Legislação Informatizada - DECRETO Nº 5.785, DE 4 DE NOVEMBRO DE 1874 - Publicação Original

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DECRETO Nº 5.785, DE 4 DE NOVEMBRO DE 1874

Concede ao Conde de Lages e ao Dr. Francisco Teixeira de Magalhães autorização para a construcção, uso e gozo de uma linha de carris de ferro da rua dos Ourives á Copacabana.

Attendendo ao que Me requereram o Conde de Lages e o Dr. Francisco Teixeira de Magalhães, Hei por bem, Tendo ouvido as Secções dos Negocios do Imperio e da Justiça do Conselho de Estado, Conceder-lhes autorização, por 50 annos, para a construcção, uso e gozo de uma linha de carris de ferro que, partindo da rua dos Ourives, esquina da do Ouvidor, vá terminar na Copacabana, sob as clausulas que com este baixam assignadas por José Fernandes da Costa Pereira Junior, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro em quatro de Novembro de mil oitocentos setenta e quatro, quinquagesimo terceiro da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

José Fernandes da Costa Pereira Junior.

Clausulas a que se refere o Decreto desta data

I

    O Governo concede ao Conde de Lages e ao Dr. Francisco Teixeira de Magalhães privilegio por cincoenta annos a contar desta data e nos termos e condições adiante definidas, para a construcção, uso e gozo de uma linha de carris de ferro destinada ao transporte de passageiros e mercadorias, entre a rua dos Ourives nesta cidade, e a praia da Copacabana.

II

    A linha partirá da rua dos Ourives, esquina da do Ouvidor, e seguindo por aquella rua até a de S. José e d'ahi pelas da Ajuda, Evaristo da Veiga e Santa Thereza, prolongar-se-ha, por meio de um tunel, ou a céo aberto, até a rua do Cassiano, e desta em linha recta a encontrar a de D. Luiza.

    Deste ponto seguirá, por onde fôr mais conveniente, até a rua de Santo Amaro, ou em procura do becco do Guarda-mór, que, neste caso, será alargado a expensas dos concessionarios; continuando pelas ruas da Pedreira da Gloria e Pedreira da Candelaria, até a praça do Duque de Caxias, em frente da Igreja matriz da Gloria; e dahi, por uma rua, que os mesmos concessionarios abrirão, parallelamente ás do Cattete e Marquez de Abrantes, até a altura da continuação da rua Bambina, ou sómente até a de Paysandú, que percorrerá attingindo o ponto mais conveniente para, por meio de um tunel communicar com a mesma rua Bambina, por onde seguirá a encontrar a de S. Clemente.

    Neste ponto dividir-se-ha a linha em duas secções: uma que seguirá pelas ruas de D. Marianna, General Polydoro, até a da Real Grandeza, e outra que subindo a de S. Clemente até a da Real Grandeza, que percorrerá, vá encontrar a secção da rua de D. Marianna.

    Da rua da Real Grandeza continuará a linha através de um tunnel até a praia da Copacabana.

    Poderão igualmente os concessionarios estabelecer uma segunda linha de communicação com a praia da Copacabana, que, partindo do morro do Leme, percorra a rua da Passagem até entroncar-se na linha principal, no ponto de cruzamento das ruas do General Polydoro e D. Marianna.

III

    O privilegio aqui concedido comprehende sómente o direito exclusivo que aos concessionarios fica reservado para a construcção de uma linha de carris de ferro entre a cidade e a costa da Copacabana, limitada esta entre o «Forte embargado» e os «Dous Irmãos,» desde as vertentes das montanhas até o oceano; cabendo apenas aos mesmos concessionarios, quanto ás ruas que percorrer a referida linha, o uso e gozo nas condições dos Decretos nos 5567 e 5569 de 14 de Março ultimo.

IV

    Dentro do prazo de dezoito mezes desta data, deverão os concessionarios por si ou pela Companhia que incorporarem, dar começo ás obras, sob pena de caducidade da presente concessão.

    Começadas que sejam as obras, e se não proseguirem até a sua conclusão, os concessionarios incorrerão na multa de 5:000$000 por mez de demora; caducando a concessão um anno depois.

    Todas as obras da linha concedida até a Copacabana, ficarão terminadas dentro do prazo de cinco annos; salvo o caso de força maior, julgado exclusivamente pelo Governo.

V

    Dentro de um anno, desta data, os concessionarios apresentarão á approvação do Governo os planos da construcção da linha.

