Legislação Informatizada - Decreto nº 2.268, de 2 de Outubro de 1858 - Publicação Original

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Decreto nº 2.268, de 2 de Outubro de 1858

Promulgo o tratado de amizade, commercio e navegação entre este Imperio e o Ottomano, de 5 de Fevereiro de 1858.

     Tendo-se concluido e assignado na Cidade de Londres aos cinco dias do mez de Fevereiro do corrente anno hum Tratado de amizade, commercio e navegação entre este Imperio e o Ottomano, e achando-se este acto mutuamente ratificado e trocadas as ratificações no dia dezoito de Maio proximo passado; Hei por bem que o dito Tratado seja observado e cumprido inteiramente como nelle se contêm.

     O Visconde de Maranguape, do Meu Conselho, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios Estrangeiros, o tenha assim entendido e expeça para este fim os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro aos dous dias do mez de Outubro de mil oitocentos cincoenta e oito, trigesimo setimo da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

TRATADO DE AMIZADE, COMMERCIO E NAVEGAÇÃO ENTRE SUA MAGESTADE O IMPERADOR DO BRASIL E SUA MAGESTADE O IMPERADOR DOS OTTOMANOS

Em nome de Deos Todo Poderoso

S. M. o Imperador do Brasil e S. M. o Imperador dos Ottomanos, igualmente animados do desejo de estabelecer e consolidar as relações de amizade e boa intelligencia entre o Imperio do Brasil e o Imperio Ottomano; e querendo promover e ampliar os interesses commerciaes dos seus respectivos Estados, obtendo para os seus subditos, em vantagem commum e reciproca dos mesmos, todas as facilidades e favores tendentes a desenvolver aquelles interesses, resolvêrão concluir hum tratado de amizade, commercio e navegação, e para esse fim nomearão Seus Plenipotenciarios, a saber:

S. M. o Imperador do Brasil, o Sr. Francisco Ignacio de Carvalho Moreira, Membro do Seu Conselho, Cavalleiro da Ordem de Christo, Commendador da Ordem da Rosa, Seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario junto á Sua Magestade a Rainha do Reino Unido da Grãa-Bretanha e Irlanda;

E Sua Magestade o Imperador dos Ottomanos, a Constantino Musurus Bey, condecorado com a Ordem Imperial de Medjidie de segunda classe, Grão Cruz da Ordem de S. Mauricio e S. Lazaro da Sardenha, Grande Commendador da Ordem do Salvador da Grecia, Seu Embaixador Extraordinario e Plenipotenciario junto á Sua Magestade a Rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda;

Os quaes, depois de terem reciprocamente communicado os seus plenos poderes, achando-os em boa e devida fórma, convierão nos artigos seguintes:

Artigo 1º

Haverá paz constante e amizade perpetua entre S. M. o Imperador do Brasil e S. M. Imperial o Sultão, Seus Herdeiros e Successores, assim como entre os Seus subditos, Estados e Territorios, sem excepção de lugar nem de pessoa.

Artigo 2º

Alêm dos Agentes Diplomaticos que as duas Altas Partes Contractantes tem a faculdade de acreditar huma junto á outra, cada huma dellas poderá mutuamente nomear Consules Geraes, Consules e Vice-Consules em todas as cidades e portos do territorio da outra, onde julgar util a presença de taes Consules por bem do commercio e por interesse de Seus subditos, e onde as nações amigas tiverem igualmente semelhantes Consules.

Os Agentes Diplomaticos e os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules de cada huma das Altas Partes Contractantes gozarão, segundo o seu grão, nos Estados da outra, das mesmas honras, favores, immunidades, auxilio e protecção que ahi são concedidos aos Agentes Diplomaticos e aos Consules Geraes, Consules e Vice-Consules das outras Potencias amigas.

Nenhum dos Consules precitados poderá exercer suas funcções antes de haver obtido a approvação ou exequatur do Soberano para cujos Estados tiver sido nomeado.

Os Agentes Diplomaticos e os Consules Geraes, Consules e Vice-Consules de cada huma das duas Potencias Contractantes se absterão de qualquer acto tendente a conferir, por meio de patentes ou de qualquer outro modo, a nacionalidade ou a protecção do seu paiz á subditos da outra Potencia, ou a subtrahi-los por qualquer outra maneira á jurisdicção e ás leis do paiz onde residem.

Cada huma das duas Altas Partes Contractantes, em falta de seus proprios subditos, poderá nomear por seus Consules Geraes, Consules e Vice-Consules nos Estados da outra parte, a subditos estrangeiros, os quaes, todavia, depois de haverem obtido o exequatur necessario, não exercerão suas funcções senão em quanto a nação á que pertencerem fôr amiga e estiver em paz com o Imperio para cujos Estados tiverem sido nomeados.

Fica bem entendido que em nenhum caso poderá huma das duas Altas Partes Contractantes nomear por seus Consules Geraes Consules e Vice-Consules a subditos da outra parte contractante.

Artigo 3º

Os subditos de cada huma das duas Altas Partes Contractantes gozarão quanto ás suas pessoas e bens, em todas as possesões da outra, dos direitos, favores e isenções concedidos em geral aos subditos das nações amigas.

