Legislação Informatizada - Decreto nº 4.780, de 2 de Março de 1903 - Publicação Original

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Decreto nº 4.780, de 2 de Março de 1903

Approva o regulamento para a Escola Correccional «Quinze de Novembro»

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, usando da autorização que lhe conferem os arts. 1º, n. IV, 6º e 7º da lei n. 947, de 29 de dezembro de 1902; e

     Considerando que o fim da Escola Correccional «Quinze de Novembro» é educar e velar sobre menores, que, pelo abandono ou miseria dos paes, vivem ás soltas e expostos á pratica e transgressões proprias de sua idade;

     Considerando que a antiga Escola com essa denominação não satisfazia esse intuito, porquanto nella o regimen estabelecido era o dos institutos correccionaes entre nós existentes, e pelo qual os menores em promiscuidade com outros já iniciados na carreira do crime, em vez de corrigirem-se antes avezavam-se ao vicio e ao crime;

     Considerando que a experiencia dos povos cultos tem demonstrado que, ainda para os alumnos oriundos de um meio puro, nenhum systema póde produzir melhores resultados do que o regimen familiar, onde, em vez de vegetar ou extenuar-se, o menor vae encontrar elementos propicios á expansão natural do suas faculdades;

     Considerando que na execução do preceito da lei n. 947, o Governo não fica adstricto á creação de um só typo de colonias ou estabelecimentos correccionaes, e que, portanto, para satisfazer o disposto no art. 7º é indispensavel dar ao estabelecimento destinado á rehabilitação e á prevenção dos menores abandonados um caracter especial, em que prepondere a influencia dos meios pedagogicos:

     Resolve approvar o regulamento, que com este baixa, assignado pelo Ministro de Estado da Justiça e Negocios Interiores.

Rio de Janeiro, 2 de março de 1903, 15º da Republica.

FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
J. J. Seabra.

 

REGULAMENTO DA ESCOLA CORRECCIONAL «QUINZE DE NOVEMBRO», A QUE SE REFERE O DECRETO DESTA DATA

TITULO I

Da organisação do Instituto

CAPITULO I

DOS FINS DO INSTITUTO

Art. 1º A Escola Correccional «Quinze de Novembro» tem por fim dar educação physica, profissional e moral aos menores abandonados e recolhidos ao estabelecimento por ordem das autoridades competentes, nos termos do art. 7º da lei n. 947, de 29 de fevereiro de 1902.

Art. 2º Comprehendem-se como abandonados os menores de 14 annos, maiores de 9, que, por serem orphãos, ou por negligencia, ou vicios, ou enfermidades, ou falta de recursos dos paes, tutores, parentes, ou pessoas, em cujo poder, guarda ou companhia vivam, ou por outras causas, forem entregues ás autoridades judiciarias ou policiaes, ou forem encontrados habitualmente sós na via publica, entregues a si mesmos e desamparados de qualquer assistencia natural.

Art. 3º Sendo a Escola destinada a gente desclassificada, a instrucção ministrada na mesma não ultrapassará o que for indispensavel á integração do internado na vida social. Dar-se-lhes-ha, pois, o cultivo necessario ao exercicio profissional. Aquelles individuos, porém, que revelarem dotes superiores, durante ou no fim do estagio, serão admittidos a qualquer estabelecimento de ensino secundario ou artistico custeado pela União.

Art. 4º Serão respeitadas as crenças dos internados; não se admittirá, porém, na Escola propaganda religiosa.

Paragrapho unico. Aos educandos que manifestarem o desejo de frequentar as igrejas, os templos de suas respectivas confissões, o director permittirá que o façam, acompanhados por empregados do estabelecimento, em dias proprios para esses actos religiosos.

Art. 5º Tanto quanto for possivel, o director occupará os internados com os serviços economicos e de asseio dos estabelecimentos, attendendo á idade e á hygiene, de modo a não só habitual-os á ordem domestica, mas tambem a dispensar pessoal externo.

Art. 6º O estabelecimento ficará sob a immediata inspecção do Chefe de Policia, que lhe dará regimento, determinando o respectivo processo de fiscalização, com approvação do Ministro.

CAPITULO II

DA ADMINISTRAÇÃO

Art. 7º O Instituto terá o seguinte pessoal administrativo:

1 Director;

1 Secretario;

1 Medico;

1 Pharmaceutico-enfermeiro-mór;

1 Escripturario;

1 Almoxarife;

1 Roupeiro;

1 Porteiro;

Inspectores, de accordo com as necessidades da disciplina;

Os cozinheiros, auxiliares e serventes necessarios, tirados alternadamente, quando fsr possivel, dentre os internados de maior robustez.

