Legislação Informatizada - LEI Nº 601, DE 18 DE SETEMBRO DE 1850 - Publicação Original

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LEI Nº 601, DE 18 DE SETEMBRO DE 1850

Dispoem sobre as terras devolutas no Imperio, e ácerca das que são possuidas por titulo de sesmaria sem preenchimento das condições legaes, bem como por simples titulo de posse mansa e pacifica: e determina que, medidas e demarcadas as primeiras, sejam ellas cedidas a titulo oneroso assim para emprezas particulares, como para o estabelecimento de Colonias de nacionaes, e de estrangeiros, autorisado o Governo a promover a colonisação estrangeira na fórma que se declara.

     Dom Pedro Segundo, por Graça de Deos, e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil : Fazemos saber a todos os Nossos Subditos, que a Assembléa Geral Decretou, e Nós Queremos a Lei seguinte.

     Art 1º Ficão prohibidas as acquisições de terras devolutas por outro titulo que não seja o de compra.

     Exceptuão-se as terras situadas nos limites do Imperio com paizes estrangeiros em huma zona de dez leguas, a s quaes poderão ser concedidas gratuitamente.

     Art 2º Os que se aposserem de terras devolutas ou de alheias, e nellas derribarem matos, ou lhes pudezem fogo, serão obrigados a despejo, com perda de bemfeitorias, e demais soffrerão a pena de dous a seis mezes de prisão, e multa de cem mil réis, alêm da satisfação do danno causado. Esta pena porêm não terá lugar nos actos possessorios entre heréos confinantes.

     § Unico. Os Juizes de Direito nas correições que fizerem na fórma das Leis e Regulamentos, investigarão se as Autoridades a quem compete o conhecimento deste delictos poem todo o cuidado em processa-los e puni-los, e farão effectiva a sua responsabilidade, impondo no caso de simples negligencia e multa de cincoenta a duzentos mil réis.

     Art 3º São terras devolutas :

     § 1º As que não se acharem applicadas a algum uso publico nacional, provincial, ou municipal.

     § 2º As que não se acharem no dominio particular por qualquer titulo legitimo, nem forem havidas por sesmarias e outras concessões do Governo geral ou Provincial, não incursas em commisso por falta do cumprimento das condições de mediação, confirmação e cultura.

     § 3º As que não se acharem occupadas por posses, que, apezar de não se fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta Lei.

     § 4º As que nãos e fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta Lei.

     Art 4º Serão revalidadas as sesmarias, ou outras concessões do Governo Geral ou Provincial, que se acharem cultivadas, ou com principios de culturas, e morada habitual do respectivo sesmeiro ou concessionario, ou de quem os represente, embora não tenha sido cumprida qualquer das outras condições, com que forão concedidas.

     Art 5º Serão legitimadas as posses mansas e pacificas, adquiridas por occupação primaria, ou havidas do primeiro occupante, que se acharem cultivadas, ou com principio de cultura, e morada habitual do respectivo posseiro, ou de quem o represente, guardadas as regras seguintes:

     § 1º Cada posse em terras de cultura, ou em campos de criação, comprehenderá, alêm do terreno aproveitado, ou do necessario para pastagem dos animaes que tiver o posseiro, outrotanto mais de terreno devoluto que houver contiguo, com tanto que nenhum caso a extensão total da posse exceda a de huma sesmaria para cultura ou criação, igual ás ultimas concedidas na mesma Comarca ou na mais visinha.

     § 2º As posses em circunstancias de serem legitimadas, que se acharem em sesmarias ou outras concessões do Governo, não incursas em commisso ou revalidade por esta Lei, só darão direito á indemnisação pelas benfeitorias.

     Exceptua-se desta regra o caso de verificar-se a favor da posse qualquer das seguintes hypotheses : 1ª, o ter sido declarada boa por sentença passada em Julgado entre os sesmeiros ou concessionarios e os posseiros : 2ª, ter sido estabelecida antes da medição da sesmaria ou concessão, e não pertubada por cinco annos : 3ª, ter sido estabelecida depois da dita medição, enão pertubada por dez annos.

     § 3º Dada a excepção do paragrapho antecendentes, os posseiros gozarão do favor que lhes assegura o § 1º, competindo ao respectivo sesmeiro ou concessionario ficar com o terreno que sobrar da divisão feita entre os ditos posseiros, ou considerar-se tambem posseiros para entrar em rateio igual com elles.

     § 4º Os Campos de uso commum dos moradores de huma ou mais Freguezias, Municipios ou Comarcas serão conservados em toda a extensão de suas divisas, e continuarão a prestar o mesmo uso, conforme a pratica actual, em quanto por Lei não se dispuzer o contrario.

