Legislação Informatizada - Decreto nº 828, de 29 de Setembro de 1851 - Publicação Original

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Decreto nº 828, de 29 de Setembro de 1851

Manda executar o regulamento da Junta de Hygiene Publica.

     Em conformidade do disposto no Decreto Nº 598 de 14 de Setembro de 1850: Hei por bem, Tendo ouvido a Secção do Imperio do Conselho d'Estado, Approvar e Mandar que se execute o Regulamento da Junta de Hygiene Publica, que com este baixa, assignado pelo Visconde de Mont'alegre, do Conselho d'Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio, que assim o tenha entendido, e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte e nove de Setembro de mil oitocentos cincoenta e hum, trigesimo da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Visconde de Mont'alegre.

REGULAMENTO DA JUNTA DE HYGIENE PUBLICA, MANDADO EXECUTAR PELO DECRETO D'ESTA DATA

CAPITULO I
Dos Empregados da Repartição de Saude Publica

     Art. 1º A Junta de Hygiene Publica, creada por Decreto de 14 de Setembro de 1850, será denominada - Junta Central de Hygiene Publica. - Seu assento será na Côrte; e no Municipio desta e na Provincia do Rio de Janeiro exercitará immediatamente a sua autoridade.

     Art. 2º Nas Provincias do Pará, Maranhão, Pernambuco, Bahia e Rio Grande do Sul haverá Commissões de Hygiene Publica, compostas de tres membros, nomeados pelo Governo, que d'entre os mesmos designará o Presidente; nas outras Provincias haverá somente Provedores de Saude Publica. Os Presidentes, tanto da Junta como das Commissões, tem voto de qualidade.

     Art. 3º Farão parte das Commissões de Hygiene Publica os Commissarios Vaccinadores provinciaes, os Provedores de Saude dos Portos, e Delegados do Cirurgião-mór do Exercito, onde os houver. Os Prevedores de Saude Publica serão escolhidos destas tres classes, segundo o Governo entender.

     Art. 4º O Presidente da Junta Central, quando impedido, será substituido pelo Medico mais graduado, e em igualdade de graduação academica pelo mais antigo dentre os dois que exercerem os cargos de Cirurgião-mór do Exercito e da Armada: quando porêm o impedimento for alêm de hum mez o Governo nomeará quem o substitua.

     Art. 5º Os outros membros da Junta Central, quando impedidos por mais de hum mez, serão substituidos pelos que suas vezes fizerem nas respectivas Repartições: o que igualmente se seguirá quando algum dos Cirurgiões-móres estiver substituindo o Presidente. Os membros das Commissões e os Provedores de Saude Publica serão substituidos por quem os Presidentes de Provincia designarem, dando parte ao Governo das nomeações interinas que fizerem.

     Art. 6º O Secretario da Junta Central será substituido pelo mais moderno em serviço dentre o Provedor de Saude do Porto e o Inspector Geral do Instituto Vaccinico, quando o impedimento não exceder de hum mez, porque neste caso se-lo-ha por hum Amanuense da Secretaria d'Estado dos Negocios do Imperio, que o respectivo Ministro designar. O Secretario das Commissões será hum de seus membros designado pelos Presidentes de Provincia.

     Art. 7º As actas das sessões, e toda a corresponcia da Junta Central e das Commissões, serão escriptas pelo Secretario, assim como todos os termos que for necessario lavrar-se ou em sessão, ou fóra della em acto de visita, ou em qualquer outro acto de jurisdicção da Junta Central ou das Commissões; o que tudo será archivado, ficando o Archivo debaixo da guarda dos mesmos Secretarios.

     Art. 8º As sessões da Junta Central e das Commissões serão feitas nas casas das Camaras Municipaes em sala para isso por ellas designada. Terão lugar huma vez ao menos por semana, e sempre que o serviço publico o exija, ou por deliberação da Junta Central, ou das Commissões, tomada em sessão, ou por convocação do Presidente. O Archivo deverá ser collocado no mesmo lugar das sessões.

     Art. 9º O Governo sob proposta da Junta, e os Presidentes de Provincia sob proposta das Commissões, dando immediatamente parte ao Governo, poderão nomear Delegados de Saude Publica todas as vezes que a sua necessidade for reconhecida. As attribuições destes Delegados serão determinadas em hum Regimento especial, que será proposto pela Junta e approvado pelo Governo.

