Legislação Informatizada - DECRETO Nº 19.440, DE 28 DE NOVEMBRO DE 1930 - Publicação Original
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DECRETO Nº 19.440, DE 28 DE NOVEMBRO DE 1930
Organiza o Tribunal Especial, estabelece o processo, e dá outras providências
O Chefe do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil
DECRETA:
Art. 1º O Governo
Provisório confere ao Tribunal Especial, criado pelo decreto n. 19.398, de 11 de
novembro de 1930, art. 16, a competência que lhe cabe, para, em defesa dos
princípios do regime republicano, do decoro e do prestígio da administração, do
erário público, da ordem e dos interesses públicos em geral, impor as sanções e
determinar as providências de carater político previstas neste decreto,
reservando-se, porem, o Governo Provisório a faculdade de aplicá-las, de plano,
quando entender conveniente.
Art. 2º O Tribunal
Especial julgará, tambem, na conformidade das leis em vigor, os crimes políticos
e funcionais, excluidos os já aforados nas justiças ordinárias, os quais
continuarão a ser processados na forma daquelas leis.
Art.
3º A competência do Tribunal Especial restringe-se a todos os fatos que
tenham tido princípio ou fim no período do Governo que determinou a Revolução.
Art. 4º O Tribunal
Especial terá a sua sede na Capital do Brasil, e estenderá a sua jurisdição
sobre o território nacional.
Art. 5º Quando, de
sindicâncias ou de processos submetidos à apreciação do Tribunal, resultar
indício de algum crime ou contravenção que este julgue escapar à sua
competência, remeterá cópias autênticas das respectivas peças à autoridade
competente, para instauração do processo cabivel.
Art. 6º Para os efeitos
deste decreto, constituem atas e práticas passiveis das sanções e providências
nele estabelecidas:
a) aplicação ou uso indébito ou irregular dos dinheiros ou haveres públicos;
realização de contratos manifestamente prejudiciais ao Estado; e, em geral, todo
o ato ou prática de improbidade contra a fortuna pública;
| b) | os atos diretos ou indiretos de fraude praticados por qualquer representante dos poderes públicos, contra o sistema de representação eletiva, ou contra a verdade dessa representação, incluidos neste preceito os que exerceram mandato legislativo ou judicial; |
| c) | as transgressões de qualquer dever ou obrigação inerentes às funções públicas ou abuso da respectiva autoridade; |
| d) | a prática da advocacia administrativa de qualquer natureza, especialmente o patrocínio, por pessoa investida de função pública, ou por parente seu, de interesses privados junto à administração pública, ou a empresa de que a União ou o Estado seja acionista ou por uma ou outro subvencionada. |
Art. 7º As providências e sanções de carater político, a que se refere este decreto, poderão ser aplicadas cumulativamente e consistirão no seguinte :
| a) | proibição de permanência no território brasileiro, até o prazo máximo de 5 (cinco) anos; |
| b) | privação dos direitos políticos e inibição do exercício de qualquer função administrativa de direção, ou que tenha relação com dinheiros ou haveres públicos, até o prazo máximo de 10 (dez) anos; |
| c) | perda de emprego e incapacidade de exercer função pública, até o prazo máximo de 8 (oito) anos. |
Art. 8º As penas de
direito comum poderão ser aplicadas cumulativamente com as sanções e
providências do art. 7º.
Art. 9º A indenização
por danos causados à Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, e a restituição de
quaisquer quantias indevidamente recebidas dos cofres públicos poderão ser
determinadas sem piejuizo das sanções, penas e providências a que se refere este
decreto.
Parágrafo único. São solidariamente obrigados os
corresponsaveis pelos danos ou prejuizos a que se refere este artigo.
Art.
10. Na aplicação das penas, sanções e providências a que se refere este
decreto, o Tribunal terá em vista os interesses nacionais, a segurança da ordem
pública e as circunstâncias atenuantes e agravantes, sempre a seu critério.
Art.
11. Havendo transitado em julgado a decisão do Tribunal, o presidente
cientificará dos seus termos ao Governo Provisório para a competente execução.
Art. 12. Para a
restituição a que se refere o art. 9º e parágrafo único, a execução do julgado
será feita por via de sequestro e ação executiva, perante as justiças
ordinárias, e segundo a competência e processo estabelecidas.
Parágrafo único.
Não será atingido pelas disposições
deste decreto o prédio que, adquirido antes de qualquer dos fatos nele
referidos, for destinado ao lar ou sustento da família do responsavel.
Art.
