Legislação Informatizada - Decreto nº 22.194, de 9 de Dezembro de 1932 - Publicação Original

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Decreto nº 22.194, de 9 de Dezembro de 1932

Suspende por três anos direitos políticos.

O Chefe do Govêrno Provisorio da RepúbIica dos Estados Unidos do Brasil:

     O movimento insurrecional que irrompeu no Estado de São Paulo, na noite de 9 para 10 de julho do corrente ano foi articulado sob o falso pretexto de retorno ao regimen constitucional e sob a enganosa propaganda de ser proposito do Govêrno Provisorio dilatar por tempo indeterminado os poderes de que o investiu a Revolução Nacional de 1930. Esse movimento foi longamente preparado por elementos civis do regimen deposto e por outros, da mesma natureza, não filiados á antiga situação, mas que com aquêles fizeram causa comum, sob a orientação partidaria de um grupo a que êles proprios deram a designação de "Frente Unica". A principio os ditos elementos concertaram-se com o objétivo, segundo declaravam, de organizar um govêrno paulista e de acôrdo com a vontade do povo, não obstante ter sido nomeado e haver tomado posse do cargo de Interventor o Sr. Pedro Toledo, paulista e civil, a quem o Govêrno Provisorio dera ampla liberdade de organizar o Secretariado, como lhe parecesse mais conveniente aos interesses do Estado. Depois de longas combinações, a que sempre foi totalmente estranho o Govêrno Provisorio, e preparado o ambiente locaI por uma campanha violenta contra este e uma excitação impatriotica, de sentimentos regionalistas, foi afinal organizado tumultuariamente o secretariado, em comicios públicos, dirigidos por politicos do antigo regimen, e cujo espirito reacionario logo se manifestou, em átos ostensivos, como, por exemplo, o da destruição, em vários lugares, de placas comemorativas do none de João Pessôa, - o grande patriota sacrificado em defesa da autonomia do seu Estado e da liberdade da Patria. Assim organizado o govêrno do, Interventor, os mesmos elementos reacionarios acrescidos de, ambiciosos e descontentes de várias origens, desenvolveram nova campanha desleal contra o govêrno instituido pela Revolução de 1930, disfarçando seus intuitos sob a falsa bandeira da imediata restauração do regimen constitucional do país. Entretanto, desde 24 de fevereiro do corrente ano, fôra decretado o Codigo Eleitoral da Republica; por decreto n.º 21.402, de 14 de maio de 1932, fôra fixado o dia 3 de maio de 1933 para a realização das eleições á Assembléa Constituinte e creada uma comissão para elaborar o ante-projéto da Constituição; desde março, tambem do corrente ano, fôra iniciada a organização do Tribunal Superior e dos demais Tribunais Regionais do Brasil, - completando-se assim todos os átos e medidas legais necessarios á eleição do poder constituinte. Um dos motivos principais do grande movimento nacional de 1930 foi a deturpação do regimer representativo pela fraude generalizada no alistamento eleitoral e nas eleições. Portanto, sem o cancelamento total do alistamento e organização de outro, em bases assecuratorias da verdade dos sufragios, não é possivel a implantação da democracia no Brasil, nem a realização dos ideais da Revolução triunfante. Nessas condições, impôr sumariamente a volta imediata do país ao regimen constitucional seria pretender restaurar, pela manutenção do antigo alistamento, o regimen de ficção representativa, contra o qual a Nação se levantou a 3 de outubro de 1930, ou fazer obra perturbadora e sem siceridade, porque o meio honesto de conduzir o país á normalidade constitucional é proceder-se ao alistamento, ou crear-se o corpo eleitoral, que elegerá os membros da Assembléa Constituinte. Tudo demonstra que a bandeira constitucionalista, arvorada pelos condutores da rebelião de 9 de julho, éra méro pretexto para embair a opinião popular, já, super-excitada com a sistemática exploração de sentimentos geradores de animadversação contra o Govêrno Provisorio. O plano subversivo dos chefes do movimento, circunscrito a principio aos Estados de São Paulo e Mato Grosso, ampliou-se pouco a pouco, a criminosa propaganda foi tomando as proporções de uma tentativa de conflagração geral, pretendendo abranger, principalmente os Estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais e Pará. Todas as provas, já existentes, da conspiração articulada, entre certos elementos dos ditos Estados, ficaram definitivamente confirmadas, no decurso da rebelião, de S.Paulo, por fátos inequivocos, ocorridos em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul, onde o plano de conflagração só malogrou pela pronta repulsa da opinião popular nêstes Estados. A farta documentação fornecida pelos proprios rebeldes, notadamente a dos jornais paulistas, publicados durante a rebelião, prova á evidencia a conspiração anterior, o aliciamento de militares, a preparação belica, a felonia da propaganda, a improcedencia dos motivos invocados para a insurreição e o objétivo não dissimulado da conquista do poder. O traço psicologico dessa vasta trama politica, tecida com intrigas e falsidades, é o da resurreição do espirito reacionario, que julgou azado o momento para tentar um assalto ao poder e a reconquista das posições perdidas, - como ficou demonstrado pelo fáto da vinda imediata, do Rio da Prata, do pretendente á presidencia da Republica e de sua coIaboração, alí, com os emissarios dos rebeldes. Apezar do alto espirito de tolerancia e generosidade com que o Govêrno Provisorio está tratando os que se levantaram contra ele com armas na mão, não lhe é licito comprometer os objétivos patrioticos da Revolução de 1930. permitindo que agitadores contumazes e reacionarios, ávidos do poder perdido, continuem a perturbar a ordem e a segurança publicas.

