Legislação Informatizada - DECRETO Nº 5.135, DE 13 DE NOVEMBRO DE 1872 - Publicação Original

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DECRETO Nº 5.135, DE 13 DE NOVEMBRO DE 1872

Approva o regulamento geral para a execução da lei nº 2040 de 28 de Setembro de 1871.

Usando da attribuição que me confere o § 12 do art. 102 da Constituição Politica do Imperio, Hei por bem approvar o regulamento geral, que com este baixa, organizado para a execução da lei nº 2040 de 28 de Setembro do anno passado, e assignado por Francisco do Rego Barros Barreto, do Meu Conselho, Senador do Imperio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro, em treze de Novembro de mil oitocentos setenta e dous, quinquagesimo primeiro da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Francisco do Rego Barros Barreto.

Regulamento a que se refere o Decreto nº 5135 de 13 de Novembro de 1872

CAPITULO I

DOS FILHOS LIVRES DA MULHER ESCRAVA

    Art. 1º Os filhos da mulher escrava, nascidos no Imperio desde a data da lei nº 2040 de 28 de Setembro de 1871, são de condição livre. (Lei - art. 1º)

    Art. 2º Os assentamentos de baptismo dos filhos de mulher escrava devem mencionar o dia do nascimento.

    Art. 3º A declaração errada do parocho, que no assento de baptismo inscrever o filho livre de mulher escrava como de condição servil, é causa de multa ou punição criminal, conforme as circumstancias do facto.

    Paragrapho unico. Os parochos, para isentarem-se de responsabilidade, deverão exigir declaração escripta, ou simplesmente assignada, do senhor da mãi escrava, sobre as circumstancias necessarias ao assentamento de baptismo, e, na falta da referida declaração, bastará a que fôr feita verbalmente, pelo senhor ou quem o representar, ante duas testemunhas, que attestem ou assignem o assentamento.

    Art. 4º Quaesquer erradas declarações nos assentamentos de baptismo, em prejuizo da liberdade, deverão ser rectificadas pelos senhores ou possuidores das mãis escravas, perante o parocho respectivo e na matricula a que se refere o § 4º do art. 8º da lei.

    § 1º A rectificação espontanea, durante o primeiro anno de idade do prejudicado em sua liberdade, isenta de culpa.

    § 2º A mesma isenção aproveitará ao parocho, se dentro do dito prazo corrigir o engano ou erro, sendo seu; o que communicará ao senhor ou possuidor da mãi escrava e á estação fiscal encarregada da matricula.

    Art. 5º Os filhos da mulher escrava, livres pela lei, ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mãis até á idade de 8 ou de 21 annos, conforme as condições da mesma lei.

    Art. 6º Até á idade de 8 annos completos, os senhores das mãis são obrigados a crial-os e a tratal-os (Lei - art. 1º § 1º), sob pena de pagarem, desde o dia do abandono, salvo o caso de penuria, os alimentos que, a prudente arbitrio, forem taxados pelo juizo de orphãos, até que os menores sejam entregues a alguma das associações mencionadas na lei, ás casas de expostos ou ás pessoas que forem encarregadas de sua educação.

    Paragrapho unico. Se o abandono do menor se revestir de circumstancias que o caracterisem crime, será como tal processado e punido, e mais serão taxados os alimentos.

    Art. 7º Ainda que falleçam as mãis antes que os filhos completem os 8 annos de idade, subsistem as disposições do artigo e paragrapho antecedentes.

    Art. 8º A cessão de menores, a que refere-se o art. 2º da lei, não poderá ser feita sem o assentimento do juiz de orphãos; nem antes da idade de tres annos (Ord. liv. 4º, tit. 99 in princ.), excepto se a mãi houver fallecido, ou se tiver tal impedimento, que não possa criar, ou se houver associação beneficente que se preste a receber as crianças antes daquella idade.

    Art. 9º A mulher escrava, que obtiver sua liberdade, tem o direito de conduzir comsigo os filhos menores de 8 annos (Lei - art. 1º § 4º), os quaes ficarão desde logo sujeitos á legislação commum. Poderá, porém, deixal-os em poder do senhor, se este annuir a ficar com elles (Lei - ibid).

    Art. 10. A declaração do senhor, para habilital-o a requerer ao governo a indemnização pecuniaria em titulo de renda de 600$000 com juro annual de 6 %, será feita ante qualquer autoridade judiciaria, em fórma de protesto, dentro de 30 dias a contar daquelle em que o menor attingir á idade de 8 annos; e, se o não fizer então, ficará entendido que opta pelo arbitrio de utilisar-se dos serviços do mesmo menor até á idade de 21 annos completos. (Lei - art. 1º § 1º).

    § 1º O protesto será intimado ao agente da fazenda nacional, no districto da jurisdicção do juiz, que o houver mandado tomar por termo; e , na falta, ao agente fiscal que fôr mais vizinho, por carta precatoria.

    § 2º Não poderá ser recebido protesto para ser reduzido a termo, se não forem juntas ao requerimento inicial as respectivas certidões de matricula.

    Art. 11. Estando em termos o requerimento de protesto, o juiz ordenará a exhibição do menor, a quem interrogará, e procederá ás diligencias necessarias para verificar a identidade de pessoa. O agente fiscal deverá ser citado para assistir a todas essas diligencias.

    Art. 12. Se o agente fiscal reconhecer que não ha direito á indemnização, ou porque de facto o protesto haja sido requerido fóra do prazo legal, ou porque o menor exhibido não seja o mesmo individuo mencionado nas certidões de baptismo e de matricula, ou emfim porque existam outros quaesquer fundamentos juridicos, requererá, dentro de 10 dias, que seja tomado por termo o seu contraprotesto nos mesmos autos.

    Paragrapho unico. A falta de contraprotesto por parte do agente fiscal não prejudica á fazenda nacional, se sobrevier o conhecimento de algum dos fundamentos que obstem á indemnização. O agente fiscal responderá por qualquer damno a que der causa por dólo, culpa ou negligencia.

    Art. 13. O processo original será remettido á thesouraria de fazenda na respectiva provincia, e ao thesouro nacional na côrte, extrahido traslado para existir no cartorio.

    Art. 14. A thesouraria de fazenda em sessão da junta examinará o processo; e, em vista das provas dos autos, de outras que exigir, sendo precisas, e depois de ouvido, por escripto, o procurador fiscal, reconhecerá ou denegará o credito, interpondo, no caso de denegação, recurso suspensivo para o thesouro.

    Art. 15. Sendo reconhecidos os creditos, a thesouraria emittirá os titulos de renda, logo que lhe sejam fornecidos pelo thesouro; e ficarão vencendo o juro annual de 6 % desde o dia do reconhecimento da divida. Semelhantemente procederá o thesouro na côrte.

    Estes titulos de renda se considerarão extinctos no fim de 30 annos. (Lei - art. 1º § 1º)

    Art. 16. Os serviços optados, em conformidade da lei, são intransferiveis, salvos os casos dos § § 5º e 7º do art. 1º da mesma lei, ou, se o menor fôr de idade superior a 12 annos, havendo accôrdo com assistencia de um curador ad hoc e consentimento do juiz de orphãos.