Poderão reciprocamente viajar e residir em todos os portos, cidades e lugares dos territorios dos dous Imperios, onde as autoridades publicas lhes darão toda protecção e facilidade legitimas, sem permittirem que soffrão o menor vexame.

Os passaportes de que precisarem lhes serão passados pela autoridade competente, e segundo o uso adoptado no paiz.

Artigo 4º

Os subditos dos dous Imperios poderão commerciar livremente em todas as cidades, portos e lugares abertos ao commercio estrangeiro, e alugar para esse fim casas e armazens sendo sómente obrigados a pagar os mesmos direitos e impostos que pagão os subditos das Potencias amigas.

Os negociantes, subditos de hum dos dous Imperios, que tiverem transacções commerciaes nos Estados do outro, terão a faculdade de dirigir por si mesmos todos os seus negocios, ou de servir-se para esse fim de agentes de sua escolha.

Artigo 5º

Em caso de fallecimento de hum subdito Brasileiro no Imperio Ottomano, ou de hum subdito Ottomano no Imperio do Brasil, a entrega dos bens do fallecido ao Consul respectivo se fará na conformidade das leis, regulamentos e usos em tal caso observados em cada hum dos dous Imperios, onde tiver tido lugar o fallecimento, a respeito das heranças dos subditos das outras nações amigas.

Artigo 6º

Os subditos de cada huma das duas Altas Partes Contractantes serão, nos Estados da outra, isentos de todo serviço militar, seja qual for o seu estado ou profissão; e não serão obrigados a pagar senão as contribuições e impostos a que estão sujeitos os subditos das outras nações amigas.

Artigo 7º

As contestações ou differenças que occorrerem nos Estados de huma das duas Altas Partes Contractantes entre os subditos da outra, ou entre estes e os subditos nacionaes ou estrangeiros, bem como os delictos ou crimes commettidos pelos subditos de huma das duas Altas Partes Contractantes nos Estados da outra, serão ahi julgados segundo as fórmas e as leis em vigor, e que forem applicaveis tambem a respeito dos subditos das outras nações amigas.

Artigo 8º

Os navios mercantes de cada huma das duas nações, que fizerem commercio entre os dous Imperios, poderão em perfeita seguridade com a bandeira de sua respectiva nação navegar nas aguas e entrar nos portos da outra nação abertos ao commercio estrangeiro, onde pagarão os mesmos impostos e direitos que pagarem os navios mercantes das outras potencias amigas; e serão, a todos os respeitos, tratados como estes pelos governos e autoridades das duas nações, podendo importar e exportar todos os productos e mercadorias cuja importação ou exportação não for prohibida pelas leis e regulamentos do paiz. Estes productos e mercadorias serão sujeitos ao pagamento dos mesmos impostos e dos mesmos direitos de alfandega que pagão as outras nações amigas.

He prohibido aos navios de huma das duas Alias Partes Contractantes nos Estados da outra fazer o commercio de cabotagem ou costeiro; e, em nenhum caso, a bandeira de huma das duas nações será concedida a navios que pertenção a subditos da outra ou aos de qualquer outra nação.

Artigo 9º

Os navios de guerra de cada huma das duas Altas Partes Contractantes observarão huns para com os outros as demonstrações de amizade e cortezia usadas entre as marinhas das potencias amigas.

Artigo 10.

Em caso de naufragio de hum navio pertencente a huma das duas Altas Partes Contractantes sobre as costas do territorio da outra, a equipagem e passageiros serão eficazmente soccorridos e protegidos; e quanto aos effeitos e mercadorias que se puderem salvar, se observará o mesmo que em taes casos se pratica para com os das outras nações amigas.

Artigo 11 e ultimo.

As duas Altas Partes Contractantes tendo approvado e accordado as estipulações contidas no presente tratado de amizade, commercio e navegação, se obrigão a mantê-las em plena força e vigor por espaço de dez asnos, a contar da data da troca das ratificações, e durante todos os annos seguintes até que huma das Altas Partes Contractantes tenha notificado explicitamente á outra a sua resolução de o fazer cessar ou de modificar-lhe as disposições. Neste caso as estipulações do presente tratado serão obrigatorias para as duas Altas Partes Contractantes por espaço de doze mezes, a contar do dia da notificação da intenção de as fazer cessar ou de as modificar.

Conclusão

O presente tratado será ratificado, e as ratificações serão trocadas em Londres no espaço de quatro mezes a datar do dia da assignatura, ou antes se for possivel, e começará a ser posto em execução sessenta dias depois da troca das ratificações.

Em fé do que, os respectivos Plenipotenciarios o assignárão e sellarão com o sello de suas armas.

Feito em Londres aos cinco dias do mez de Fevereiro do anno de mil oitocentos e cincoenta e oito.

(L. S.)  FRANCISCO IGNACIO DE CARVALHO MOREIRA.

(L. S.)  C. MUSURUS.

Sua Magestade o Imperador houve por bem ratificar este Tratado em data de 10 de Abril do corrente anno.

Visconde de Maranguape.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1858


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1858, Página 482 Vol. 1 pt II (Publicação Original)