Legislação Informatizada - DECRETO Nº 5.248, DE 5 DE ABRIL DE 1873 - Publicação Original

Veja também:

DECRETO Nº 5.248, DE 5 DE ABRIL DE 1873

Concede á Companhia de Navegação Costeira autorização para funccionar e approva seus estatutos.

    Attendendo ao que me requereu a Companhia de Navegação Costeira, organizada nesta Côrte e devidamente representada, e na conformidade da Minha Immediata Resolução de 24 de Março proximo findo, tomada sobre parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado, exarado em Consulta de 3 de Fevereiro ultimo, Hei por bem Conceder-lhe autorização para funccionar e approvar os respectivos estatutos que com este baixam.

    José Fernandes da Costa Pereira Junior, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro, em cinco de Abril de mil oitocentos setenta e tres, quinquagesimo segundo da Independencia e do Império.

    Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

    José Fernandes da Costa Pereira Junior.

Estatutos da Companhia de Navegação Costeira approvados pelo Decreto nº 5248 de 1873

CAPITULO I

DA COMPANHIA E SEUS FINS

    Art. 1º A Companhia de Navegação Costeira é uma sociedade anonyma e tem por fim fazer a navegação, por barcos a vapor ou á vela, desta Côrte para qualquer porto do Imperio ou estrangeiro e especialmente do Rio de Janeiro para o porto de Macahé na Provincia do Rio de Janeiro.

    Art. 2º A séde da Companhia será no Rio de Janeiro.

    Art. 3º A Companhia durará pelo tempo de 20 annos, podendo este prazo ser prorogado se a assembléa geral, convocada expressamente para este fim, assim o resolver e fôr approvado pelo Governo.

    Antes do tempo fixado para a sua duração só poderá dissolver-se verificando-se alguma das hypotheses especificadas no art. 295 do Codigo do Commercio e no art. 35 do Decreto nº 2711 de 19 de Dezembro de 1860 ou se a assembléa geral dos accionistas, reunida especialmente para tratar deste objecto, com uma anticipação de 40 dias, assim o resolver por dous terços dos votos que representarem as acções emittidas.

    Tambem se julgará dissolvida e será immediatamente posta em liquidação, logo que soffrer prejuizos que absorvam os fundos de reserva e de deterioração apurados e metade do capital social.

    Art. 4º A Companhia começará a funccionar logo que estejam emittidas todas as acções e realizados 30 % do seu capital.

CAPITULO II

DO CAPITAL E DOS ACCIONISTAS

    Art. 5º O capital da Companhia será de 200:000$000 divididos em 1.000 acções de 200$000 cada uma.

    Este capital poderá ser augmentado se a assembléa geral dos accionistas, sob proposta do conselho fiscal, assim o resolver, por metade dos votos que representarem as acções emittidas, precedendo autorização do Governo.

    Se por ventura se verificar o augmento do capital, terão preferencia proporcional ás novas acções os accionistas da Companhia.

    Art. 6º As entradas das acções serão realizadas na quota e nas épocas que o conselho fiscal julgar conveniente, precedendo sempre annuncios com uma anticipação de 20 dias pelo menos.

    Art. 7º O accionista que não effectuar as entradas a que fôr obrigado, nas épocas annunciadas, perderá, em beneficio da Companhia, as entradas que anteriormente houver realizado, exceptuados, todavia, os casos de força maior, devidamente justificados perante o conselho fiscal.

    O accionista a quem tal falta fôr relevada deverá pagar immediatamente a entrada que dever e o juro da demora.

    As acções cahidas em commisso poderão de novo ser emittidas ou ficarão pertencendo á Companhia; no primeiro caso, o producto do commisso será levado á conta de lucros e perdas; e no segundo, serão as entradas feitas pela propria Companhia.

    Art. 8º Póde ser accionista da Companhia qualquer pessoa, quér nacional, quér estrangeira, ou associação, devendo a transferencia das acções ser feita, depois de realizados 30 % do valor nominal, no escriptorio da Companhia em livro especial, na presença dos transferentes e transferidos, ou seus representantes, que assignarão com o gerente o termo respectivo.

    Art. 9º Os accionistas são solidariamente responsaveis até o valor das acções que possuirem por distribuição primitiva ou transferencia.

    Art. 10. Emquanto não estiverem realizadas todas as entradas das acções da Companhia, o gerente, ouvindo para este effeito o conselho fiscal, terá o direito de recusar a transferencia se o comprador das acções lhe não merecer plena confiança.

