Legislação Informatizada - DECRETO Nº 1.132, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1903 - Republicação

DECRETO Nº 1.132, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1903

Reorganiza a Assistencia a Alienados

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a resolução seguinte:

     Art. 1º O individuo que, por molestia mental, congenita ou adquirida, comprometter a ordem publica ou a segurança das pessoas, será recolhido a um estabelecimento de alienados.

     § 1º A reclusão, porém, só se tornará effectiva em estabelecimento dessa especie, quer publico, quer particular, depois de provada a alienação.

     § 2º Si a ordem publica exigir a internação de um alienado, será provisoria sua admissão em asylo publico ou particular, devendo o director do estabelecimento, dentro em 24 horas, communicar ao juiz competente a admissão do enfermo e relatar-lhe todo o occorrido a respeito, instruindo o relatorio com a observação medica que houver sido feita.

     Art. 2º A admissão nos asylos de alienados far-se-ha mediante requisição ou requerimento, conforme a reclame autoridade publica ou algum particular.

     § 1º No primeiro caso, a autoridade juntará á requisição: 
     

a) uma guia contendo o nome, filiação, naturalidade, idade, sexo, côr, profissão, domicilio, signaes physicos e physionomicos do individuo suspeito da alienação, ou a sua photographia, bem como outros esclarecimentos, quantos possa colligir e façam certa a identidade do enfermo;
b) uma exposição dos factos que comprovem a alienação, e dos motivos que determinaram a detenção do enfermo, caso tenha sido feita, acompanhada, sempre que possivel, de attestados medicos affirmativos da molestia mental;
c) o laudo do exame medico-legal, feito pelos peritos da Policia, quando seja esta a requisitante.

     § 2º No segundo caso, sendo a admissão requerida por algum particular, juntará este ao requerimento, além do que os regulamentos especiaes a cada estabelecimento possam exigir:
     
a) as declarações do § 1º, lettra a, documentadas quanto possivel;
b) dous pareceres de medicos que hajam examinado o enfermo 15 dias antes, no maximo, daquelle em que for datado o requerimento, ou certidão de exame de sanidade.


     Art. 3º O enfermo de alienação mental poderá ser tratado em domicilio, sempre que lhe forem subministrados os cuidados necessarios.

     Paragrapho unico. Si, porém, a molestia mental exceder o periodo de dous mezes, a pessoa que tenha á sua guarda o enfermo communicará o facto á autoridade competente, com todas as occurrencias relativas á molestia e ao tratamento empregado.

     Art. 4º Salvo o caso de sentença, no qual logo será dada curatela ao alienado, a autoridade policial providenciará, segundo as circumstancias, sobre a guarda provisoria dos bens deste, communicando immediatamente o facto ao juiz competente, afim de providenciar como for de direito.

     Art. 5º Em qualquer occasião será permittido ao individuo internado em estabelecimento publico ou particular, ou em domicilio, reclamar, por si ou por pessoa interessada, novo exame de sanidade, ou denunciar a falta dessa formalidade.

     Art. 6º Salvo o caso de perigo imminente para a ordem publica ou para o proprio enfermo, não será recusada sua retirada de qualquer estabelecimento, quando pedida por quem requereu a reclusão.

     Art. 7º Quando recusada, naquelle caso, a sahida, o director do estabelecimento dará incontinente, em relatorio, á autoridade competente as razões da recusa, para o julgamento de sua procedencia.

     Art. 8º Evadindo-se qualquer alienado de asylo publico ou particular, sómente poderá ser reinternado, sem nova formalidade, não havendo decorrido da evasão 15 dias.

     Art. 9º Haverá acção penal, por denuncia do Ministerio Publico em todos os casos de violencia e attentados ao pudor, praticados nas pessoas dos alienados.

     Art. 10. E' prohibido manter alienados em cadeias publicas ou entre criminosos.

     Paragrapho unico. Onde quer que não exista hospicio, a autoridade competente fará alojar o alienado em casa expressamente destinada a esse fim, até que possa ser transportado para algum estabelecimento especial.

     Art. 11. Emquanto não possuirem os Estados manicomios criminaes, os alienados delinquentes e os condemnados alienados sómente poderão permanecer em asylos publicos, nos pavilhões que especialmente se lhes reservem.

     Art. 12. O Ministro da Justiça e Negocios Interiores, por intermedio de uma commissão composta, em cada Estado e no Districto Federal, do procurador da Republica, do curador de orphãos e de um profissional de reconhecida competencia, designado pelo Governo, fará a suprema inspecção de todos os estabelecimentos de alienados, publicos e particulares, existentes no paiz.

