Legislação Informatizada - DECRETO Nº 3.711, DE 6 DE OUTUBRO DE 1866 - Publicação Original

Veja também:

DECRETO Nº 3.711, DE 6 DE OUTUBRO DE 1866

Promulga a Declaração Interpretativa assignada em Paris aos 21 de Julho do corrente anno por parte do Brasil e da França para firmar o sentido e modo de execução do art. 7º da Convenção Consular celebrada entre os dous Paizes em 10 de Dezembro de 1860.

Havendo-se assignado em Paris aos 21 de Julho do corrente anno, entre o Meu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario em missão especial e o Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros de Sua Magestade o Imperador dos Francezes, uma Declaração Interpretativa do art. 7º da Convenção Consular celebrada entre o Brasil e a França em 10 de Dezembro de 1860, e promulgada pelo Decreto nº 2787 de 26 de Abril de 1861, Hei por bem Mandar que as disposições da referida Declaração Interpretativa, que com este baixa, sejão observadas e cumpridas, como se contidas fossem no art. 7º da citada Convenção, cujo sentido e modo de execução por ellas ficão elucidados e firmados.

    Martim Francisco Ribeiro de Andrada, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros, assim o tenha entendido e faça executar com os despachos necessarios.

Palacio do Rio de Janeiro aos seis de Outubro de mil oitocentos sessenta e seis, quadragesimo quinto da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Martim Francisco Ribeiro de Andrada.

Declaração Interpretativa do art. 7º da Convenção Consular de 10 de Dezembro de 1860 entre o Brasil e a França.

    Havendo a applicação do art. 7º da Convenção Consular de ,10 de Dezembro de 1860 dado lugar a conflictos de attribuição entre as Autoridades do Brasil e os Consules Francezes, o Governo de Sua Magestade o Imperador do Brasil e o Governo de Sua Magestade o Imperador dos Francezes, animados de igual desejo de pôr termo a esses conflictos, resolvêrão, de commum accordo, fixar definitivamente a interpretação do dito artigo.

    Em consequencia os abaixo assignados:

    Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario de Sua Magestade o Imperador do Brasil, em missão especial junto a Sua Magestade o Imperador dos Francezes; e

    Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros de Sua Magestade o Imperador dos Francezes, devidamente autorizados, convierão no seguinte.

§1º

    No caso de morte de um subdito de uma das partes contractantes no territorio da outra, as Autoridades locaes competentes deveráõ immediatamente avisar os Consules Geraes, Consules ou Vice-Consules, em cujo districto occorrer o fallecimento, e estes, por sua parte, si forem os primeiros a saber do facto, deveráõ dar o mesmo aviso ás Autoridades locaes.

§ 2º

    A administração e liquidação da herança de um Francez fallecido no Brasil serão reguladas do seguinte modo:

    Quando um Francez fallecido no Brasil não tiver deixado senão herdeiros Brasileiros, ou quando, com herdeiros Francezes maiores, presentes e capazes, concorrerem herdeiros Brasileiros menores, ausentes ou incapazes, o Consul Francez não intervirá.

    Quando entre os herdeiros do Francez fallecido no Brasil houver um ou mais Francezes menores, ausentes ou incapazes, terá o Consul a administração exclusiva da herança, si não houver viuva Brasileira de origem, nem herdeiro Brasileiro cabeça de casal, nem testamenteiro, nem herdeiros Brasileiros menores, ausentes ou incapazes.

    Si com um ou mais herdeiros Francezes menores, ausentes ou incapazes, houver ao mesmo tempo, quér uma viuva Brasileira de origem, quér um herdeiro Brasileiro cabeça de casal, quér um testamenteiro, quér um ou mais herdeiros Brasileiros menores, ausentes ou incapazes, o Consul Francez administrará a herança conjunctamente com a dita viuva Brasileira, ou dito cabeça de casal, ou dito testamenteiro, ou o representante legal dos ditos herdeiros Brasileiros.

    Fica entendido que aos herdeiros menores, nascidos no Brasil de pais Francezes será applicado o estado civil de seu pai, até a sua maioridade, de conformidade com a Lei de 10 de Setembro de 1860, e em reciprocidade da faculdade que tem os Consules Brasileiros em França de administrar e liquidar a herança de seus nacionaes nos casos analogos.

    Fica igualmente entendido que os legatarios universaes ou por titulo universal são equiparados aos herdeiros.

