Legislação Informatizada - DECRETO Nº 4.689, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1871 - Publicação Original

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DECRETO Nº 4.689, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1871

Autoriza a construcção de uma estrada de ferro entre as Provincias de Santa Catharina e de S. Pedro do Rio Grande do Sul, depois de approvados os estudos definitivos.

Attendendo ao que Me requereu o Engenheiro Sebastião Antonio Rodrigues Braga, e de conformidade com a Lei nº 1864 de 12 de Outubro de 1870: Hei por bem Conceder-lhe autorização para, por si, ou por meio de uma companhia que organizar, construir uma estrada de ferro entre o melhor ponto maritimo na Provincia de Santa Catharina e a cidade de Porto Alegre, capital da de S. Pedro do Rio Grande do Sul, ficando esta concessão dependente da approvação dos estudos definitivos, na fórma das condições que com este baixam, assignadas pelo Dr. João Alfredo Corrêa de Oliveira, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio e interino dos da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro, em dez de Fevereiro de mil oitocentos setenta e um, quinquagesimo da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

João Alfredo Corrêa de Oliveira.

Clausulas a que se refere o Decreto nº 4689 desta data

I

    O Governo Imperial concede á companhia, que organizar o engenheiro Sebastião Antonio Rodrigues Braga, privilegio exclusivo por 50 annos, a contar da data desta concessão, para a construcção, uso e gozo de uma estrada de ferro, que, partindo do melhor ponto maritimo da Provincia de Santa Catharina, vá ter á cidade de Porto Alegre, capital da de S. Pedro do Rio Grande do Sul.

    A estrada será denominada - Estrada de ferro de Dom Pedro 1º -; e nos documentos concernentes aos seus estudos, construcção e trafego será permittido o uso do emblema, que com estas baixa.

II

    Durante o tempo do privilegio não poderá o Governo conceder outros caminhos de ferro de qualquer systema dentro da zona de 30 kilometros para cada lado e na mesma direcção desta estrada, salvo se houver accôrdo prévio com esta companhia.

III

    A restricção da clausula antecedente não obstará a que o Governo conceda ou construa outras estradas de ferro, que sejam ramificaçães ou prolongamento desta linha, e como taes della se aproximem e até a cruzem. Todavia, em taes casos será, em igualdade de circumstancias, preferida a companhia da estrada, a que se refere esta concessão.

IV

    A companhia não poderá reclamar indemnização alguma pelo facto do estabelecimento daquelles ramaes ou prolongamento, com tanto que dahi não resultem obstaculos á circulação sobre esta linha, nem novas despezas para a companhia.

    No caso em que a companhia da estrada, a que se refere esta concessão, não possa entender-se com as emprezas dos ramaes ou do prolongamento sobre o modo de combinarem os seus respectivos serviços de transporte, a fim de que não haja prejuizo para o publico, o Governo terá o direito de estatuir, como julgar conveniente sobre as dificuldades que houver, ouvindo préviamente as partes discordantes.

V

    A incorporação deverá verificar-se dentro do prazo de quatro annos, contados desta data, e não se considerará realizada sem que sejam os estatutos registrados no tribunal do commercio competente.

VI

    Os trabalhos de exploração para a determinação do traço da estrada começarão dentro de um anno, e deverão ficar concluidos de modo que dentro de quatro.

XIII

    Nas extremidades da linha e nos pontos intermedios onde forem precisas, haverá estações com as accommodações necessarias ao serviço de viajantes e mercadorias.

    A estação inicial em Santa Catharina deverá ser uma estação maritima, ligada a dócas de capacidade sufficiente para receberem os navios de maior lotação que demandarem o porto.

XIV

    A via ferrea não impedirá o livre transito pelos caminhos actuaes, ou outros que se abrirem para a commodidade publica, nem a companhia terá direito a qualquer taxa pela passagem nos pontos de intersecção.

XV

    Será obrigação da companhia restabelecer e manter em qualquer tempo, á sua custa, o livre escoamento de todas as aguas, cujo curso seja demorado ou retido pelas obras da estrada.

    Nos cruzamentos com as vias navegaveis serão as obras de arte construidas de modo que não offereçam embaraço algum á navegação.

XVI

    Todas as obras da estrada serão construidas com materiaes de boa qualidade e com a solidez desejada.

XVII

    A companhia será obrigada a estabelecer em toda a extensão da estrada de ferro um telegrapho electrico, que deverá estar prompto para funccionar no dia da abertura da linha ferrea ao trafego.