    Esses planos consistirão nos seguintes trabalhos:

    1º Traçado da linha, com indicação dos declives, raios de curvas, pontos de estações, e descriminação das propriedades que tiverem de ser desappropriadas, na escala de 1:1000;

    2º Secção dos carris;

    3º Projectos dos tunneis, na escala de 1:200;

    4º Desenhos dos carros para differentes transportes, dos edificios das estações, das officinas e dos armazens para mercadorias.

    Trinta dias depois da apresentação dos planos, estes considerar-se-hão approvados se nenhuma modificação tiver proposto o Governo.

VI

    Na construcção da linha e seu serviço, serão observadas as seguintes condições:

    § 1º A linha poderá ser dupla em todas as ruas de 11 metros pelo menos de largura; e bem assim percorrer no trajecto de volta em via singela, outras ruas não indicadas nesta concessão, conforme os estudos aconselharem; com tanto que sejam mencionados no traçado de que trata a clausula precedente e não prejudiquem direitos adquiridos.

    Em todo o caso, porém, os carros descerão pela rua dos Ourives até o ponto de partida.

    § 2º Os trilhos serão de fenda e terão o peso de 16 kilogrammas por metro corrente pelo menos.

    A distancia entre as faces internas dos trilhos será de 1m,40.

    Os trilhos serão collocados sobre linhas de madeira e dormentes espaçados de um metro. Estes poderão ser de ferro.

    § 3º Nos lugares onde houver desvio ou via dupla, a distancia entre as duas linhas será pelo menos de um metro.

    § 4º Os trilhos serão assentados no centro das ruas quando a linha fôr dupla, e nos lados quando fôr singela. Em qualquer dos casos não prejudicarão o transito de vehiculos, de pessoas a pé ou a cavallo, e nem a largura dos passeios.

    § 5º Os tuneis terão 8 metros pelo menos de largura e 6 de altura, contada esta do nivel do calçamento; em todo o caso conservarão um espaço livre para a passagem franca e sem perigo de pessoas a pé e a cavallo.

    § 6º A largura dos carros não excederá de 1m,80 ou de 1m,88 incluidos os estribos.

    § 7º A tracção será animada.

VII

    Nenhuma obra nova, não mencionada nos planos approvados, poderá ter começo sem que tenha sido previamente autorizada pelo Governo, e por este approvada a respectiva planta.

VIII

    O Governo poderá mandar sobr'estar na execução de qualquer obra que se ache em andamento sem as prescripções da clausula antecedente.

    Se a obra estiver concluida, os concessionarios a farão demolir no prazo que lhes fôr marcado, sob pena de ser a demolição feita á custa dos proprios concessionarios, além da multa em que incorrerem.

IX

    A conservação dos carris far-se-ha com a maior vigilancia possivel; para o que terão os concessionarios os cantoneiros e guardas que a juizo do Governo forem necessarios.

    Igual vigilancia se exercerá na circulação dos carros, na passagem dos tuneis e nos cruzamentos das ruas.

    Os tunneis serão illuminados dia e noite.

X

    Para regularidade de todo o serviço de policia e segurança, ministrarão os concessionarios instrucções escriptas aos seus agentes e destas darão sciencia ao Governo.

XI

    Além das prescripções aqui impostas, os concessionarios obrigam-se a cumprir as dos regulamentos que, para segurança, fiscalisação e policia das linhas de carris, publicar o Governo.

XII

    No caso de interrupção até 15 dias do trafego da linha, e por motivo não justificado, a juizo do Governo, ficam os concessionarios sujeitos á multa de um a dez contos de réis.

    Se a interrupção exceder daquelle periodo, caducará a presente concessão. Nesta ultima pena incorrerão igualmente os concessionarios pela não observancia das clausulas 2ª, 5ª, 6ª, 11ª, 14ª, 15ª, 21ª e 31ª

XIII

    A pena de caducidade da concessão será imposta administrativamente pelo Governo Imperial, sem dependencia de outra formalidade.

    Feita a competente intimação aos concessionarios, o Governo Imperial reassumirá o direito de conceder a linha que é objecto das presentes clausulas a quem julgar conveniente; não podendo os concessionarios reclamar indemnização, por qualquer titulo que seja; e devendo remover os trilhos dentro do prazo de tres mezes, contados da data da intimação, sob pena de effectuar-se a remoção pelo Governo, á custa dos mesmos concessionarios.

XIV

    As obras serão executadas a expensas dos concessionarios, ou de uma Companhia, que poderá ser incorporada dentro ou fóra do Imperio; tendo, porém, no ultimo caso um representante nesta cidade com poderes necessarios para tratar de todas as questões que se suscitarem entre a mesma Companhia e o Governo, ou entre esta e os particulares.