    Art. 17. O menor poderá remir-se do onus de servir, mediante prévia indemnização pecuniaria , que por si ou por outrem offereça ao senhor de sua mãi, procedendo-se á avaliação dos serviços pelo tempo que lhe restar a preencher, se não houver accôrdo sobre o quantum da mesma indemnização. (Lei - art. 1º § 2º).

    Paragrapho unico. O processo de arbitramento correrá perante o juizo de orphãos, e será identico ao do art. 39 deste regulamento. O preço será taxado, pura e simplesmente, sobre as condições da idade, saude e profissão. O menor será representado ou acompanhado por um curador ad hoc, nomeado pelo juiz. A appellação do senhor não terá effeito suspensivo.

    Art. 18. Cessa a prestação dos serviços dos filhos das escravas, antes de atingirem elles a idade de 21 annos, se, por sentença do juizo criminal, reconhecer-se que os senhores das mãis os maltratam, infligindo-lhes castigos excessivos. (Lei - art. 1º § 6º)

    Art. 19. A privação de alimentos, ou a sujeição a actos immoraes, produzirá effeito igual ao do artigo antecedente.

    Paragrapho unico. O juiz de orphãos, verificando administrativamente, com citação da parte interessada a existencia destes factos, si julgar que ha fundamento bastante para a acção no juizo commum, nomeará depositario e curador ao menor.

    Art. 20. No caso de alienação da mulher escrava, seus filhos livres, menores de 12 annos, a acompanharão, sob pena de nullidade do çontracto, havendo-o; ficando o novo senhor da escrava subrogado nos direitos e obrigações do antecessor. (Lei - art. 1º § 5º).

    Paragrapho unico. A disposição deste artigo, especial aos filhos livres, não prejudica nem limita a do § 7º do art. 4º da lei, relativa aos filhos escravos.

    Art. 21. O direito conferido aos senhores no § 1º do art. 1º da lei, transfere-se nos casos de successão necessaria, devendo o filho da escrava prestar serviços á pessoa a quem nas partilhas pertencer a mesma escrava. (Lei - art. 1º § 7º).

    Art. 22. Incumbe tambem aos senhores criar e tratar os filhos que as filhas livres de suas escravas tenham durante o prazo da prestação de serviços. (Lei - art. 1º § 3º).

    § 1º Essa obrigação cessa logo que findar a prestação dos serviços, e os filhos ficarão desde logo sujeitos á legislação commum, salva a disposição do paragrapho seguinte. (Lei - ibid.)

    § 2º Se as mãis fallecerem antes de findo o prazo da prestação de serviços, seus filhos deverão ser postos á disposição do governo, que lhes dará qualquer dos destinos designados no art. 2º da lei. (Lei - ibid).

CAPITULO II

DO FUNDO DE EMANCIPAÇÃO

    Art. 23. Serão annualmente libertados, em cada provincia do Imperio, tantos escravos quantos corresponderem á quota disponivel do fundo destinado para emancipação. (Lei - art. 3º)

    § 1º O fundo de emancipação compõe-se:

    I. Da taxa de escravos; (Lei - ibid. § 1º)

    II. Dos impostos geraes sobre transmissão de propriedade dos escravos; (Lei - ibid.)

    III. Do producto de seis loterias annuaes, isentas de impostos, e da decima parte das que forem concedidas para correrem na capital do Imperio; (Lei - ibid.).

    IV. Das multas impostas em virtude deste regulamento; (Lei - ibid.)

    V. Das quotas que sejam marcadas no orçamento geral e nos provinciaes e municipaes; (Lei - ibid.)

    VI. Das subscripções, doações e legados com esse destino. (Lei - ibid.)

    § 2º As quotas marcadas nos orçamentos provinciaes e municipaes, assim como as subscripções, doações e legados, se tiverem destino local, serão applicadas á emancipação nas provincias, comarcas, municipios e freguezias designadas. (Lei ibid. - § 2)

    Art. 24. Para distribuição do fundo de emancipação, o governo tomará como base a estatistica organizada em conformidade do decreto nº 4835 do 1º de Dezembro de 1871.

    Paragrapho unico. Aos presidentes de provincia será remettida copia parcial da estatistica da população escrava na respectiva provincia, por municipios e por freguezias.

    Art. 25. O fundo de emancipação será distribuido annualmente pelo municipio neutro e pelas provincias do Imperio na proporção da respectiva população escrava.

    Paragrapho unico. Não serão contempladas no fundo divisivel a importancia das quotas decretadas nos orçamentos provinciaes e municipaes, e bem assim a importancia das subscripções, doações e legados, se tiverem destino local. Essas quantias serão applicadas á emancipação na fórma determinada no § 2º do art. 3º da lei, e no § 2º do art. 23 deste regulamento.

    Art. 26. Os presidentes de provincia, reunindo a quota distribuida e as quantias destinadas pelas assembléas provinciaes e por particulares á emancipação nas respectivas provincias, sem designação de localidade, dividirão o total pelos municipios e freguezias na proporção da população escrava.

    Art. 27. A classificação para as alforrias pelo fundo de emancipação será a seguinte:

    I. Familias;

    II. Individuos.

    § 1º Na libertação por familias, preferirão:

    I. Os conjuges que forem escravos de differentes senhores;

    II. Os conjuges, que tiverem filhos, nascidos livres em virtude da lei e menores de oito annos;

    III. Os conjuges, que tiverem filhos livres menores de 21 annos;

    IV. Os conjuges com filhos menores escravos;

    V. As mãis com, filhos menores escravos;

    VI. Os conjuges sem filhos menores.

    § 2º Na libertação por individuos, preferirão:

    I. A mãi ou pai com filhos livres;

    II. Os de 12 a 50 annos de idade, começando pelos mais moços no sexo feminino, e pelos mais velhos no sexo masculino.

    Na ordem da emancipação das familias e dos individuos, serão preferidos: 1º, os que por si ou por outrem entrarem com certa quota para a sua libertação; 2º, os mais morigerados a juizo dos senhores. Em igualdade de condições a sorte decidirá.

    Art. 28. Haverá em cada municipio, para classificação dos escravos que possam ser libertados, uma junta composta do presidente da camara, do promotor publico e do collector. No municipio em que não residir o promotor servirá o seu ajudante, e onde não houver collector, o chefe da repartição fiscal encarregado da matricula ou o empregado por este designado. O presidente da camara será substituido, em seus impedimentos, pelo vereador immediato na votação e que esteja no exercício do cargo.

    Art. 29. O presidente da junta será o da camara municipal ou o seu substituto legal.

    Um dos escrivães do juizo de paz da freguezia, em que se reunir a junta, servirá nos trabalhos desta, á requisição do presidente.

    A falta ou impedimento do escrivão será supprida pelo cidadão que o mesmo presidente nomear.