Art. 8º O director e o secretario serão nomeados por decreto; o medico, o pharmaceutico-enfermeiro, o escripturario e o almoxarife, pelo Ministro sobre proposta do Chefe de Policia; os outros empregados pelo Chefe de Policia.

Art. 9º Os vencimentos dos empregados da administração serão os constantes da tabella sob a lettra A.

Art. 10. Os empregados da Escola tomarão posse e entrarão em execicio á vista do titulo de nomeação.

Art. 11. São competentes para dar posse:

I. O Chefe de Policia ao director, secretario, medico, pharmaceutico, escripturario e professor.

II. O director. aos demais empregados.

Paragrapho unico. O exercicio será communicado ao Chefe de Policia.

Art. 12. Sómente por motivo de molestia ou em virtude de licença do Governo poderão os empregados interromper o exercicio de suas fuucções.

Art. 13. São competentes para conceder licenças:

I. O Ministro ao director, ao secretario, ao medico, ao pharmaceutico, ao escripturario o ao almoxarife.

II. O Chefe do Policia aos empregados de sua nomeação; e até 30 dias ao director, ao secretario, ao medico, ao pharmaceutico, ao escripturario e ao almoxarife.

Do director

Art. 14. O director é a primeira autoridade da Escola, São-lhe subordinados todos os empregados, que delle receberão as instrucções e ordens necessarias para, o bom desempenho das suas funcções.

Art. 15. Compete ao director:

§ 1º Distribuir e fiscalizar, de conformidade com este regulamento, todo o serviço dos diversos funccionarios;

§ 2º lnspeccionar os serviços e dar as ordens e instrucções necessarias para regularidade e efficacia da educação e exercicios dos internados;

§ 3º Regular e fiscalizar a despeza, de modo que esta se faça com a maior economia;

§ 4º Determinar e regularisar o serviço da escriptutação;

§ 5º Recolher ao cofre do estabelecimento todo o dinheiro que receber, quer do Thesouro, quer provoniente de vendas effectuadas;

§ 6º Nomear e demittir os empregados subalternos não designados no art. 13;

§ 7º Rubricar os pedidos mensaes para os despezas da Escola; ordenar a execução das autorizadas e assignar as folhas dos empregados que, mensalmente, são enviadas ao Thesouro e ao Ministro;

§ 8º Deliberar, sob sua responsabilidade, ácerca de qualquer occurrencia não prevista neste regulamento, participando ao Ministro o que houver succedido;

§ 9º lmpôr penas aos internados e aos empregados , segundo a gravidade das faltas por elles commettidas, de accordo com o disposto neste regulamento;

§ 10. Contractar e comprar todos os objectos necessarios á Escola, salvo contracto que o Ministro houver feito com terceiro, e vender o producto das officinas, tudo com prévia autorização do Chefe de Policia, a cuja approvação serão submettidas as minutas dos contractos e propostas de venda.

Art. 16. O director deve morar num dos estabelecimentos.

Art. 17. O director deverá apresentar ao Ministro, depois de terminados os trabalhos do anno e até o dia 30 de janeiro, um relatorio circumstanciado do estado da Escola em relação ao pessoal e ao material, dando conta dos trabalhos do anno findo, mencionando as principaes occurrencias havidas, propondo as modificações no plano de educação e ensino profissional que se verificar mais consentanea com o systema adoptado neste regulamento e todas as medidas que julgar necessarias á boa marcha do estabelecimento e ao seu melhoramento.

Art. 18. Com o relatorio annual, de que trata o artigo precedente, deverá, o director apresentar o balanço da receita e despeza do anno findo e o orçamento da receita e despeza, para o anno seguinte.

Art. 19. O director deverá franquear o estabelecimento ás visitas do publico nos dias e horas para esse fim designados, mas de modo que não sejam perturbados os trabalhos da Escola.

Do secretario

Art. 20. O secretario alternará com o director, e a aprazimento deste, a inspecção immediata das 2ª e 3ª divisões ( arts. 57 e seguintes) da Escola, quando estas estiverem em funcção, podendo morar ou não num dos estabelecimentos.

Compete-lhe:

§1º Substituir o director em seus impedimentos e coadjuval-o nas respectivas funcções;

§ 2º Dirigir e ter em dia toda a escripturação e contabilidade da Escola, fiscalizando e authenticando os documentos de receita e despeza, por cuja exactidão será responsavel;

§ 3º Conservar sob sua guarda e vigilancia, o cofre e do Instituto que terá duas chaves, uma das quaes ficará em seu poder e a outra com o director.