    O Governo terá o direito de utilisar-se dos postes da companhia para collocar um ou mais fios electricos e poderá assentar os seus apparelhos e estabelecer escriptorios telegraphicos nos edificios das estações da companhia, sem que por isso tenha esta direito de reclamar indemnização alguma.

XVIII

    Depois de concluidas as obras da estrada, a companhia será obrigada a conserval-as sempre em bom estado, de modo que não haja em tempo algum interrupção do trafego, nem o menor perigo para a circulação dos trens.

    Se as obras não forem conservadas em bom estado, o Governo poderá mandar fazer por conta da companhia os trabalhos necessarios para restabelecer a segurança da linha ferrea.

XIX

    Se depois de começada a construcção da estrada, ficarem as obras paradas por mais de seis mezes, ou se a companhia não concluir toda a linha no prazo marcado na condição 8ª, ou se depois de aberta a linha ao trafego, fôr a circulação interrompida por mais de tres mezes, ou se a companhia por qualquer motivo fôr declarada incapaz de continuar os seus trabalhos, considerar-se-ha caduca a concessão, salvo caso de força maior devidamente provado.

    O Governo providenciará sobre o acabamento das obras, ou continuação do trafego, adjudicando á outra empreza as obras executadas e os materiaes existentes.

    O preço obtido será entregue pela nova companhia á companhia desapossada, que não terá direito a nenhuma outra indemnização.

    Se não tiver lugar a adjudicação, a companhia disporá dos materiaes e mais objectos, que lhe pertencerem, dentro do prazo que fôr marcado pelo Governo, sem direito de reclamar cousa alguma.

XX

    Poderá a companhia desappropriar, na fórma do Decreto nº 1664 de 27 de Outubro de 1855, os terrenos de dominio particular, que forem: necessarios para o leito da estrada, suas estações e mais dependencias.

    Para os mesmos fins conceder-lhe-ha o Governo gratuitamente o uso-fructo, durante o tempo do privilegio, da zona que occupar, dos terrenos devolutos e nacionaes, e dos comprehendidos nas sesmarias e posses, salvas as indemnizações que forem de direito.

XXI

    Será concedido á companhia importar livre de direitos, durante o prazo marcado para a conclusão das obras, e nos dez annos que se lhe seguirem, todas as machinas, wagons, trilhos, carvão e mais materiaes que tiverem de ser empregados na construcção, conservação e custeio da linha, ficando nesta parte sujeita aos regulamentos fiscaes.

    Para poder gozar desse favor deverá a companhia, no principio de cada anno, apresentar ao Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas uma relação dos objectos que tiver de importar durante o anno.

XXII

    A companhia terá o direito, durante o tempo do seu privilegio, de explorar dentro da zona privilegiada, minas de quaesquer metaes, e de productos chimicos, que descobrir, sem detrimento de direitos adquiridos por outros, devendo quando descobril-as, requerer ao Governo a fim de lhe serem demarcadas as datas e estipuladas as condições do seu gozo na fórma da legislação vigente.

XXIII

    Os preços que a companhia poderá perceber pelo transporte de passageiros e mercadorias de qualquer especie, serão determinados em uma tarifa organizada pela companhia de accôrdo com o Governo, podendo essa tarifa ser revista de tres em tres annos, e reduzida quando a receita liquida da empreza exceder de 12%.

XXIV

    O Governo fiscalisará como julgar conveniente a execução das obras, o serviço do trafego e o cumprimento de todas as clausulas desta concessão.

    As despezas de fiscalisação correrão por conta da companhia.

    Quando a empreza não executar qualquer obra ou serviço nas condições exigidas, o Governo as mandará fazer á custa da mesma empreza.

XXV

    Serão observadas nesta estrada de ferro, no que lhe fôr applicavel, as disposições dos regulamentos em vigor nas outras estradas de ferro existentes, e de quaesquer outros regulamentos, que pelo Governo forem decretados, uma vez que não contrariem as condições desta concessão.

XXVI

    Depois dos 15 primeiros annos de duração do privilegio deverá a companhia começar a formar o seu fundo de amortização, empregando para este fim, pelo menos meio por cento do capital despendido, quando a renda liquida exceder a 7%.

XXVII

    Em qualquer época, depois de decorridos os primeiros 15 annos de duração do privilegio, poderá o Governo resgatar a presente concessão, se o julgar conveniente.