    Art. 30. A junta deverá reunir-se annualmente na primeira dominga do mez de Julho, precedendo annuncio por editaes. A primeira reunião, porém, verificar-se-ha na 1ª dominga de Abril de 1873.

    Qualquer pessoa do povo poderá dirigir á junta as informações que julgue dignas de consideração para o trabalho que incumbe á mesma junta.

    Art. 31. O ministerio da agricultura, commercio o obras publicas fornecerá os livros necessarios para os trabalhos das juntas e lançamento do quadro das classificações dos escravos, numerados, rubricados e encerrados do mesmo modo que os da matricula dos escravos, na fórma do art. 8º do decreto nº 4835 do 1º de Dezembro de 1871.

    Art. 32. Para a classificação, além dos esclarecimentos que os senhores ou possuidores de escravos podem espontaneamente prestar-lhe, a junta os exigirá, quando lhe sejam precisos, dos mesmos senhores e possuidores, dos encarregados da matricula e de quaesquer funccionarios publicos; e observará as seguintes disposições:

    § 1º Os alforriados com a clausula de serviços durante certo espaço de tempo, ou sujeitos a cumprir alguma outra especificada condição, não serão contemplados na classificação; e, se classificados, serão omittidos, salvo o caso do art. 90, § 3º

    § 2º Embora classificados serão preteridos na ordem da emancipação:

    I. Os indiciados nos crimes mencionados na lei de 10 de Junho de 1835;

    II. Os pronunciados em summario de culpa;

    III. Os condemnados;

    IV. Os fugidos ou que o houverem estado nos seis mezes anteriores á reunião da junta;

    V. Os habituados á embriaguez.

    § 3º O escravo que estiver litigando pela sua liberdade, não será contemplado na execução do art. 42; mas ser-lhe-ha mantida a preferencia, que entretanto houver adquirido até a decisão do pleito, se esta lhe fôr contraria.

    Art. 33. Feita a classificação, e affixadas ás portas das matrizes do municipio para conhecimento dos interessados, serão extrahidas duas copias, uma para ser remettida ao juiz de orphãos do termo e outra ao presidente da provincia. Na côrte esta segunda copia será remettida ao ministro da agricultura, commercio e obras publicas. As copias deverão ser rubricadas, em todas as paginas, pelos membros da junta.

    Paragrapho unico. No prazo de 15 dias, depois de concluidos os trabalhos, o livro da classificação será tambem remettido ao juizo de orphãos, que será o da 1ª vara, onde houver mais de um.

    Art. 34. Perante o juiz de orphãos deverão os interessados apresentar suas reclamações dentro do prazo de um mez, depois de concluidos os trabalhos da junta. As reclamações versarão sómente sobre a ordem de preferencia ou preterição na classificação.

    Paragrapho unico. Se houver reclamações, o juiz de orphãos as decidirá dentro do prazo de 15 dias.

    Art. 35. Não havendo reclamações, ou decididas estas pelo juiz de orphãos, considerar-se-ha concluida a classificação.

    Art. 36. São competentes para reclamar e recorrer na fórma do art. 34:

    I. O senhor ou o possuidor do escravo;

    II. O escravo, representado por um curador ad hoc.

    Paragrapho unico. As reclamações são isentes de sello e de emolumentos. (Lei - art. 4º § 6º).

    Art. 37. Concluida a classificação do modo acima prescripto, o collectos, ou o empregado fiscal de que falla o art. 28, promoverá, nas comarcas geraes, ante o juizo municipal, salva a alçada para o julgamento final, e, nas comarcas especiaes, ante o juizo de direito, o arbitramento da indemnização, se esta não houver sido declarada pelo senhor, ou, se declarada, não houver sido declarada pelo senhor, ou, se declarada, não houver sido julgada razoavel pelo mesmo agente fiscal, ou se não houver avaliação judicial, que o dispense.

    Art. 38. São partes para o arbitramento o senhor e o empregado fiscal mencionado nos artigos antecedentes.

    No caso de condominio, os condominos presentes deverão combinar entre si para que uma só pessoa os represente, sob pena de serem considerados revéis. Assim, nos casos de usufructo e de fidei-commisso.

    Nos casos de penhor com ou sem a clausula de constituti, e de hypotheca convencional ou judicial, o credor ou exequente tem preferencia ao senhor para ser parte no arbitramento. Se forem mais de um credor ou exequente, procederão como os condominios.

    Nas massas fallidas, o curador fiscal e depois a administração representarão o senhor. Assim, na cessão civil de bens.

    Art. 39. O processo de arbitramento consistirá sómente na nomeação dos louvados, na decisão da suspeição de algum delles, se fôr allegada, e na resolução dos arbitradores, seguindo-se o disposto nos arts. 192, 193, 195, 196, 197, 201 e 202 do regulamento nº 737 de 23 de Novembro de 1830.

    O juiz nomeará arbitradores á revelia das partes, na ausencia do senhor, credor e exequente fóra do termo, sem ter deixado procurador, e bem assim no caso de litigio sobre o dominio. O terceiro arbitrador é obrigado a concordar com qualquer dos louvados divergentes, se não houver accôrdo.

    Paragrapho unico. Feito o arbitramento, o juiz respectivo o remetterá immediatamente ao de orphãos, de que trata o art. 42.

    As custas do processo do arbitramento correrão por conta do fundo de emancipação.

    Art. 40. Nas avaliações observar-se-hão as seguintes regras:

    § 1º O preço da indemnização será taxado sobre as condições da idade, saude e profissão.

    § 2º Os escravos sujeitos a usufructo ou a fidei commisso serão avaliados sem attenção a qualquer desses onus; o seu preço, porém, os representará para todos os effeitos juridicos como se permanecessem escravos, salvas as seguranças a que, segundo a legislação civil, julgue-se com direito o proprietario ou o successor.

    § 3º Os escravos, que houverem de ser vendidos judicialmente ou que ainda não houverem sido adjudicados em partilha por sentença final, não dependem de arbitramento; prevalecerá a avaliação judicial ou a do inventario.

    § 4º Na avaliação será levada em conta, para ser deduzida, qualquer quantia que o escravo houver pago ao senhor para sua alforria, devendo ser declarada essa circumstancia no termo da avaliação. Qualquer fraude, neste caso, será punida nos termos do codigo criminal.

    Art. 41. A verificação do valor dos escravos por algum dos meios precedentes deverá estar concluida até 31 de Dezembro de cada anno, e comprehenderá tantos escravos classificados, quantos possam ser libertados pela importancia do fundo de emancipação.

    Art. 42. Os juizes de orphãos, em audiencia previamente annunciada, declararão libertos, e por editaes o farão constar, todos os escravos que, segundo a ordem da classificação, possam ser alforriados pela respectiva quota de emancipação; e entregar-lhes-hão suas cartas pelo intermédio dos senhores; assim como remetterão aos presidentes, nas provincias, e ao ministerio da agricultura, commercio e obras publicas, na côrte, uma relação em duplicada, a fim de ser ordenado o pagamento, publicando-se os nomes do senhor e do liberto por edital impresso nas gazetas do lugar e affixado na porta da matriz de cada parochia, com antecedencia de um mez, para garantir direitos de quem quér que os tenha sobre o preço do mesmo liberto.