Do medico e pharmaceutico

Art. 21. Compete ao medico, além do exercicio profisional:

§ 1º Examinar os viveres fornecidos, rejeitando os que não lhe parecerem bons;

§ 2º Intervir nos contractos para o fornecimento de medicamentos;

§ 3º Vaccinar os internados que anda não o tenham sido;

§ 4º Fiscalizar e superintender o serviço a cargo do pharmaceutico;

§ 5º Explicar aos empregados subalternos e aos educandos os principios elementares de hygiene;

§ 6º Assumir interinamente a direcção do estabelecimento no caso de impedimento do director e secretario.

Art. 22. O pharmaceutico desempenhará as funcções proprias de sua profissão, bem como as de enfermeiro-mór sob as ordens e direcção do medico.

Do escripturario

Art. 23. Ao escripturario compete:

§ 1º Auxiliar o secretario;

§ 2º Fazer a escripturação, mantendo-a sempre em dia;

§ 3º Preparar a correspondencia sob a direcção do secretario;

§ 4º Registrar em livro especial os relatorios de que trata o art. 17;

§ 5º Authenticar a entrada de dinheiros para o cofre e o pagamento das despezas, que por elle se houver de fazer.

Do almoxarife

Art. 24. Incumbe ao almoxarife:

§ 1º Conservar em boa ordem e limpeza, a, casa da arrecadação;

§ 2º Receber e ter sob sua guarda todos os generos, fazendas, manufacturas e quaesquer outros objectos destinados ao consumo;

§ 3º Satisfazer com promptidão e á vista de pedidos, rubricados pelo director, as requisições de generos, fazendas o objectos a seu cargo;

§ 4º Verificar o modo pelo qual o cozinheiro ou cozinheiros distribuem o rancho.

Art. 25 Na arrecadação haverá um livro escripturado com clareza pelo almoxarife, com carga e descarga.

Art. 26. No primeiro dia de cada mez o almoxarife apresentará, ao director um mappa geral da distribuição do rancho verificada no mez anterior e justificada pelos pedidos diarios; que serão registrados em livro proprio.

Do roupeiro

Art. 27. Ao roupeiro incumbe:

§ 1º Tomar escrupuloso cuidado com a roupa dos internados, marcada e depositada nos armarios da rouparia;

§ 2º Entregar, mediante rol, ao encarregado da lavanderia e engom mado, a roupa dos educandos, e bem assim as peças de uso dos refeitorios, copas, cozinhas e enfermarias;

§ 3º Receber a roupa lavada e engommada, verificando si está de accordo com o rol e si se acha tratada com cuidado e asseio.

Do porteiro

Art. 28. Incumbe ao porteiro:

§ 1º A guarda, limpeza e arranjo das diversas dependencias em que funccionar a direcção e annexos;

§ 2º Receber e expedir a correspondencia, fiscalizar o serviço do pessoal subalterno, dos quaes um, designado pelo director, o substituirá em seus impedimentos e faltas.

Dos inspectores

Art. 29. Aos inspectores incumbe zelar e manter a ordem na turma de internados que dirigirem.

Art. 30. Haverá um inspector geral da escolha do director ao qual deverão os demais prestar obediencia directa para boa marcha do serviço interno da Escola.

CAPITULO III

DO CORPO DE EDUCADORES E MESTRES

Art. 31. Haverá na Escola o seguinte pessoal para o ensino primario, profissional e exercicios praticos e ruraes:

1 professor de portuguez o mathematica elementar, desenho e noções de artes;

1 professor de musica e instrumental;

1 mestre de gymnastica, esgrima, exercicios de natação, remo e equitação;

1 horticultor;

Tantos chefes de turmas ruraes e mestres de officios quantos comportar a extensão dos serviços.

Do professor de portuguez

Art. 32. Ao professor do portuguez compete:

§ 1º Reger alternadamente nas tres divisões, attendendo aos trabalhos de campo e de officina, as respectivas aulas;

§ 2º Preparar os alumnos que o devam auxiliar nessa regencia, constituindo turmas não excedentes de 15, aos quaes será dada a instrucção pelo methodo de ensino concreto;

§ 3º Propor ao diretor os programmas de ensino;

§ 4º Fazer aos domingos, quando for possivel, leituras moraes e promover diversões de natureza esthetica.

Do professor de musica

Art. 33. O professor de musica, além do ensino da disciplina artistica, organisará uma banda marcial, cuidando de preparar, dentre os alumnos, um mestre, que o substitua.

Do professor de gymnastica e esgrima

Art. 34. O mestre de gymnastica e esgrima promoverá todos os exercicios e jogos, que forem usados em estabelecimentos similares.

