Legislação Informatizada - DECRETO Nº 7.619, DE 21 DE OUTUBRO DE 1909 - Republicação

DECRETO Nº 7.619, DE 21 DE OUTUBRO DE 1909

Approva o regulamento para organização dos serviços contra os effeitos das seccas

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, para dar execução á lei n. 1.396, de 10 de outubro de 1905, e ás autorizações constantes dos ns. XXV e XLII, art. 16, da lei n. 2.050, de 31 de dezembro de 1908,

DECRETA:

     Artigo único. Fica approvado o regulamento que com este baixa, assignado pelo ministro de Estado da Viação e Obras Publicas, para organização dos serviços contra os effeitos das seccas.

Rio de janeiro, 21 de outubro de 1909, 88º da Independencia e 21º da Republica.

NILO PEÇANHA.
Francisco Sá.

 

REGULAMENTO A QUE SE REFERE O DECRETO N. 7.619 DESTA DATA

CAPITULO I

DOS SERVIÇOS CONTRA OS EFFEITOS DAS SECCAS

     Art. 1º Os serviços de estudos e obras, destinados a prevenir e a attenuar os effeitos das seccas que assolam alguns Estados do Norte do Brazil, são os seguintes:

     I, estradas de ferro de penetração;

     II, estradas de ferro affluentes das estradas principaes;

     III, estradas de rodagem e outras vias de communicação entre os pontos flagellados e os melhores mercados e centros productores;

     IV, açudes e poços tubulares, os artezianos e canaes de irrigação;

     V, barragens transversaes submersas e outras obras destinadas a modificar o regimen torrencial dos cursos de agua;

     VI, dredagem dos valles desaproveitados no littoral e melhoramento das terras cultivaveis do interior;

     VII, estudo systematizado das condições meteolologicas, geologicas e topographicas das zonas assoladas;

     VIII, installação de observatorios meteorologicos e de estações pluviometricas;

     IX, conservação e reconstituição das florestas;

     X, outros trabalhos cuja utilidade contra os effeitos das seccas a experiencia tenha demonstrado.

     Art. 2º Os serviços de que trata o artigo precedente serão executados pela União, ou por esta e pelo Estado conjunctamente, nos termos da lei n. 1.396, de 10 de outubro de 1905, e mais disposições em vigor.

     Art. 3º A União executará por sua conta as obras que julgar mais urgentes e necessarias, comprehendidas nestas as que estiverem especificadas na lei de orçamento.

     Art. 4º As outras obras com o mesmo fim poderão ser executadas pelo Estado, mediante auxilio da União.

     Art. 5º O auxilio da União consistirá no seguinte:

     § 1º Mandar proceder ao estudo dos Estados assolados pelas seccas, entregando aos respectivos governos cópias das cartas levantadas, com as indicações dos logares onde a construcção de açudes e a perfuração de poços artezianos ou tubulares fôr conveniente e exequivel.

     § 2º Entregar ao governo estadual a quantia em que fôr fixado o referido auxilio, para que seja convenientemente applicado, mediante fiscalização da União.

     Art. 6º A União será obrigada, sempre que o Estado o solicitar, nos termos da citada lei n. 1.396, a prestar o seu concurso e auxilio, que não poderá ser inferior a 200:000$, annualmente.

     Art. 7º O Estado que pretender o auxilio da União deverá requerel-o ao Ministro da Viação e Obras Publicas, comprovando:

     a) que é periodicamente assolado pela secca;

     b) que em seus orçamentos consigna verbas especiaes para a construcção de obras preventivas e attenuantes dos effeitos da secca, não sendo as quantias votadas inferiores a 5 % da sua receita ordinaria:

     c) que taes verbas, escripturadas á parte, constituem deposito especial e não são desviadas para outros fins (lei citada, Art. 2º).

     Art. 8º A requisição do auxilio declarará a obra a que este se destina.

     Si esta não fôr daquellas cujos estudos já tenham sido feitos por alguma commissão do Governo Federal e por este approvados, o Estado apresentará, juntamente com o pedido, o respectivo projecto e orçamento, feitos por commissão technica por elle nomeada, e verificados pela secção de obras do Governo Federal, que deverá ter acompanhado os trabalhos do governo estadual.

     Os estudos poderão ser feitos por aquella secção de obras, mediante solicitação do governo do Estado, e, neste caso, a despeza que custarem será lançada á conta do auxílio requisitado da União.