     Art. 10. As gratificações dos membros da Junta Central e das Commissões pertencerão aos que estiverem em serviço effectivo, passando nos seus impedimentos, qualquer que seja a causa, para os que os substituirem. O Governo na Côrte e os Presidentes nas Provincias marcarão aos membros da Junta Central, ao Secretario, e aos membros das Commissões e Provedores de Saude Publica quantia para transporte e comedorias em todos os casos de serviço extraordinario.

CAPITULO II
Da Inspecção de Saude dos Portos

     Art. 11. A Inspecção de Saude dos Portos fica incorporada e debaixo da direcção da Junta Central de Hygiene Publica, subsistindo o Decreto Nº 268 de 29 de Janeiro de 1843 com as seguintes alterações.

     Art. 12. Logo que constar aos Provedores de Saude dos Portos, ou a qualquer membro da Junta Central, ou das Commissões que nos lugares que estão em communicação com o Imperio, se tem manifestado alguma molestia contagiosa, darão parte aos Presidentes da Junta Central ou das Commissões, que as convocarão immediatamente, a fim de deliberar sobre as providencias a tomar para evitar o contagio.

     Art. 13. Onde não houver Commissões, os Provedores de Saude darão parte das noticias que tiverem aos Presidentes de Provincia, que nomearáõ, para o fim do Artigo antecedente, Commissões extraordinarias de tres membros, das quaes farão parte os mesmos Provedores de Saude dos Portos, os de Saude Publica, os Commissarios Vaccinadores e os Delegados do Cirurgião-mór, onde os houver.

     Art. 14. No caso de alguma embarcação ser declarada em quarentena, ou simplesmente em observação, os Provedores de Saude dos Portos, dando as providencias que julgarem necessarias, darão parte de tudo sem perda de tempo á Junta Central ou ás Commissões, para que estas resolvão sobre a necessidade da continuação dessas medidas, não deixando de communicar-lhes as circumstancias, que de novo occorrerem, até que se resolva a cessação da quarentena ou da observação.

     Art. 15. Os meios necessarios para a policia sanitaria dos Portos, e as providencias para os casos extraordinarios, de que trata o Art. 8º do mencionado Decreto de 1843, serão apresentados á Junta Central ou ás Commissões, que deliberarão a respeito de sua conveniencia. As Commissões communicarão suas decisões á Junta Central e se conformarão com as instrucções, que por esta lhes forem dadas. Nos casos porêm em que for necessario tomar medidas promptas, serão logo executadas as decisões das Commissões, não deixando por isso de as communicar á Junta Central, que as transmittirá ao Governo.

     Art. 16. O Governo marcará o lugar onde em terra devem funccionar as Repartições de Saude dos Portos, quando não o possa ser no mesmo lugar da Junta Central e das Commissões, e regulará, como mais conveniente for, o serviço de mar, combinando-o, quando seja possivel, com o da Policia e da Alfandega.

     Art. 17. Quando os dois Secretarios da Provedoria de Saude do Porto do Rio de Janeiro estiverem impedidos, ou quando o impedimento de hum delles exceder de hum mez, o Governo nomeará quem sirva interinamente, marcando huma gratificação razoavel. Fica supprimido o lugar de Guarda-bandeira, fazendo suas vezes o Guarda que estiver de serviço no mar.

     Art. 18. A Junta Central tomará em particular consideração as questões relativas a quarentenas e Lazaretos; proporá ao Governo as alterações que julgar convenientes ao Decreto de 29 de Janeiro de 1843; e em geral indicará as providencias que se tornarem precisas para o bom desempenho do serviço sanitario dos Portos.

CAPITULO III
Da Inspecção da Vaccinação

     Art. 19. Fica igualmente incorporada na Junta Central e debaixo de sua direcção a Inspecção da Vaccinação, continuando em vigor o Decreto Nº 464 de 17 de Agosto de 1846 com as modificações seguintes.

     Art. 20. As instrucções, providencias, exames, averiguações, mappas e relatorios, de que trata o Art. 8º do mencionado Decreto nos §§ 5º, 9º, 11, 13, 14, 15 e 16; as consultas, Art. 10 §§ 1º e 4º; e a Memoria, de que falla o Art, 26 serão apresentadas á Junta Central, que as levará á presença do Governo com as observações que entender dever accrescentar.