    No caso de morte ou fallencia de qualquer accionista, a transferencia será feita a quem legalmente pertencer, desde que fôr approvado; no caso contrario a Companhia pagará o valor das respectivas acções pelo preço ou cotação do mercado, emittindo-as de novo a quem lhe convier.

    O mesmo se observará no caso de venda em hasta publica por sentença ou execução judiciaria.

    Art. 11. A Companhia não tem responsabilidade alguma pelos onus a que possam estar sujeitas as acções com relação aos seus possuidores.

    Os recibos passados pelos accionistas, ou por quem legalmente os representar, de qualquer dividendo ou somma que lhes seja afferente, valerão para a Companhia de plena quitação.

CAPITULO III

DA ADMINISTRACÃO

    Art. 12. A Companhia será administrada por um conselho fiscal, composto de tres membros, com outros tantos supplentes, e um gerente.

    Art. 13. A eleição do conselho fiscal, dos supplentes, e gerente, será feita em assembléa geral, e á maioria relativa de votos, de tres em tres, annos, por escrutinio secreto, em duas cedulas, contendo, uma tres nomes para o conselho e outros tres para supplentes, e outra um para gerente com a declaração externa dos votos.

    Art. 14. Na eleição a que se refere o artigo precedente não serão admittidos votos por procuração, salvo os tutores por seus pupillos e os maridos por suas mulheres.

    Paragrapho unico. As Companhias ou Sociedades só poderão ser representadas por um dos socios.

    Art. 15. O conselho fiscal escolherá na primeira reunião, o seu Presidente e Secretario.

    Art. 16. Só poderá ser eleito membro do conselho fiscal o accionista que possuir, no acto da eleição, pelo menos 20, acções, e gerente o accionista que possuir 50 acções, das quaes nenhum delles poderá dispôr senão depois de cessarem as suas funcções e haver obtido quitação da assembléa geral.

    Art. 17. No impedimento ou falta de qualquer dos membros do conselho fiscal, serão chamados os supplentes na ordem da votação, devendo, porém, proceder-se á eleição tanto destes como daquelles, logo que entre em exercido o terceiro supplente.

    O gerente será substituido nos seus impedimentos, por um membro do conselho fiscal, e quando o impedimento se espaçar além de tres mezes, será eleito outro.

    Art. 18. Os membros do conselho fiscal servirão gratuitamente.

    Os vencimentos do gerente serão arbitrados pela assembléa geral.

    Art. 19. São attribuições do conselho fiscal:

    § 1º Representar a Companhia judicial e extra-judicialmente, para o que lhe são outorgados todos os poderes geraes e especiaes, assim como os de causa propria.

    § 2º Autorizar o gerente para fazer chamadas de prestações do capital, e para realizar despezas que sejam consideradas extraordinarias; para celebrar contractos, e finalmente para effectuar alienações e acquisições, precedendo a esta ultima autorização, assentimento da assembléa geral.

    § 3º Resolver ácerca das acções cahidas em commisso.

    § 4º Deliberar sobre qualquer assumpto ácerca do qual fôr consultado pelo gerente.

    § 5º Tomar contas ao gerente sempre que o julgar necessario, e impreterivelmente uma vez de tres em tres mezes, a fim de inspeccionar as operações dos tres mezes anteriores.

    § 6º Autorizar, dos lucros liquidados, os dividendos semestraes.

    § 7º Convocar as assembléas geraes ordinarias na fórma determinada no art. 32, e as extraordinarias sempre que fôr mister, o gerente o solicitar ou o requererem accionistas que representem, pelo menos, um terço das acções emittidas.

    § 8º Resolver ácerca da idoneidade dos que quizerem fazer acquisição de acções, emquanto não estiver realizado todo o capital da Companhia.

    Art. 20. Compete ao Presidente do conselho:

    § 1º Presidir nas reuniões do conselho.

    § 2º Rubricar e encerrar o livro em que forem registradas as actas das assembléas geraes, e das reuniões do conselho fiscal e o das transferencias de acções.

    § 3º Assignar com o gerente os cheques para a retirada do Banco, dos dinheiros da Companhia.

    § 4º Assignar com o Secretario a correspondencia privativa do conselho fiscal.

    Art. 21. Compete ao Secretario do conselho:

    § 1º Redigir e assignar as actas das reuniões do mesmo conselho.

    § 2º Assignar com o Presidente a correspondencia do conselho.

    Art. 22. Não havendo unanimidade nas decisões do conselho fiscal, serão tomadas pela maioria dos pareceres concordes.

    Art. 23. São attribuições do gerente:

    § 1º A gerencia da Companhia, com poderes para proceder como melhor entender em beneficio da mesma Companhia.