Disposições especiaes sobre o pessoal da administração

Art. 35. Exceptuados o director, secretario e medico, todo o pessoal mencionado neste capitulo e no anterior funccionará provisoriamente até que dentre os educandos se possam habilitar os mais aptos para preenchimento do quadro respectivo.

Art. 36. O director poderá acceitar os serviços gratuitos, que se offereçam a prestar ao estabelecimento pessoas competentes, propondo ao Chefe de Policia a sua nomeação provisoria, desde que os mesmas se sujeitem às disposições regulamentares.

CAPITULO IV

DA ESCRIPTURAÇÃO E DA CAIXA

Art. 37. Haverá na secretaria da Escola os seguintes livros, abertos, numerados e rubricados por um empregado da Secretaria da Policia designado pelo Chefe de Policia:

§ 1º De - matricula - em que será lançado o nome de cada alumno, com as declarações constantes da guia com que for apresentado afim de ser internado.

§ 2º De - receita e registro do contas - no qual se mencionará a quantia consignada, na lei do orçamento para despezas do Instituto, distribuida pelas differentes consignações, e no fim de cada mez se registrarão as contas da fornecedores, cujas importancias serão deduzidas gradualmente.

§ 3º De - lançamento das despezas de prompto pagamento - cuja escripturação será feita e encerrada todos os dias e discriminadamente pelas rubricas da lei do orçamento.

§ 4º De - termos - que mencionará o dia de posse dos empregados, o registro de seus titulos de nomeação e as licenças obtidas.

§ 5º De - attestado de frequencia - dos empregados relacionados em folha do Thesouro, do qual constará o nome e emprego de cada um e as faltas mensaes com causa justificada ou não.

§ 6 º De - ponto dos empregados.

§ 7º Além destes livros, haverá mais na secretaria ou em qualquer outra dependencia da Escola os que o director julgar necessarios para a regularidade do serviço.

Art. 38. Todas as quantias pertencentes á Escola serão recolhidas pelo secretario, no mesmo dia em que as receber, ao cofre do estabelecimento, que ficará sob sua guarda e exclusiva responsabilidade.

Paragrapho unico. Em um livro, que nesse cofre deve ser guardado, o escripturario fará o lançamento das quantias recolhidas, com declaração da procedencia, e das quantias que sahirem, com declaração dos seus destinos.

Art. 39. Nenhuma despeza se fará sem preceder pedido por escripto e autorização do director e nenhuma conta será remettida para ser paga no Thesouro sem estar conferida e assignada pelo escripturario e pelo secretario e rubricada pelo director.

O director prescreverá o modo pratico de se fazerem as pequenas despezas eventuaes a que se não possa applicar esta regra.

Art. 40. No ultimo dia do mez se dará balanço á caixa na presença do director, depois de pagos os salarios dos mestres das officinas, dos operarios, dos serventes e as despezas do prompto pagamento; e no fim de cada trimestre recolherá á Caixa Economica a, parte que pertencer aos educandos.

CAPITULO V

DO PATRIMONIO

Art. 41. O patrimonio da Escola será constituido:

§ 1º Com os valores que forem doados ou legados á Escola por qualquer modo Legal;

§ 2º Com as multas impostas aos empregados e sobre o peculio dos internados;

§ 3º Com as subvenções que forem votadas pelo Congresso, em beneficio do fundo patrimonial;

§ 4º Com os saldos de que trata o art. 50.

Art. 42. O fundo patrimonial do Instituto será convertido em apolices geraes da divida publica fundada ou em quaesquer outros titulos da divida publica que melhores garantias offerecerem. Todavia a Escola poderá possuir em bens do raiz uma parte do seu patrimonio, a qual será determinada pelo Governo.

Art. 43. Nenhuma quantia será distrahida do fundo patrimonial ou dos juros e mais rendimentos, emquanto não for elle sufficiente para occorrer a todas as despezas da Escola com os nove decimos de seus juros e rendimentos annuaes.

Art. 44. Logo que o patrimonio attingir essa somma empregar-se-hão os novo decimos dos rendimentos nas despezas da Escola, nos seus melhoramentos e progressivo desenvolvimento, e então nada mais com elle despenderá a União.

Art. 45. No caso do artigo antecedente serão applicados ao augmento do fundo patrimonial todos os saldos que se verificarem assim como todas as doações, legados e subvenções que dessa epoca em diante se fizerem em beneficio do Instituto.

Art. 46. Haverá um conselho administrativo do patrimonio composto do director, secretario e escripturario.

CAPITULO VI

DO PECULIO DOS EDUCANDOS

Art. 47. A despeza com o custeio da Escola correrá pelo credito que for votado.

Art. 48. Em favor de cada um dos internados se formará um peculio, que será composto pela accumulação da quinta parte da importancia em que for avaliado o seu trabalho mensal.