     Art. 21. As medidas sanitarias, de que trata o Art. 21 §§ 5º e 6º serão apresentadas ás Commissões de Hygiene para resolverem sobre a sua adopção, e por estas aos Presidentes de Provincia, que as mandarão executar nos casos urgentes, sendo em todo o caso levadas ao conhecimento da Junta Central, cujas instrucções serão observadas. Nas Provincias onde não houver Commissões, serão ellas apresentadas aos Provedores de Saude, que as levarão ao conhecimento dos Presidentes de Provincia com as suas observações.

     Art. 22. As propostas para Commissarios municipaes e parochiaes, de que fallão os Arts. 6º e 21 § 8º do supracitado Decreto, serão feitas pelos Commissarios Vaccinadores Provinciaes aos Presidentes das Provincias, a quem ficão competindo essas nomeações nos mesmos termos dos Arts. 6º e 7º do Decreto, fazendo-se as competentes participações ao Governo e ao Inspector Geral. Se no lugar houver Delegado de Saude, este servirá ao mesmo tempo de Commissario Vaccinador.

     Art. 23. O Governo na Côrte e os Presidentes nas Provincias regularão o serviço da vaccinação, marcando os dias em que ella se deve fazer e designando os lugares a que devem ir os Vaccinadores, ouvindo para isso o Inspector Geral ou os Commissarios Vaccinadores Provinciaes.

     Art. 24. A Junta Central proporá ao Governo as providencias que julgar necessarias e dará Instrucções para a regularidade da vaccinação, dando parte de tudo ao Governo.

CAPITULO IV
Do exercicio da Medicina

     Art. 25. Ninguem póde exercer a medicina, ou qualquer dos seus ramos, sem titulo conferido pelas Escolas de Medicina do Brasil, nem póde servir de perito perante as Autoridades Judiciarias, ou Administrativas, ou passar certificados de molestia para qualquer fim que seja. Os infractores incorrerão na multa de cem mil réis pela primeira vez, e nas reincidencias em duzentos mil réis e quinze dias de cadêa.

     Art. 26. Os Medicos, Cirurgiões, e Boticarios, nacionaes ou estrangeiros, formados em Escolas estrangeiras que forem ou tiverem sido Professores de qualquer Universidade ou Escola de Medicina, reconhecida pelos seus respectivos Governos, poderão exercer temporaria ou perpetuamente as suas profisssões sem dependencia de exame perante as Escolas de Medicina. Para poderem porém gozar deste favor, deverão justificar primeiro perante as mesmas Escolas que são ou forão com effeito Professores, e que as Escolas e Universidades em que o são ou forão, estão reconhecidas pelos seus Governos; apresentando para isso attestado dos Agentes Diplomaticos do Imperio, e na falta destes, dos Consules Brasileiros acreditados nesses Paizes.

     Art. 27. O Governo, ouvida a Escola de Medicina da Côrte, poderá dar licença aos Medicos, Cirurgiões e Boticarios formados em Universidades ou Escolas estrangeiras para exercerem suas profissões no Imperio, no caso de que sejão autores de obras scientificas de reconhecido merecimento, e que sejão de bem estabelecida reputação litteraria, independente de qualquer outra formalidade.

     Art. 28. Os Medicos, Cirurgiões, Boticarios, Dentistas e Parteiras apresentarão os seus diplomas, na Côrte e Provincia do Rio de Janeiro, á Junta Central, e nas Provincias, ás Commissões e aos Provedores de Saude Publica. Em hum livro destinado para a matricula se inscreverá o nome do individuo, a que pertence o diploma; a profissão a que se refere e a Corporação que o conferio; o que feito o Presidente da Junta Central ou da Commissão ou o Provedor de Saude Publica lançará nas costas do diploma o - Visto - e assignarão. Os formados em Universidades ou Escolas estrangeiras, cujos diplomas não tenhão sido legalisados pelas Faculdades de Medicina do Imperio, ou não estiverem comprehendidos nos dois antecedentes Artigos, não serão inscriptos nos livros da matricula.

     Art. 29. Sem que se tenha feito a matricula do modo determinado neste Regulamento, não he licito o exercicio da medicina em qualquer de seus ramos, ainda que tenhão sido preenchidas as obrigações do Art. 25º, e que gozem dos favores dos Art. 26 e 27. Os infractores incorrerão na multa de cincoenta mil réis pela primeira vez, e no dobro e em quinze dias de cadêa nas reincidencias.

