Legislação Informatizada - LEI Nº 9.263, DE 12 DE JANEIRO DE 1996 - Veto

LEI Nº 9.263, DE 12 DE JANEIRO DE 1996

MENSAGEM DE VETO Nº 66 DE 12 JANEIRO DE 1996

     Senhor Presidente do Senado Federal,

     Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1º do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar parcialmente o Projeto de Lei nº 209, de 1991 (nº 114/94 no Senado Federal), que "Regula o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências."

     Os dispositivos ora vetados são os artigos 10,11, § único do art. 14 e art. 15, do seguinte teor:

Art. 10. 

"Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações:

I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce;

II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois méritos.

§ 1º É condição para que se realize a esterilização o registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes.

§ 2º É vedada a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores.

§ 3º Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do § 1º, expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de discernimentos por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente.

§ 4º A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro método cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e ooforectomia.

§ 5º Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges.

§ 6º A esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da Lei."
Art. 11. 

"Art. 11. Toda esterilização cirúrgica será objeto de notificação compulsória à direção do Sistema Único de Saúde."§ único do art. 14

"Parágrafo único. Só podem ser autorizadas a realizar esterilização cirúrgica as instituições que ofereçam todas as opções de meios e métodos de contracepção reversíveis."Art. 15. 

"Art. 15. Realizar esterilização cirúrgica em desacordo com o estabelecido no art. 10 desta Lei. Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, se a prática não constitui crime mais grave.

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço se a esterilização for praticada:

I - durante os períodos de parto ou aborto, salvo o disposto no inciso II do art. 10 desta Lei.

II - com manifestação da vontade do esterilizado expressa durante a ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente;

III - através de histerectomia e ooforectomia;

IV - em pessoa absolutamente incapaz, sem autorização judicial;

V - através de cesária indicada para fim exclusivo de esterilização."
     Sobre os arts. 10,11 e 15, assim se manifestou o Ministério da Saúde:

"A esterilização, condicionada apenas à vontade das pessoas, não deve ser praticada, porque se trata de clara mutilação, com perda da função, possível apenas quando haja precisa indicação médica, para eliminar dano maior à saúde do paciente ou quando for irreversível a afecção do órgão reprodutor. Se o fato ocorre com a participação de outrem, ainda que médico, caracterizada está a lesão corporal, tipificada como crime no Código Penal. A pesquisa de antijuricidade do fato punível pode, é verdade, ser ultrapassada pela lei nova, mas esta nunca deve afastá-la, se não há fundamento médico, mas apenas conveniências pessoais, sociais ou econômicas. Nesse quadro, avulta a esterilização de incapazes, em que se incluem os menores de idade e os privados de faculdades para a manifestação de vontade. No último caso, é preciso ter a advertência de que a incapacidade, enquanto não declarada judicialmente, supõe habilitação para atos da vida civil, podendo daí resultar induzimento de pessoas em tais condições a aceitar a esterilização. A autorização judicial, de outro lado, não é garantia contra possível violação da integridade física do incapaz, porque a inciativa do processo supõe que o seu interesse estaria sendo ajuizado por outra pessoa. É certo que, por não endereçar disposições reguladoras do processo judicial, a esterilização, em tal hipótese, estará inviabilizada, razão bastante havendo, por isso mesmo, para sequer seja prevista, como mínimo de cautela para não trair uma intenção não suficientemente clara. Em igual objeção incorre a esterilização, como se quer, a pretexto de risco para saúde do futuro concepto, mediante relatório de dois médicos. Trabalha-se, aqui, com perspectiva de evento futuro incerto e não com critério de certeza, de resto inexistente, salvo em raríssimas condições. Não se estimou, ao menos, o grau de severidade das afecções a que estaria exposto o futuro concepto e até mesmo a perspectiva de sua reversão, ainda no útero materno ou depois de nascido."

     Tais dispositivos, portanto, contrariam o interesse público.

     Quanto ao parágrafo único do art. 14, o Ministério apresenta a seguinte razão de veto, considerando-o também em desacordo com o interesse público:

"O parágrafo único do artigo 14, causa preocupação quanto à viabilização da esterilização cirúrgica, tendo em vista que serão autorizadas a realizá-la as instituições que ofereçam todas as (grifo nosso) opções de meios e métodos de contracepção reversíveis. Esta condição, na prática, será difícil de ser cumprida, pelo rápido avanço tecnológico dessa área, pela falta de oferta de todos os meios e métodos no mercado brasileiro e porque a CEME dificilmente incluirá na sua lista de distribuição de contraceptivos todos os métodos contraceptivos reversíveis existentes. Por outro lado, os artigos 4º a 6º, 9º e 14 e o Capítulo II, este o que estabelece penas para o não cumprimento da lei, poderão garantir a qualidade da atenção à saúde da população na área de saúde reprodutiva, e o SUS, ao normatizar as ações de planejamento familiar, estará garantindo sua operacionalização."

     Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar em parte o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

     Brasília, 12 de janeiro de 1996

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 15/01/1996


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