    Reciprocamente a herança de um Brasileiro fallecido em França será administrada e liquidada conforme as regras estabelecidas pelo presente paragrapho, no que não forem contrarias á Lei Franceza.

§ 3º

    Nos casos em que, nos termos do paragrapho antecedente, tiver lugar a intervenção exclusiva do Consul, deveráõ os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules:

    1º Pôr sellos, quér ex-officio, quér a requerimento das partes interessadas, em toda a mobilia e papeis do defunto, prevenindo com anticipação a Autoridade local competente, que poderá assistir ao acto, e até, si julgar conveniente, cruzar com os seus sellos os que houverem sido postos pelo Consul.

    2º Fazer tambem em presença da competente Autoridade local, si esta entender que deve comparecer, o inventario de todos os bens e objectos possuidos pelo defunto.

§ 4º

    Pelo que diz respeito á dupla operação da apposição dos sellos, que deverá effeituar-se no mais curto prazo, e do inventario, os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules fixaráõ, de accordo com a Autoridade local, o dia e hora em que ambas estas operações deveráõ ter lugar; o aviso do Consul á Autoridade será feito por escripto, e esta accusará a recepção. Si a Autoridade local não comparecer apezar do convite que lhe tiver sido feito, os Consules procederáõ sem demora e sem mais formalidade ás duas supracitadas operações.

    Os sellos duplos postos pelo Consul e pela Autoridade local só serão levantados de commum accordo. Todavia, si o Consul deixar decorrer quinze dias sem chamar a Autoridade local para levantar os sellos, esta lhe pedirá por escripto que fixe dia e hora em que essa operação deverá ter lugar, e elle accusará recepção do aviso que houver recebido; si o Consul não responder no termo de oito dias, a Autoridade local procederá sem demora e sem mais formalidade ao levantamento dos sellos e ao inventario.

§ 5º

    Si o fallecimento se der em uma localidade onde não haja Agente Consular da nacionalidade do defunto, a Autoridade local dará disso parte immediatamente ao Governo, e procederá á apposição dos sellos e ao inventario dos bens da herança. O Governo avisará á Autoridade Consular do districto, a qual poderá comparecer no lugar, ou nomear, sob sua responsabilidade, um Agente para liquidar a herança. Entretanto continuará a Autoridade local a administrar, arrecadar e liquidar essa herança até a chegada do Consul ou do Agente nomeado ad hoc pelo Consul, o qual proseguirá então na liquidação, si ella não estiver terminada; e si já o estiver, a Autoridade local lhe entregará o produto liquido da herança.

§ 6º

    Os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules, nos casos em que, nos termos do paragrapho segundo, lhes compete exclusivamente a administração e liquidação das heranças, farão proceder, de conformidade com as leis e usos do paiz, á venda de todos os bens moveis da herança susceptiveis de deterioração, e arrecadaráõ o producto da venda. Poderão administrar e liquidar pessoalmente ou nomear, sob sua responsabilidade, um Agente para administrar e liquidar a herança. Receberáõ as rendas, alugueis e quaesquer rendimentos vencidos, cobraráõ as quantias devidas á herança, receberáõ o producto da venda dos bens moveis e da dos immoveis, no caso de haver sido esta autorizada pelo Juiz, pagaráõ os credores, darão quitação aos devedores e cumpriráõ os legados.

    A herança assim liquidada será dividida entre os herdeiros, de conformidade com a partilha que será feita pelo Juiz competente, o qual nomeará, si houver lugar, peritos para a avaliação dos bens, formação dos quinhões e designação das tornas.

    Em caso nenhum os Consules serão juizes das contestações relativas aos direitos dos herdeiros, collações á herança, legitima e terça. Estas contestações serão submettidas aos tribunaes competentes.

§ 7º

    Si sobrevier alguma questão, quér entre os coherdeiros, quér entre os herdeiros e terceiros que se julguem com direito contra a herança, esta questão deverá ser devolvida aos tribunaes competentes, figurando o Consul, nos casos em que elle administra só, nos termos do § 2º, como representante da herança. Proferido o julgamento, o Consul deverá executal-o, si não tiver por conveniente appellar, ou si as partes se não houverem accommodado amigavelmente, proseguindo depois, de plano, na liquidação que havia sido suspensa, emquanto se aguardava a decisão do tribunal.