     Art 6º Não se haverá por principio de cultura para revalidação das sesmarias ou outras concessões do Governo, nem para a legitimação de qualquer posse, os simples roçados, derribadas ou queimas de matos ou campos, levantamentos de ranchos e outros actos de semelhante natureza, não sendo acompanhados da cultura effectiva, e morada habitual exigidas no Artigo antecendente.

     Art 7º O Governo marcará os prazos dentro dos quaes deverão ser medidas as terras adquiridas por posses ou por sesmarias, ou outras concessões, que estejão por medir, assim como designará e instruirá as pessoas que devão fazer a medição, attendendo ás circunstancias de cada Provincia, Comarca e Municipio, e podendo prorrogar os prazos marcados, quando o julgar conveniente, por medida geral que comprehenda todos os possuidores da mesma Provincia, Comarca e Municipio, onde a prorrogação convier.

     Art 8º Os possuidores que deixarem de proceder á mediação nos prazos marcados pelo Governo serão reputados nos prazos marcados pelo Governo serão reputados cahidos em commisso, e perderão por isso o direito que tenhão a serem preenchidos das terras concedidas por seus titulos, ou por favor da presente Lei, conservando-o somente para serem mantidos na posse do terreno que occuparem com effectiva cultura, havendo-se por devoluto o que se achar inculto.

     Art 9º Não obstante os prazos que forem marcados, o Governo mandará proceder á medição das terras devolutas, respeitando-se no acto da mediação os limites das concessões e posses que se acharem nas circunstancias dos Artigos 4º e 5º.

     Qualquer opposição que haja da parte dos possuidores não impedirá a medição; mas, ultimada esta, se continuará vista aos oppoentes para deduzirem seus embargos em termo breve.

     Art 10º o Governo proverá o modo pratico de extremar o dominio publico do particular, segundo as regras acima estabelecidas, imcumbindo a sua execução ás Autoridades que julgar mais convenientes, ou a Comissarios especiaes, os quaes procederão administrativamente, fazendo decidir por arbitros as questões e duvidas o Presidente da Provincia, do qual o  haverá tambem para o Governo.

     Art 11º Os posseiros serão obrigados a tirar titulos dos terrenos que lhes ficarem pertecendo por effeito desta Lei, e sem elles não poderão hypothecar os mesmos terrenos, nem aliena-los por qualquer modo.

     Estes titulos serão passados pelas Repartições Provinciaes que o Governo designar, pagando-se cinco mil réis de direitos de Chancellaria pelo terreno que não exceder de hum quadrado de quinhentas braças por lado, e outrotanto por cada igual quadrado que demais contiver a posse; e alêm disso quatro mil réis de feitio, sem mais emolumentos ou sello.

     Art 12º O Governo reserverá das terras devolutas as que julgar necessarias: 1º, para a colonisação dos Indigenas: 2º, para a fundação de Povoações, abertura de estradas, e quasquer outras servidões. e assento de Estabelecimento publico: 3º, para a construcção naval.

     Art 13º O mesmo Governo fará organisar por Freguezias o registro das terras possuidas, sobre as declarações feitas pelos respectivos possuidores, impondo multas e penas àquelles que deixarem de fazer nos prazos marcados as ditas declarações, ou as fizerem inexactas.

     Art 14º Fica o Governo autorisado a vender as terras devolutas em hasta publica, ou fóra della, como e quando julgar mais conveniente, fazendo previamente medir; dividir, demarcar e descrever a porção das mesmas terras que houver de ser exposta á venda, guardada as regras seguintes:

     § 1º A medição e divisão serão feitas, quando o permittirem as circunstancias locaes, por linhas que corrão de norte sul, conforme o verdaddeiro meridiano, e por outras que as cortem em angulos rectos, de maneira que formem lotes ou quadrados de quinhentos braças por lado demarcados convenientemente.

     § 2º Assim esses lotes, como as sobras de terras, em que se não puder verificar a divisão acima indicada, serão vendidos separadamente sobre o preço minimo, fixado anticipadamente e pago á vista, de meio real, hum real, real e meio, e dous réis, por braça quadrada, segundo for a qualidade e situação dos mesmos lotes e sobras.

     § 3º A venda fóra da hasta publica será feita pelo preço que se ajustar, nunca abaixo do minimo fixado, segundo a qualidade e situação dos respectivos lotes e sobras, ante o Tribunal do Thesouro Publico, com assitencia do Chefe da Repartição Geral das Terras, na Provincia do Rio de Janeiro, e ante as Thesourarias, approvação do respectivo Presidente, nas outras Provincias do Imperio.

