Legislação Informatizada - DECRETO DE 23 DE MAIO DE 1821 - Publicação Original
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DECRETO DE 23 DE MAIO DE 1821
Dá Providencias para garantia da liberdade individual.
Vendo que nem a Constituição da Monarchia Portugueza, em suas disposições expressas na Ordenação do Reino, nem mesmo a Lei da Reformação da Justiça de 1582, com todos os outros Alvarás, Cartas Régias, e Decretos de Meus Augustos Avós tem pedido affirmar de um modo inalteravel, como é de Direito Natural, a segurança das pessoas; e Constando-Me que alguns Governadores, Juizes Criminaes e Magistrados, violando o Sagrado Deposito da Jurisdicção que se lhes confiou, mandam prender por mero arbitrio, e antes de culpa formada, pretextando denuncias em segredo, suspeitas vehementes, e outros motivos horrorosos, á humanidade para impunente conservar em marmorras, vergados com o peso de ferros, homens que se congregaram convidados por os bens, que lhes offerecera a Instituição das Sociedades Civis, o primeiro dos quaes é sem duvida a segurança individual; E sendo do Meu primeiro dever, e desempenho de Minha palavra o promover o mais austero respeito á Lei, e antecipar quanto ser possa os beneficios de uma Constituição liberal: Hei por bem excitar, por a meneira mais efficaz e rigorosa, a observancia da sobre mencionada legislação, ampliando-a, e ordenando, como por este Decreto Ordeno, que desde a sua data em diante nenhuma pessoa livre no Brazil possa jamais ser presa sem ordem por escripto do Juiz, ou Magistrado Criminal do territorio, excepto sómente o caso de flagrante delicto, em que qualquer do Povo deve preencher o delinquente. Ordeno em segundo logar, que nenhum Juiz ou Magistrado Criminal possa expedir ordem de prisão sem preceder culpa formada por inquirição summaria de tres testemunhas, duas das quaes jurem contestes assim o facto, que em Lei expressa seja declarado culposo, como a designação individual do culpado; escrevendo sempre sentença interlocutoria que o obrigue a prisão e livremente, a qual se guardará em segredo até que possa verificar-se a prisão do que assim tiver sido pronunciado delinquente. Determino em terceiro logar que, quando se acharem presos os que assim forem indicados criminosos se lhes faça immediata, e successivamente o processo, que deve findar dentro de 48 horas premptorias, improrrogaveis, e contadas do momento da prisão, principiando-se, sempre que possa ser, por a confrontação dos réos com as testemunhas que os culparam, e ficando alertas, e publicas todas as provas, que houverem, para assim facilitar os meios de justa defesa, que a ninguem se devem difficultar, ou tolher, exceptuando-se por ora das disposições deste paragrapho os casos, que provados, merecerem por as Leis do Reino pena de morte, ácerca dos quaes se procederá infallivelmente nos termos dos §§ 1º e 2º do Alvará de 31 de Março de 1742. Ordeno em quarto logar que, em caso nunhum possa alguem ser lançado em segredo, ou marmorra estreita, escura, ou infecta, pois que a prisão deve só servir para guardar as pessoas, e nunca para adoecer e flagellar; ficando implicitamente abolido para sempre o uso de correntes, algemas, grilhões, e outros quaesquer ferros inventados para martyrisar homens ainda não julgados a soffrer qualquer pena affictiva por sentença final; entendendo-se toda via que os Juizes, e Magistrados Criminaes poderão conservar por algum tempo, em casos gravissimos, incommunicaveis os delinquentes, comtando que seja em casas arejadas e commodas, e nunca manietados, ou soffrendo qualquer especie de tormento.
Determino finalmente que a contravenção, legalmente provada, das disposições do Decreto, seja irremissivelmente punida com o perdimento do emprego, e inhabilidade perpetua para qualquer outro, em que haja exercicio de jurisdicção. O Conde dos Arcos, do Conselho de Sua Magestade, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino do Brazil e Estrangeiros, o tenha assim entendido e faça executar com os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em 23 de Maio de 1821.
Com a rubrica do Principe Regente.
Conde dos Arcos.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1821, Página 88 Vol. 1 pt. II (Publicação Original)