Legislação Informatizada - DECRETO Nº 5.421, DE 24 DE SETEMBRO DE 1873 - Publicação Original

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DECRETO Nº 5.421, DE 24 DE SETEMBRO DE 1873

Promulga o tratado de extradição celebrado em 21 de Junho do corrente anno entre o Brasil e o Reino da Belgica.

    Havendo-se concluido e assignado na Cidade de Bruxellas, aos 21 dias do mez de Junho do corrente anno, um tratado entre o Brasil e o Reino da Belgica para a entrega reciproca de criminosos; e tendo sido esse acto mutuamente ratificado, trocando-se as respectivas ratificações nesta Côrte em o dia 20 do presente mez de Setembro: Hei por bem Mandar que o dito tratado seja observado e cumprido tão inteiramente como nelle se contém.

    O Visconde de Caravellas, do Meu Conselho e do de Estado, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros, assim o tenha entendido e faça executar, expedindo os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em vinte e quatro de Setembro de mil oitocentos setenta e tres, quinquagesimo segundo da Independencia e do Imperio.

    Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

    Visconde de Caravellas.

    Nós, D. Pedro II, por Graça de Deus e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil, etc.

    Fazemos saber a todos os que a presente Carta de Confirmação, Approvação e Ratificação virem, que aos vinte e um dias do mez de Junho de mil oitocentos setenta e tres concluiu-se e assignou-se na Cidade de Bruxellas entre Nós e Sua Magestade o Rei dos Belgas pelos respectivos Plenipotenciarios, munidos dos competentes plenos poderes, um tratado de extradição de criminosos do teor seguinte:

    Sua Magestade o Imperador do Brasil e Sua Magestade o Rei dos Belgas, tendo concordado em regular por meio de um tratado a extradição reciproca dos criminosos, nomearam para este fim seus Plenipotenciarios:

    Sua Magestade o Imperador do Brasil a Thomaz Fortunato de Brito, Barão de Arinos, Moço Fidalgo de Sua Casa, do Seu Conselho, Commendador da Ordem de Christo do Brasil. Grã-Cruz da Ordem de Leopoldo da Belgica, Commendador das Ordens do Danebrog de Dinamarca, dos SS. Mauricio e Lazaro de Italia, e seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario junto a Sua Magestade o Rei dos Belgas, etc., etc.

    Sua Magestade o Rei dos Belgas ao Sr. Guilherme Bernardo Fernando Carlos, Conde de Aspremont-Lynden, Official da Ordem de Leopoldo, Commendador do Ramo Ernestino de Saxonia, Grã-Cruz das Ordens da Aguia Branca da Russia, da Aguia Vermelha da Prussia e de Leopoldo d'Austria, etc., etc., etc., seu Ministro dos Negocios Estrangeiros, Membro do Senado.

    Os quaes, depois de darem-se reciproca communicação dos seus plenos poderes, que acharam em boa e devida fórma, convieram nos artigos seguintes:

    Art. 1º O Governo de Sua Magestade o Imperador do Brasil e o Governo de Sua Magestade o Rei dos Belgas obrigam-se pelo presente tratado á reciproca entrega de todos os individuos refugiados da Belgica no Brasil e do Imperio na Belgica, pronunciados ou condemnados (renvoyés devant Ia jurisdiction répressive ou condamnés) como autores ou complices de qualquer dos crimes declarados no art. 3º pelos tribunaes daquella das duas Nações em que o crime tiver sido commettido.

    Art. 2º A obrigação da extradição se não estende em caso algum aos nacionaes dos dous paizes.

    Art. 3º A extradição deverá realizar-se contra os individuos pronnunciados ou condemnados (renvoyés devant Ia jurisdiction répressive ou condamnés) como autores ou complices dos crimes seguintes:

    1º Homicidio voluntario, comprehendendo o assassinio, o parricidio, o envenenamento e o infanticidio;

    2º A tentativa destes crimes;

    3º Ferimentos voluntarios de que resulte inhabilitação permanente de trabalho pessoal, destruição ou inhabilitação absoluta de algum membro ou orgão, ou a morte sem intenção de causal-a;

    4º Violação, estupro, rapto e outros attentados contra o pudor, uma vez que se dê a circumstancia da violencia; polygamia;

    5º Subtracção, occultação, suppressão e substituição de criança;

    6º Roubo (furto fazendo violencia á pessoa e ás cousas), associação de malfeitores;

    7º Incendio voluntario, damno voluntario nos caminhos de ferro, do qual resultem ferimentos ou a morte;

