Legislação Informatizada - DECRETO Nº 9.324, DE 22 DE NOVEMBRO DE 1884 - Publicação Original

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DECRETO Nº 9.324, DE 22 DE NOVEMBRO DE 1884

Revoga o art. 2º do Decreto n. 4683 de 27 de Janeiro de 1871.

Hei por Bem, Tendo ouvido a Secção de Justiça do Conselho de Estado, a cujo parecer se refere a Minha Imperial Resolução de 15 do corrente, Revogar o art. 2º do Decreto n. 4683 de 27 de Janeiro de 1871, para que tenha fiel execução o art. 6º da Lei de 11 de Outubro de 1827, segundo o qual os successores nomeados por impossibilidade dos serventuarios vitalicios dos officios de justiça servirão durante a vida dos mesmos serventuarios vitalicios, ou emquanto durar o legitimo impedimento destes e não commetterem crime ou erro que os inhabilite.

    Francisco Maria Sodré Pereira, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Justiça, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em 22 de Novembro de 1884, 63º da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Francisco Maria Sodré Pereira.

    SENHOR. - Foi Vossa Magestade Imperial Servido ordenar, por Aviso de 29 de Março ultimo, que os membros  da Secção de Justiça do Conselho de Estado comparecessem no dia 2 de Abril seguinte, ás 7 horas da noite, na respectiva Secretaria, para o fim de consultarem em conferencia sobre a questão a que se referiam os papeis, que com o mesmo aviso lhe foram remettidos, a saber:

    Si um serventuario vitalicio, a quem se deu successor, restabelecendo-se, está inhibido de voltar ao exercicio do seu emprego.

    Os papeis a que o aviso se refere consistem:

    Primeiramente em uma petição devidamente instruida com grande numero de documentos, na qual o serventuario vitalicio do 1º officio de Tabellião de notas desta Corte, allegando e provando estar impossibilitado de continuar a servir por molestia incuravel, requereu ao Governo, em 7 de Fevereiro de 1876, não só que lhe desse successor durante a sua vida, com obrigação de dar ao supplicante a terça parte da lotação do mesmo officio, visto os seus bons serviços, e a falta de outro meio de subsistencia, mas tambem que a nomeação do successor recahisse na pessoa de Mathias Teixeira da Cunha.

    Esta petição foi deferida favoravelmente em ambas as suas partes, como consta do Decreto de 23 de Fevereiro de 1876.

    Em segundo logar: - Nas informações prestadas pela 2ª Secção da Secretaria da Justiça e pelo Conselheiro Director Geral, sobre a questão formulada em termos geraes no Aviso de 29 de Março ultimo.

    As informações concluem resolvendo a questão negativamente, e são as que abaixo se transcrevem:

    Da 2ª Secção:

    «Em a nota inclusa manda V. Ex. que se informe si um serventuario vitalicio, a quem se deu successor, restabelecendo-se, está inhibido de voltar ao exercicio do seu officio.»

    «Não encontrei precedentes, mas me parece que não ha razão para impedir que volte ao exercicio do officio o serventuario nas condições indicadas.»

    «O Decreto n. 1294 de 16 de Dezembro de 1853, art. 2º, manda dar ao serventuario successor no caso de impossibilidade absoluta ou proveniente de idade avançada, cegueira, demencia ou outra molestia incuravel. A concessão do successor não é mais do que o signal de respeito ao provimento vitalicio do serventuario effectivo, tanto que cessa a nomeação por morte deste.»

    «Ora, comquanto qualquer das condições indicadas se tenha verificado, nunca é possivel affirmar de modo absoluto que a impossibilidade em alguns casos não possa desapparecer, e como é regra de direito que em todo o caso a ficção cede á realidade, não á rezoavel manter a nomeação do successor quando o serventuario effectivo provar que o seu impedimento desappareceu.»

    «Parece, entretanto, prudente que o Governo, antes de attender ao pedido, sujeite o pretendente ao exame de uma junta medica. - 28 de Janeiro de 1881. - Dr. Souza Bandeira Filho.»

    Do Conselheiro Director Geral:

    «Penso que para a solução da questão podem contribuir as disposições da Lei de 11 de Outubro de 1827, disposições que transcreverei para melhor intelligencia da questão.»