§ 8º

    Os ditos Consules Geraes, Consules e Vice-Consules serão obrigados a mandar annunciar a morte do fallecido em uma das gazetas do seu districto, e não poderão fazer entrega da herança ou do seu producto aos legitimos herdeiros ou aos seus procuradores, senão.depois de pagas todas as dividas que o defunto tiver contrahido no paiz, ou depois de haver decorrido um anno da data do fallecimento, sem que se tenha apresentado reclamação alguma contra a herança.

    Antes de qualquer distribuição aos herdeiros do producto da herança deveráõ pagar os direitos do Thesouro.

§ 9º

    A Autoridade local é a unica competente para proceder á abertura do testamento. Si durante a apposição dos sellos, ou feitura do inventario, o Consul achar um testamento, descreverá a fórma exterior delle no seu processo verbal, o rubricará perante as partes interessadas e presentes, o porá debaixo de sello, e dará parte ao Juiz territorial competente, para que elle abra o testamento segundo as fórmas legaes. Si o testamento do defunto estiver depositado no Consulado, o Consul promoverá a sua abertura pelo Juiz territorial. As questões de validade do testamento serão submettidas aos Juizes competentes.

§ 10.

    Quando houver lugar á nomeação de um tutor, ou de um curador, o Consul promoverá, si por outro modo não estiver providenciado, a mesma nomeação pela Autoridade local competente.

§ 11.

    Si ao tempo do fallecimento, os bens ou parte dos bens de uma herança, cuja administração e liquidação pertenção ao Consul, nos termos do § 2º, se acharem embargados, penhorados ou sequestrados, o Consul não poderá tomar posse dos ditos bens, antes do levantamento do embargo, penhora ou sequestro. O Consul terá o direito de ser ouvido, de velar conjunctamente com o tutor na observancia das formalidades legaes, e si a execução se effectuar, receberá o remanescente do producto da venda. Si durante a liquidação feita pelo Consul, nos termos do § 2º, sobrevier um embargo, penhora ou sequestro dos bens, ou parte dos bens da dita herança, o Consul ou o Agente nomeado por elle para liquidar a herança, será nomeado guarda ou depositario dos bens embargados, penhorados ou sequestrados.

§ 12.

    Os Consules geraes, Consules e Vice-Consules, ainda mesmo no caso em que o § 2º lhes concede a faculdade de intervir nas heranças de seus nacionaes, não poderão pôr sellos nem inventariar os bens de seus nacionaes fallecidos depois de haverem sido declarados fallidos. A administração e liquidação desses bens serão feitas conforme as Leis especiaes do paiz.

    Fica entendido que o Consul conserva sempre o direito de velar, a bem dos menores e com os tutores, em que sejão preenchidas as formalidades exigidas pela lei.

§ 13.

    Os Consules geraes, Consules e Vice-Consules, mesmo no caso em que o § 2º lhes concede a faculdade de intervir nas heranças de seus nacionaes, não poderão pôr sellos, inventariar, administrar nem liquidar os bens de um seu nacional, que pertencer a uma sociedade commercial. Serão obrigados neste ponto a se conformarem, quér com as disposições especiaes estipuladas no contracto de sociedade, quér com as regras estabelecidas pela lei commercial do paiz. Si a sociedade continuar depois da morte do socio, o Consul receberá para os herdeiros as partes dos lucros que lhes couberem, si a sociedade fôr dissolvida por morte do dito socio, o Consul deixará liquidar a sociedade por quem competir, e receberá sómente a parte liquida que pertencer á dita herança.

    Fica entendido que, nos casos previstos pelo presente paragrapho e pelos dous precedentes, o Consul tem sempre o direito de velar, a bem dos menores, no cumprimento das formalidades legaes.

§ 14.

    A superveniencia de herdeiros maiores e capazes durante a liquidação, começada pelo Consul, nos termos do § 2º, não faz cessar os poderes do Consul, senão quando não houver mais um só incapaz ou ausente entre os herdeiros, por cujo interesse elle intervinha; si os ditos herdeiros se tornarem todos maiores e capazes antes de finda a liquidação, e si elles se apresentarem todos, quér em pessoa, quér por procuradores, será o Consul obrigado a entregar-lhes toda a liquidação.

§ 15.

