Legislação Informatizada - LEI Nº 8.073, DE 30 DE JULHO DE 1990 - Veto

LEI Nº 8.073, DE 30 DE JULHO DE 1990

MENSAGEM DE VETO Nº 557, DE 30 DE JULHO DE 1990

     EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL:

     Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1º do artigo 66 da Constituição Federal, resolvi vetar parcialmente o Projeto de Lei nº 61, de 1990 (nº 5.340, de 1990, na origem), que "estabelece a Política Nacional de Salários e dá outras providências".

     Os dispositivos ora vetados, que considero contrários ao interesse público, são os artigos 1º e 2º, e seus parágrafos, e o parágrafo único do artigo 3º, do seguinte teor:

     "Art. 1º - A Política Nacional de Salários, respeitado o princípio da irredutibilidade salarial, terá como fundamento a livre negociação coletiva e se regerá pelas normas estabelecidas nesta Lei.

     Parágrafo único . As vantagens asseguradas aos trabalhadores nas normas coletivas incorporam-se aso contratos individuais de trabalho, constituindo-se em direito da categoria, e somente poderão ser reduzidas ou suprimidas por posterior Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho.

     Art. 2º - Os salários dos trabalhadores serão reajustados mensalmente pelo Índice de Preços ao Consumidor - IPC do mês anterior até o valor de cinco salários mínimos; a parcela que exceder esse valor até dez salários mínimos será reajustada trimestralmente pelo Índice de Preços ao Consumidor - IPC do trimestre findo no mês anterior, garantindo-se um adiantamento mensal do percentual, do IPC do mês anterior, superior a 5% (cinco por cento); a parcela que exceder a dez salários mínimos terá seus reajustes livremente negociados.

     Parágrafo único . O Índice de Preços ao Consumidor - IPC de que trata este artigo será calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

     Art. 3º - ......................................................................................................

     Parágrafo único . Havendo coação ou ameaça de demissão, cabe, ao Juízo competente, processar e julgar a ação, negar validade a renúncia, desistência ou transação individuais."

     O projeto em questão conflita, nas disposições mencionadas, com os objetivos de política macroeconômica do Governo, ameaçando o processo de estabilização implementado pelo Plano Brasil Novo, conforme se demonstra a seguir.

     A história econômica do País tem-se caracterizado pela presença constante da inflação, moldando o processo de desenvolvimento e funcionamento da economia. Isto tem ocorrido porque os agentes adaptam seu comportamento e suas regras de decisão sob o pressuposto da existência crônica de inflação.

     Nestas circunstâncias, a indexação generalizada surge como um dos principais elementos das relações econômicas. Esta resposta adaptativa do comportamento dos agentes à inflação, em vários mercados, chega a se consolidar através da sua institucionalização. Um exemplo disto é a indexação salarial.

     A indexação formal, isto é, a indexação institucionalizada através de leis, tem duas características fundamentais.

     Primeiro, ela se transforma num mecanismo que funciona de maneira autônoma em relação aos demais movimentos dos mercados. Ou seja, independentemente de quaisquer condições, as regras de indexação formal são acionadas automaticamente. Isto implica a perpetuação dos níveis da inflação passada.

     Segundo, em se tratando de uma regra definida em lei, a indexação formal é obviamente incapaz de adequar-se às características e situações conjunturais específicas de cada mercado. Através dela a mesma regra genérica é aplicada a todos os contratos de trabalho da economia, independentemente da situação econômica específica dos diferentes setores e empresas.

     Essa generalização excessiva dificulta, sobremaneira, a passagem de um regime de alta inflação para um regime de estabilidade dos preços, a qual pressupõe mudanças de preços relativos. Também é sabido que, quando o mercado encontra dificuldades para fazer as mudanças de preços relativos requeridas para a estabilização, faz os ajustes através das quantidades. Nessa situação, o ajustamento pelas quantidades no mercado de trabalho corresponde a um aumento do desemprego. Assim, uma regra que vise garantir o nível de renda dos trabalhadores acaba perpetuando a inflação e provocando desemprego.

     Além disso, justamente num momento em que a consolidação da estabilidade de preços requer a maior flexibilidade possível, para que se processe da maneira mais rápida a acomodação de todos os agentes às profundas reformas implementadas pelo Governo, a adoção de uma política de indexação dos salários implicaria violentar os mercados com uma regra excessivamente genérica e automatizada. Como conseqüência, estar-se-ia recriando as condições para a penalização de muitos trabalhadores com a perda desnecessária do emprego, e à sociedade com um todo pela volta da inflação.

     Coerentemente com o diagnóstico acima, editei a Medida Provisória nº 193, que define um conjunto de regras de orientação para a negociação salarial, sem recorrer a nenhum mecanismo de indexação.

     Desse modo, por contrariar o interesse público, conforme demonstrado na evidente incompatibilidade entre a aludida Medida Provisória e a política nacional de salários proposta nos artigos 1º e 2º, e seus parágrafos, do referido Projeto de Lei, vetei esses dispositivos.

     Da mesma forma, com relação ao parágrafo único do artigo 3º do Projeto, uma vez que é contrário ao interesse público, não posso deixar de vetá-lo.

     Com efeito, desnecessariamente, esse parágrafo regula " em norma extravagante " matéria posta, ali sim, adequadamente , na Parte Geral do Código Civil " Das Nulidades - , onde disciplinados os chamados vícios de consentimento, (art. 147, inciso II) como causas de anulabilidade dos atos jurídicos em geral, nestes compreendidas, obviamente, as hipóteses de coação e de ameaça de demissão, de que trata o dispositivo impugnado.

     Ademais, se admitida, essa regulação autônoma certamente ensejará conflitos e incidentes processuais paralelos, envolvendo não apenas patrões e empregados, como, também, o que será pior, empregados e sindicatos da respectiva categoria, ainda quando, eventualmente, determinado trabalhador não seja sindicalizado ou tenha se desligado da entidade, no exercício da liberdade que lhe assegura, expressamente, o artigo 8º, inciso V, da Constituição.

     Por isso, vetei o aludido parágrafo, pois a matéria nele disciplinada já se contém, em preceito próprio, no Código Civil que, em vigor desde 1917, ensejou se acumulassem, em torno de todos os seus dispositivos, estudos doutrinários e experiência jurisprudencial quase centenários.

     Estas as razões que me levaram a vetar parcialmente o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Brasília, em 30 de julho de 1990

FERNANDO COLLOR


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 31/07/1990