    Art. 43. Dentro das forças da quota do fundo de emancipação, a alforria declarada pelos juizes de orphãos é irretratavel e independente de quaesquer recursos, com tanto que seja seguida a ordem das classificações.

    Paragrapho unico. No caso de inversão da ordem das classificações, o culpado será multado em 100$000, repetindo-se esta multa tantas vezes quantos forem os escravos prejudicados; e no caso de fraude, será punido criminalmente.

    Art. 44. Decorrido um mez depois da expedição das cartas de liberdade ria fórma do art. 42, pelas thesourarias de fazenda nas provincias, e pelo thesouro na côrte, será entregue o preço aos individuos mencionados nas relações dos juizes de orphãos, se áquellas repartições não houver sido apresentada requisição judicial, ou reclamação fundada de qualquer interessado para o deposito.

    Paragrapho unico. Em geral o preço dos escravos sujeitos a penhor, hypotheca judicial, hypotheca legal especialisada ou convencional, deposito, ou outros quaesquer onus, em que o mesmo preço possa ser subrogado, não será entregue senão em virtude de requisição judicial fundada, conforme o caso, sobre accôrdo ou sobre audiencia contenciosa das partes.

    Art. 45. As sobras das quotas das differentes parochias do mesmo municipio serão reunidas para a libertação de um ou mais escravos immediatos nas classificações, que tiverem em seu favor a preferencia estatuida no art. 27.

    § 1º A applicação do sobredito remanecente se fará ás familias e individuos que nas diferentes classificações representem esse valor, segundo os preços accordados ou arbitrados; observada a preferencia estabelecida no art. 27. Em igualdade de condições, decidirá a sorte.

    § 2º Se a quantia das sobras fôr absolutamente insufficiente para a libertação da familia ou individuo immediato nas classificações, conforme o paragrapho antecedente, ou se, applicada a um ou mais escravos, deixar algum resto, e não houver quem queira, em um ou em outro caso, reforçar esse residio até completar o preço de uma alforria, nem escravo que o possa fazer com seu proprio peculio, será reservada essa quantia a favor do municipio para accrescer á quota do anno seguinte.

    Art. 46. O escravo é obrigado a contribuir, até á importancia do preço de sua alforria ou da familia a que pertencer, com as doações, legados e heranças que tenha obtido com esse destino especial. Os que não quizerem fazel-o perderão o lugar de ordem na classificação e serão preteridos.

    Art. 47. Os escravos mudados para o municipio depois da ultima classificação só poderão ser ahi contemplados na do anno immediato.

    Paragrapho unico. Em compensação não perderão no municipio, da qual foram mudados, o seu numero de ordem para a libertação.

CAPITULO III

DO PECULIO E DO DIREITO Á ALFORRIA

    Art. 48 E' permittido ao escravo a formação de um peculio com o que lhe provier de doações, legados e heranças, e com o que, por consentimento do senhor, obtiver do seu trabalho e economias. (Lei - art. 4º)

    Paragrapho unico. As doações para a liberdade são independentes de escriptura publica e não são sujeitas a insinuação.

    Art. 49. O peculio do escravo será deixado em mão do senhor ou do possuidor, se este o consentir, salva a hypothese do art. 53, vencendo o juro de 6 % ao anno; e outrosim poderá, com prévia autorização do juizo de orphãos, ser recolhido pelo mesmo senhor ou possuidor ás estações fiscaes, ou a alguma caixa economica ou banco de depositos, que, inspire sufficiente confiança.

    Paragrapho unico. E' permittido ao senhor receber, com o mesmo juro de 6 %, o peculio do escravo, á medida que este o fôr adquirindo, como indemnização parcial de sua alforria, urna vez que o preço seja fixada previamente em documento entregue ao mesmo escravo.

    No caso de condominio, poderá ficar em mão do condomino que o escravo preferir.

    Art. 50. O senhor ou possuidor do escravo é obrigado a declarar a existencia do peculio na occasião da matricula dos escravos ou de quaesquer averbações nesta, ou quando haja de effectuar contractos, inventarios ou partilhas sobre elles, ou solicitar passaporte para os mesmos, a fim de que esta sua declaração seja inserta nos respectivos livros, instrumentos, autos ou papeis.

    Art. 51. O peculio do escravo, no caso de transferencia de dominio, passará para as mãos do novo senhor, ou terá qualquer dos destinos mencionados no art. 49.

    Paragrapho unico. A transferencia de dominio comprehende a adjudicação por partilha entre herdeiros ou socios; a adjudicação nestes casos não se fará sem exhibição do peculio ou documento do seu deposito.

    Art. 52. Quando haja impossibilidade de ser resgatado do poder do senhor o peculio do escravo, este tem direito á alforria indemnizando o resto do seu valor, com serviços prestados por prazo não maior de 7 annos. O preço da alforria será fixado por arbitramento nos termos do § 2º do art. 4º da lei, se não existir avaliação judicial, que deverá prevalecer.

    Art. 53. O juizo de orphãos tem a faculdade de impedir que o peculio permaneça era poder do, senhor ou do possuidor do escravo, ou de qualquer estabelecimento particular onde tenha sido depositado, se reconhecer que não ha sufficiente garantia, expedindo mandado para a comminação de sequestro.

    Paragrapho unico. Os tutores e os curadores, e em geral quaesquer pessoas, que não são senhores ou possuidores de escravos, são obrigados a exhibir, sob pena de sequestro, o peculio e juros pertencentes a escravos que estiverem sob sua administração, sempre que o juizo de orphãos o determinar, independentemente da circumstancia da falta de garantia.

    Art. 54. Em concurso de credores, o escravo pertencerá á classe de credores de dominio, por seu peculio e juros, considerado este sob administração.

    Art. 55. O peculio, recolhido ao thesouro nacional, e ás thesourarias de fazenda, será equiparado a dinheiro de orphãos.

    Art. 56. O escravo que, por meio de seu peculio, puder indemnizar o seu valor, tem direito á alforria. (Lei - art. 4º § 2º)

    § 1º Em quaesquer autos judiciaes, existindo avaliação e correspondendo a esta a somma do peculio, será a mesma avaliação o preço da indemnização (Lei - art. 4º 2º), para ser decretada ex officio a alforria.

    § 2º Em falta de avaliação judicial ou de accôrdo sobre o preço, será este fixado por arbitramento. (Lei - art. 4º § 2º)

    Art. 57. Não poderá requerer arbitramento, para execução do art. 4º, § 2º da lei, o escravo que não exhibir, no mesmo acto em juizo, dinheiro ou titulos de peculio, cuja somma equivalha ao seu preço razoavel.

    § 1º Não é permittida a liberalidade de terceiro para a alforria, excepto como elemento para a constituição do peculio: e só por meio deste e por iniciativa do escravo será admittido o exercicio do direito á alforria, nos termos do art. 4º, § 2º da lei.