XV

    Os concessionarios não poderão cobrar mais de 200 réis pelo transporte de cada passageiro, desde a rua dos Ourives até o cruzamento da rua da Real Grandeza com a dos Voluntarios da Patria, ou entre os pontos intermediarios; e mais 100 réis até a Copacabana.

    O transporte de mercadorias far-se-ha por uma tabella previamente approvada pelo Governo.

XVI

    As horas de partida dos carros e o numero de viagens serão reguladas em tabellas approvadas pelo Governo. Este terá o direito de exigir maior numero de viagens se o julgar conveniente á commodidade publica.

XVII

    Os concessionarios pagarão a Illma. Camara Municipal, pelos terrenos de sua propriedade, que occuparem, o arrendamento que a mesma Camara arbitrar, e farão acquisição dos que forem precisos para abertura e alargamento de ruas; sendo, em falta de accôrdo, desappropriados nos termos da legislação vigente.

XVIII

    Terão transporte gratuito os agentes do Correio, da Policia e quaesquer empregados ou funccionarios publicos que apresentarem passe dos respectivos chefes, declarando que vão em serviço.

    No caso de incendio em propriedades situadas nas ruas da linha concedida ou em suas immediações, terão tambem passagem gratuita até as referidas ruas, e independente de passes, os bombeiros e agentes policiaes, sendo posto á disposição do Chefe de Policia, do Director do Corpo de Bombeiros, ou de quem suas vezes fizer, um carro especialmente construido para transportar duas bombas de extincção de incendio.

    Tambem ficarão á disposição do Governo sempre que este o exigir, todos os meios de transporte, mediante abatimento de 30% da tarifa, para conducção de tropa.

XIX

    Para o assentamento dos trilhos e seu posterior concerto precederá licença da Illma. Camara Municipal; os concessionarios, porém, em casos urgentes, poderão proceder aos trabalhos indispensaveis á regularidade do trafego, participando immediatamente á mesma Camara.

XX

    Os concessionarios não poderão mudar o nivelamento das ruas e praças sem autorização prévia da Illma. Camara Municipal.

    As despezas feitas com as alterações do referido nivelamento correrão por conta dos concessionarios.

XXI

    Os concessionarios obrigam-se a manter em perfeito estado a linha de carris e todas as suas obras, e a macadamizar ou a calçar pelo systema de parallelipipedos, quando estes forem empregados, todo o espaço comprehendido entre os trilhos e mais 0m,35 para cada lado das ruas, ou de quaesquer communicações que abrirem; sob pena de ser esse trabalho executado pelo Governo, cobrando este executivamente dos concessionarios a respectiva importancia.

XXII

    Os concessionarios pagarão á Illma. Camara Municipal as despezas de conservação do calçamento das ruas e praças, no espaço comprehendido pelos trilhos e mais 0m,35 para cada lado, sendo taes despezas indemnizadas mensalmente pelos mesmos preços exigidos de outras emprezas.

XXIII

    Serão os concessionarios igualmente responsaveis pelas despezas que exigir o restabelecimento do calçamento das ruas e praças, se por qualquer circumstancia deixar a empreza de funccionar; ficando para esse fim sujeito á Illma. Camara Municipal seu material fixo e rodante.

XXIV

    Todas as vezes que a Illma. Camara resolver a construcção ou reconstrucção do calçamento das ruas e praças comprehendidas na linha concedida, nenhum embaraço será opposto pelos concessionarios nem reclamada qualquer indemnização pela interrupção do trafego, que fôr indispensavel; sendo, além disso obrigados a collocar os trilhos á proporção que o mesmo calçamento progredir.

XXV

    O Governo nomeará um Engenheiro para fiscalisar os trabalhos da construcção da linha e o serviço da empreza, sendo os respectivos vencimentos fixados pelo mesmo Governo, de accôrdo com os concessionarios, que entregarão trimensalmente a importancia correspondente no Thesouro Nacional.

XXVI

    Os concessionarios obrigam-se a construir e a manter pelo espaço de tempo do seu privilegio, de conformidade com um plano approvado pela Illma. Camara Municipal, um estabelecimento balneario na praia da Copacabana.

XXVII

    Obrigam-se ainda:

    § 1º A fundar na mesma praia, entre o mar e as montanhas adjacentes, uma povoação, que será delineada e projectada de accôrdo com os planos de distribuição e arruamento; e bem assim dos edificios e obras de protecção e segurança, que forem previamente approvadas pela Illma. Camara Municipal.

    § 2º A canalizar agua potavel para o mesmo povoado, a illuminal-o a gaz, e a construir os necessarios esgotos para o escoamento das aguas pluviaes e materias fecaes: podendo por estes serviços cobrar as taxas que forem opportunamente approvadas pelo Governo.