    8º Peculato ou malversação de dinheiros publicos; o emprego, com o fim de apropriar-se do alheio, de artificio fraudulento, pelo qual se obtenha de outrem a entrega de dinheiros, fundos, obrigações ou quaesquer outros titulos e bens, usando-se de nome, qualidade, ou papel falso ou falsificado, ou de fraude para persuadir a existencia de emprezas, bens, credito ou poder supposto, ou para produzir a esperança ou o temor de um successo, accidente ou qualquer acontecimento chimerico; abuso de confiança ou subtracção de dinheiros, fundos, documentos e quaesquer titulos de propriedade publica ou particular por pessoas, a cuja guarda estejam confiados, ou que sejam associadas no estabelecimento contra o qual o crime foi commettido;

    9º Falsificação, alteração de moeda, emissão ou introducção dolosa na circulação de moeda falsa ou falsificada;

    Falsificação ou contrafacção de sellos, timbres, carimbos, cunhos e quaesquer sellos do Estado e das administrações publicas; uso, importação e venda desses objectos;

    Falsificação ou contrafacção de effeitos publicos ou de bilhetes de banco, titulos publicos ou particulares, emissão ou introducção dolosa na circulação desses effeitos, bilhetes ou titulos falsificados ou alterados; falsificação de escriptura ou de despachos telegraphicos e uso desses despachos, effeitos, bilhetes, e escriptos ou titulos contrafeitos, fabricados ou falsificados;

    10. Barataria e pirataria constituindo a tomada de um navio por pessoas pertencentes á sua equipagem, por meio de fraude ou violencia contra o Capitão, ou quem o substituir; abandono do navio pelo Capitão fóra dos casos previstos pela lei;

    11. Quebra fraudulenta, falso testemunho em materia criminal.

    Art. 4º Quando se der algum caso, que entre na categoria dos factos previstos pelo artigo antecedente, e seja tal que a extradição do individuo reclamado pareça offender a equidade ou humanidade, a cada um dos Governos Contractantes será licito não concedel-a, dando conhecimento ao Governo que a reclamar dos motivos da recusa.

    Art. 5º A extradição será reclamada por via diplomatica, e não será concedida senão á vista do traslado authentico do despacho de pronuncia ou da sentença condemnatoria (ordonnance de renvoi de la Chambre du Conseil ou un arrêt de la Chambre des mises en accusation ou un jugement ou un arrèt de condamnation), extrahida dos autos de conformidade com as Leis do Estado reclamante.

    Estes documentos serão, sempre que seja possivel, acompanhados dos signaes caracteristicos do individuo reclamado, e de uma copia do texto da lei applicavel ao crime imputado.

    Art. 6º O individuo perseguido por um dos factos previstos pelo art. 3º do presente tratado, será detido provisoriamente á vista de um mandado de prisão ou de qualquer outro acto com igual força, expedido pela autoridade estrangeira competente, e apresentado por via diplomatica.

    Nos casos urgentes para que se effectue a arrestação provisoria bastará o aviso, transmittido pelo Correio ou pelo Telegrapho, da existencia de um mandado de prisão, com a condição, porém, de que será esse aviso dado regularmente por via diplomatica ao Ministro dos Negocios Estrangeiros do Estado, no qual o delinquente refugiou-se.

    A prisão provisoria se effectuará nas condições, e segundo as regras da legislação do Governo requerido; cessará, se dentro do prazo de tres semanas, contadas do momento em que ella se effectuou, não receber o accusado communicação do mandado de prisão expedido contra elle pela autoridade estrangeira competente.

    Tendo o accusado recebido em devido tempo communicação do mandado de prisão expedido contra elle, continuará a sua detenção provisoria por mais dous mezes, contados da data em que ella se effectuou.

    Cessará se, findo este prazo, não tiver recebido o delinquente communicação do despacho de sua pronuncia ou da sentença de sua condemnação (jugement ou arrêt de condamnation ou ordonnance de la Chambre du Conseil ou arrêt de la Chambre des mises en accusation, ou d'un acte de procédure criminelle ou correctionnelle emané de l'autorité compétente décrétant formellement ou opérant de plein droit le renvoi du prévenu devant la jurisdiction repressive).

    Art. 7º Si dentro do termo de tres mezes, contados do dia em que o pronunciado ou condemnado (l'individu renvoyé devant le tribunal correctionel, accusé on condamné) fôr posto á sua disposição, o agente diplomatico, que o reclamou, não o tiver remettido para o Estado reclamante, dar-se-lhe-ha a liberdade e não poderá ser de novo preso pelo mesmo motivo.

    Neste caso as despezas correrão por conta do Governo que dirigiu a instancia.

    Art. 8º Quando o individuo reclamado por uma das Altas Partes contractantes, em virtude do presente tratado, o fôr tambem por algum ou alguns outros Governos por crimes commettidos nos seus respectivos territorios, será elle entregue ao Governo que primeiro o houver reclamado.

    Art. 9º Em nenhum caso a extradição será concedida por crimes ou delictos politicos ou por factos connexos com elles.