     Art. 9º Approvados pelo Governo Federal os planos e orçamentos dos trabalhos e autorizada a sua execução, serão no mesmo acto fixadas a importancia total a despender, a despeza annual que ficará a cargo do Estado e a despeza animal que ficará a cargo da União.

     Art. 10. O auxilio da União será entregue ao Estado em duas prestações semestraes. A entrega de cada uma das que seguirem a primeira se fará, depois de provada a applicação da anterior e da quota a cargo do Estado, por meio de contas approvadas pelo Governo.

     Art. 11. O auxilio não será dado para a execução de mais de uma obra ao mesmo tempo, salvo si o valor das obras a executar fôr inferior ao correspondente ao limite do auxilio fixado no art. 6º.

     Art. 12. Immediatamente após a entrega da primeira parte do auxilio deverão ser iniciadas as obras a executar por parte do Estado e designado o engenheiro da secção de obras federal incumbido da fiscalização.

     Art. 13. Cessará o concurso da União sempre que o Estado deixar de observar o que está determinado no art. 7º, lettras b e c.

     Art. 14. Cessará tambem o concurso da União sido Estado desviar para outros fins as quantias recebidas do Governo Federal e destinadas á execução das obras de que trata o presente regulamento.

     Art. 15. O Estado que já houver realizado o auxilio de que se occupa o art. 6º, e concluidas as obras a que se destinava, poderá solicitar novo auxilio para conclusão dos serviços já estudados ou de outros tendentes ao mesmo fim.

CAPITULO II

DA EXECUÇÃO DAS OBRAS

     a) Açudes

     Art. 16. Os açudes serão grandes, médios e pequenos.

     Art. 17. São considerados grandes açudes aquelles que offereçam capacidade superior a dez milhões de metros cubicos e profundidade média maior de seis metros.

     Art. 18. São considerados médios os açudes cuja capacidade seja de dous milhões de metros cubicos, no minimo, e que tenham profundidade não inferior a cinco metros.

     Art. 19. São considerados pequenos os açudes de capacidade não inferior a meio milhão de metros cubicos e de profundidade de quatro metros, no minimo.

      Art. 20. Os grandes açudes serão construidos de preferencia á margem das estradas de ferro, ou nas suas proximidades, e só poderão sel-o em terras publicas ou previamente desapropriadas.

      Art. 21. Os grandes açudes serão, em regra, construidos por empreitadas, totaes ou parciaes, mediante concurrencia publica.

     Excepcionalmente, quando a urgencia da obra ou a necessidade de soccorro á população o reclamar, ou quando a concurrencia não houver dado resultado satisfactorio, serão construidos por administração.

     Art. 22. Concluida a construcção, o Governo da União estabelecerá o regimen que lhe parecer mais conveniente para a utilização das aguas e dos canaes, ou entregará o açude ao governo do Estado mediante, condições que assegurem conservação da barragem e das obras complementares.

     Art. 23. Os açudes médios e pequenos serão construidos pelo Estado ou pelos particulares,

     Art. 24. Os projectos dos açudes médios e pequenos, já approvados pelo Ministerio da Viação e Obras Publicas, serão igualmente remettidos aos Estados para terem execução.

     Art. 25. Nos periodos de calamidade, reconhecida a urgencia de multiplicar os trabalhos publicos, a União poderá tomar a seu cargo a construcção de açudes médios.

     b) Perfuração de poços

     Art. 26. Além dos poços construidos por iniciativa da administração publica, a Inspectoria de Obras mandará construir os que lhe forem solicitados por municipalidades, agricultores ou criadores, nos logares onde se houver verificado a existencia de agua no sub-solo.

     Art. 27. Os individuos a quem o poço houver de beneficiar pagarão apenas as despezas de mão de obra no revestimento, de maneio e de installação.

     Art. 28. O modo de pagamento será por annuidades, conforme fôr convencionado.

     Art. 29. No contracto, a clausula de fornecimento de agua para fins domesticos ás populações circumvisinhas é essencial.

     c) Estradas de rodagem

     Art. 30. As estradas de rodagem a serem construidas entre os pontos flagellados e os melhores mercados e centros productores terão, no minimo, quatro metros de largura e vinte metros de raio nas curvas, a sua declividade maxima será de 5 %.

     d) Barragens transversaes no leito dos rios

     Art. 31. As barragens transversaes no leito dos rios teem por fim corrigir-lhes o regimen torrencial e conservar a humidade.