    Nos casos em que a administração e liquidação se fizerem em commum, nos termos do § 2º, pelo Consul e a viuva, ou o cabeça de casal, ou testamenteiro, ou o representante legal dos menores ausentes ou incapazes, cujos interesses não estiverem sob a protecção do Consul, todos. os actos de apposição de sellos, inventario, adminstração e liquidação, deveráõ ser feitos em commum, funccionando o Consul e a viuva, ou o cabeça de casal, ou o testamenteiro, ou o representante legal dos ditos menores até a partilha definitiva, como dous liquidadores encarregados da liquidação da mesma sociedade; nenhuma desobriga será valiosa si não estiver revestida das duas assignaturas.

§ 16.

    Si os herdeiros forem todos maiores, capazes, presentes e da nacionalidade do Consul, poderão, de commum accordo, encarregar o dito Consul de administrar, liquidar e mesmo partilhar os bens da herança. Mas, si a herança comprehender immoveis situados no paiz, será chamado um Tabellião ou Escrivão (notaire ou officier public) competente do lugar, para assistir ao acto da partilha amigavel, e assignar com o Chanceller sob pena de nullidade.

    Os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules respectivos terão além disto o direito de receberem em sua Chancellaria, a requerimento de todas as partes interessadas, qualquer acto de partilha amigavel de uma herança de seus nacionaes, com tanto que todos os herdeiros sejão maiores, mesmo quando houver entre os herdeiros subditos do paiz onde elles residirem, uma vez, bem entendido, que essa partilha só diga respeito a bens situados no territorio da nação a que pertencer o Consul ou Agente perante quem fôr feita.

    Os traslados destes actos de partilha, devidamente legalizados pelos Consules geraes, .Consules e Vice-Consules, e sellados com o sello de seu Consulado ou Vice-Consulado, farão fé em Juizo perante todos os Tribunaes, Juizes e Autoridades do Brasil e da França, e terão respectivamente a mesma força e valor que terião, si fossem passados por Tabelliães e outros Escrivães competentes do paiz, uma vez que esses actos sejão lavrados conforme as Leis do Estado a que o Consul pertencer, e que tenhão sido submettidos. previamente ás formalidades do sello, ao registro, insinuação, e a quaesquer outras formalidades que regem a materia no paiz em que o acto de partilha dever ser executado.

§ 17.

    Si a herança de um subdito de uma das duas partes contractantes, fallecido ab intestato no territorio da outra, se tornar vaga (vient à tomber en deshérence), isto é, senão houver nem conjuge sobrevivente, nem herdeiro em gráo successivel, essa herança, tanto movel como immovel, deverá ser devolvida ao Estado em cujo terrtorio tiver morrido o dito subdito.

    Depois da apposição dos sellos, o Juiz territorial exigirá do Consul em nome do Estado o inventario dos bens do defunto. Tres annuncios serão publicados successivamente por diligencia do Juiz territorial, de tres em tres mezes, nos jornaes do lugar em que a successão se houver aberto, e nos da capital do paiz. Estes annuncios deveráõ conter os nomes e pronomes do defunto, o lugar e data do seu nascimento, si forem conhecidos, a profissão que exercia, a data e lugar de sua morte. Annuncios semelhantes serão publicados, á diligencia do Juiz territorial por intermedio do Consulado Brasileiro em Paris, ou do Consulado Francez no Rio de Janeiro, nos jornaes da cidade mais vizinha do lugar do nascimento do defunto. O Consul procederá á administração e á liquidação da herança, segundo as regras estabelecidas pela Convenção. Si, passados dous annos, contados do fallecimento, não se tiver apresentado nem herdeiro, nem conjuge, quér pessoalmente, quér por procurador, o Juiz territorial ordenará por uma sentença, que será intimada ao Consul, a entrega ao Estado. O Consul entregará então á Fazenda Publica todos os objectos e valores provenientes da herança, e bem assim todos os documentos relativos á administração e ás contas da herança. A Administração da Fazenda Publica tomará posse della, ficando obrigada a dar conta aos herdeiros ou conjuges que possão depois apparecer, em conformidade com a Lei do paiz.

    Tal é a interpretação que os Governos do Brasil e da França declarão, de commum accordo, dar ao art. 7º da Convenção de 10 de Dezembro de 1860, e que d'ora em diante servirá de regra na applicação do dito artigo.

    Em fé do que os abaixo assignados assignárão a presente Declaração, e nella puzerão o sello de suas Armas.

    Feito e expedido por duplicata, em Paris aos 21 de Julho de 1866.

    

(L. S.) Assignado - Penedo.
(L. S.) Assignado - Drouyn de Lhuys.

Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1866


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1866, Página 279 Vol. 1 pt. II (Publicação Original)