     Art. 30. A matricula determinada no Artigo 28 deste Regulamento dispença a que pela Lei de 11 de Outubro de 1828 se fazia perante as Camaras Municipaes.

     Art. 31. Huma vez feita a matricula, segundo fica determinado, não he necessario repetil-a, quando se tenha de mudar de domicilio; com tudo, quando a mudança for de huma Provincia para outra, a Autoridade que procedeo á matricula ou da Provincia em que se achava porá hum - Passe - nas costas do diploma, que servirá para melhor provar a identidade da pessoa e legitima posse do diploma.

     Art. 32. A Junta Central, as Commissões e os Provedores de Saude Publica, logo que entrarem em exercicio, officiarão ás Camaras Municipaes para que lhe enviem listas dos Facultativos matriculados com todos os esclarecimentos que constarem dos seus assentos. Se a esse tempo não estiverem reunidas as Camaras Municipaes, os seus Presidentes as farão tirar pelos Secretarios das mesmas, e verificando sua exactidão, as remetterão com suas assignaturas e as dos mesmos Secretarios; e na primeira reunião darão parte do que houverem praticado.

     Art. 33. Recebidas as listas enviadas pelas Camaras Municipaes, serão lançadas nos livros da matricula com todas as indicações necessarias. Com estas e com as que se fizerem de novo, formar-se-ha a matricula provincial, que será publicada pela imprensa.

     Art. 34. As mesmas Autoridades sanitarias, que organisarem as matriculas provinciaes, remetterão copias á Junta Central, que com ellas, e com as matriculas do Municipio da Côrte e Provincia do Rio de Janeiro, formará huma matricula geral que fará publicar pela imprensa.

     Art. 35. Estão habilitados a exercer suas profissões, independentemente de nova matricula, todos os que já se achão matriculados nos livros das Camaras Municipaes. Aos que não estiverem matriculados são concedidos tres mezes a contar da execução deste Regulamento para cumprir o disposto no Art. 28. Igual prazo fica concedido aos que para o futuro houverem de receber diplomas, devendo o prazo ser contado do dia em que o recebêrão, ou da chegada á respectiva Provincia.

     Art. 36. As Commissões e os Provedores de Saude Publica mandarão todos os annos, até o dia 15 de Janeiro, á Junta Central copia das matriculas feitas durante o anno anterior, acompanhada das alterações, que por morte ou ausencia houver soffrido a presente. A' vista dellas a Junta Central reorganisará a matricula geral e a fará publicar.

     Art. 37. A Junta Central, tendo noticia de que alguma matricula se fez contra o disposto neste Regulamento, exigirá da Autoridade, que a presidio, os esclarecimentos necessarios, e á vista delles, julgando que menos curial foi a matricula, mandará responder á Autoridade respectiva sobre os pontos da illegalidade, sendo igualmente ouvida a parte interessada: em presença destas respostas julgará da legalidade da matricula.

     Art. 38. A matricula julgada illegal ficará sem effeito, fazendo-se no respectivo livro a declaração competente. Da decisão da Junta haverá recurso para o Conselho d'Estado, tanto por parte da Autoridade que procedeo á matricula, como da parte interessada. A correspondencia para este fim se fará por intermedio dos Presidentes de Provincia, que a dirigirão ao Governo.

     Art. 39. Nenhum Facultativo poderá preparar e nem vender remedios ou drogas, excepto nos lugares onde não houver botica aberta; o nem tão pouco poderá em hypothese nenhuma ter sociedade ou fazer contracto com Boticario ou droguista sobre objectos relativos ás suas profissões; e nem impor aos doentes a condição de comprar os remedios em certa e determinada botica. As infracções serão punidas com a multa de duzentos mil réis pela primeira vez, e na mesma quantia e quinze dias de cadêa nas reincidencias.

     Art. 40. Os Facultativos serão obrigados a escrever as receitas em portuguez, e a lançar por extenso as formulas dos remedios, ou sejão proprias ou alheias, com os nomes e doses das substancias que entrão na composição dos mesmos remedios, sem abreviaturas, signaes nem algarismos. São excetuados somente os casos em que as formulas se achem escriptas nas Pharmacopeas; que então bastará escrever o nome por que he conhecido o remedio e a Pharmacopea em que se acha; mas isto mesmo sem abreviaturas, nem signaes.