    § 2º Prevalecem na libertação, por meio do peculio, as regras estatuidas no paragrapbo unico do art. 44, quanto á entrega do preço do escravo alforriado.

    Art. 58. Além das regras do processo de arbitramento prescriptas nos arts. 39 e 40 deste regulamento, observar-se-hão mais as seguintes em execução do citado § 2º do art. 4º da lei:

    § 1º O curso do dito processo não será prejudicado por outros trabalhos judiciarias de natureza civil.

    § 2º No arbitramento figurará por parte do escravo um curador nomeado pelo juiz. Quanto ao senhor, ou a quaesquer interessados no valor do escravo, observar-se-ha o disposto no art. 38.

    § 3º Na avaliação dos escravos, cuja liberdade esteja promettida para certa época, ou até que se cumpra especificada condição, se deverá attender, para a fixação real do seu valor, a estas circumstancias como favoraveis ao libertando.

    Art. 59. Por morte do escravo, metade do seu peculio pertencerá ao conjuge sobrevivente, se o houver, e a outra metade se transmittirá aos seus herdeiros, conforme a lei civil. Na falta de herdeiros e do conjuge, o peculio será adjudicado ao fundo de emancipação geral. (Lei - art. 4º § 1º)

    Fica subentendido que todo o peculio pertencerá ao conjugo sobrevivente, se o escravo não tiver outros herdeiros.

    Art. 60. Por fallecimento do escravo, deixando peculio e herdeiro escravo ou menor livre, o juiz de orphãos, tomando a declaração do senhor ou possuidor, mandará lavrar auto da existencia do dito peculio, no qual o partilhará sem mais formalidade pelos herdeiros, ou o adjudicará ao fundo de emancipação geral. Só levantando-se questão contenciosa, deixar-se-ha de observar este processo summarissimo, que fica isento de sello e custas.

CAPITULO IV

DA CLAUSULA E DOS CONTRACTOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

    Art. 61. E' permittido ao escravo, em favor de sua liberdade, contractar com terceiro a prestação de futuros serviços, por tempo que não exceda de sete annos, mediante o consentimento do senhor e approvação do juiz de orphãos. (Lei - art. 4º § 3º).

    Art. 62. O escravo que pertencer a condominos, e fôr libertado por um destes, terá direito á sua alforria, indemnizando os outros senhores da quota do valor que lhes pertencer. Esta indemnização poderá ser paga em serviços prestados por prazo não maior de sete annos, em conformidade do artigo antecedente. (Lei - art. 4º § 4º)

    Paragrapho unico. Nesta hypothese o exercido do direito do escravo não depende do consentimento dos outros condominos.

    Art. 63. A alforria com a clausula de serviços durante certo tempo não ficará annullada pela falta de implemento da mesma clausula.

    Em geral, os libertos com a clausula de prestação de serviços durante certo tempo, e os que adquirirem a sua alforria mediante indemnização com futuros serviços, são obrigados a taes serviços, sob pena de serem compellidos a prestal-os nos estabelecimentos publicos, ou por contracto a particulares (Lei - art 4º § 5º), mediante intervenção do juiz de orphãos.

CAPITULO V

Das Associações

    Art. 64. Os juizes de orphãos poderão entregar a associações autorizadas pelo governo os filhos de escravas, nascidos desde a dela da lei que sejam cedidos ou abandonados pelos senhores, ou tirados do poder destes em virtude dos arts. 18 e 19 do presente regulamento. (Lei-art. 2º)

    § 1º A essas associações poderão ser entregues tambem os filhos das filhas livres de escravas. (Lei - art. 1º § 3º)

    § 2º Na falta de associações ou de estabelecimentos creados para tal fim, os menores poderão ser entregues ás casas de expostos, ou a particulares, aos quaes os juizes de orphãos encarregarão a sua educação. (Lei - art. 2º § 3º)

    Art. 65. As associações, as casas de expostos, ou os particulares terão direito aos serviços gratuitos dos menores até á idade de 21 annos, e poderão alugar esses serviços; mas têm a obrigação:

    1º De criar e tratar os mesmos menores;

    2º De constituir para cada um delles um peculio, consistente na quota que para esse fim fôr marcada;

    3º De procurar-lhes, findo o tempo de serviço, apropriada collocação. (Lei - art. 2º §§ 1º e 3º)

    § 1º As associações são sujeitas á inspecção dos juizes de orphãos, quanto aos menores sómente (Lei - art. 2º § 2º); devendo dar annualmente conta das obrigações que a lei lhes incumbe, e exhibir, para ser recolhido ao cofre dos orphãos, o peculio dos mesmos menores. Os particulares e as casas de expostos devem igualmente prestar contas e exhibir o peculio, qual fôr contractado.

    § 2º A's associações, ás casas de expostos e aos particulares são applicaveis as disposições dos arts. 18 e 19 deste regulamento, quér no caso de utilisarem-se directamente dos serviços dos menores, quér no caso de alugarem esses serviços, se não providenciarem, dentro de prazo assignado após a intimação, a respeito dos mesmos menores. O juiz decretará ex oficio deposito, se houver perigo; e, para ordenal-o, é competente qualquer autoridade judiciaria.

    § 3º Os contractos de aluguel dos serviços serão feitos sob a inspecção do juiz de orphãos, sómente para verificar as suas condições legaes e a idoneidade do locatario, a fim de prevenir os factos mencionados nos arts. 18 e 19. O juiz de orphãos recusará a pessoa do locatario, cujo procedimento ou profissão não garantir a vida, a saude e a moralidade do menor.

    Só poderão ser alugados os serviços dos menores que houverem completado 8 annos de idade.

    § 4º Igualmente é-lhes applicavel o disposto no art. 17, para o effeito de poderem os menores remir-se do onus de servir, mediante prévia indemnização. Desde o momento da remissão ficarão sujeitos á legislação commum, que rege os menores em geral.

    Art. 66. No juizo de orphãos deverá existir um livro especial, aberto, encerrado, numerado e rubricado pelo juiz, para a matricula dos menores entregues em virtude do art. 2º da lei ás associações, ás casas de expostos e aos particulares. Nesse livro constará o nascimento, a filiação, a associação, estabelecimento ou particular, que aceitou o menor, se foi cedido pelo senhor de sua mãi, se for tirado do poder do mesmo, ou abandonado, em que data, e quilos as causas; e outrosim a remissão de serviços, a emancipação por maioridade, o obito, se o individuo houver fallecido antes de ser collocado em conformidade do art. 2º, § 1º da lei. Annualmente serão averbadas no respectivo registro todas as circunstancias sobre a pessoa do menor e sobre o seu peculio.

    § 1º O livro especial não dispensa o processo da tomada de contas, em autos.

    § 2º Se dous forem os escrivães, o governo, na côrte, e os presidentes, nas provincias, designarão qual deverá ser o encarregado desse serviço.

    § 3º As custas do processo de contas serão pagas pelas associações, estabelecimentos ou particulares, a quem forem entregues os menores.

