Legislação Informatizada - DECRETO Nº 9.801, DE 5 DE NOVEMBRO DE 1887 - Publicação Original

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DECRETO Nº 9.801, DE 5 DE NOVEMBRO DE 1887

Declara a intelligencia de algumas disposições da Lei n. 3129 de 14 de Outubro de 1882.

    A Princeza Imperial Regente, em Nome do Imperador, Attendendo ás duvidas suscitadas na execução da Lei n. 3129 de 14 de Outubro de 1882 acerca da prioridade do direito de propriedade do inventor que, tendo requerido patente em nação estrangeira, fizer igual pedido ao Governo Imperial (art. 2º, § 1º), e da verificação, por meio de experiencias, dos requisitos e das condições legaes para a validade do privilegio quando não se tenha procedido ao exame prévio mencionado no § 2º do art. 3º (art. 4º, paragrapho unico); Tendo ouvido a Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado e conformando-Se com as conclusões do seu parecer exarado em Consulta de 11 de Outubro proximo passado: Ha por bem Decretar: 1º, que a novidade da invenção, quando tratar-se da confirmação de privilegio concedido em nação estrangeira nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei n. 3129 de 14 de Outubro de 1882, prevalece sómente durante sete mezes contados da data da concessão estrangeira, si, dentro deste prazo, o inventor solicital-a do Governo Imperial; 2º, que o paragrapho unico do art. 4º da mesma lei refere-se sómente ás concessões de privilegio dependente de exame prévio que não se tenha realizado; 3º, que, não sendo obrigatoria a verificação da invenção depois de concedido o privilegio, são meios de conhecer si o inventor satisfez os requisitos e condições legaes todos aquelles de que póde dispor a administração para seu conhecimento ou informação, e especialmente o processo a que na respectiva Secretaria de Estado deve ser submettido o requerimento de qualquer privilegio de invenção.

    Rodrigo Augusto da Silva, do Conselho de Sua Magestade o Imperador, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, assim o tenha entendido e faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro em 5 de Novembro de 1887, 66º da Independencia e do Imperio.

    PRINCEZA IMPERIAL REGENTE.

    Rodrigo Augusto da Silva.

Consulta a que se refere o Decreto supra

    Senhor. - Em aviso expedido pela Secretaria de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, ordenou Vossa Magestade Imperial que a Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado consultasse sobre os seguintes pontos:

    1º Si, para a confirmação dos direitos de inventor privilegiado em outras nações, a novidade da invenção da qual trata o art. 2º da Lei n. 3129 de 14 de Outubro de 1882, deve ser actual ou referir-se ao tempo em que a respectiva patente tiver sido concedida na nação estrangeira;

    2º Si a disposição do paragrapho unico do art. 4º da citada lei regula todas as concessões de privilegio, ás quaes não houver precedido exame prévio e secreto do art. 3º, § 2º, ou sómente os casos em que este exame, devendo ter sido feito, houver sido omittido;

    3º Si, no caso de não ser obrigatoria a verificação da invenção, como dispõe o citado paragrapho unico do art. 4º, qual o meio de conhecer-se, nos demais casos, ter o inventor satisfeito os requisitos e condições da lei para a validade do privilegio.

    Tendo attentamente examinado estas questões, a Secção passa a emittir seu parecer.

    A novidade da invenção é condição essencial para o privilegio, como é expresso no art. 1º da Lei n. 3129, o qual na sua parte final declara:

    «Entendem-se por novos os productos, meios, applicações e melhoramentos industriaes, que, até ao pedido da patente, não tiverem sido, dentro ou fóra do imperio, empregados ou usados, nem se acharem descriptos ou publicados de modo que possam ser empregados ou usados.»

    E' claro, pois, que nenhum privilegio póde ser concedido sem que a novidade da invenção seja actual, isto é, sem que ella permaneça em segredo ao tempo de ser formulado o respectivo pedido.

    Tratando-se, porém, de confirmação do privilegio concedido em nações estrangeiras, a lei mui razoavel e justamente abro uma excepção a esse principio, estatuindo no § 1º do art. 2º:

    «A prioridade do direito de propriedade do inventor que, tendo requerido patente em nação estrangeira, fizer igual pedido ao Governo Imperial dentro de sete mezes, não será invalidada por factos que occorram durante esse periodo, como sejam outro igual pedido, a publicação da invenção e o seu uso ou emprego.»

    Assim, que, Senhor, a Secção responde ao 1º quesito - que para a confirmação de privilegio a novidade da invenção, existente ao tempo em que esse privilegio foi requerido ao governo estrangeiro, prevalece durante sete mezes, si, dentro desse prazo, o inventor solicital-a do Governo Imperial.

    Portanto, não é necessario que essa novidade seja actual, isto é, subsistente na data ou tempo do requerimento de confirmação.

    Passando a considerar o 2º quesito, a Secção transcreverá o que preceituam os artigos da lei a elle referentes, a saber:

    «Art. 1º, § 2º Não podem ser objecto de patente as invenções:

    1º Contrarias á lei ou á moral;

    2º Offensivas da segurança publica;

    3º Nocivas á saude publica;

    4º As que não offerecem resultado pratico industrial.

    Art. 3º, § 2º Si parecer que a materia da invenção involve infracção do § 2º do art. 1º, ou tem por objecto productos alimentares, chimicos ou pharmaceuticos, o Governo ordenará o exame prévio e secreto de um dos exemplares, de conformidade com os regulamentos que expedir, e á vista do resultado concederá ou não a patente.

    § 3º Exceptuados sómente os casos mencionados no paragrapho antecedente, a patente será expedida sem prévio exame.