     Art. 41. As receitas deverão tambem conter o modo por que se deve fazer uso do remedio e especialmente se interna ou externamente; deverão declarar o nome do dono da casa, e, não havendo incnoveniente, a pessoa a quem he destinado, assim como o dia, mez e anno em que são escriptas.

     Art. 42. Os Boticarios não prepararão receita que não esteja assignada por Facultativo matriculado, e nem na conformidade dos Artigos antecedentes. Não poderão alterar, nem substituir os medicamentos ou as substancias que forem prescriptas para a sua composição. Quando as doses lhes pareção excessivas representarão ao Facultativo que as receitou, e só as prepararão depois de declaração expressa deste.

     Art. 43. As infracções dos tres precedentes Artigos serão punidas com a multa de dez mil réis pela primeira vez, e o dobro na segunda, podendo nas reincidencias elevar-se até cem mil réis. As receitas, que não estiverem na conformidade dos Artigos antecedentes, não serão acceitas em Juizo, nem para provar divida, nem para abonar qualquer reclamação.

     Art. 44. Os Boticarios transcreverão textualmente, as receitas nas vasilhas ou envoltorios que as contiverem, sendo estas lacradas e marcadas com os seus nomes e lugares de morada, assim como o modo de se fazer uso. Deverão ter livro proprio, em que registrem as receitas com o nome do dono da casa para que são enviadas.

     Art. 45. Para a composição dos remedios officinaes seguir-se-ha a Pharmacopea Franceza, até que se ache organisada huma Pharmacopea Brasiliense, para o que o Governo nomeará huma Commissão de pessoas competentes. Depois de publicada a Pharmacopea Brasiliense, que o será por autorisação do Governo, os Boticarios deverão ter os remedios preparados segundo as formulas dessa Pharmacopea; o que não inhibe que os possão ter segundo as formulas de outras Pharmacopeas para satisfazerem ás prescripções dos Facultativos, os quaes podem receitar como entenderem.

     Art. 46. Os individuos que sem ter diplomas que facultem o exercicio da midicina ou da pharmacia, e os digão ter, e effectivamente exerção algumas dessas profissões, incorrerão pela primeira vez na multa de duzentos mil réis, e nas reincidencias na mesma multa e quinze dias de cadêa, além das penas em que possão incorrer, segundo os Arts. 301 e 302 do Codigo Criminal.

CAPITULO V
Da Policia Sanitaria

     Art. 47. A Junta Central, as Commissões, e os Provedores de Saude Publica terão o maior cuidado em investigar as causas da insalubridade geral ou parcial de algum lugar, em observar o curso das molestias reinantes particularmente das contagiosas, e em geral empregar a maior vigilancia sobre tudo que diga respeito á saude publica.

     Art. 48. Inspeccionarão com o maior escrupulo as substancias alimentares expostas á venda; visitarão todos os annos, huma vez pelo menos e em epocas incertas, as boticas quer de particulares, quer de Corporações, as drogarias, armazens de mantimentos casas de pasto, botequins, mercados publicos, confeitarias açougues, hospitaes, colegios, cadêas, aqueductos, cemeterios, officinas, laboratorios, ou fabricas, em que se manipulem remedios ou quaesquer outras substancias que servem para a, alimentação e podem prejudicar a saude; e em geral todos os lugares donde possa provir damno á Saude Publica, ou pelas substancias que se frabricão ou pelos trabalhos que se operão, devendo preceder as convenientes participações ás respectivas Autoridades, quando se trate de Estabelecimentos publicos.

     Art. 49. Examinarão as localidades em que se achem fabricas, cujos trabalhos são nocivos á saude ou ainda de cheiro inconmmodo, e marcarão as distancias em que devão ficar dos povoados; podendo manda-Ias fechar até que se realise a remoção determinada. Das decisões das Commissões e dos Provedores de Saude Publica haverá recurso para a Junta Central, assim como desta para o Conselho d' Estado.