    «Art. 3º O serventuario continuar a exercel-o por doença, provando a impossibilidade, seu bom serviço, e a falta de outro meio de subsistência, perante o Governo, poderá obter a terça parte do rendimento do officio, segundo a sua lotação, a cargo dos successores no dito officio, os quaes todavia poderão ventilar a verdade dos motivos allegados que, provados falsos, ficará o officio livre do encargo. »

    «Art. 4º As pessoas que actualmente se acharem na posse da propriedade ou serventia vitalicia de alguns officios, que pessoalmente não possam servir, são obrigados a fazer a nomeação de pessoa idônea para a serventia, dentro de seis mezes, si já antes a não tiverem feito, contados da data da publicação desta lei em cada um dos logares, em que forem os officios e perante as autoridades respectivas. »

    «Art. 5º Si dentro do sobredito prazo não fizerem a nomeação, perderão o direito a ella, e a farão os magistrados ou autoridades, perante quem hão de servir os officiaes. »

    «Art. 6º Em qualquer dos casos dos artigos antecedentes os serventuarios serão providos por uma só vez para servirem emquanto viverem os proprietarios ou serventuarios vilaticios, ou durar o seu legitimo impedimento, e elles não commetterem crime ou erro que os inhabilite.»

    «A phrase - ou durar o seu legitimo impedimento - revela ter sido a intenção do legislador que o serventuario vitalicio pudesse voltar ao exercicio do officio, desde que cessasse o motivo que delle o tivesse privado. »

    «E' esta a doutrina do Aviso de 19 de Março de 1880, abaixo transcripto: »

    «Illm. e Exm. Sr. - Verificando-se das informações prestadas em officio n. 74 de 5 de Novembro ultimo e do registro e mais papeis existentes nesta Secretaria de Estado, relativamente ao officio de 1º Tabellião e annexos dessa capital: »

    «Que o serventuario vitalicio Manoel José de Oliveira, allegando impossibilidade physica, obteve por Decreto de 5 de Agosto de 1858, que fosse declarado vago o officio com obrigação de lhe ser paga a terça parte dos rendimentos pelo successor, recahindo a nomeação deste na pessoa de Joaquim do Amaral e Silva Ferrão, por Decreto de 12 de Outubro de 1858; »

    «Que por fallecimento do mesmo successor em 1863, mandou essa Presidencia que nos editaes do concurso se declarasse o onus da terça parte em favor do serventuario vitalicio; »

    «Que, não obstante, foi provido Juvencio Duarte Silva na serventia vitalicia do mencionado officio por Decreto de 17 de Junho de 1864, sem ficar sujeito ao dito onus. »

    «Que, por morte do mesmo Juvencio, no 1º de Abril do corrente anno, publicaram-se editaes chamando concurrentes, com expressa menção de ser pago o onus da terça parte a Oliveira, como este requereu. »

    «Declaro a V. Ex.: »

    «Que pela disposição tanto do Decreto n. 1294 de 16 de Dezembro de 1853, art. 2º e seguintes, como do de n. 4683 de 27 de Janeiro de 1871, arts. 1º a 3º, não podia o serventuario vitalicio Oliveira, salvo o caso de desistencia ou deliberação expressa nas hypotheses previstas pelas citadas disposições, ser privado do beneficio da terça parte dos rendimentos durante a vida dos seus successores, e no caso de fallecimento de qualquer destes cumpria, mediante as formalidades legaes, averiguar si continuava ou não a impossibilidade do serventuario vitalicio para no primeiro caso garantir-se o pagamento da terça parte e no segundo obrigar-se o serventuario a servir pessoalmente o officio, sob pena de ser este declarado vago e nomeado successor que em tal caso póde ficar isento do onus da terça parte; »

    «Que nesta conformidade deve V. Ex. proceder prestando ao Governo e as necessarias informações e propondo desde logo successor idoneo, si reconhecer subsistente a impossibilidade do serventuario vitalicio. »

    «Deus Guarde a V. Ex. - Lafayette Rodrigues Pereira. - Sr. Presidente da Provincia de Santa Catharina.»

    «Ahi se diz que, no caso de fallecer o substituto, verificando-se que não continúa a impossibilidade do substituído, deve este ser obrigado a servir o officio, sob pena de lhe ser nomeado successor sem onus da terça parte. »

    «E' certo que apenas se tratou da hypothese de já não existir o substituto, mas esta circumstancia penso que não altera a solução da questão, uma vez estabelecido, como fica, o principio de que o serventuario póde voltar a exercer o officio cessando a impossibilidade. »

    «O serventuario vitalicio continúa a ter este caracter, apezar da substituição; apenas interrompe o seu exercicio pela impossibilidade e perde com isso duas terças partes do rendimento, as quaes revertem para o substituto que trabalha em seu logar. »

    «Não ha pois uma privação com a natureza de perpetuidade; verifica-se uma interrupção de exercicio, a qual deve cessar com a causa que a determinára. »

    «Desapparecendo essa causa, seria uma iniquidade manter a interdicção do serventuario e forçal-o a subsistir com o tenue vencimento que, por uma triste necessidade, lhe fora concedido como uma pensão, que elle até, por dignidade propria e por escrupulos de consciencia, póde não querer receber, quando está no caso de trabalhar. »

    «Pouco importa que o decreto tenha dado ao substituto o direito de exercer o officio durante a vida do serventuario. Isto quer dizer que o seu exercicio não vai além da morte do serventuario. »

    «Pela phrase do decreto a missão do substituto não deixa de ter um caracter provisorio e condicional, quando se considera o motivo por que foi conferida. E tanto isto é assim, que o substituto nem adquire o direito de preferencia no provimento vitalicio do officio, que só se considera vago por morte do serventuario.