    Art. 67. O juizo de orphãos fiscalisará a instrucção primaria e a educação religiosa dos menores, quér exigindo das associações, das casas de expostos e dos particulares o cumprimento dessa obrigação, quér impondo-a aos locatarios de serviços nos respectivos contractos.

    Art. 68. Fica salvo ao governo o direito de mandar recolher os referidos menores aos estabelecimentos publicos, transferindo-se neste caso para o Estado as obrigações que o § 1º do art. 2º da lei impõe ás associações autorizadas. (Lei - art. 2º § 4º)

    Não entende-se, porém, que o governo possa retirar do poder das associações, das casas de expostos e dos particulares os menores já entregues em virtude do art. 2º da lei, salvo o caso do art. 65, § 2º.

    Art. 69. Além das associações encarregadas da educação dos menores, são tambem sujeitas á inspecção dos juizes de orphãos as sociedades de emancipação já organizadas e que de futuro se organizarem. (Lei - art. 5º)

    § 1º Essa inspecção limita-se ao exame animal das contas entre as sociedades e cada um dos manumittidos, de accôrdo com os estatutos ou com os respectivos contractos.

    § 2º Todavia, os juizes de orphãos poderão prover, sempre que o julgarem necessario, sobre o tratamento dos manumittidos, em relação á sua moralidade, vida e saude.

    Art. 70. As sociedades de emancipação terão privilegio sobre os serviços dos escravos, que libertarem, para indemnização do preço da compra. (Lei - art. 5º paragrapho unico.)

    § 1º Esses serviços não são devidos durante prazo maior de sete annos, qualquer que seja o valor da indemnização. Será descontado no prazo o tempo de prisão criminal e de fuga.

    Os menores de 21 annos completarão essa idade em poder das sociedades, ainda que excedam o prazo prescripto, salvo o caso do paragrapho seguinte. Em relação a estes, as sociedades de emancipação são equiparadas ás associações do art. 64 para todos os effeitos juridicos.

    § 2º Os manumittidos poderão remir-se do onus de servir, mediante prévia indemnização pecuniaria, que por si ou por outrem offereçam á sociedade, com a cautela do art. 57, se o requererem em juizo.

    Se não houver accôrdo sobre o quantum da indemnização, será esta calculada sobre o preço da compra, dividido pelos annos de serviço para que seja paga pelo tempo que ainda restar.

    As sociedades têm direito ao accrescimo de 18 %, sobre o preço total despendido, qualquer que seja o tempo decorrido.

    Esta disposição applicar-se-ha, em geral, a todos os escravos libertados por preço certo, com a clausula ou contracto de prestação de serviços.

    § 3º As sociedades de emancipação têm o direito de usar da providencia permittida no art. 4º § 5º da lei e mencionada no art. 63 deste regulamento.

    Art. 71. Aos manumittidos por sociedades e por particulares, com a clausula ou contracto de prestação de serviços, é applicavel tudo o que na lei e neste regulamento está determinado quanto á formação, guarda e disposição do peculio.

    Art. 72. No juizo de orphãos haverá um livro especial, igual ao do art. 66 deste regulamento, para a matricula dos escravos libertados por indemnização do seu preço com a clausula da prestação de serviços, quér por sociedades, quér por individuos. No registro de cada um liberto, além do nascimento e filiação constara o nome do que foi seu senhor, o numero, de ordem na matricula especial, a data e o municipio em que esta foi feita, a associação ou particular que o libertou, o seu preço, o tempo de prestação de serviços e a sua aptidão; e outrosim a remissão ou o obito, se houver fallecido antes de completar o tempo de serviço. Annualmente serão averbadas no respectivo registro todas as circumstancias sobre a pessoa do liberto e sobre o seu peculio.

    Os manumittidos, cujo tempo de serviço houver de completar-se antes da maioridade, serão matriculados em outro livro especial, que será appenso ao anterior.

    O mais como nos §§ 1º, 2º e 3º do art. 66.

    Paragrapho unico. A séde da sociedade ou a residencia do particular, que libertar escravos com a clausula ou contracto de serviços, indemnizando seu valor, firma a competencia do respectivo juizo de orphãos para a matricula. Assim, relativamente ás associações para menores livres, filhos de escravas.

    Art. 73. O § 3º do art. 1º da lei amplia-se ás associações, casas de expostos e particulares, para o effeito de ser acautelada a sorte dos filhos das menores livres e das menores sujeitas á prestação de serviços.

    Art. 74. O governo garante ás associações a concessão gratuita de terrenos devolutos, mediante as condições que estabelecer em regulamentos especiaes, para a fundação de colonias agricolas ou estabelecimentos industriaes, em que sejam empregados os libertos e se cure da educação dos menores.

    Igualmente garante ás associações, pelo preço minimo, a concessão de terrenos devolutos para fundação de estabelecimentos ruraes, que as mesmas associações destinem para serem vendidos a immigrados.

CAPITULO VI

DOS LIBERTOS PELA LEI

    Art. 75. São declarados libertos:

    I. Os escravos pertencentes á nação, dando-lhes o governo a occupação que julgar conveniente:

    II Os escravos dados em usufructo á corda;

    III Os escravos das heranças vagas;

    IV. Os escravos abandonados por seus senhores. (Lei - art. 6º §§ 1º a 4º)

    § 1º Os escravos pertencentes á nação receberão as suas cartas de alforria, em conformidade do decreto nº 4815 de 11 de Novembro de 1871, e terão o destino determinado no mesmo decreto.

    § 2º Os escravos dados em usufructo á corôa são equiparados, para todos os effeitos, aos escravos pertencentes á nação.

    § 3º Os escravos das heranças vagas receberão do juiz, que julgar da vacancia, as suas competentes cartas. Não podem, pois, ser arrematados ex vi do art. 38 do decreto nº 2433 de 15 de Junho de 1859, até á decisão sobre a vacancia da herança e devolução desta ao Estado; e, durante esse tempo, os seus serviços serão alugados pelo curador da herança, sob a inspecção e com acquiescencia do juiz.

    § 4º Os escravos abandonados por seus senhores receberão igualmente do juizo, que julgar o abandono, as suas cartas.

    Art. 76. Considera-se abandonado o escravo cujo senhor, residindo no lugar, e sendo conhecido, não o mantem em sujeição, e não manifesta querer mantel-o sob sua autoridade.

    Art. 77. As cartas passadas aos escravos das heranças vagas, e aos escravos abandonados, serão a certidão da sentença extrahida pelo escrivão e rubricada pelo juiz.

    Art. 78. Se os senhores abandonarem os escravos por invalidos, são obrigados a alimental-os, salvo o caso de penuria, sendo os alimentos taxados pelo juiz de orphãos. (Lei - art. 6º § 4º in fine)

    Paragrapho unico. Os alimentos serão taxados na sentença que julgar o abandono.