     Art. 50. As fabricas de aguas mineraes precisão para se estabelecerem de previa autorisação das Autaridades Sanitarias. Para esse fim deverão os seus proprietarios apresentar amostras de suas aguas, a fim de reconhecer-se sua qualidade. As analyses serão feitas em sua presença, sendo negada ou concedida a autorisação á vista de seu resultado. As mesmas Autoridades poderão visitar as ditas fabricas, quando julgarem conveniente, e se nessas visitas encontrarem aguas falsificadas, poderão mandar fechar as fabricas por hum mez e inutilisar as aguas que estiverem em deposito.

     Art. 51. Os droguista, e os que vendem substancias venenosas das constantes da tabella de que falla o Art. 79 deste Regulamento, assim como os fabricantes que em suas fabricas empregarem taes substancias, deverão participar ás Autoridades Sanitaras, que os matricularão em livro para isso determinado, especificando-se o lugar em que vendem as ditas substancias ou as fabricas em que as usão. Os infractores incorrerão pela primeira vez na multa de duzentos mil reis, e nas reincidencias na mesma multa, podendo-se-lhes fechar as casas ou fabricas por espaço de tres mezes.

     Art. 52. Os Boticarios deverão administrar suas boticas por si proprios, e não poderão ter mais de huma, ou abrir outra por sua conta sem que ponhão para as administrar outros Boticarios igualmente matriculados, ou officiaes competentemente approvados pelas Escolas de Medicina, segundo as habilitações que para esse fim serão ordenadas.

     Art. 53. Os Boticarios e droguistas deverão ter aferidos os pesos, medidas e balanças, e collocar rotulos nos vasos ou seus envoltorios, em que guardem medicamentos ou outras substancias, que designem o seu contendo. As substancias venenosas activas deverão estar em lugar separado e fechadas com chave, que estará nas mãos dos mesmos Boticarios ou droguistas ou na de seus primeiros caixeiros.

     Art. 54. Os Boticarios e droguistas não abandonarão suas boticas ou drogarias sem que deixem em seu lugar pessoa habilitada para fazer suas vezes. Se do erro commettido em sua ausencia por troca de substancia ou alteração de dose resultar damno, ficarão elles sujeitos á sua satisfação, alêm das demais penas em que possão incorrer.

     Art. 55. Os Boticarios não farão em suas boticas outro genero de negocio, que não seja da sua profissão.

     Art. 56. Os Boticarios matriculados na conformidade deste Regulamento não precisão de licença das Camaras Municipaes para exercer a pharmacia ou abrir botica. Os que porêm as abrirem sem estarem matriculados, ou os que as tiverem em nome de outrem, alêm da multa de cem mil réis fecharão a botica. Nas reincidencias, alêm do dobro da multa, serão confiscados os remedios e vendidos para as despezas com a Saude Publica.

     Art. 57. Da data da execução deste Regulamento em diante não se abrirão boticas na Côrte e nas Capitaes das Provincias sem que as Autoridades Sanitarias tenhão examinado se estão sufficientemente sortidas de remedios, vasilhame, instrumentos, utensilios e livros constantes de hum tabella, que para esse fim será organisada pela Junta Central, e publicada com autorisação do Governo. Das decisões das Commissões e dos Provedores haverá recurso para a Junta Central, devendo ser acompanhado de huma copia das faltas.

CAPITULO VI
Das visitas sanitarias

     Art. 58. As visitas sanitarias ás embarcações continuarão a ser feitas como até o presente, devendo o Provedor de Saude do Porto obrar na conformidade do disposto no Capitulo 2º deste Regulamento.

     Art. 59. As visitas ás boticas e estabelecimentos dellas dependentes serão feitas pelas Autoridades Sanitarias ou por Delegados seus, quando não as possão fazer por si. Os Delegados das Commissões serão alguns dos seus membros. As Commissões, seus Delegados ou os Provedores serão acompanhados por hum Fiscal da Camara Municipal, por esta designado, o qual lavrará os termos necessarios se os Secretarios não puderem exercer estas funcções como determina o Art. 7º, notificará os peritos, e procederá ás diligencias que lhe forem determinadas.

     Art. 60. Se nas visitas se reconhecer que algumas substancias estão falsificadas, corrompidas ou alteradas, ou que os medicamentos e drogas estão deteriorados ou já destituidos de vigor para produzir seus effeitos, ou finalmente que as preparações não estão feitas segundo as formulas prescriptas, serão os ditos objectos immediatamente destruidos e seus donos condemnados, pela primeira vez na multa de cem mil réis, e nas reincidencias em duzentos mil réis, podendo o estabelecimento ser fechado até tres mezes.