     Art. 13. Todo hospicio, asylo ou casa de saude, destinado a enfermos de molestias mentaes, deverá preencher as seguintes condições:

     1ª ser dirigido por profissional devidamente habilitado e residente no estabelecimento;
     2ª installar-se e funccionar em edificio adequado, situado em logar saudavel, com dependencias que permittam aos enfermos exercicios ao ar livre;
     3ª possuir compartimentos especiaes para evitar a promiscuidade de sexos, bem como para a separação e classificação dos doentes, segundo o numero destes e a natureza da molestia de que soffram;
     4ª offerecer garantias de idoneidade, no tocante ao pessoal, para os serviços clinicos e administrativos.

     Art. 14. Quem quer que pretenda fundar ou dirigir uma casa de saude destinada ao tratamento de alienados deverá requerer ao Ministerio do Interior ou aos presidentes ou governadores dos Estados a devida autorização.

     Art. 15. O requerente annexará á sua petição:

     1º documentos tendentes a provar que o local e o estabelecimento estão nas condições do art. 13;
     2º o regulamento interno da casa de saude;
     3º declaração do numero de doentes que pretenda receber;
     4º declaração de receber ou não o estabelecimento apenas alienados, e de ser, no ultimo caso, o local reservado a estes inteiramente separado do destinado aos outros doentes.

     Art. 16. Estando esses documentos e declarações em fórma, e sendo pelo deferimento da petição a commissão inspectora, recolherá o peticionario aos cofres publicos a quantia que arbitrar o Governo para a fiscalização do estabelecimento, annualmente.

     Art. 17. Pretendendo a direcção do estabelecimento elevar o numero primitivo de pensionistas, submetterá ao Governo, devidamente informada pela commissão inspectora, uma nova planta do edificio, provando que as novas construcções comportam, na conformidade requerida, os novos pensionistas.

     Art. 18. Os directores de asylos de alienados, publicos ou particulares, enviarão mensalmente á commissão inspectora uma relação circumstanciada dos doentes internados no mez anterior.

     Art. 19. Ao Governo da União incumbe manter a assistencia aos alienados do Districto Federal, havendo da Prefeitura do Districto a diaria dos doentes.

     Paragrapho unico. A diaria dos alienados remettidos pelos Estados será paga por estes, e pelos respectivos paizes a dos alienados estrangeiros.

     Art. 20. O pessoal da Assistencia aos Alienados no Districto Federal compor-se-ha: no Hospicio Nacional, de um director, superintendendo o serviço clinico e administrativo, quatro alienistas effectivos, um adjunto, um cirurgião-gynecologista, um pediatra, um medico do pavilhão de molestias infecciosas, um ophtalmologista, um director do laboratorio anatomopathologico, um assistente do mesmo, um chefe dos serviços kinesotherapicos, um dentista, quatro internos effectivos, um pharmaceutico, um administrador, um archivista, um primeiro, um segundo, um terceiro e um quarto escripturarios, um continuo e um porteiro; e nas colonias de alienados: de um director, que será medico, um alienista effectivo, um adjunto, um pharmaceutico, um almoxarife, um primeiro e um segundo escripturarios. No pavilhão de admissão, onde funccionará a secção de clinica psychiatrica da Faculdade de Medicina, haverá um alienista, director do mesmo pavilhão, cabendo o exercicio deste cargo ao lente da cadeira de psychiatria e de molestias nervosas.

     Paragrapho unico. O almoxarife do Hospicio passará a exercer o cargo de administrador.

     Art. 21. Serão providos mediante concurso os cargos de alienista-adjunto, de pediatra, de medico do pavilhão de molestias infecciosas, de assistente do laboratorio histo-chimico e de interno, devendo ser preferido no provimento de todos esses cargos, com excepção dos dous ultimos, o concurrente que haja exercido o cargo de assistente ou preparador das Faculdades de Medicina do paiz.

     Art. 22. As infracções desta lei serão punidas com as penas de prisão até oito dias e de multa de 500$ a 1:000$, além das mais em que, pelas leis anteriores, incorra o infractor.

     Paragrapho unico. Ao director reincidente será cassada a autorização para funccionar o estabelecimento.

     Art. 23. Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 22 de dezembro de 1903, 15º da Republica.

FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
J. J. Seabra.


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 25/12/1903


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 25/12/1903, Página 5869 (Republicação)