13. O Tribunal Especial, se antes não tiver concluido os julgamentos da sua
competência, ficará extinto com a reorganização constitucional do país (decreto
n. 19.389, de 11 de novembro de 1930, art. 1º)
DA CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL.
Art. 14. O Tribunal se comporá
de 5 (cinco) membros, livremente nomeados pelo Governo Provisório, os quais se
considerarão empossados logo que receberem o respectivo título de nomeação, não
podendo ser demitidos.
Art. 15. Os membros do
Tribunal Especial elegerão entre si um presidente e um vice-presidente, que
exercerão esse mandato durante a existência do Tribunal.
Art.
16. Não haverá incompatibilidade entre o exercício das funções de membros
do Tribunal e quaisquer outras, inclusive as de profissões liberais.
§
1º Qualquer membro do Tribunal poderá declarar-se suspeito ou impedido para
funcionar no processo contra este ou aquele indigitado, sendo a sua suspeição ou
impedimento somente em relação esse indigitado.
§ 2º Quando essa suspeição
ou impedimento alcançar a mais de um membro do Tribunal, o presidente comunicará
o fato ao Governo Provisório, que nomeará os substitutos, com função limitada ao
caso.
Art. 17. No caso de
renúncia de qualquer de seus membros, a nomeação do substituto será feita nos
termos do art. 14.
DO FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL.
Art. 18. O Tribunal funcionará
com a presença da maioria dos seus membros.
§ 1º Os atos decisórios,
porem, salvo motivo de impedimento, ou suspeição declarada de alguns dos seus
membros devem ser, sempre, resolvidos pela totalidade destes, e por maioria de
votos.
§ 2º O presidente terá voto,
como membro do Tribunal.
§ 3º No caso de empate na
votação, prevalecerá a decisão mais favoravel ao imputado.
Art.
19. Todos os trabalhos do Tribunal serão registados em atas, que, depois de
aprovadas, serão assinadas pelos membros presentes.
Art. 20. As sessões do
Tribunal serão públicas ou não, a critério do Tribunal.
Parágrafo único. Mesmo que não sejam públicas, o
imputado, por si, pelo seu advogado, ou por este acompanhado, terá direito, se
assim o requerer, de assistir às sessões, salvo se nestas se houver de de tratar
de providência ou deliberação que torne conveniente o sigilo, a critério do
Tribunal.
Art. 21. A ordem de
trabalhos do Tribunal será determinada por este, segundo o regimento interno que
deverá organizar.
SECRETARIA DO TRIBUNAL
Art. 22. O Tribunal organizará
a sua Secretaria, requisitando ao Governo Provisório os funcionários
necessários.
Art. 23. Os funcionários
requisitados poderão ser livremente dispensados pelo Tribunal.
Art.
24. As discriminações de funções e serviços da Secretaria serão feitas no
regimento interno do Tribunal.
DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Art. 25. Ficam criados os
cargos de Procuradores do Tribunal Especial, em número de dois (2), os quais se
denominarão procuradores especiais e serão livremente nomeados e demitidos pelo
Governo Provisório, sendo-lhes aplicavel o disposto no art. 16 deste decreto.
Art. 26. Os procuradores
especiais funcionarão como orgãos da acusação, mediante distribuição alternada,
salvo deliberação em contrário do presidente do Tribunal, tendo em vista os
interesses do serviço.
Art. 27. Competirá aos
procuradores especiais promover ex-officio todos os atos e diligências
necessárias para instaurar e seguir a acusação perante o Tribunal.
Parágrafo único. Os procuradores especiais poderão
requerer e requisitar de todas e quaisquer repartições públicas, ou comissões de
inquérito e sindicância, as providências, diligências e esclarecimentos que
forem necessários, para preparação e instrução dos respectivos processos.
Art.
28. Os procuradores especiais, tendo em vista as necessidades do serviço,
poderão fazer as requisições a que se refere o artigo 22.
Art.
29. Aplica-se à Procuradoria Especial o disposto no art. 23 deste decreto
DAS SINDICÂNCIAS
Art. 30. Serão nomeadas as
comissões de sindicância, que forem necessárias, a critério do Governo
Provisório, para apuração dos fatos delituosos a que se refere o presente
decreto.
