Legislação Informatizada - LEI Nº 108, DE 11 DE OUTUBRO DE 1837 - Publicação Original

Veja também:

LEI Nº 108, DE 11 DE OUTUBRO DE 1837

Dando varias providencias sobre os Contractos de locação de serviços dos Colonos.

     O Regente interino em Nome do Imperador o Senhor Dom Pedro II faz saber a todos os Subditos do Imperio que a Assembléa Geral Legislativa Decretou e elle sanccionou a Lei seguinte.

     Art. 1º O contracto de locação de serviços, celebrado no Imperio, ou fóra, para se verificar dentro delle, pelo qual algum estrangeiro se obrigar como locador, só póde provar-se por escripto. Se o ajuste fór tratado com interferencia de alguma Sociedade de Colonisação reconhecida pelo Governo no Municipio da Côrte, e pelos Presidentes nas Provincias, os titulos por ellas passados, e as certidões extrahidas dos seus livros, terão fé publica para prova do contracto.

     Art. 2º Sendo os estrangeiros menores de vinte hum annos perfeitos, que não tenhão presentes seus pais, tutores, ou curadores, com os quaes se possa validamente tratar, serão os contractos autorisados, pena de nullidade, com assistencia de hum curador, o qual será igualmente ouvido em todas as duvidas, e acções, que dos mesmos contractos se originarem, e em que algum locador menor fôr parte, debaixo da expressada pena.

     Art. 3º Para este fim, em todos os Municipios, onde houver Sociedades de Colonisação, haverá hum Curador geral dos colonos, nomeado pelo Governo na Côrte, e pelos Presidentes nas Provincias, sobre Proposta das Mesas de Direcção das mesmas Sociedades.

     Nos outros Municipios servirão os Curadores geraes dos orphãos. Nas faltas, ou impedimentos de huns e outros, nomearão as sobreditas Mesas de Direcção para autorisação dos contractos, e os Juizes respectivos para os casos das acções que se moverem, pessoa idonea que o substitua.

     Art. 4º Não apresentando os menores documento legal da sua idade, será esta estimada no acto do contracto, á vista da que elles declararem, e parecer que podem ter; e ainda que depois o apresentem, este não valerá para annullar o contracto, mas se estará pela idade, que no acto deste se houver estimado, para os effeitos sómente da validade do mesmo contracto.

     Art. 5º He livre aos estrangeiros de maior idade ajustarem seus serviços pelos annos que bem lhes parecerem; mas os menores não poderão contractar-se por tempo que exceda á sua menoridade, excepto se fôr necessario que se obriquem por maior prazo para indemnisação das despezas com elles feitas, ou se forem condemnados a servir por mais tempo, em pena de terem faltado ás condições do contracto,

     Art. 6º Em todos os contractos de locação de serviços, que se celebrarem com os mesmos menores, se designará a parte da soldada que elles devão receber para suas despezas, que não poderá nunca exceder da metade: a outra parte, depois de satisfeitas quaesquer quantias adiantadas pelo locatario, ficará guardada em deposito na mão deste, se fôr pessoa notoriamente abonada, ou não sendo, prestará fiança idonea para ser entregue ao menor, logo que acabar o tempo de serviço a que estiver obrigadado, e houver sahido da menoridade. Fóra destes casos será recolhida no cofre dos Orphãos do Municipio respectivo.

     Nos Municipios, onde houver Sociedades de Colonisação reconhecidas pelo Governo, serão taes dinheiros guardados nos cofres das mesmas Sociedades.

     Art. 7º O locatario de serviços, que, sem justa causa despedir o locador antes de se findar o tempo por que o tomou, pagar-lhe-ha todas as soldadas, que este devêra ganhar, se o não despedira. Será justa causa para a despedida:

     1º Doença do locador, por fórma que fique impossibilitado de continuar a prestar os serviços para que foi ajustado.

     2º Condemnação do lacador á pena de prisão, ou qualquer outra que o impeça de prestar serviço.

     3º Embriaguez habitual do mesmo.

     4º Injuria feita pelo lacador á seguridade, honra, ou fazenda do locatario, sua mulher, filhos, ou pessoa de sua familia.

     5º Se o locador, tendo-se ajustado para o serviço determinado, se mostrar imperito no desempenho do mesmo serviço.

     Art. 8º Nos casos do numero 1º e 2º do artigo antecedente, o locador despedido, logo que cesse de prestar o serviço, será obrigado a indemnisar o locatario da quantia que lhe dever. Em todos os outros pagar-lhe-ha tudo quanto dever, e se não pagar logo, será immediatamente preso, e condemnado a trabalhar nas obras publicas por todo o tempo que fôr necessario, até satisfazer com o producto liquido de seus jornaes tudo quanto dever ao locatario, comprehendidas as custas a que tiver dado causa.

     Não havendo obras publicas, em que possa ser admittido a trabalhar por jornal, será condemnado a prisão com trabalho, por todo o tempo que faltar para completar o do seu contracto: não podendo todavia a condemnação exceder a dous annos.

     Art. 9º O locador, que, sem justa causa, se despedir, ou ausentar antes de completar o tempo do contracto, será preso onde quer que fôr achado, e não será solto, em quanto não pagar em dobro tudo quanto dever ao locatario, com abatimento das soldadas vencidas: se não tiver com que pagar, servirá ao locatario de graça todo o tempo que faltar para o complemento do contracto. Se tornar a ausentar-se será preso e condemnado na conformidade do artigo antecedente.