Art. 49. Metade desse peculio será trimensalmente depositada na Caixa Economica desta capital, por conta de cada educando, para se lhe entregar, com os juros que vencer, quando seu dono attingir a maioridade.

Art. 50. A outra metade ficará no cofre para ser applicada ao custeio e desenvolvimento das officinas, sendo os saldos applicados ao augmento do patrimonio do Instituto.

TITULO II

Do processo de internação

CAPITULO I

DA APPREHENSÃO DO MENOR E DO INQUERITO

Art. 51. Os menores de que trata o art. 2º serão recolhidos á Escola mediante o processo seguinte:

§ 1º Apresentado o menor ao pretor da circumscripção em que for encontrado, este, mandando autoar o officio ou parte que o acompanhar, tomará o depoimento daquelle e ouvirá duas ou tres pessoas que saibam ou tenham razão de saber do comportamento e habitos do menor, do caracter, situação, moralidade e meios de vida do pae, tutor, parente ou pessoa sob cujo poder ou guarda se ache, ou em cuja companhia viva, compellindo-os a dar as necessarias informações.

§ 2º Findo o inquerito administrativo, que será sempre processado com audiencia do representante do Ministerio Publico, o juiz poderá ordenar ou não a internação do menor no estabelecimento, fundamentando sempre as razões de decidir.

§ 3º Os menores recolhidos á Escola permanecerão nesta até a idade de 17 annos completos, salvo decisão em contrario do respectivo juiz.

§ 4º O pae, tutor, parente ou pessoa em cujo poder, guarda ou companhia esteja o menor não poderá obstar a internação deste, ordenada pela autoridade competente; só lhe é licito requerer a retirada do menor, por acção summaria, proposta no Juizo do domicilio, com assistencia do Ministerio Publico.

§ 5º Si, na decurso do inquerito de que trata o § 1º, ficar provado que o desvio do menor foi devido aos máos tratos, ou ao abandono, ou a actos consignados nos arts. 273, paragrapho unico, e 277 do Codigo Penal, praticados contra aquelle por seus progenitores, a mesma sentença que ordenar a internação, os demittirá do patrio poder (Ord. L., 3º, T. 2º § 4º; Codigo Penal, arts. cits.; Alv. de 31 de jan. de 1775).

CAPITULO II

DO RECURSO

Art. 52. Da sentença que denegar a internação caberá appellação, em ambos os effeitos, interposta pelo representante do Ministerio Publico para o Conselho do Tribunal Civil e Criminal, dentro de cinco dias, contados da sua intimação.

Art. 53. Julgada procedente ou improcedente a acção summaria, a que allude o § 4º do artigo antecedente, o pretor que proferir a sentença recorrerá ex-officio para o mesmo Conselho.

Art. 54. Os autos de taes processos, em caso de recurso, deverão ser apresentados á instancia superior, no prazo maximo de 48 horas, não podendo ser retidos sob qualquer pretexto.

Art. 55. Os paes, tutores, parentes ou pessoas, em cujo poder, guarda ou companhia viva o menor, quando obtenham a retirada deste, ficarão obrigados a indemnisar a Fazenda dos alimentos que esta tiver prestado ao mesmo menor.

Paragrapho unico. Por alimentos entende-se o sustento, habitação, vestuario, tratamento de molestias, educação e instrucção.

Art. 56. Si durante o tempo da internação, o menor tiver prestado serviços apreciaveis, as referidas pessoas ficarão isentas da alludida indemnisação, que será calculada pela Directoria de Contabilidade do respectivo Ministerio.

CAPITULO III

DOS MENORES DE 9 ANNOS

Art. 57. Não terá Iogar o procedimento a que se referem os capitulos anteriores contra inculpado menor de 9 annos completos. Não obstante, se a seu respeito se verificar alguma das condições previstas no art. 2º, será elle recolhido ao estabelecimento, afim de receber durante a menoridade a devida educação profissional e moral.

Art. 58. Sem embargo da disposição do artigo anterior, as autoridades, quando julgarem preferivel, entregarão os menores de que se trata ao patronato particular, procurando estabelecimentos de reconhecida competencia e moralidade ou collocando-os sob a guarda de familias honestas, que se responsabilisem em Juizo pela educação daquelles.

TITULO III

Do regimen premunitorio

CAPITULO I

DAS DIVISÕES DE TRABALHO

Art. 59. A Escola Correccional «Quinze de Novembro» compor-se-ha de tres divisões: a primeira situada no predio nacional da rua de S. Christovão n. 168; a segunda em suburbio ou ilha da bahia do Rio de Janeiro, que se adaptar aos fins da mesma Escola, destinada ao sexo masculino; e a terceira, constituida nas mesmas condições, e destinada ao sexo feminino.