     E' necessario pacificar o país, tão impatrioticamente sacrificado pelos efeitos do criminoso movimento, que trouxe a luta fratricida e a perda de tantas vidas preciosas da mocidade brasileira, - mal irreparavel e de repercussão pungente e prolongada no futuro de nossa Patria. Está provado que a grande maioria dos que se bateram bravamente nas fileiras rebeldes se viram arrastados pela aleivosa e enganadora propaganda dos politicos ambiciosos, que foram os principais responsaveis pelo desencadeamento da guerra civil, e tambem é notorio que, no correr da luta e desde o seu inicio, o Govêrno Provisorio manifestou varias vêses, em declarações publicas, o ardente desejo de promover e facilitar a paz. Hoje, é dever de todos os patriotas contribuir para que, serenados os espirito, possa formar-se o ambiente pre-eleitoral, indispensavel ao prelio das urnas, afim de que a eleição da Assernbléa Nacional Constituinte se processe em plena calma e os seus trabalhos correspondam ás aspirações nacionais. Conseguintemente, devem ser tratados com clemencia os que foram ludibriados, afastados os chefes responsaveis, os que tramaram e puzeram em execução o plano tenebroso, cujas funestas consequencias vão muito além do sangue derramado e dos prejuizos materiais, financeiros e economicos. Apontados pela opinião nacional e acusando-se, agora, uns aos outros, os autores do atentado contra os interesses supremos da Patria, são elementos incompativeis com os ideais da Revolução Nacional de 1930, e, portanto, inaptos á colaboração na obra da Constituinte, que vai traçar novos rumos á vida do Brasil.

     Assim considerando, o Chefe do Govêrno Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brasil,

DECRETA:

     Art. 1º Ficam suspensos por tres anos os direitos politicos dos que se acharem incluidos em qualquer dos dispositivos enumerados nos paragrafos seguintes:

a) de todos os membros do Govêrno da União, depostos pela revolução de outubro de 1930, do vice-presidente do Senado e dos presidentes e vice-presidentes da Camara;
b) de todos os membros dos Govêrnos dos Estados, que, solidarios com aquêle, lhe prestaram auxilio material ou politico para combater o referido movimento, pelo gual se manifestava de modo inequivoco a vontade da Nação;
c) de todos os ex-deputados e ex-senadores, que assinaram pareceres anulando os diplomas dos deputados e do senador legitimamente releitos pelo Estado da Paraíba, na eleição federal de 1930;
d) de todos os ex-deputados que assinaram o parecer depurando os quatorze deputados legitimamente eleitos pelo Estado de Minas Gerais, na mencionada eleição federal;
e) de todos os que foram reconhecidos por essa ocasião, apezar de não eleitos, deputados pelos Estados da Paraíba e de Minas Gerais, assim como o reconhecido senador por aquele Estado;
f) de todos os membros do govêrno rebelde do Estado de São Paulo e dos da sua primeira Junta Governativa;
g) dos que, no Estado de Mato Grosso,fizeram parte da administração creada pelo govêno rebelde de São Paulo articular a rebelião nos dois Estados, realizando-se por êsse meio o objetivo, anunciado pelo dito govêrno, de incorporar á sua Jurisdição o territorio de Mato Grosso;
h) de todos os que tenham tomado parte no levante militar, ou auxiliado por qualquer fórma o preparo ou desencadeamento da rebelião, ou a êle, posteriormente, prestado seu concurso;
i) dos que, nos Estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, chefiaram ou promoveram a articulação de elementos dêsses Estados com a denominada "Frente Unica", dos Partidos Democratico e Republicano de São PauIo, declarando-se solidarios com os rebeldes;
j) dos que, fazendo parte dessa "Frente Unica" dos partidos paulistas, chefiaram ou promoveram a rebelião;
k) dos que, tomando armas ou aliciando homens, chefiaram as tentativas de insurreição em outros pontos do territorio nacional, colaborando assim com os rebeldes de São Paulo;
i) dos que, fóra do Brasil, promoveram no exterior a campanha impatriotica contra o Govêrno Provisorio, reconhecido por todas as potencias, ou a auxiliaram prejudicando assim o nosso crédito, o nosso prestigio e o nosso nome no estrangeiro;
m) dos que se fizeram agentes dos rebeldes para a compra de material belico, ou receberam recursos, ou dinheiro do govêrno ilegal, para a propaganda criminosamente desenvolvida no exterior contra o Govêrno Provisorio, que, no ponto de vista internacional, como no interno, é o govêrno legitimo do Brasil;
n) dos que, em boletins, foIhas, avulsos ou quaisquer impressos, publicados no exterior, colaboraram de gualquer modo para a difusão de falsas noticias com referencia ás forças legais do brasil, á marcha das operações militares, á situação politica, ou á ordem pública no país.

     Art. 2º Si, apezar dos motivos de incapacidade ativa e passiva de voto, declarados no artigo precedente, algum dos incursos aos seus dispositivos fôr qualificado, ex-officio, ou não, e inscrito no alistamento eleitoral, a sua exclusão se fará a requerimento de qualquer eleitor ou delegado de partido, ou em virtude de declaração do ministro da Justiça.

      § 1º O processo da exclusão a requerimento será o do artigo 55 do decreto n. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932.

      § 2º Decretada a exclusão por qualquer dos motivos de incapacidade instituidos na presente lei, ou si fôr ela denegada, caberá recurso nos termos e fórma do § 2º do art. 55, do decreto n. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932.

      § 3º Confirmada a exclusão, o Tribunal Superior ordenará á secretaria o cancelamento da inscrição.

      § 4º Será nulo de pleno direito o alistamento efetuado, não obstante a declaração a que se refere a última parte dêste artigo.

     Art. 3º Não são atingidos pelo presente decreto, embora incidam em alguns dos casos enumerados pelo art. 1º os que tenham prestado concurso eficiente, de modo inequivoco, a Juizo do Govêrno da Republica, na manutenção da ordem, no restabelecimento da tranquilidade e na defesa das leis e instituições nacionais, durante o movimento sedicioso que teve origem no Estado de São Paulo, na noite de 9 para 10 de julho do corrente ano.

     Art. 4º Esta lei entrará em vigor no Distrito Federal, nos Estados e no Territorio do Acre, no dia de sua publicação, nos respectivos jornais oficiais, sendo o seu texto comunicado telegraficamente aos Interventores.

     Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 9 de dezembro de 1932, 111º da Independencia e 44º da República.

GETÚLIO VARGAS.
Francisco Antunes Maciel.
Washington Ferreira Pires.
Augusto lgnacio do Espirito Santo Cardoso.
A. de Mello Franco.
Protogenes Guimarães.
José Americo de Almeida.
Joaquirn Pedro Salgado Filho.
Oswaldo Aranha.
Mario Barbosa Carneiro, encarregado do expediente da Agricultura, na ausencia do ministro.


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 13/12/1932


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 13/12/1932, Página 22718 (Publicação Original)