Art. 31. Essas comissões
organizarão, em ato preliminar, a ordem dos seus serviços, tendo em vista,
porem, as seguintes regras, que devem ser sempre adotadas :
| a) | todos os trabalhos da comissão deverão constar de atas relativas a cada sessão, as quais deverão ser lavradas, aprovadas e assinadas pelos respectivos membros, até à sessão seguinte; |
| b) | todo processo será escrito, salvo os incidentes de natureza meramente ordenatória, os quais poderão ser propostos verbalmente, devendo, porem, figurar nas atas dos trabalhos da comissão; |
| c) | os imputados poderão, sem dilações especiais, oferecer quaisquer provas, requerer a produção de prova, ainda que testemunhavel e de perícias. A comissão, reconhecendo, a seu critério, a necessidade de dilação para estas provas, poderá concedê-la a requerimento do interessado, pelo prazo máximo de 20 (vinte) dias; |
| d) | encerradas as sindicâncias, poderão os imputados, se quiserem, oferecer alegações no prazo máximo de 10 (dez) dias, a contar da data em que, por via de carta, for citado para esse fim, ou, no caso de não ser sabido seu paradeiro, do aviso de chamamento publicado em dois jornais do lugar, sendo um o jornal oficial; |
| e) | corrido o prazo fixado na letra c, a comissão formulará, um relatório sobre as sindicâncias feitas, apresentando, em seguida, as conclusões a que chegar; |
| f) | feito o relatório e formuladas as conclusões da comissão, será o processo apresentado ao presidente do Tribunal, que o mandará remeter ao procurador especial, a quem for distribuido; este promoverá as diligências complementares necessárias, ou instaurará a acusação, se for o caso; |
| g) | se o procurador especial entender que não há acusação a promover, requererá ao Tribunal o arquivamento do processo de sindicância, o que será feito uma vez deferido o requerimento; no caso contrário, o Tribunal determinará as diligências e as providências a tomar ; |
| h) | as comissões de sindicância, já nomeadas e que não hajam observado as disposições supra, farão lavrar, em tendo ciência do presente decreto, uma ata relativa aos trabalhos realizados até então e prosseguirão com observância do aquí disposto. |
DO PROCESSO
Art. 32. O processo será escrito, salvo quanto a incidentes de natureza ordenatória, que poderão ser propostos verbalmente, devendo, porem, figurar nas atas do Tribunal.
Art. 33. A ação perante
o Tribunal se instaurará por via de denúncia do procurador especial.
§
1º Qualquer cidadão poderá representar a Procuradoria Especial, pedindo a
instauração de processo contra os responsaveis pelos crimes previstos neste
decreto.
§ 2º Essa representação deve
ser assinada, trazer o endereço da residência do signatário, e ter a firma
competentemente reconhecida por tabelião público, e, se não vier, desde logo,
acompanhada de prova, deve indicar, com clareza e precisão, o fato ou fatos
arguidos, e os meios de prova para a sua verificação.
Art.
34. Oferecida a denúncia pelo procurador especial, o Tribunal a receberá ou
não, mandando arquivar o processo, no caso de não recebimento; e, na hipótese
contrária, determinará a instauração do respectivo processo.
Art.
35. A petição de acusação oferecida pelo procurador especial será, por
cópia autêntica, comunicada ao acusado, como fixação do prazo de quinze dias
para apresentar a defesa.
§ 1º Se o acusado se achar
fora da Capital do Brasil, mas em lugar certo e sabido, esse prazo poderá ser
dilatado, tendo em vista as circunstâncias, a critério do Tribunal.
§
2º No caso, porem, de não ser conhecido o paradeiro do acusado, far-se-á essa
comunicação por avisos publicados por duas vezes em dois jornais, sendo um o
Diário Oficial, neles se declarando sucintamente o motivo da acusação. O prazo
para apresentação da defesa, nessa hipótese, será de 30 (trinta) dias, a contar
da publicação do aviso, nos dois referidos jornais.
Art. 36. Findos os
prazos a que se refere o art. 35, com a apresentação ou não da defesa, o
processo prosseguirá.
§ 1º Se o acusado não se
defender, nem constituir advogado, o Tribunal oficiará ao Instituto da Ordem dos
Advogados Brasileiros, pedindo a designação de um advogado, para acompanhar o
processo e fazer a defesa do acusado, devendo esse advogado ser nomeado defensor
do acusado pelo Tribunal.
§ 2º Nomeado esse advogado,
ser-lhe-á feita a comunicação da acusação, na conformidade do disposto no art.
35, para apresentar, no prazo aí estabelecido, a defesa do acusado.
Art.
37. Mesmo que ausentes, os acusados poderão constituir advogados.
Art.