     Art. 32. Estas barragens deverão ser acompanhadas da protecção das margens dos rios, já guardecendo-as pelos meios que a sciencia e a experiencia indicarem, já prohibindo-se á destruição das arvores marginaes e outros obstaculos que impeçam a corrosão das mesmas.

     e) Drenagem dos valles

     Art. 33. A drenagem e dessecamento dos valles desaproveitados do littoral e o melhoramento das terras cultivaveis do interior serão leitos para o fim de localizar familias de retirantes que o requererem.

     Art. 34. Feito o melhoramento a que se refere o artigo precedente, as terras drenadas, se forem de propriedade da União, serão entregues ao Ministerio da Agricultura, para providenciar sobre a localização nellas das familias retirantes.

     f) Estações pluviometricas e observatorios meteorologicos

     Art. 35. As estações pluviometricas serão installadas pela União e ficarão a cargo dos agentes do Correio e empregados do Telegrapho, e os observatorios serão confiados a observadores idoneos.

     g) Premios

     Art. 36. Serão distribuidos premios aos individuos ou syndicatos agricolas que construirem açudes médios ou pequenos.

     Art. 37. Os projectos e orçamentos de taes açudes serão organizados gratuitamente, a requerimento do proprietario do terreno, instruido com a demonstração das vantagens do açude a construir, certidão affirmativa da municipalidade de ser agricultor ou criador o requerente; prova legal de que nenhum onus real grava a propriedade onde o açude houver de ser construido.

     Art. 38. O premio será conferido mediante novo requerimento do proprietario ao Governo Federal, acompanhando o attestado do fiscal da União de haver sido o açude construido de accôrdo com o projecto préviamenle organizado e approvado, e de que a barragem e obras complementares satisfazem as exigencias da utilidade a que se destinam.

     Art. 39. O proprietario requerente comprometter-se-ha a fornecer agua para as necessidades domesticas das populações circumvizinhas.

     Art. 40. O premio será conferido na razão da metade da importancia do orçamento approvado.

     Art. 41 Os açudes existentes, quando melhorados, conforme o projecto organizado, nos termos do art. 37, serão tambem premiados na razão da metade do preço dos melhoramentos executados.

     Paragrapho unico. As obrigações dos proprietarios serão as mesmas e identicas ás exigencias para realização das obras e obtenção do premio.

     Art. 42. Si aquelle que houver construido ou melhorado um açude fizer junto a este a plantação e conservação ulterior, por tres annos, de arvores em área não inferior a dous hectares, terá um premio supplementar correspondente á metade da despeza feita com esse trabalho.

     Art. 43. Terão as mesmas vantagens os syndicatos agricolas regularmente organizados, sendo-lhes facultada a construcção de mais um açude.

     Art. 44. Poderá igualmente fazer jús aos premios o município que, a expensas proprias e sempre mediante as exigencias dos arts. 37, 38 e 39, construir em terras de seu patrimonio, ou previamente desapropriadas, açudes de utilidade publica, ou que realize o serviço florestal indicado no art. 42.

     Art. 45. O Governo poderá adeantar parte do premio a ser conferido, si entender conveniente.

     Paragrapho unico. Para effeito desse adeantamento, é mister que, pelo menos, metade da barragem já esteja construida.

     Art. 46. A propriedade onde estiver encravado o açude premiado será previamente avaliada para os effeitos da desapropriação pelo Governo, caso a construcção não se ultime, ou a conservação se não faça, ou se faça por tal modo imperfeita que ponha em risco a segurança da barragem e obras complementares.

     Art. 47. Todas as condições impostas neste regulamento constarão do acto que conceder o premio e se consideram tacitamente acceitas pelo requerente. No caso de omissão, a sua obrigatoriedade será a mesma.

CAPITULO III

DA DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS

     Art. 48. A direcção e fiscalização das obras contra os effeitos das seccas executadas pela União, ou com o concurso desta, ficarão a cargo de uma divisão especial do Ministério da Viação e obras Publicas, intitulada Inspectoria das Obras Contra as Seccas.