Art. 60 Na 1ª divisão funccionarão a administração, secretaria, enfermaria central, almoxarifado, uma das aulas de primeiras lettras, officinas de sapateiro, marceneiro, torneiro, alfaiate, typographo, encadernador, o bem assim de escovas e empalhação, e o deposito de menores, a que se refere o art. 74 deste regulamento.

Art. 61. Nas 2ª e 3ª divisões, que se constituirão em parques de cultura e educação pratica, serão estabelecidos todos os serviços e exercicios necessarios ao desenvolvimento physico, intellectual e moral dos internados, guardados as differenças de idade e de sexo.

Art. 62. A construcção dos parques será executada em áreas sufficientes, de modo que os edificios rusticos, de que se compuzerem, fiquem disseminados por toda a extensão do terreno, dispostos entre elles os campos de cultura e de exercicios, que forem necessarios.

Art. 63. O regimento interno determinará o plano para a formação das secções de trabalho e exercicios em ordem systematica, a começar por serviços rudimentares e infantis, até aos mais complexos; cada secção terá um chefe, que será responsavel pelas turmas respectivas, as quaes não excederão de 15 educandos.

§ 1° Os internados serão divididos em dous grupos:

a) maiores de 9 annos;

b) menores de 9 annos.

§ 2º Os grupos de que trata o paragrapho anterior serão sub-divididos em secções:

a) agricultura e horticultura;

b) criação;

c) jardinagem;

d) officios e artes;

e) exercicios e diversões;

f) aulas.

§ 3° Os menores de 9 annos serão excluidos dos trabalhos indicados nas lettras a e b.

Art. 64. No ensino de primeiras lettras, da lingua portugueza, desenho, mathematicas elementares, utilisar-se-ha o methodo concreto, tanto quanto comportarem as materias ensinadas.

Art. 65. Os officios e artes serão ministrados em pequenos ateliers apropriados, nos quaes os educandos serão detidos por tempo não excedente de duas horas por dia.

Art. 66. Na pratica do campo e das fabricas, quando puderem estas ser estabelecidas, observar-se-hão os principios hygienicos, attendendo-se á idade do educando, de modo a evitar a sobrecarga ou a aversão ao trabalho.

Art. 67. Aos exercicios dar-se-ha o caracter de diversões uteis, interpolando-se estas com as horas do trabalho regimental.

Art. 68. Ficam prohibidos os dormitorios-casernas. Os educandos pernoitarão nos respectivos grupos, divididos por turmas, em casas para esse fim destinadas e sob a vigilancia dos chefes respectivos, que ahi poderão dar alojamento familias, si as tiverem e quizerem utilisar-se da vantagem da moradia.

CAPITULO II

DAS PENAS E PREMIOS

Art. 69. No systema de coerção, adoptado na Escola, são eliminados inteiramente o medo e a intimidação.

Art. 70. O internado, que incorrer em falta, será admoestado paternalmente pelo chefe de turma, pelo secretario ou director successivamente. Si estes meios suasorios não pruduzirem effeito, o director, a cujo conhecimento será levado o facto, attendendo ao caracter e aos precedentes do educando, emprazal-o-ha para que modifique o seu procedimento, fazendo-lhe sentir o mal que fatalmente resultará da continuação de sua má, conducta, isto é, - que os seus actos terão consequencias regulamentares, a que não poderá fugir. Esgotado este recurso, impôr-se-hão ao internado as seguintes penas:

I. Privação de exercicios;

II. Privação de commodidade nos trabalhos;

III. Regressão de classe superior para inferior;

IV. Separação dos companheiros ou deportação para outra turma, por tempo limitado, a juizo do director;

V. Passagem do parque para o estabelecimento da rua do S. Christovão;

VI. Deportação para a secção de menores da Colonia dos Dous Rios, e de que trata o art. 25 do respectivo regulamento.

Art. 71. As penas sob ns. I o II poderão ser impostas pelos chefes de turmas, sendo logo communicadas ao director; as dos ns. III e IV pelo director; a ultima por determinação do pretor que houver decretado a internação.

Art. 72. As penas sob ns. IV e V não são applicaveis aos menores de 9 annos de que trata o art. 57.

Art. 73. As recompensas consistirão no augmento de peculio e na passagem para classe superior, desde que o educando mostre capacidade para trabalhos mais complexos; nessas promoções ter-sa-ha em vista particularmente satisfazer as aspirações razoaveis dos educandos e a natureza das suas aptidões.