    «A nossa legislação, força é reconhecer, não preveniu expressamente a hypothese, mas facilmente se explica essa omissão com a falta de precedentes.

    «Para poder ser substituído, percebendo a terça parte dos rendimentos, deve o serventuario provar cegueira, demencia ou molestia incuravel, além da falta de outro meio de subsistência.

    «Ora, raros são os casos em que cesse uma impossibilidade nas condições indicadas.

    «Por outro lado, a melhora dos padecimentos póde coincidir com o avanço da idade e nestas circumstancias o serventuario, já resignado a uma parca subsistência, difficilmente se resolverá a adquirir os habitos do trabalho.

    «Entretanto, pelo que se infere das disposições citadas e pelas razões ponderadas, penso que, uma vez provada por inspecção de saude a cessação da impossibilidade, póde ser cassado o decreto que concedeu a serventia ao substituto, voltando o serventuario vitalicio ao exercicio do officio.

    «Trata-se, porém, de uma questão grave, sobre a qual me parece que seria conveniente ouvir o illustrado voto da Secção de Justiça do Conselho de Estado.

    «Directoria Geral, 31 de Janeiro de 1881. - Cunha Figueiredo Junior.»

    A Secção de Justiça do Conselho de Estado discorda desta opinião, e entende que o serventuario vitalicio de um officio de justiça, a quem se deu successor, fica inhibido, segundo a legislação em vigor, de voltar ao exercicio do emprego.

    As razões em que se funda são:

    Primeira, que, conforme o art. 6º da Lei de 11 de Outubro de 1827 e o art. 2º do Decreto n. 1294 de 16 de Dezembro de 1853, o Governo não póde dar successor a um serventuario vitalicio senão no caso em que a sua impossibilidade de continuar a servir fôr absoluta ou proveniente de idade avançada, cegueira, demencia ou outra moléstia incuravel, segundo o juizo dos médicos; e sendo assim é obvio que a lei não podia ter em vista a circumstancia de um restabelecimento, como o que figura no Aviso de 29 de Março.

    Segunda, que, coherentemente, no caso de impossibilidade absoluta, o successor, que se dá ao serventuario vitalicio, é para servir durante a vida deste, expedindo-se-lhe nestes termos o competente titulo, com o qual o successor adquire o direito de exercer o officio emquanto viver o serventuario que se impossibilitára absolutamente e elle não commetter crime ou erro que o inhabilite.

    Assim que, privar o successor do exercicio do officio em uma hypothese, que não está nem podia estar declarada na lei, seria grave injustiça, e não só isto, mas tambem faltar inteiramente á fé do titulo que se lhe passou, e que lhe garantiu direitos, que devem ser respeitados.

    Terceira, que a doutrina contraria não tem precedente algum em seu favor, e seria certamente opposta aos princípios da boa administração da justiça, em que assenta a Lei de 11 de Outubro de 1827, sendo manifesto que as palavras - ou durar o seu legitimo impedimento - que se lêm no art. 6º, não podem referir-se contraditoriamente á impossibilidade absoluta do serventuario vitalicio a quem se dá successor, mas a impedimentos temporários do mesmo serventuario.

    E' este o parecer da Secção, mas Vossa Magestade Imperial resolverá o que fôr mais acertado.

    O Conselheiro Visconde de Nictheroy acrescenta que este parecer, sendo conforme á lei e á pratica constante nunca alterada, ainda tem por fundamento a razão primordial da regra do serviço publico e do bem de todos, que jamais deve ser preterido por causa de graciosas hypotheses que, aliás, são em si mesmas contradictorias e repellidas pelos próprios que provocaram, em requerimentos fundados e comprovados, essa mesma regras que de sua natureza não póde deixar de ser subsistente.

Sala das Conferencias da Secção de Justiça do Conselho de Estado, 29 de Abril de 1881. - Visconde de Abaeté. Visconde de Jaguary. - Visconde de Nictheroy.

RESOLUÇÃO

Está bem. - Paço, 15 de Novembro de 1884.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Francisco Maria Sodré Pereira.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1884


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1884, Página 571 Vol. 2 pt. 1 (Publicação Original)