneficiar desses serviços.

     Além de esclarecer vários outros temas, a presente proposta de Medida Provisória em questão prioriza a segurança jurídica e regulação adequada como condições essenciais para o desenvolvimento do setor de saneamento. Estabelece condições sadias de competição entre empresas, fortalecendo o papel do Titular desses serviços, que passam a pleitear maiores investimentos, melhor qualidade e menores preços dos serviços prestados à população.

     Por fim, a MP inclui no escopo das ações públicas de saneamento a ampliação dos serviços nos assentamentos urbanos irregulares e consolidados ocupados por população de baixa renda. Estas são áreas em que a reversão da ocupação apresenta grande dificuldade e, devido as características socioeconômicas da população e da ocupação do solo, os serviços de saneamento apresentarão maiores retornos sociais e econômicos.

     Desta forma, fica explícita na proposta a relevância do tema para o país e a sua urgência caracterizada pela imperiosa necessidade de maiores investimentos nesse setor, de reverter uma realidade de baixos índices de cobertura desses serviços, garantindo redução significativa nos custos de Saúde e melhoria na qualidade de vida da população brasileira.

     Respeitosamente,

ALEXANDRE BALDY DE SANTÁNNA BRAGA


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 28/12/2018


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 28/12/2018 (Exposição de Motivos)