     Art. 61. Quando os donos dos objectos condemnados se não conformarem com a decisão do Artigo antecedente, poderão exigir a nomeação de novos peritos, cujo parecer se seguirá. Quando a segunda decisão não possa ser dada na mesma occasião, serão os objectos guardados em lugar seguro, com todas as cautelas para se evitarem substituições. Os Chefes de Policia ou quaesquer outras Autoridades policiaes se prestarão a facilitar os meios de segurança.

     Art. 62. A execução destas decisões será determinada pelos Chefes de Policia, devendo para esse fim as Autoridades Sanitarias remetter-lhes copia de todos os papeis, ficando os originaes nos archivos.

     Art. 63. Nas occasiões de visita todos os objectos e depositos delles serão franqueados ás Autoridades, e os que se recusarem serão considerados como incursos no Art. 60, e sujeitos ás penas ahi determinadas.

     Art. 64. Os Boticarios devem ter e apresentar os seus diplomas, as Pharmacopeas em uso, a lista dos Facultativos e a tabella das substancias venenosas, de que trata o Art. 79. Os droguistas, que venderem as substancias venenosas referidas na dita tabella, devem te-la e apresenta-la, e a certidão das suas matriculas. Os que se negarem a isto serão considerados como exercendo profissão sem titulo, e sujeitos ás penas do Art. 46.

     Art. 65. Dadas as hypotheses dos Artigos antecedentes, lavrar-se-ha hum termo com a exposição de todas as circunstancias, assignado pelas Autoridades Sanitarias, que houverem procedido á visita, e por duas testemunhas pelo menos, e será remettido em original ao Delegado de Policia, que julgará com recurso para o Juiz de Direito.

     Art. 66. Nas visitas ás boticas se examinará mais se estão sufficientemente providas de remedios; se não estiverem serão mandadas fechar, lavrando-se termo com especificação de todas as faltas, e só se tornarão a abrir depois de novo exame. Desta decisão quando proferida pelas Commissões ou Provedores haverá recurso para a Junta Central.

CAPITULO VII
Da venda dos medicamentos e de quaesquer substancias medicinaes

     Art. 67. Os medicamentos compostos, de qualquer denominação que sejão, ou quaesquer outros activos, não poderão ser vendidos senão por pessoa legalmente autorisada. Os droguistas não poderão vender drogas ou medicamentos por peso medicinal, nem poderão vender os medicamentos compostos chamados officinaes.

     Art. 68. As substancias venenosas constantes da 1ª tabella a que se refere o Art. 79 não poderão ser vendidas se não a Boticarios e droguistas matriculados. As empregadas em artes e para fabricas só serão vendidas aos fabricantes, quando estes apresentarem certidão de matricula.

     Art. 69. Para as vendas de que se trata no Artigo antecedente haverá livro proprio rubricado pelo Presidente da Junta ou pelos das Commissões, por seus Delegados ou pelos Provedores. Cada vendedor terá o seu livro, onde, se lavrará hum termo que será assinado pelo comprador, vendedor e duas testemunhas, fazendo-se nelle expressa menção da qualidade e quantidade da substancia vendida.

     Art. 70. O arsenico e outros venenos activos, proprios para a destruição de animaes, não serão vendidos se não de mistura com substancias inertes, segundo a formula que pela Junta Central for prescripta. E só serão vendidos a pessoas conhecidas dos Boticarios ou droguistas, deixando-se declaração em livro proprio da quantidade e qualidade do veneno, nome do comprador e dia da venda.

     Art. 71. Sem autorisação especial he prohibida a venda de remedios, cuja composição for desconhecida; assim como o fazerem-se annuncios por meio de jornaes, periodicos, ou cartazes de taes remedios, ou de machinas e instrumentos como tendo virtudes especificas para certas e determinadas molestias. 

     Art. 72. Os infractores das disposições dos Arts. 67 a 71 serão punidos com a multa de trinta a cem mil réis; e nas reincidencias com o duplo, podendo-se-lhes fechar a loja, quando a tenhão, por hum a tres mezes.