    Para execução da presente clausula fica concedido aos concessionarios o direito de desappropriação na fórma da lei vigente.

XXVIII

    O Governo cederá por modico arrendamento ou aforamento todos os terrenos que lhe pertencerem ou a que tenha direito, quér na costa da Copacabana, quér nas montanhas adjacentes; e bem assim todas as marinhas alli existentes, e de que não tenha disposto até esta data.

XXIX

    Os concessionarios, dentro de tres annos da data do decreto, darão começo ás construcções mencionadas no plano que fôr approvado pela Illma. Camara, e que se refere á clausula XXVII, as quaes ficarão concluidas dentro de 10 annos, e á medida que a commodidade publica o reclamar, a juizo do Governo.

    Por falta de cumprimento desta clausula incorrerão os concessionarios na pena de cinco contos de réis por mez de demora; caducando, um anno depois, a concessão de todos os favores, e ficando sem effeito os contractos celebrados com o Governo.

XXX

    A clausula precedente não será applicada, quanto ao prazo, ao estabelecimento balneario, que deverá ser inaugurado ao mesmo tempo que a linha de carris aqui concedida; sob pena de uma multa equivalente á da citada clausula.

XXXI

    Os concessionarios construirão a suas expensas no povoado de Copacabana, e de accôrdo com os planos approvados pela Illma. Camara Municipal, os seguintes edificios publicos:

    1º Uma escola para o ensino primario e secundario;

    2º Um estabelecimento que se preste á formação de um jardim zoologico;

    3º Um hospital com proporção para 100 convalescentes, destinado á Santa Casa de Misericordia.

XXXII

    Os concessionarios fornecerão ao Governo, sempre que lhes forem exigidos, os dados estatisticos do movimento da linha de carris.

XXXIII

    Findo o prazo de 50 annos da presente concessão, reverterão para o dominio da Municipalidade todo o material fixo e rodante, os animaes, estações, officinas e mais edificios destinados ao serviço da linha, e bem assim o estabelecimento balneario com todos os seus apparelhos ou pertenças; tudo em perfeito estado de conservação, ficando ipso facto dissolvida a empreza, e sem direito a indemnização alguma.

    Se á Illma. Camara Municipal convier ulteriormente arrendar ou vender a linha de carris e o estabelecimento balneario, aos concessionarios caberá a preferencia em igualdade de condições.

XXXIV

    Ao Governo fica reservado o direito de embargar a renda da linha de carris e do estabelecimento balneario, durante os ultimos cinco annos desta concessão, para com o seu producto reparar as obras e o material que, por negligencia dos concessionarios, não se acharem nas condições exigidas na clausula anterior.

XXXV

    O Governo poderá resgatar esta concessão em qualquer tempo depois dos 15 primeiros annos, contados da abertura da linha de carris. O resgate comprehenderá sómente as propriedades que teriam de passar ao dominio da Municipalidade no fim do prazo do privilegio; e não annullará os favores concedidos para a edificação do povoado.

    O preço do resgate será fixado por arbitros, um nomeado pelo Governo e outro pelos concessionarios, os quaes tomarão em consideração a importancia das obras no estado em que então estiverem, sem attenderem ao seu custo primitivo; e a renda liquida da empreza nos cinco annos anteriores.

    Se os dous arbitros não chegarem a accôrdo dará cada um seu parecer, e será a questão resolvida pela Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado.

XXXVI

    Todas as questões que se suscitarem entre o Governo e os concessionarios serão decididas por arbitramento, sem recurso algum.

    Cada uma das partes nomeará seu arbitro, e o terceiro, que, no caso de empate, decidirá definitivamente, será escolhido por accôrdo de ambos. Não se dando o accôrdo, proceder-se-ha a sorteio entre dous nomes de Conselheiros de Estado, designado cada um por uma das partes.

XXXVII

    Por falta de cumprimento de qualquer das clausulas desta concessão, a que não tenha sido imposta a pena de caducidade, poderá o Governo impôr multas até cinco contos de réis, conforme a gravidade do caso.

    Tratando-se de falta de execução de obras previstas nas mesmas clausulas, ou de má execução dellas, poderá o Governo, além da imposição da multa, mandar fazer as ditas obras por conta dos concessionarios.

XXXVIII

    Serão applicaveis á Companhia ou sociedade que fôr organizada pelos concessionarios, as estipulações expressas nas presentes clausulas.

    Palacio do Rio de Janeiro em 4 de Novembro de 1874. - José Fernandes da Costa Pereira Junior.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1874


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1874, Página 1136 Vol. 2 pt. I (Publicação Original)