     Art 15º Os possuidores de terra de cultura e criação, qualquer que seja o titulo de sua acquisição, terão preferencia na compra das terras devolutas que lhes forem contiguas, com tanto que mostrem pelo estado da sua lavoura ou criação, que tem os meios necessarioos para aproveita-las.

     Art 16º As terras devolutas que se venderem ficarão sempre sujeitas aos onus seguintes:

     § 1ºCeder o terreno preciso para estradas publicas de huma Povoação a outra, ou algum porto de embarque, salvo o direito de indemnisação das bemfeitorias e do terreno occupado.

     § 2º Dar servidão gratuita aos visinhos quando lhes for indispensavel para sahirem á huma estrada publica, Povoação ou porto de embraque, e com indemnisação quando lhes for proveitosa por incurtamento de hum quatroou mais de caminho.

     § 3º Consentir a tirada de aguas desaproveitadas e a passagem dellas, precedendo a indemnisação das benfeitorias e terreno occupado.

     § 4º Sujeitar ás disposições das Leis respectivas quasquer minas que se descobrirem nas mesmas terras.

     Art 17º Os estrangeiros que comprarem terras, e qualquer industria no Paiz, serão naturalisado querendo, depois de dous annos de residencia pela fórma porque o farão os da Colonia de São Leopoldo, e ficarão isentos do serviço militar, menos do da Guarda Nacional dentro do Municipio.

     Art 18º O Governo fica autorisado a mandar vir annualmente á custa do Thesouro, certo numero de colonos livres para serem empregados, pelo tempo que for marcado, em Estabelecimentos agricolas, ou na formação de Colonias nos lugares em que estas mais convieerm; tomando antecipadamente as medidas necessarias para que taes colonos achem emprego logo que desembarcarem.

     Aos colonos assim importados são applicaveis as disposições do Artigo antecendente.

     Art 19º O producto dos direitos de Chancellaria e da venda das terras, de que tyratão os Arts. 11 e 14 será exclusivamente applicado, 1º á ulterior medição das terras devolutas, e 2º á importação de colonos livres, conforme o Artigo precedente.

     Art 20º Em quanto o referido producto não for sufficiente para as despezas a que he destinado, o Governo exigirá annualmente os creditos necessarios para as mesmas tirem dos creditos anteriormente dados a favor da colonisação, e mais a somma de duzentos contos de réis.

     Art 21º Fica o Governo autorisado a estabelecer, com o necessario Regulamento, huma Repartição especial que se denominará - Repartição Geral das Terras publicas - e será encarregada de dirigir a medição, divisão, e descripção das terras devolutas, e sua conservação, de fiscalisar a venda e distribuição dellas, e de promover a colonisação nacional e estrangeira.

     Art 22º O Governo fica autorisado igualmente á impor, nos Regulamentos que fizer para a execução da presente Lei, penas de prisão até tres mezes, e de multa até duzentos mil réis.

     Art 23º Ficão derogadas todas as disposições em contrario.

     Mandamos por tanto a todas as Autoridades, a quem o conhecimento, e execução da referida lei pertencer, que a cumprão, e fação cumprir, e guardar tão inteiramente, como n' ella se contém. O Secretario d' Estado dos Negocios do Imperio a faça imprimir, publicar e correr.

Dada ao Palacio do Rio de Janeiro aos dezoito dias do Mez de Setembro de mil oitocentos e cincoenta, vigesimo nono da Independencia e do Imperio.

IMPERADOR Com Rubrica e Guarda.

Visconde de Mont'alegre.

     Carta de Lei, pela qual Vossa Magestade Imperial manda executar o Decreto da Assembléa Geral, que Houve por bem Sanccionar, sobre terras devolutas, sesmarias, posses e colonisação.

Para Vossa Magestade Imperial ver.

João Gonçalves de Araujo a fez.

Eusebio de Queiroz Coitinho Mattoso Camara.

     Sellada na Chancellaria do Imperio em 20 de Setembro de 1850.

Josino do Nascimento Silva.

     Publicada na Secretaria d' Estado dos Negocios do Imperio em 20 de Setembro de 1850.

José de Paiva Magalhães Calvet.

     Registrada a fl. 57 do Lv. 1º de Actos Legislativos. Secretaria d' estado dos Negocios do Imperio em 2 de Outubro de 1850.

Bernardo José de Castro.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1850


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1850, Página 307 Vol. 1 pt. I (Publicação Original)