    Art. 79. Em geral, os escravos libertados em virtude da lei ficam durante cinco annos sob a inspecção do governo. Elles são obrigados a contractar seus serviços, sob pena de serem constrangidos, se viverem vadios, a trabalhar nos estabelecimentos publicos.

    Cessará, porém, o constrangimento do trabalho sempre que o liberto exhibir contracto de serviço. (Lei - art. 6º § 5º)

CAPITULO VII

DO PROCESSO

    Art. 80. Nas causas em favor da liberdade:

    § 1º O processo será summario.

    § 2º Haverá appellações ex officio quando as decisões forem contrarias á liberdade. (Lei - art. 7º e seus paragraphos.)

    Art. 81. O processo summario é o indicado no art. 65 do decreto nº 4824 de 22 de Novembro de 1871.

    § 1º As causas de liberdade não dependem de conciliação.

    § 2º Os manutenidos em sua liberdade deverão contractas seus serviços durante o litigio, constituindo-se o locatario, ante o juiz da causa, bom e fiel depositario dos salarios, em beneficio de qualquer das partes que vencer o pleito. Se o não fizerem, serão forçados a trabalhar em estabelecimentos publicos, requerendo-o ao juiz o pretendido senhor.

    § 3º Estes processos serão isentos de custas.

    Art. 82. O processo para verificar os factos do art. 18 deste regulamento é o dos paragraphos do art. 63 do decreto nº 4824 de 22 de Novembro de 1871.

    Paragrapho unico. Essa mesma fórma de processo servirá para verificação do abandono conforme os arts. 76, 77 e 78 deste regulamento.

    Art. 83. No caso de infracção do contracto de prestação de serviços, a fórma do processo é a da lei de 11 de Outubro de 1837; e o juiz competente é o de orphãos nas comarcas geraes, e o de direito nas comarcas especiaes, onde não houver juiz privativo de orphãos.

    Paragrapho unico. Havendo perigo de fuga, ou no caso de fuga, pôde ser ordenada a prisão do liberto contractado, como medida preventiva, não podendo, porém, exceder de trinta dias.

    Art. 84. Para a alforria por indemnização do valor, para a remissão, é sufficiente uma petição, na qual, exposta a intenção do peticionario, será solicitada a venia para a citação do senhor do escravo ou do possuidor do liberto. Antes da citação o juiz convidará o senhor para um accôrdo, e só em falta deste proseguirá nos termos ulteriores. (Lei - art. 4º e seus paragraphos.)

    § 1º Se houver necessidade de curador, precederá á citação nomeação do mesmo curador, em conformidade das disposições deste regulamento.

    § 2º Feita a citação, as partes serão admittidas a louvarem-se em arbitradores, se houver necessidade de arbitramento; e o juiz proseguirá nos termos dos arts. 39, 40 e 58 deste regulamento, decretando a final o valor ou o preço da indemnização, e, paga esta, expedirá a carta de alforria ou o titulo de remissão.

    § 3º Se a alforria fôr adquirida por contracto de serviços, esta circumstancia será mencionada na carta; e, no caso de ulterior remissão, não se passará titulo especial, mas bastará averbal-a na mesma carta.

    Art. 85. Nos casos para que este regulamento não designa fôrma de processo, o juiz procederá administrativamente.

    Art. 86. O valor da indemnização para alforria, ou para a remissão, regulará a competencia para o simples preparo ou para o preparo e julgamento, em conformidade da lei nº 2033 de 20 de Setembro de 1871. Assim, o valor do escravo no caso de abandono.

CAPITULO VIII

DA MATRICULA ESPECIAL

    Art. 87. Proceder-se-ha á matricula especial de todos os escravos existentes no Imperio, com declaração do nome, sexo, idade, estado, aptidão para o trabalho e filiação de cada um se fôr conhecida. (Lei - art. 8º)

    § 1º O prazo em que deve começar e encerrar-se a matricula será annunciado com a maior antecedencia possivel, por meio de editaes repetidos, nos quaes será inserta a disposição do paragrapho seguinte. (Lei ibid. - § 1º)

    § 2º Os escravos que, por culpa ou omissão dos interessados, não forem dados á matricula até um anno depois do encerramento desta, serão por este facto considerados libertos. (Lei ibid. - § 2º)

    § 3º Pela matricula de cada escravo pagará o senhor, por uma vez sómente, o emolumento de 500 rs., se o fizer dentro do prazo marcado; e de 1$000 se exceder o dito prazo. O producto deste emolumento será destinado ás despezas da matricula e o excedente ao fundo de emancipação. (Lei ibid. - 13º)

    § 4º Serão tambem matriculados em livro distincto os filhos da mulher escrava, que pela lei nº 2040 de 28 de Setembro de 1871 ficaram livres.

    Incorrerão os senhores omissos, por negligencia, na multa de 100$000 a 200$000, repetida tantas vezes quantos forem os individuos omittidos; e, por fraude, nas penas do art. 169 do Cod. Crim. (Lei ibid. - § 4º)

    § 5º Os parochos, são obrigados a ter livros especiaes para os registros dos nascimentos e obitos dos filhos de escravas, nascidos desde a data da lei. Cada omissão sujeitará os parochos á multa de 100$00. (Lei ibid. - § 5º)

    Art. 88. A matricula será regulada pelos Decretos nº 4835 do 1º de Dezembro de 1871, e nº 4960 de 8 de Maio de 1872.

CAPITULO IX

DISPOSIÇÕES GERAES

    Art. 89. As alforrias, quér gratuitas, quer a titulo oneroso, são isentas de quaesquer direitos, emolumentos ou despezas. (Lei - art. 4º § 6º)

    Art. 90. A lei nº 1695 de 15 de Setembro de 1869 permanece em seu inteiro vigor, com as seguintes alterações:

    § 1º Em qualquer caso de alienação ou transmissão de escravos é prohibido, sob pena de nullidade, separar os conjuges, e os filhos, menores de 12 annos do pai ou mãi. (Lei - art. 4º § 7º)

    Esta disposição comprehende a alienação ou transmissão extrajudicial.

    Em beneficio da liberdade, porém, podem ser separados do pai ou da mãi os filhos menores de 12 annos, que forem manumittidos com ou sem a clausula de futuros serviços.

    § 2º Nas vendas judiciaes e nos inventarios em geral, o juiz concederá carta de alforria aos escravos que exhibirem á vista o preço de suas avaliações. Neste caso é permittida a liberalidade directa de terceiro.

    § 3º As propostas de arrematação para alforria sem condições, respeitada a avaliação, preferem a outras quaesquer. Em segundo lugar serão attendidas as propostas para alforria com a clausula de contracto de serviços; e, entre estas, a que conceder menor prazo para servir, havendo igualdade no preço da indemnização.

    Havendo proposta dessa natureza, não será renovado annuncio por novo prazo, nem será admittida impugnação de herdeiros ou de credores que requeiram adjudicação por preço maior.

    O escravo, que tiver direito a ser manumittido pelo fundo de emancipação, dentro do anno em que fôr annunciada a arrematação, não será preterido, embora arrematado com contracto de prestação de serviços; excepto se incorrer em alguma das faltas mencionadas no art. 32, § 2º.