    § 2º Dar cumprimento ás deliberações do conselho fiscal, podendo todavia, quando assim o entender, appellar de taes deliberações para a assembléa geral ordinaria, ou mesmo convocal-a extraordinariamente por si proprio se, havendo solicitado do conselho fiscal a convocação, este se recusar a effectual-a.

    § 3º Crear agencias e supprimil-as.

    § 4º Nomear e demittir os agentes, commandantes ou capitães de navios e todos os mais empregados, e marcar-lhes os respectivos ordenados.

    § 5º Assignar a correspondencia e os contractos, precedendo, quanto aos contractos, autorização do conselho fiscal.

    § 6º Organizar as tabellas de fretes e passagens.

    § 7º Ordenar as compras e as despezas ordinarias.

    § 8º Receber e despender os dinheiros da Companhia, collocando as sobras em conta corrente em um Banco.

    § 9º Assignar, com o Presidente do conselho fiscal, os cheques para a retirada do dinheiro.

    § 10. Assignar, com os transferentes e transferidos, ou seus representantes, os termos de transferencia de acções.

    § 11. Dirigir a escripturação, que deverá ser feita com methodo e clareza.

    § 12. Apresentar á assembléa geral dos accionistas um relatorio annual das operações da Companhia, acompanhado do balanço geral e da demonstração da conta de lucros e perdas.

    § 13. Propôr ao Conselho Fiscal e á assembléa geral o que julgar util ao bom andamento e prosperidade da Companhia.

CAPITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL.

    Art. 24. A assembléa geral, quando legalmente constituida, representa a totalidade dos accionistas, e suas deliberações, sendo tomadas de conformidade com estes estatutos, obrigam a todos, quér presentes quér ausentes.

    A assembléa geral será composta dos accionistas, cujas acções se acharem averbadas no livro respectivo trinta dias antes da data em que se verificar a assembléa.

    Art. 25. A assembléa geral não poderá constituir-se senão com accionistas que representem, pelo menos, a terça parte das acções emittidas, e com este numero resolverá sobre qualquer assumpto, com excepção do augmento do capital e dissolução da Companhia, devendo, nestes dous ultimos casos, cumprir-se o que determinam os arts. 3º e 5º.

    Art. 26. A assembléa geral será sempre presidida por accionista que não seja Director ou gerente, e eleito no acto por acclamação.

    Este Presidente completará a mesa, nomeando o Secretario e o escrutador.

    Art. 27. Não se reunindo numero sufficiente de accionistas na primeira convocação da assembléa geral, será annunciada segunda, e nesta se deliberará com o numero presente, o que se fará constar nos annuncios respectivos.

    E' expressamente vedado tratar nesta segunda reunião de objecto estranho ao que tiver motivado a primeira convocação.

    Art. 23. A ordem da votação será de um voto por cada 10 acções até 150, que terão 15 votos. Além deste numero nenhum voto mais se contará, seja qual fôr o numero de acções que o accionista possua ou represente por procuração, mandato este que só poderá ser conferido a accionista.

    A votação será por escrutinio secreto quando se tratar de eleições e responsabilidade de funccionarios, ou quando algum accionista o proponha e a assembléa geral assim o delibere.

    Art. 29. Os accionistas que possuirem menos de 10 acções poderão assistir ás assembléas geraes, propondo o que lhes parecer util e tomando parte nas discussões, mas não terão voto.

    Art. 30. Os accionistas podem fazer parte da assembléa geral, quér possuam as acções suas livres e desembaraçadas quér as tenham caucionadas ou em penhor mercantil.

    Art. 31. Compete á assembléa geral:

    § 1º Resolver ácerca de todos os negocios da Companhia aprovando-os ou reprovando-os.

    § 2º Reformar os presentes estatutos, devendo as alterações ser submettidas á approvação do Governo.

    § 3º Eleger o conselho fiscal, os supplentes e o gerente.

    § 4º Eleger a commissão de exame de contas, que será de tres membros.

    § 5º Resolver ácerca da elevação do capital e responsabilidade de funccionarios.

    § 6º Approvar ou reprovar as contas apresentadas pelo gerente e dar-lhe ou negar-lhe quitação.

    § 7º Destituir o conselho fiscal e o gerente, antes da época da eleição, havendo para isso motivos ponderosos e justificados.

    § 8º Resolver ácerca das propostas que lhe forem apresentadas pelo conselho fiscal, gerente e accionistas.

    § 9º Deliberar ácerca da continuação da Companhia, e bem assim da sua liquidação nos casos previstos nas leis geraes do paiz e nos presentes estatutos, e estabelecer o modo por que se ha de verificar a mesma liquidação.

