Legislação Informatizada - DECRETO Nº 8.277, DE 15 DE OUTUBRO DE 1881 - Publicação Original

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DECRETO Nº 8.277, DE 15 DE OUTUBRO DE 1881

Manda observar provisoriamente instrucções relativas ao serviço sanitario do porto do Rio de Janeiro.

1    Hei por bem, Attendendo ao que representou o Inspector de Saude do Porto, que no serviço sanitario do porto do Rio de Janeiro se observem provisoriamente as Instrucções que com este baixam, assignadas pelo Barão Homem de Mello, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em 15 de Outubro de 1881, 60º da Independencia e do Imperio.

    Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

    Barão Homem de Mello.

Instrucções para o serviço sanitario do porto do Rio de Janeiro, a que se refere o Decreto n. 8277 desta data

CAPITULO I

DOS ANCORADOUROS

    Art. 1º O Inspector de Saude do Porto, de accôrdo com o Capitão do Porto, determinará os limites de duas regiões da bahia do Rio de Janeiro, as quaes serão destinadas: uma a ancoradouro dos navios postos em quarentena de observação e a outra aos navios sujeitos á quarentena de rigor.

    Art. 2º Marcará tambem o mesmo Inspector, ainda de accôrdo com o referido Capitão, o ancoradouro especial para os navios, que, já se achando ancorados dentro da bahia, devam ficar sujeitos á sequestração sanitaria, de modo a evitar-se a infecção de outros navios.

    Este ancoradouro será denominado de vigia.

    Art. 3º Os navios retidos pela autoridade sanitaria não poderão ter livre pratica sem que a mesma autoridade a conceda.

    Art. 4º O interdicto sanitario isenta os navios da jurisdicção da Alfandega da Côrte e Capitania do Porto, as quaes só poderão neste caso intervir para a fiscalisação activa e constante dos ditos navios e a observancia destas instrucções na parte em que dependem do seu auxilio.

CAPITULO II

DAS VISITAS SANITARIAS

    Art. 5º Haverá duas visitas sanitarias, que serão feitas pelos Ajudantes do Inspector: a externa ou dos navios que entrarem e a interna ou dos navios ancorados.

Da visita externa

    Art. 6º As embarcações nacionaes ou estrangeiras, mercantes ou de guerra, serão sujeitas á visita sanitaria na occasião da entrada.

    § 1º Ficam dispensadas desta visita as embarcações que regularmente navegam entre portos da Provincia do Rio de Janeiro, as lanchas de pesca e os cruzadores.

    § 2º O Inspector de Saude poderá, porém, quando julgar conveniente, sujeitar á visita sanitaria os navios exceptuados.

    Art. 7º Logo que qualquer navio fundear, ou mesmo sob a vela, o Ajudante em serviço para elle se dirigirá a fim de proceder á visita sanitaria, que começará pelo interrogatorio, no qual fará as perguntas que julgar necessarias para seu esclarecimento sobre a sanidade do dito navio.

    Art. 8º Si as informações obtidas forem satisfactorias, o Ajudante entrará no navio; procurará verificar a exactidão das respostas que lhe houverem sido dadas; examinará os compartimentos de bordo; aconselhará as precauções indispensaveis, e lançará na carta de saude, si fôr limpa, o - visto - preciso para que a embarcação tenha livre pratica.

    Terminada a visita, o Ajudante entregará o certificado desta ao capitão ou commandante, prevenindo-o de que sem a apresentação desse documento não se lhe dará carta de saude para a sahida, e fazendo-o assignar o talão dos certificados para prova da alludida entrega.

    Art. 9º Si as informações não forem satisfactorias, si houver suspeita de molestia pestilencial a bordo ou si o navio não trouxer carta de saude não só dos portos do Imperio em que tiver tocado, mas tambem do porto estrangeiro mais proximo, o Ajudante não subirá a bordo e ordenará que o navio siga para o ancoradouro de observação e ice a bandeira amarella; o que communicará immediatamente ao Ajudante da visita interna, dando tambem sem demora parte do occorrido ao Inspector de Saude do Porto.