    O preço do resgate será fixado por dous arbitros, um nomeado pelo Governo, e o outro pela companhia, os quaes tomarão em consideração não só a importancia das obras no estado em que então estiverem, sem attenderem ao seu custo primitivo, mas tambem á renda liquida da estrada nos cinco annos anteriores.

    Em nenhum caso, porém, o preço do resgate, que resultar do arbitramento, será superior a uma somma, cuja renda annual de 6% seja equivalente á renda liquida média dos cinco annos anteriores.

    Se os dous arbitros não chegarem a um accôrdo, dará cada um o seu parecer, e será a questão resolvida pela Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado.

    Do preço do resgate, conforme fôr arbitrado, será deduzido pelo Governo o fundo de amortização, que então houver.

XXVIII

    Terminado o prazo do privilegio e não verificando-se a hypothese da clausula precedente, continuará a companhia na posse e gozo da estrada e suas dependencias, pagando desde então ao Governo o que por este fôr fixado pelo aforamento dos terrenos devolutos e nacionaes occupados pela empreza.

XXIX

    As malas dos Correios e seus conductores, quaesquer sommas de dinheiro pertencentes ao Thesouro Geral ou Provincial, os presos e seus respectivos guardas, os agentes policiaes em serviço serão conduzidos gratuitamente pela companhia com as necessarias garantias de segurança.

XXX

    Se o Governo tiver necessidade de mandar tropas e material de guerra pela estrada de ferro, a companhia porá immediatamente á sua disposição, pela metade dos preços da tarifa, todos os meios de transporte que possuir.

    As outras cargas do Governo, não especificadas na clausula antecedente, e os colonos com suas bagagens serão tambem transportados pela metade dos preços da tarifa.

XXXI

    O Governo concede á companhia, para estabelecimento de colonos, até 20 leguas quadradas de terras devolutas, escolhidas de accôrdo com o Governo, seja na zona privilegiada, seja em outros lugares de qualquer das duas Provincias de Santa Catharina ou do Rio Grande do Sul, onde as houver.

    A medição e demarcação dessas terras serão feitas á custa da companhia.

XXXII

    Os direitos e obrigações que por esta concessão competem ao Engenheiro Sebastião Antonio Rodrigues Braga, passarão, em sua falta, aos seus herdeiros ou successores.

XXXIII

    Poderá a companhia ter sua séde no paiz ou fóra delle, com tanto que tenha no Brasil um representante com plenos poderes para tratar e resolver directamente com Governo quaesquer questões emergentes, ficando entendido que, ou com o Governo ou com particulares, serão todas tratadas e resolvidas no Brasil, de conformidade com a respectiva legislação e sem recurso para tribunaes estrangeiros.

XXXIV

    Em caso de desaccôrdo entre o Governo e a companhia sobre direitos e obrigações de ambas as partes na execução desta concessão, será a questão resolvida por dous arbitros, um nomeado pelo Governo e outro pela companhia.

    Se estes não chegarem a um accôrdo, dará cada um o seu parecer separado, e será a decisão proferida pela Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado.

XXXV

    A companhia não poderá reclamar do Thesouro Nacional garantia de juros sobre o capital empregado em suas obras, nem prestação ou subvenção alguma, nem quaesquer favores além dos que se acham expressos nas presentes condições.

XXXVI

    Pelo não cumprimento de qualquer das clausulas desta concessão, para a qual já não estiverem estabelecidas penas especiaes, poderá o Governo impôr multas de um a dez contos de réis, conforme a gravidade do caso.

    Se se tratar de falta de execução de obras previstas nestas clausulas ou constantes dos planos approvados ou da má execução de algumas obras, poderá o Governo, além da imposição da multa, mandar fazer os trabalhos que julgar necessarios por conta da companhia.

XXXVII

    A companhia remetterá ao Governo no fim do mez de Janeiro de cada anno um relatorio circumstanciado, concernente ao anno anterior, de todas as occurrencias, movimento dos passageiros e mercadorias, receita e despeza e estado da linha, e condições financeiras da empreza.

XXXVIII

    Dentro dos primeiros tres mezes depois de entregue a linha ao trafego deverá a companhia remetter ao Governo os planos completos, e uma memoria descriptiva da estrada conforme a execução.

    Palacio do Rio de Janeiro, em dez de Fevereiro de mil oitocentos setenta e um. - João Alfredo Corrêa de Oliveira.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1871


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1871, Página 78 Vol. 1 pt. II (Publicação Original)