    Art. 32. A assembléa geral reunir-se-ha duas vezes por anno, em sessão ordinaria, nos mezes de Janeiro e Março.

    Na primeira destas reuniões será apresentado pelo gerente o relatorio e as contas do anno findo, e eleita a commissão de exame de contas; e na segunda será discutido e votado o parecer da commissão referida.

    Além das reuniões a que este artigo se refere haverá as extraordinarias que forem convocadas pelo conselho fiscal, pelo gerente nos termos do art. 23, § 2º, ou requeridas por accionistas que representarem, pelo menos, um terço das acções emittidas.

    Nas reuniões ordinarias assim como extraordinarias, só se tratará do objecto ou objectos que tiverem motivado a convocação, salvo, nas ordinarias, qualquer proposta do Conselho fiscal ou do gerente, que será logo submettida á deliberação.

    Qualquer outra proposta só poderá ser resolvida em assembléa extraordinaria, expressamente convocada para este effeito, 15 dias depois da apresentação.

    Art. 33. As assembléas geraes serão sempre convocadas com anticipação, pelo menos, de cinco dias e por annuncios nas folhas diarias de maior circulação.

    Art. 34. A approvação das contas que forem apresentadas pelo gerente, votada em assembléa geral e sob parecer da respectiva commissão, importa para o gerente plena e geral quitação e para o conselho fiscal a desoneração de toda e qualquer responsabilidade.

CAPITULO V

DO FUNDO DE RESERVA E DOS DIVIDENDOS

    Art. 35. O fundo de reserva será formado de 2 % tirados dos lucros liquidos de cada semestre.

    Este fundo é exclusivamente destinado a fazer face ás perdas do capital social ou para substituil-o.

    Art. 36. Todos os semestres se levarão a credito da conta de - Deterioramento - 6 % do valor primitivo do material da Companhia, a fim de serem applicados aos reparos ou reconstrucção do material.

    Art. 37. As sommas destinadas para os fins a que se referem os dous artigos precedentes serão depositadas em um Banco, applicadas em apolices da divida publica, bilhetes do Thesouro, ou de acções de companhias acreditadas, conforme entender o conselho fiscal.

    Art. 38. Serão distribuidos aos accionistas, em dividendos semestraes pagos nos mezes de Janeiro e Julho, os lucros liquidos provenientes das operações effectivamente concluidas dentro do respectivo semestre e depois de feitas as deducções autorizadas nos presentes estatutos.

    Art. 39. Logo que o fundo de reserva attingir á somma de 20:000$000, não se fará mais senão a deducção destinada para deterioramento.

    Art. 40. Se o capital social se achar desfalcado em virtude de perdas sociaes, não se fará distribuição alguma de dividendos, emquanto o mesmo capital não fôr integralmente restaurado.

    Art. 41. Prescrevem em beneficio da companhia os dividendos que não forem reclamados no prazo de cinco annos, contados do primeiro dia que fôr fixado para o seu pagamento.

DISPOSIÇÕES GERAES

    Art. 42. Os accionistas carregadores terão direito a uma reducção no preço da tabella de frete que será arbitrada pelo gerente.

    Art. 43. O primeiro conselho fiscal é composto de Joaquim Antonio Guerreiro Lima, Domingos Antonio de Góes Pacheco e Vicente Alves do Soccorro; e supplentes, José Ribeiro de Freitas, Augusto Gomes Ferreira e Joaquim Marques da Costa.

    Art. 44. Fica desde já nomeado gerente durante os primeiros tres annos José Maria Teixeira de Azevedo.

    Art. 45. São agentes nos tres primeiros annos, nesta côrte Azevedo & Comp., e na cidade de Macahé Gervasio Manoel Pinto.

    Art. 46. Fica desde já autorizado o conselho fiscal e o gerente José Maria Teixeira de Azevedo a fazer acquisição do vapor nacional Conde d'Eu pela quantia de 60:000$000 no estado em que se acha, e a mandar proceder á factura de caldeiras e todos os mais reparos necessarios no referido vapor.

    DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

    Os accionistas obrigam-se pelo valor das acções que lhes foram distribuídas, sujeitando-se a todas as disposições dos presentes estatutos, que approvaram em assembléa geral e concedem ao conselho fiscal e ao gerente plenos poderes para requererem ao Governo Imperial a approvação dos mesmos estatutos e aceitar as alterações ou modificações que o Governo julgar convenientes.

    Rio de Janeiro, 11 de Dezembro de 1872. (Seguem-se as assignaturas.)


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1873


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1873, Página 201 Vol. 1 pt II (Publicação Original)