    Art. 10. Tomará este as providencias que o caso exigir, e o Ajudante da visita interna seguirá para o navio e procurará verificar si houve ou ha a bordo doentes de molestia pestilencial.

    Art. 11. No caso de ter havido a bordo doentes de molestia pestilencial ordenará o Ajudante a desinfecção das cargas que forem melhor vehiculo de contagio, a baldeação destas para saveiros e a completa desinfecção do navio, marcando prazo para cumprimento dessas providencias.

    Findo o dito prazo, o mesmo Ajudante procederá a nova visita, e, si verificar que não se executaram taes providencias, multará o navio, marcando novo prazo.

    Conceder-lhe-ha depois livre pratico, si o ultimo caso da molestia pestilencial houver occorrido pelo menos dez dias antes do da entrada. Na hypothese contraria ficará o navio no ancoradouro de observação pelo tempo que o Inspector determinar.

    Si durante os prazos referidos occorrer a bordo algum caso da mesma molestia, observar-se-ha o disposto no artigo seguinte.

    Art. 12. Si o navio chegar com doentes de molestia pestilencial, o Ajudante:

    1º Removerá os doentes para o Hospital maritimo de Santa Isabel, os suspeitos de molestia para o Lazareto de observação e os demais tripolantes e passageiros para o de quarentena, deixando apenas a bordo os tripolantes indispensaveis para guardarem o navio e effectuarem as desinfecções.

    2º Mandará baldear o carregamento que fôr julgado mais susceptivel para saveiros ou alvarengas, onde possa ser convenientemente arejado e desinfectado.

    3º Mandará abrir as escotilhas do navio; mudar a ordem de collocação das cargas restantes e desinfectal-as; lavar o porão e mais dependencias, empregando neste serviço pessoas de bordo ou outras de terra, observadas as convenientes cautelas.

    Art. 13. As despezas relativas ao que dispoem os arts. 11 e 12 correrão por conta do navio.

    Art. 14. Afim de effectuar-se o serviço de que trata o art. 12 seguirá o navio para o ancondouro de quarentena, onde será visitado todas as vezes que o Inspector julgar conveniente.

    Art. 15. Será concedida livre pratica ao navio e facultada aos passageiros a entrada no litoral e na cidade, esgotado o prazo marcado para a quarentena tanto do primeiro como dos segundos e verificada a ausencia de molestia pestilencial a bordo e nos Lazaretos.

    Art. 16. Si forem satisfactorias as informações obtidas pelo Ajudante na occasião da visita externa, mas não houver o navio trazido carta de saude, será este mandado para o ancoradouro de observação, e, prevenido o Ajudante da visita interna, irá elle a bordo do navio examinar as suas condições hygienicas.

    Art. 17. No caso de serem boas taes condições, dará o Ajudante livre pratica ao navio, depois de impor-lhe a multa marcada no art. 32 destas Instrucções, cujo conhecimento, datado e assignado, apresentará ao commandante ou a quem suas vezes fizer.

    Art. 18. A interdicção sanitaria será ainda applicavel, a juizo do Inspector, aos navios que trouxerem doentes de molestias transmissiveis, embora não pestilenciaes; executando-se neste caso as providencias indicadas nos artigos anteriores com as alterações compativeis com o interesse commercial e o gráo de contagio da molestia.

    Art. 19. Será declarada suspeita toda a embarcação procedente de porto infeccionado; e considerado como tal o de procedencia, quando nelle reinar, por occasião da sahida do navio, alguma molestia pestilencial.

    Será ainda tido como infeccionado o porto em que se houverem manifestado casos de molestia pestilencial pouco tempo antes da sahida do navio; isto é: menos de 10 dias para a colera-morbo, de 20 para a febre amarella e de 30 para a peste oriental.

Da visita interna

    Art. 20. Além das disposições em vigor, contidas nos arts. 40 a 46 e 48 a 50 do Regulamento de 23 de Janeiro de 1861, e 12 e 13 das Instrucções mandadas executar pelo Decreto n. 640 de 13 de Dezembro de 1876, o Inspector de Saude do Porto fará observar as constantes dos subsequentes artigos das presentes Instrucções.