    Art. 91. São intransferiveis os serviços, quér dos menores livres, salvos os casos dos §§ 5º e 7º do art. 1º da lei, ou o prévio accôrdo do art. 16 deste regulamento, quér dos manumittidos gratuitamente com a clausula de prestação dos mesmos serviços. Poderão, porém, ser alugados.

    § 1º Esta disposição não comprehende os serviços contractados para acquisição da alforria, seja judicial ou particular o contracto.

    § 2º A disposição do art. 1º, § 5º da lei, é applicavel tanto á alienação forçada, como á onerosa ou gratuita.

    No caso de disposição testamentaria, a alienação da mãi escrava não comprehende os menores livres, se os legatarios não forem herdeiros necessarios, conforme o § 7º do art. 1º da lei.

    Art. 92. Se a divisão de bens entre herdeiros ou socios não comportar a reunião de uma familia escrava, e nenhum delles preferir conserval-a sob o seu dominio, mediante reposição da quota-parte dos outros interessados, será a mesma familia vendida e o seu producto rateado. (Lei - art. 4º § 8º)

    § 1º Os filhos livres menores de 12 annos não acompanharão a mãi escrava senão no caso de ser herdeiro necessario aquelle que adquirir na partilha a familia.

    § 2º Assim no caso de não ser herdeiro necessario, como no caso de divisão entre socios, os menores ficarão á disposição do governo ou do juiz de orphãos.

    § 3º Todavia, tanto na hypothese dos paragraphos antecedentes, como na do 2º do art. 91, o juiz de orphãos preferirá os senhores das mãis para os encarregar da educação dos menores; e, em todo caso, a separação não será feita senão depois que o menor houver completado a idade de tres annos, salvas as excepções do art. 8º.

    Art. 93. Nenhum inventario ou partilha entre herdeiros ou socios, que comprehender escravos, e nenhum litigio, que versar sobre o dominio ou a posse de escravos, será admittido em juizo, se não fôr desde logo exhibido o documento da matricula. (Decreto nº 4835 do 1º de Dezembro de 1871, art. 45.)

    Tambem se não dará passaporte a escravos, sem que sejam presentes á autoridade, que o houver de dar, os documentos da matricula, cujos numeros de ordem, data e lugar, onde foi feita, serão mencionados nos passaportes; e, se forem acompanhados por seus filhos livres, devem os passaportes conter os nomes e mais declarações relativas a estes. (Decreto citado - ibid.)

    Art. 94. Fica derogada a Ord. Liv. 4º, Tit. 63, na parte que revoga as alforrias por ingratidão. (Lei - art. 4º § 2º)

    Art. 95. Quaesquer certidões requisitadas pelos juizes, curadores geraes de orphãos, promotores publicos e adjuntos, ou pelos curadores particulares, para defesa dos escravos, dos menores livres e dos manumittidos sujeitos a serviços, serão extrahidas gratuitamente.

CAPITULO X

DAS MULTAS E DAS PENAS

    Art. 96. Além das multas comminadas pelo decreto nº 4835 do 1º de Dezembro de 1871, art. 33 e seguintes, serão impostas:

    A de 10§000 até 50§000, a cada um dos membros das juntas municipaes de emancipação, que deixarem de comparecer aos respectivos trabalhos sem motivo justificado. Na mesma multa incorrerá o escrivão bem assim os funccionarios e os individuos que não se prestarem a dar os esclarecimentos do art. 39 deste regulamento;

    A de 20$000 até 60$000, aos individuos que, nomeados arbitradores, curadores ou depositarios, recusarem-se sem motivo legitimo ou justificado;

    A de 50$000 até 100$000, aos juizes e mais funccionarios, que não cumprirem, nos prazos marcados, os deveres que este regulamento lhes recommenda;

    A de 50$000 até 100$000, aos senhores e possuidores, e aos parochos, que concorrerem para erro na declaração do art. 3º deste regulamento, se não fôr rectificada em tempo, não sendo caso de punição criminal.

    A de 50$000 até 100$000, aos juizes e escrivães que forem negligentes ou omissos no cumprimento das obrigações que este regulamento lhes incumbe, além da responsabilidade criminal;

    A de 100$000, a cada um dos directores das associações, administradores das casas de expostos e possuidores de menores livres, e de manumittidos com clausula ou contracto do serviços, que não derem á matricula no juizo competente os menores e os manumittidos sob sua autoridade, ou que annualmente não prestarem as contas, ou não derem as informações necessarias para as averbações no registro respectivo.

    Art. 97. Soffrerão a pena de prisão:

    Os que de má fé não derem á classificação de que tratam os arts. 27 e seguintes os nomes dos escravos para a emancipação pelo fundo publico: de 10 a 20 dias;

    Os que, tendo em seu poder peculio de escravos ou de manumittidos sujeitos a serviço, sem autorização legal, não o manifestarem em juizo dentro de prazo assignado em edital: 30 dias;

    Os que alliciarem menores sujeitos á autoridade dos senhores das mãis entregues a associações, casas de expostos e particulares, ou manumittidos obrigados a serviço: 30 dias.

    Art. 98. São competentes para impôr as multas:

    O ministro e secretario de estado dos negocios da agricultura, commercio e obras publicas, na côrte, aos membros da junta municipal, aos parochos e aos juizes;

    Os presidentes de provincia, aos individuos que devem compôr as juntas municipaes, aos parochos e aos juizes;

    As juntas municipaes, aos respectivos escrivães ou individuos, que os devam substituir, e ás pessoas que recusarem-se a dar-lhes esclarecimentos solicitados;

    Os juizes, aos seus subalternos, comprehendidas as autoridades inferiores, escrivães, individuos nomeados curadores, depositamos ou arbitradores; aos senhores e possuidores de menores livres e de manumittidos; ás associações e ás casas de expostos.

    Paragrapho unico. Em geral, as autoridades superiores podem impôr as multas que as autoridades interiores não houverem imposto sem motivo justificado: multando-as pela negligencia ou omissão em 50$000 até 100$000.

    Art. 99. Da imposição de multa haverá recurso:

    Para os presidentes, nas provincias, quando forem impostas pelas autoridades administrativas e judiciarias da mesma provincia; para o ministro, quando impostas pelos presidentes de provincia;

    Para o conselho de estado, na fórma do art. 46 do Regul. nº 124 de 5 de Fevereiro de 1842, quando impostas pelo ministro.

    Na côrte os recursos serão interpostos para o ministro.

    Art. 100. As multas serão cobradas executivamente, remettendo-se para esse fim as certidões ás repartições fiscaes.

    Art. 101. A pena de prisão será imposta pela autoridade judiciaria competente.

    Art. 102. As multas comminadas por este regulamento farão parte do fundo de emancipação.

    Palacio do Rio de Janeiro, em 13 de Novembro de 1872. - Francisco do Rego Barros Barreto.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1872


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1872, Página 1053 Vol. 2 pt. II (Publicação Original)