     Art. 49. A essa inspectoria incumbe:

     1º, organizar o serviço de levantamento das zonas mais assoladas pelas seccas e a collecta dos dados meteorologicos, geologicos, topographicos e outros necessarios á systematização do serviço de estudos e de construcção de obras contra os effeitos das seccas;

     2º, o estudo, projecto, orçamento e execução das obras especiaes que forem ordenadas pelo Ministerio da Viação e Obras Publicas;

     3º, a conservação e exploração das obras que ficarem a cargo do Governo Federal;

     4º, a fiscalização das obras executadas pelos Estados, pelas municipalidades ou pelos particulares, com auxilio ou premios da União;

     5º, a celebração de contractos e accôrdos relativos ao concurso da União nas obras por esta fórma executadas.

     Art. 50. A inspectoria das Obras Contra as Seccas se comporá de uma secção central e tres secções districtaes. Estas serão designadas por 1ª, 2ª e 3ª secções.

     Art. 51. A secção central, que funccionará junto ao Ministerio da Viação e Obras Publicas, será constituida pelo inspector, sub-inspector, um secretario e um servente.

     Art. 52. O inspector percorrerá, ao menos duas vezes por anno, as zonas em que houver trabalhos contra os effeitos das seccas.

     Art. 53. Cada uma das secções districtaes será constituida por um engenheiro chefe de secção, engenheiros de 1ª classe, engenheiros de 2ª classe, conductores de 1ª classe, conductores de 2ª classe, um desenhista-escripturario, um pagador e um almoxarife.

     Art. 54. A 1ª secção terá a seu cargo os trabalhos a executar nos Estados do Ceará e Piauhy. A 2ª secção terá a seu cargo os trabalhos a executar nos Estados do Rio Grande do Norte e Parahyba. A 3ª secção terá o seu cargo os trabalhos a executar nas zonas seccas comprehendidas entre Pernambuco e o norte de Minas Geraes.

     Art. 55. As sédes das secções serão estabelecidas nos pontos indicados pela intensidade do phenomeno das seccas e pela importancia das obras em execução. Constarão assim como o quadro do pessoal e a distribuição dos trabalhos deste, de instrucções especiaes.

     Os quadros não serão fixos, mas serão preenchidos a medida das necessidades do serviço.

     Art. 56. Os empregados de uma secção poderão ser designados para trabalhar em outra secção, quando a inspectoria o julgar necessario para o serviço.

     Art. 57. Serão nomeados: por decreto do Presidente da Republica, o inspector; por portaria do ministro: o sub-inspector, os chefes de secção, os engenheiros de 1ª e 2ª classes, o secretario da inspectoria; pelo inspector: os escripturarios, pagadores e almoxarifes. Os demais empregados serão nomeados pelos chefes de secção.

     Art. 58. Todo o pessoal da Inspectoria de Obras Contra as Seccas será considerado em commissão.

     Art. 59. Não se comprehende nas attribuições da Inspectoria de Obras Contra as Seccas a direcção de estradas de ferro, as quaes ficarão sob o regimem especial estabelecido para as outras estradas de ferro da União.

     Art. 60. Os vencimentos dos empregados serão os fixados na tabella annexa.

     O Governo poderá contractar pessoas idoneas para serviços comprehendidos neste regulamento, sendo-lhes fixados vencimentos não superiores aos da tabella annexa ou aos que já perceberem em outros cargos officiaes.

     Os empregados nomeados ou removidos para terem exercido em logares onde não estiverem residindo terão uma ajuda de custo correspondente a um mez de vencimentos.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 1909. - Francisco Sá.

TABELLA DOS VENCIMENTOS QUE COMPETEM AOS EMPREGADOS DOS SERVIÇOS CONTRA OS EFFEITOS DAS SECCAS

CLASSES VENCIMENTOS
Inspector........................................................................................... 18:000$000
Sub- Inspector................................................................................... 15:000$000
Chefe de secção................................................................................... 15:000$000
Engenheiro de 1ª classe....................................................................... 9:00$000
Engenheiro de 2ª classe........................................................................... 7:200$000
Conductor de 1ª classe............................................................................. 4:800$000
Conductor de 2ª classe.............................................................................. 3:600$000
Desenhista-escripturario.............................................................................. 4:800$000
Secretario.................................................................................................... 6:000$000
Almoxarife................................................................................................... 3:600$000
Pagador....................................................................................................... 4:800$000
Servente (diaria)........................................................................................... 5$000

     Uma terça parte do vencimento annual será considerada como gratificação de exercicio.

     Ao pessoal technico e ao pagador será arbitrada pelo inspector uma diaria de cinco a quinze mil réis.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 1909. - Francisco Sá.



 


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 08/01/1910


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 8/1/1910, Página 156 (Republicação)