Disposições geraes

Art. 74. Haverá no predio central da rua de S. Christovão um deposito incommunicavel, em que serão recolhidos, até que tenham destino, os menores condemnados á reclusão na Colonia dos Dous Rios, nos termos do regulamento respectivo, os quaes não poderão, em caso algum, ser detidos em outra prisão.

Art. 75. Os menores que forem empregados nos serviços da Escola perceberão, além da vantagem do peculio, uma gratificação, que lhes será arbitrada pelo Governo.

Disposições provisorias

Art. 1º Emquanto não estiver habilitado para installar os dous parques, de que tratam os arts. 59 e seguintes, o Chefe de Policia providenciará para que no actual estabelecimento se observe, quanto for possivel, o regimen de agrupamentos, modificando os extensos dormitorios alli existentes.

Art. 2º O Chefe de Policia encaminhará as crianças do sexo feminino, que forem sujeitas ao processo do art. 51 e seguintes, para os estabelecimentos de caridade, que se promptificarem a auxiliar o Governo nessa obra de regeneração.

Art. 3º O Chefe de Policia submetterá á approvação do Ministro o regimento interno da Escola e das suas succursaes, e observará nelle o regimen alternado da educação nas officinas estabelecidas no edificio da rua de S. Christovão n. 168 e os exercicios ruraes nos parques, dispondo os serviços de modo que seja evitada a sobrecarga dos educandos, que deverão ser constantemente vigiados pelos empregados superiores da Escola.

Art. 4º O director poderá residir em casa situada nas proximidades da Escola, emquanto não existirem nesta accommodações apropriadas á sua installação.

Art. 5º Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 2 de março de 1903. - J. J. Seabra.

Tabella de vencimentos, a que se refere o art. 6° da lei n. 947, de 29 de dezembro de 1902

NUMERO DE EMPREGADOS
 

DESIGNAÇÃO DO EMPREGO

DIARIA
VENCIMENTO ANNUAL DE CADA EMPREGADO
Ordenado
Gratificação
Total
1
Director.......................................................
.......
2:800$000
1:400$000
4:200$000
1
Medico........................................................
.......
2:400$000
1:200$000
3:600$000
1
Secretario...................................................
.......
2:000$000
1:000$000
3:000$000
1
Pharmaceutico...........................................
.......
1:600$000
800$000
2:400$000
1
Escripturario...............................................
.......
1:200$000
600$000
1:800$000
1
Almoxarife..................................................
.......
1:200$000
600$000
1:800$000
1
Professor....................................................
.......
1:200$000
600$000
1:800$000
1
Inspector.....................................................
.......
960$000
480$000
1:440$000
1
Mestre de officina.......................................
.......
960$000
480$000
1:440$000
1
Roupeiro.....................................................
.......
800$000
400$000
1:200$000
1
Porteiro.......................................................
.......
800$000
400$000
1:200$000
1
Chacareiro .................................................
.......
3$000
-
-
Rio de Janeiro, 2 de março de 1903. - J. J. Seabra.

Tabella das rações

REFEIÇÕES
GENEROS
 

UNIDADES

 

QUANTIDADES

OBSERVAÇÕES
Almoço
Carne secca ou bacalhau........................................
Grammas
150
Toucinho ou banha..................................................
»
25
Pão...........................................................................
»
170
Café..........................................................................
»
40
Assucar de 3ª...........................................................
»
70
Farinha....................................................................
Litros..........
0,2
Sal...........................................................................
»
0,01
Condimentos............................................................
....................
.................
5 réis para cada um.
Jantar

A-s 2as, 3as e sabbados

Carne secca.............................................................
Grammas
220
Toucinho..................................................................
»
40
Farinha.....................................................................
Litros......
0,25
Feijão.......................................................................
»
0,2
Sal............................................................................
»
0,01
Condimentos............................................................
....................
.................
5 réis para cada um.
Jantar ás 6os feiras
Bacalhau..................................................................
Grammas
220
Batatas.....................................................................
»
55
Toucinho..................................................................
»
40
Farinha.....................................................................
Litros......
0,35
Feijão.......................................................................
»
0,2
Vinagre.....................................................................
»
0,015
Azeite doce..............................................................
»
0,02
Sal............................................................................
»
0,01
Condimentos............................................................
....................
.................
5 réis para cada um.
Jantar aos domingos e 5as feiras
Carne verde.............................................................

Batatas.....................................................................

Toucinho..................................................................

Farinha.....................................................................

Arroz.........................................................................

Vinagre.....................................................................

Sal............................................................................

Condimentos............................................................

Grammas

»

»

Litros

Grammas

Litros

»

....................

530

55

40

0,35

110

0,01

0,01

.................