    Art. 4º, paragrapho unico. No caso de não ter havido o exame prévio de que trata o § 2º do art. 3º, o Governo, publicado o relatorio, ordenará a verificação por meio de experiencias dos requisitos e das condições que a lei exige para a validade do privilegio, procedendo-se pelo modo estabelecido para aquelle exame.»

    Confrontadas estas diversas disposições, julga a Secção que a verificação exigida no paragrapho unico do art. 4º refere-se unicamente ás concessões de privilegios, que, de conformidade com o art. 3º, § 2º, dependem de exame prévio e secreto, quando este tenha sido omittido.

    Em primeiro logar é o que se conclue do texto: no caso de não ter havido o exame prévio, diz o citado paragrapho unico.

    Ora, si o exame prévio só pode ter logar nas hypotheses previstas nos arts. 1º, § 2º, e 3º, § 2º, sendo dispensado em qualquer outra (art. 3º, § 3º), é manifesto que a verificação só tem logar exactamente naquellas hypotheses em que, devendo ter sido feita, todavia não se houver effectuado, por qualquer motivo.

    Em segundo logar, a doutrina da lei confirma esta intelligencia.

    E' questão debatida sempre e onde quer que se trate de legislar sobre patentes de invenção, a de saber si á respectiva concessão deve preceder exame do invento que ella vai proteger.

    As opiniões divergem, e dessa divergencia dá testemunho a legislação comparada, facil de ser compulsada nos quadros synopticos do Code Général des Brévêts d'Invention par Edmond et Emile Picard, dos quaes vê-se que algumas nações estabelecem o exame prévio e outras não.

    A Lei n. 3129 de 14 de Outubro de 1882, a exemplo da italiana de 13 de Novembro de 1870, nem o dispensou em absoluto, nem o exigiu, firmando uma theoria que poder-se-ha denominar média, como Vossa Magestade dignou-se de ver das transcripções feitas.

    Desde que, salvas as excepções apontadas, dispensou o exame prévio, não ha motivo para determinal-o a posteriori, sujeitando o inventor a despezas que melhor empregará na execução e exploração da sua descoberta; tanto mais quanto a patente é expedida com resalva dos direitos de terceiro, e da responsabilidade do Governo relativamente á novidade e utilidade da invenção. (Art. 3º, § 3º, 2ª parte.)

    Nenhuma utilidade advirá da verificação, principalmente podendo a patente ser annullada e ficar de nenhum effeito, nos termos do art. 5º, já por acto do Governo e já por iniciativa de qualquer interessado (§ 3º), isto é, de qualquer consumidor dos productos da industria privilegiada. (Regulamento n. 8820 de 30 de Dezembro de 1882.)

    Comprehende-se que o exame prévio possa ter alguma vantagem, de par com inconvenientes muito maiores que levaram varias legislações a dispensal-o, como a Lei n. 3129 dispensou em these.

    Elle póde, no dizer de um tratadista francez, - desilludir do proprio erro os requerentes de boa fé, poupando-lhes decepções e despezas - (Bedarride - Brévêts d'Invention n. 160); mas o exame posterior não se recommenda por nenhuma conveniencia, salvo sobrevindo razões que obriguem o Governo a deliberar de accôrdo com o citado art. 5º, § 3º, 2ª parte, remettendo ao Procurador dos Feitos documentos comprobatorios de infracção da lei, para promover a nullidade de alguma patente.

    Portanto, Senhor, pensa a Secção que o paragrapho unico do art. 4º sómente diz respeito ás concessões de privilegios dependentes de exame prévio que não se tenha realizado.

    Pelo que toca ao terceiro ponto, entende ella que os meios de conhecer si o inventor satisfez os requisitos e condições da lei, são todos os de que dispõe a administração publica para seu esclarecimento ou informação, e especialmente o processo a que na Secretaria de Estado competente deve ser submettido o requerimento, antes de subir a despacho.

    Nem se objecte que esse processo será alli difficil, e por vezes impossivel, por abranger a averiguação da novidade da invenção; porquanto, além de não estar a Secretaria inhibida de solicitar a audiencia de qualquer estabelecimento technico, ou funccionario habilitado, semelhante averiguação não póde deixar de ser summaria, perfunctoria, que outra absolutamente não é necessaria, attento o regimen da lei.

    Já ponderou a Secção que a patente é expedida sem comprometter a responsabilidade do Governo e com resalva dos direitos de terceiro; observou tambem que a sua nullidade póde ser promovida ex officio, ou pela provocação directa de qualquer consumidor de genero, por outra, a patente é concedida, segundo se exprimem os escriptores, - aux risques et périls des demandeurs.

    Que necessidade ha, portanto, de instituir-se como regra geral uma averiguação profunda, uma analyse circumstanciada da pretendida invenção?

    Uma vez que a Secretaria de Estado verifique não ter sido concedida patente sobre objecto identico ao do pedido, ou que este não recahe sobre cousa notoriamente sabida ou conhecida, terá cumprido o seu dever, e o contrario será avocar a si trabalho insano e de duvidosa utilidade.

    Todos os demais interesses que cumpre zelar com referencia a esta ordem de idéas estão sufficientemente garantidos pelas providencias da lei.

    Este é, Senhor, o parecer da Secção, mas Vossa Magestade Imperial resolverá o que tiver por mais acertado.

    Sala das conferencias da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado em 11 de Outubro de 1886. - Affonso Celso de Assis Figueiredo. - João Lins Vieira Cansansão de Sinimbú. - José Bento da Cunha e Figueiredo.

    Como parece. - Paço em 1º de Setembro de 1887.

    PRINCEZA IMPERIAL REGENTE.

    Rodrigo Augusto da Silva


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1887


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1887, Página 431 Vol. 1 (Publicação Original)