38. Terminados os prazos de defesa a que se refere o artigo 35, será aberta
uma dilação de prova, se assim o requererem o procurador especial ou qualquer
dos interessados, devendo o prazo dessa dilação ser fixado, a critério do
Tribunal, tendo em vista as provas requeridas.
Parágrafo único. O Tribunal poderá indeferir o
requerimento de provas de inutilidade evidente, ou que represente um recurso
protelatório.
Art. 39. As provas
requeridas e deferidas pelo Tribunal serão produzidas perante a comissão de
sindicância respectiva, com prévia ciência dos interessados, ou seus advogados.
Parágrafo único. O Tribunal poderá determinar
qualquer outra maneira de realização de diligência, tendo em vista os interesses
da Justiça.
Art. 40. Dispensada a
dilação, ou encerrada esta, será concedido ao procurador especial o prazo de
quinze dias, para apresentar, por escrito, as alegações que tiver, findo o qual,
terá o acusado, ou, se for revel, o seu defensor, igual prazo, para o mesmo fim.
Parágrafo único. Se for oferecido algum documento
com as alegações de defesa, o procurador especial terá o prazo de cinco dias
para dizer sobre ele.
Art. 41. Decorridos
esses prazos, o Tribunal proferirá a sua sentença.
Parágrafo único. Se o Tribunal, ao ter de proferir a
sua decisão, entender que é conveniente fazer ainda alguma diligência,
converterá o julgamento em diligência, determinando como deva ela ser feita, e,
uma vez efetuada, terão as partes metade dos prazos a que se refere o art. 40
para dizerem, por escrito.
Art. 42. As sentenças do
Tribunal serão escritas e fundamentadas, e só admitirão o recurso de embargos
para o próprio Tribunal.
Parágrafo único. Esses embargos deverão ser oferecidos
no prazo de dez dias, da ciência do julgado, e impugnados pela parte contrária,
em igual prazo, sendo depois submetidos a julgamento.
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 43. São nulos de pleno
direito, em relação à Fazenda Pública, todos os atos de alienação, oneração, ou
desistência de qualquer bem, direito ou ação, dos responsaveis pela gestão ou
aplicação de dinheiros públicos, inclusive membros do Congresso Nacional, ou dos
Governos federal, estaduais ou municipais, no período do Governo que determinou
a Revolução, no que venham a frustrar, no todo ou em parte, as indenizações ou
restituições a que possam ser obrigados, nos termos deste decreto e mais
disposições aplicaveis.
Art. 44. O Tribunal,
para realização das suas deliberações, poderá requisitar de todos e quaisquer
funcionários ou repartições públicas do Brasil, ainda que em país estrangeiro,
as providências, diligências e informações que julgar necessárias ou
convenientes.
Parágrafo único. Poderá tambem, a requerimento do
procurador especial, determinar a prisão dos indiciados. Esta providência
poderá, a qualquer tempo, ser revogada pelo Tribunal.
Art.
45. Os advogados terão imunidades para, o exercício da defesa, não podendo
sofrer qualquer coação por motivo do seu patrocínio.
§
1º No caso de entender o Tribunal que, por qualquer circunstância, os advogados
constituídos ou nomeados se tornem passíveis de penas, referirá o fato ao
Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, que poderá, no prazo máximo de
cinco dias, a contar do recebimento da comunicação, indicar a pena a aplicar.
§ 2º Se não for feita essa indicação no prazo marcado, o Tribunal, então,
aplicará as penas que couberem, segundo direito comum.
Art.
46. Qualquer cidadão poderá pedir ao Tribunal seja admitido como assistente
para acompanhar a ação do procurador especial. Uma vez admitida a assistência,
poderá representar, por escrito, ao procurador especial, sugerindo diligências
ou providências, ficando, porem, a critério desse procuradorar adotar ou não
essas sugestões. Em qualquer hipótese, tais petições de sugestões deverão ser
juntas aos autos, salvo se o Tribunal entender de as mandar arquivar em
separado.
Art. 47. As sindicâncias
e processos, bem como todos os atos a ele pertinentes ou atinentes, inclusive os
de defesa, ficarão isentos de selo, ou de pagamento de quaisquer custas ou
emolumentos.
Art. 48. São
consideradas como subsidiárias, naquilo em que não contrariarem o presente
decreto, e a critério do Tribunal, as leis criminais, civís e as de processo
federal e do Distrito Federal.
Rio de Janeiro, 28 de novembro de 1930, 109º da Independência e 42º da República.
GETULIO VARGAS
Oswaldo
Aranha
- Diário Oficial da União - Seção 1 - 30/11/1930, Página 21540 (Publicação Original)