    Art. 21. No percurso do ancoradouro o vapor da visita interna se dirigirá em primeiro logar aos navios que tiverem içado a bandeira de sua nação no mastro da prôa; receberá os doentes de molestia pestilencial que encontrar e os transportará para o Hospital maritimo de Santa Isabel.

    § 1º Proceder-se-ha depois á desinfecção immediata do mesmo vapor, visitando-se então todos os navios recem-chegados afim de se verificar si observaram-se os conselhos dados na occasião da entrada e si a bordo ha indicios de molestia.

    § 2º Em seguida o vapor da visita interna se dirigirá para o Lazareto de observação, do qual se aproximará apenas para indagar si os individuos que tinham sido suspeitos de molestia pestilencial apresentam symptomas inequivocos da molestia.

    No caso affirmativo o vapor os transportará para o Hospital maritimo, e, si não houver confirmação da molestia, retirar-se-ha immediatamente.

    § 3º Quando a molestia epidemica reinar no porto, o vapor da visita interna não irá ao referido Lazareto, que terá um vapor especial destinado a transportar os doentes para o Hospital maritimo.

    § 4º Ao voltar do Hospital será desinfectado o vapor do Lazareto, e só se approximará deste quando fôr chamado.

    Art. 22. Todo o navio que tiver menos de 4 dias de ancoragem será considerado como recem-chegado.

    Art. 23. Terminada a visita interna, que será feita como determinam os arts. 41 do Regulamento de 23 de Janeiro de 1861 e 22 destas Instrucções, o Ajudante da mesma visita informar-se-ha do occorrido na visita externa, afim de se proceder na conformidade das disposições dos arts. 10, 11, 12 e 16.

    Art. 24. Os encargos do Ajudante da visita interna consignados nestas Instrucções, poderão ser temporariamente commettidos ao Ajudante da visita externa, quando o Inspector de Saude, em attenção ás conveniencias do serviço, assim o determinar.

    Art. 25. Poderá tambem o Inspector chamar simultaneamente a serviço os quatro Ajudantes, si circumstancias extraordinarias exigirem a suspensão temporaria do que se acha disposto no art. 1º das Instrucções de 13 de Dezembro de 1876.

    Art. 26. Si em algum navio ancorado ou retido se manifestar, em época epidemica, um caso de molestia, seja ella qual fôr, o commandante do navio, si já houver sido feita a visita sanitaria interna, deverá immediatamente chamar medico a bordo, para saber qual a molestia manifestada.

    § 1º No caso de suspeitar-se que a referida molestia é da mesma natureza da epidemica, deverá o commandante enviar, sem demora, o doente para o Hospital maritimo em um escaler do navio, remettendo nessa occasião a declaração, escripta pelo medico que examinou o doente, de que a molestia data de menos de 24 horas.

    § 2º Si, porém, a molestia não fôr a reinante, nem outra qualquer de natureza pestilencial, será permittido ao doente tratar-se a bordo, em alguma casa de saude ou nos hospitaes publicos; não podendo, entretanto, ser recebido em nenhum destes estabelecimentos sem que o acompanhe a declaração a que se refere o paragrapho antecedente, a qual neste caso substituirá a guia dos Ajudantes.

    Art. 27. Para fiscalisar-se o cumprimento das disposições do art. 26 o Ajudante da visita interna terá o direito de examinar o doente recolhido a qualquer estabelecimento e verificar si a molestia é ou não pestilencial.

    § 1º Na primeira hypothese imporá ao proprietario da casa de saude ou á administração do hospital publico a multa de 200$000, devendo, no caso de desaccôrdo de diagnostico, promover uma conferencia gratuita com dous medicos escolhidos pelo indicado proprietario ou pela referida administração.

    § 2º Nenhuma das medidas deste artigo será executada, si o proprietario da casa de saude ou os administradores do hospital communicarem á Inspectoria de Saude do Porto que receberam de bordo do navio, cujo nome indicarão, um doente affectado de molestia pestilencial, ou si o remetterem directamente para o Hospital maritimo, como dispõe o art. 4º, § 3º do Decreto de 15 de Novembro de 1876.