 


 

5 réis para cada um

Café
Pão...........................................................................
Grammas
170
Matte........................................................................
»
20
Assucar 3ª................................................................
»
70
Nota - Os empregados de vencimento fixo, residindo na Escola ou em suas divisões, terão o direito a duas rações e mais cem grammas de assucar branco e vinte grammas de manteiga para cada refeição de almoço e ceia, bem assim a cento e dez grammas de arroz nos dias não marcados nesta tabella. Os empregados de salario terão egualmente direito a duas rações da tabella acima Uns e outros terão apenas direito a uma ração, quando as respectivas familias não residirem na Escola ou suas divisões.

Rio de Janeiro, 2 de março de 1903. - J. J. Seabra.

Tabella da distribuição da roupa

MENORES
TEMPO
DE DURAÇÃO
1
Calça de algodão azul..................................................................
2 mezes
1
Blusa de igual Fazenda...................................................................
2 »
1
Camisa de algodão Branco..............................................................
2 »
1
Bonet ou gorro de panno..................................................................
6 »
1
Par de sapatos.................................................................................
3 »
1
Lenço de chita..................................................................................
2 »
1
Colchão.............................................................................................
1 anno
1
Travesseiro......................................................................................
1 »
1
Fronha .............................................................................................
4 mezes
1
Lençol..............................................................................................
1 anno
1
Colcha de chita.................................................................................
1 »
1
Cobertor............................................................................................
1 »
1
Toalha.............. ...............................................................................
4 mezes
1
Par de meias.................................... ................................................
1 mez
1
Ceroula de algodão branco...................... ..........................................
3 mezes
NOTA - A cada um dos internados dar-se-hão na primeira distribuição, por occasião do incluimento, as peças precisas para duas mudas, sem que altere o respectivo tempo de duração.

Rio de Janeiro, 2 de março de 1903. - J. J. Seabra.

Tabella das dietas

DIETAS
ALMOÇO
JANTAR
CEIA
OBSERVAÇÕES

250 grammas de caldo de gallinha.
O mesmo
O mesmo
Os caldos serão na razão de 8 para uma galinha ou 6 para um frango.
250 grammas de leite ou 150 grammas de canja de arroz.
200 grammas de leite ou 150 grammas canja de arroz
100 grammas de leite ou 150 grammas de canja de arroz
A quantidade de assucar será de: 50 grammas ao almoço, 40 ao jantar e 20 á ceia.
A canja será preparada com 30 grammas de arroz, podendo ser substituida por um mingau de araruta.
256 grammas de caldo de vacca e 70 do pão
O mesmo
O mesmo
A quantidade de carne para um caldo será de 100 grammas.
Canja de gallinha.
O mesmo
O mesmo
Cada canja será preparada com 30 grammas de arroz, 250 de agua e a 6ª parte de uma gallinha.
Chá, café ou matte, com pão de 140 grammas
Um quarto de gallinha assada, guisada ou cosida, e um pão de 140 grammas
O mesmo que ao almoço.
O pão do jantar poderá ser substituido por 60 grammas de arroz. O café será preparado com 25 grammas de pó para 250 de agua e 40 de assucar; o matte, com 15 grammas de folha e o chá com 3 grammas; podendo ser preto ou verde.
O mesmo na 5ª.
300 grammas de carne de vacca ou carneiro, assado ou guisado, e um pão de 140 grammas.
O mesmo que ao almoço.
O pão do jantar poderá ser substituido por 60 grammas de arroz ou pirão, feito com 120 grammas de farinha. O chá, café ou matte, como na 5ª dieta.
O mesmo que na 6ª e mais 200 grammas de carne de vacca ou carneiro, assado ou em bife.
300 grammas de carne de vacca cosida, assada ou guisada, um pão de 140 grammas e 120 de batatas cosidas ou fritas.
O mesmo que ao almoço, menos a carne.
Poderão ser substituidos o pão ou as batatas do jantar por arroz ou pirão, sendo o mais como acima.

NOTA. - Será permittido ao medico substituir um pão por metade em peso de roscas ou bolachas, assim como  abonar, em casos bem justificado, nas tres ultimas dietas, os seguintes  extraordinarios: 50 gramma de goiabada, 50 de marmellada, 30 de aletria e 30 de  assucar; uma laranja, lima ou banana, herva cosida ; 50 gramma de vinho do Porto ou de Lisboa; na 5ª e 6ª dietas um até dous ovos ao almoço, 200 grammas de leite, um mingau com 30 grammas de araruta ou tapioca e 30 de assucar.

Rio de Janeiro, 2 de março de 1903.- J. J. Seabra.


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 12/03/1903


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 12/3/1903, Página 1329 (Publicação Original)