     Art. 73. Para que possão ser vendidos os remedios de composição desconhecida, seus autores os apresentarão com a receita, e com a declaração das molestias para que são proprios, á Junta Central, que os examinará. Sendo approvados, a receita será guardada no Archivo da Junta debaixo da guarda do Secretario, sendo fechada e sellada com as Armas Imperiaes, lançando-se por fóra huma declaração do objecto que encerra, e que será assignada pelo Presidente e Secretario da Junta, e pelo autor ou seu procurador.

     Art. 74. Approvado o remedio, a Junta Central informará ao Governo sobre a sua utilidade, e indicará o tempo por que se deva conceder hum privilegio exclusivo de venda. A' vista da informação o Governo resolverá o que entender, devendo, quando conceda o privilegio, declarar na Carta de concessão o seu tempo, e a molestia a que he applicavel o remedio.

     Art. 75. Concedido o privilegio e apresentado á Junta Central, fará esta unir á receita huma declaração delle com todas as clausulas, a qual será assignada pelo Presidente e Secretario. Findo o tempo do privilegio será a receita aberta e publicada.

     Art. 76. Se a receita apresentada á Junta Central for falsa, incorrerá o seu autor na multa de duzentos mil réis, e em quinze dias de cadêa. Se igualmente o autor applicar o remedio para molestias que não estejão mencionadas no privilegio ficará este sem effeito, e a receita aberta e publicada.

CAPITULO VIII
Disposições diversas

     Art. 77. As infracções das disposições deste Regulamento, que expressamente não tiverem sido commettidas ás Autoridades Sanitarias, e cujo conhecimento e imposição de penas não lhes houver sido outorgado, serão julgadas pelos Delegados de Policia com recurso para o Juiz de Direito, segundo o disposto nos Arts. 205, 206, 207, 208, 209, 210 e 211 do Codigo do Processo Criminal.

     Art. 78. As infracções, a que expressamente se não tenhão determinado penas, serão punidas com as do Art. 43 deste Regulamento.

     Art. 79. A Junta Central formará huma tabella explicativa das substancias venenosas, que só podem ser expostas á venda por Boticarios e droguistas, assim como outra das mesmas substancias que podem ser empregadas nas artes e fabricas. Estas tabellas serão revistas todos os annos e organisadas de novo, quando for necessario fazer-lhe alguma alteração. Tanto as tabellas primitivas, como as organisadas posteriormente, serão remettidas ás Commissões e aos Provedores para as distribuir pelos Boticarios e droguistas, e faze-las publicar pela imprensa.

     Art. 80. As Autoridades Sanitanias se empenharão com todo o desvelo na execução dos §§ 1º e 2º do Art. 4º da Lei de 14 de Setembro de 1850. Os Provedores, porêm, quanto á indicação de medidas que devão ser expostas ás Camaras Municipaes, deverão communica-las aos Presidentes de Provincia que, nomeando Commissões extraordinarias de tres membros, compostas de Medicos e Cirurgiões, e na falta destes de Boticarios ou outras pessoas habilitadas, e ouvindo o seu parecer, as remetterão ás Camaras Municipaes para que estas as reduzão a Posturas.

     Art. 81. A Junta Central deverá propor ao Governo Regulamentos especiaes para os cemiterios na parte relativa á Saude Publica; para as confeitarias prescrevendo as substancias que devem ser empregadas em colorir os doces, e qualidades de vasos em que estes devem ser preparados; e em geral para todos os Estabelecimentos que exijão providencias hygienicas particulares.

     Art. 82. As Commissões e Provedores enviarão todos os annos até o fim de Janeiro á Junta Central hum relatorio circumstanciado do estado sanitario das respectivas Provincias, com todos os esclarecimentos que pela Junta Central forem exigidos. Esta, com os relatorios provinciaes, e com os da Côrte e Provincia do Rio de Janeiro, formulará hum geral, que remetterá ao Governo.

     Art. 83. A Junta Central indicará ao Governo os livros necessarios para o serviço das diferentes Estações da Repartição de Hygiene Publica; os modelos de sua escripturação; as normas dos termos que for necessario lavrar; e arbitrará o que julgar necessario para o expediente de cada huma das Estações; o que sendo approvado pelo Governo, fará repartir e distribuir pelas Commissões e Provedores. As despezas com o expediente e com os livros correrão por conta da Fazenda Nacional.

Palacio do Rio de Janeiro em 29 de Setembro de 1851. - Visconde de Mont'alegre.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1851


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1851, Página 259 Vol. 1 pt II (Publicação Original)