     Art. 10. Será causa justa para rescisão do contracto por parte do locador:

     1º Faltando o locatario ao cumprimento das condições estipuladas no contracto.

     2º Se o mesmo fizer algum ferimento na pessoa do locador, ou o injuriar na honra de sua mulher, filhos, ou pessoa de sua familia.

     3º Exigindo o locatario, do locador, serviços não comprehendidos no contracto.

     Rescindindo-se o contracto por alguma das tres sobreditas causas, o locador não será obrigado a pagar ao locatario qualquer quantia de que possa ser-lhe devedor.

     Art. 11. O locatario, findo o tempo do contracto, ou antes rescindindo-se este por justa causa, he obrigado a dar ao locador hum attestado de que está quite do seu serviço: se recusar passa-lo, será compellido a faze-lo pelo Juiz de Paz do districto. A falta deste titulo será razão sufficiente para presumir-se que o locador se ausentou indevidamente.

     Art. 12. Toda a pessoa que admittir, ou consentir em sua casa, fazendas ou estabelecimentos, algum estrangeiro, obrigado a outrem por contracto de locação de serviços, pagará ao locatario o dobro do que o locador lhe dever, e não será admittido a allegar qualquer defesa em Juizo, sem depositar a quantia a que fica obrigado, competindo-lhe o direito de havê-la do locador.

     Art. 13. Se algum alliciar para si directamente, ou por interposta pessoa, algum estrangeiro obrigado a outrem por contracto de locação de serviços, pagará ao locatario o dobro do que o locador lhe fôr devedor, com todas as despezas, e custas a que tiver dado causa; não sendo admittido em Juizo a allegar sua defesa sem depositar. Se não depositar, e não tiver bens, será logo preso, e condemnado a trabalhar nas obras publicas por todo o tempo que fôr necessario, até satisfazer ao locatario com o produto liquido dos seus jornaes. Não havendo obras publicas em que possa ser empregado a jornal, será condemnado a prisão com trabalho por dous mezes a hum anno.

     Os que alliciarem para outrem, serão condemnados a prisão com trabalho, por todo o tempo que faltar para cumprimento do contracto do alliciado, com tanto porém que a condemnação nunca seja por menos de seis mezes, nem exceda a dous annos.

     Art. 14. O conhecimento de todas as acções derivadas de contractos de locação de serviços, celebrados na conformidade da presente Lei, será da privativa competencia dos Juizes de Paz do foro do locatario, que as decidirão summariamente em audiencia geral, ou particular para o caso, sem outra fórma regular de processo, que não seja a indispensavelmente necessaria para que as partes possão allegar, e provar em termo breve o seu direito; admittindo a decisão por arbitros na sua presença, quando alguma das partes a requerer, ou elles a julgarem necessaria por não serem liquidas as provas.

     Art. 15. Das sentenças dos Juizes de Paz haverá unicamente recursos de appellação para o Juiz de Direito respectivo. Onde houver mais de hum Juiz de Direito, o recurso será para o da primeira Vara, e na falta deste para o da segunda, e successivamente para os que se seguirem.

     O de revista só terá lugar naquelles casos, em que os réos forem condemnados a trabalhar nas obras publicas para indemnisação dos locatarios, ou a prisão com trabalho.

     Art. 16. Nenhuma acção derivada de locação de serviços será admittida em Juizo, se não fôr logo acompanhada do titulo do contracto. Se fôr de petição de soldadas, o locatario não será ouvido, sem que tenha depositado a quantia pedida, a qual todavia não será entregue ao locador, ainda mesmo que preste fiança, senão depois de sentença passada em julgado.

     Art. 17. Ficão revogadas as Leis em contrario.

     Mando portanto a todas as Autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumprão, e fação cumprir, e guardar tão inteiramente, como nella se contém. O Secretario de Estado dos Negocios da Justiça, encarregado interinamente dos do Imperio, a faça imprimir, publicar e correr. Dada no Palacio do Rio de Janeiro em onze de Outubro de mil oitocentos trinta e sete, decimo sexto da Independencia e do Imperio.

PEDRO DE ARAUJO LIMA.

Bernardo Pereira de Vasconcellos.

     Carta de Lei, pela qual Vossa Magestade Imperial manda executar o Decreto da Assembléa Geral Legislativa, que houve por bem sanccionar, em que se dão providencias sobre os contractos de locação de serviços de estrangeiros, na fórma acima declarada.

Para Vossa Magestade Imperial ver.

Antonio José de Paiva Guedes de Andrade a fez.

Bernardo Pereira de Vasconcellos.

     Sellada na Chancellaria do Imperio em 18 Outubro de 1837. - João Carneiro de Campos.

     Nesta Secretaria de Estado dos Negocios do Imperio foi publicada a presente Lei aos 14 de Outubro de 1837. - Luiz Joaquim dos Santos Marrocos.

     Registrada nesta Secretaria de Estado dos Negocios do Imperio a fl. 226 do Livro 6º das Leis, Alvarás e Cartas. Rio de Janeiro em 16 de Novembro de 1837. - Antonio José de Paiva Guedes de Andrade.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1837


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1837, Página 76 Vol. 1 pt I (Publicação Original)