    Art. 28. Verificado ter havido má fé por parte do commandante do navio na observancia do art. 26 destas Instrucções, ou provado que o medico chamado para examinar o doente occultou este á autoridade sanitaria sob um diagnostico falso, serão impostas tanto ao commandante como ao medico as multas do art. 50 do Regulamento de 23 de Janeiro de 1861.

    Art. 29. Além das multas estabelecidas para os navios que não cumprirem os artigos destas Instrucções, ficarão elles sujeitos á suspensão de todo e qualquer trabalho que corra sob a jurisdicção da Alfandega da Côrte durante o prazo que fôr marcado, e não excederá a oito dias.

CAPITULO III

DAS CARTAS DE SAUDE

    Art. 30. Toda a embarcação que sahir do Rio de Janeiro com destino a qualquer porto do Imperio onde houver Inspecção de Saude, e a porto estrangeiro, onde o documento sanitario seja exigido, é obrigada a pedir carta de saude.

    Art. 31. Para obter carta de Saude é indispensavel a apresentação do certificado de visita, passado pelo Ajudante na occasião da entrada do navio.

    Art. 32. A embarcação que não trouxer cartas de saude dos portos estrangeiros em que tiver tocado ou de portos nacionaes onde houver Inspecção de saude, além de ficar sujeita ao que determina o art. 16 destas Instrucções, incorrerá na multa de 300$000, cuja imposição será communicada á Alfandega.

    Art. 33. Os Commandantes de navio devem trazer a carta de saude visada pelo Consul brazileiro no porto estrangeiro em que houver tocado o mesmo navio.

CAPITULO IV

DISPOSIÇÕES GERAES

    Art. 34. O Inspector de Saude do Porto formulará instrucções especiaes relativas aos processos de desinfecção e a qualquer materia scientifica attinente ao serviço da repartição a seu cargo.

    Estas instrucções especiaes serão impressas e distribuidas pelos Ajudantes, que as observarão.

    Art. 35. Os funccionarios da Alfandega do Rio de Janeiro e da Capitania do Porto prestarão o auxilio que lhes fôr requisitado pelo Inspector de Saude e pelos seus Ajudantes, não devendo a Alfandega, antes da exhibição de documento que prove o pagamento da multa, consentir na descarga ou no carregamento de navio que tiver sido multado.

    Art. 36. Em quadras epidemicas ou á vista de requisição da Inspecção de Saude poderá o Governo tomar medidas mais severas.

    Art. 37. Dadas as mesmas condições sanitarias, só poderão atracar ao litoral os navios que tiverem licença do Inspector de Saude.

    A este compete marcar a linha de afastamento dos navios.

    Art. 38. O Inspector de Saude do Porto enviará aos consules estrangeiros exemplares impressos das disposições destas Instrucções, cujo conhecimento fôr necessario aos capitães de navio, devendo as mesmas disposições ser vertidas para os respectivos idiomas.

    Art. 39. O Governo organizará para a Inspecção de Saude do Porto um Regulamento especial, em que serão instituidos os Lazaretos de observação e quarentena.

    Art. 40. Emquanto não forem estabelecidos os Lazaretos, a quarentena dos passageiros se fará a bordo dos navios retidos.

    Esta quarentena durará de tres a nove dias, marcando-se tres dias para a colera-morbo, seis para a febre amarella e nove para a peste oriental.

    Si houver necessidade, poder-se-ha, a juizo da Inspecção de Saude do Porto e com autorização do Governo, espaçar a quarentena indicada.

    Art. 41. Ficam em vigor todas as disposições dos Regulamentos de 23 de Janeiro de 1861, e de 15 de Novembro e 13 de Dezembro de 1876, que não foram modificadas pelas presentes Instrucções.

    Palacio do Rio de Janeiro em 15 de Outubro de 1881. - Barão Homem de Mello.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1881


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1881, Página 1106 Vol. 2 (Publicação Original)