    Não se reputará delicto politico, nem facto connexo com elle, o attentado contra um soberano estrangeiro e os membros de sua familia, quando esse attentado constituir o crime de homicidio, assassinio ou envenenamento.

    Art. 10. Os individuos, cuja extradição houver sido concedida, não poderão ser perseguidos ou punidos por crimes politicos anteriores á extradição, nem por factos connexos com elles, nem por outro qualquer crime não previsto pelo presente tratado.

    Art. 11. A extradição não será igualmente concedida quando, segundo a lei do paiz em que o delinquente se tiver refugiado, se achar prescripta a pena ou a acção criminal.

    Art. 12. Se o individuo reclamado achar-se perseguido ou detido no paiz, onde se refugiou, por obrigações contrahidas com pessoas particulares, a sua extradição teria, apezar disso, lugar, ficando salvo á parte lesada fazer valer o seu direito perante a autoridade competente.

    Art. 13. Os individuos reclamados que se acharem em processo ou condemnados por crimes commetidos no paiz em que se asylaram, serão entregues somente depois do julgamento definitivo ou depois de cumprida a pena.

    Art. 14. Os objectos subtrahidos e encontrados em poder dos individuos reclamados, os instrumentos e utensilios de que se tiverem servido para a perpetração do crime e qualquer outra prova de convicção, quér se realize a extradição, quer se não chegue esta a realizar por morte ou fuga do delinquente, serão entregues ao Governo reclamante, quando nessa restituição consinta a autoridade competente do Estado requerido. Ficam todavia resalvados os direitos de terceiro sobre os mencionados objectos, os quaes serão devolvidos sem despeza alguma depois de terminado o processo.

    Art. 15. As despezas feitas com a captura, custodia, manutenção e transporte do individuo, cuja extradição fôr concedida, assim como os gastos com a remessa dos objectos especificados no artigo antecedente, ficarão a cargo dos dous Governos nos limites de seus respectivos territorios. As despezas com o transporte por mar correrão por conta do Governo que requerer a extradição.

    Art. 16. Quando no seguimento de uma causa crime não politica um dos Governos julgar necessario o depoimento de testemunhas residentes no outro Estado, será enviada para esse fim, por via diplomatica, carta de inquirição, á qual se dará cumprimento, observando-se as Leis do Estado em que deve ter lugar a audição das testemunhas.

    Os Governos contrastantes renunciam a qualquer reclamação que tenha por objecto a restituição das despezas resultantes do cumprimento da commissão rogatoria, uma vez que se não trate de exames criminaes ou medico-legaes.

    Art. 17. O presente tratado terá vigor por cinco annos, contados do dia da troca das ratificações; será executorio 10 dias depois da sua publicação e continuará a subsistir emquanto um dos dous Governos não o denunciar com anticipação de um anno.

    Será ratificado e as ratificações trocadas na Cidade do Rio de Janeiro no prazo de tres mezes contados do dia da sua assignatura.

    Em fé do que os Plenipotenciarios respectivos o assignaram com o sello de suas armas.

    Feito em duplicata em Bruxellas aos 21 do mez de Junho de 1873.

    (L. S.) - Barão de Arinos.

    (L. S.) - Comte d'Aspremont-Lynden

Protocollo

    Ao assignarem o presente tratado os Plenipotenciarios abaixo assignados concordaram em que o art. 4º delle não deverá ter outro sentido ou alcance senão o de permittir que o Governo requerido, quando se trate de crimes a que esteja imposta a pena de morte, só consinta na extradição reclamada, depois de obter certeza, dada pelo Governo requerente e por via diplomatica, de que em caso de condemnação não será executada essa pena.

    Em fé do que lavraram o presente protocollo que, assignado em duplicata, foi entre elles trocado. Bruxellas aos 21 do mez de Junho de 1873.

    (L. S.) - Barão de Arinos.

    (L. S.) - Comte d'Aspremont-Lynden.

    E sendo Nos presente o dito tratado, cujo teor fica acima inserido, e bem visto, considerado e examinado por Nós tudo o que nelle se contém, o Approvamos, Ratificamos e Confirmamos, assim no todo como em cada um dos seus artigos e estipulações, e pela presente o damos por firme e valioso para produzir com o Protocollo, que o acompanha, os seus devidos effeitos, promettendo em fé e palavra imperial cumpril-o inviolavelmente e fazel-o cumprir e observar por qualquer modo que possa ser.

    Em testemunho e firmeza do que fizemos passar a presente Carta por Nós assignada, sellada com o sello grande das armas do Imperio e referendada pelo Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros abaixo assignado.

    Dada no Palacio do Rio de Janeiro aos dezoito dias do mez de Setembro do anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos setenta e tres.

    (L. S.) - IMPERADOR com rubrica e guarda.

    Visconde de Caravellas.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1873


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1873, Página 759 Vol. 2 (Publicação Original)