Legislação Informatizada - DECRETO Nº 10.327, DE 31 DE AGOSTO DE 1889 - Publicação Original

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DECRETO Nº 10.327, DE 31 DE AGOSTO DE 1889

Regula a ordem da collocação dos Ministros e a da substituição do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.

    Suscitando-se duvidas sobre a intelligencia do art. 37 da Carta de lei de 18 de Setembro de 1828, e Tendo ouvido a Secção dos Negocios da Justiça do Conselho de Estado, Hei por bem, Usando da attribuição que Me é conferida no art. 102, § 12, da Constituição do Imperio, Decretar o seguinte:

    Art. 1º A antiguidade no cargo de Desembargador, e não a data do exercicio no Supremo Tribunal de Justiça, é que regula a ordem de collocação que, nos termos do art. 37 da Carta de lei de 18 de Setembro de 1828, devem entre si guardar os Ministros respectivos na mesa do despacho.

    Art. 2º Essa mesma antiguidade prevalecerá para a substituição do Presidente de que trata o art. 2º da citada lei.

    Art. 3º Revogam-se as disposições em contrario.

    Candido Luiz Maria de Oliveira, do Meu Conselho, Senador do Imperio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Justiça, assim o tenha entendido e faça executar.

Palacio do Rio de Janeiro em 31 de Agosto de 1889, 68º da Independencia e do Imperio.

    Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

    Candido Luis Maria de Oliveira.

    Senhor. - Mandou Vossa Magestade Imperial, por Aviso de 23 de Abril do corrente anno, que a Secção de Justiça do Conselho de Estado consultasse com seu parecer sobre a reclamação que fez o Conselheiro João Antonio de Araujo Freitas Henriques contra a collocação que na mesa do Supremo Tribunal de Justiça lhe foi designada pelo respectivo Presidente.

    Em cumprimento da Ordem da Vossa Magestade Imperial a Secção examinou, como era de seu dever, attentamente a materia, mas antes de emittir seu parecer pede respeitosamente licença para delle fazer uma succinta exposição.

    O Decreto legislativo n. 3309 de 9 de Outubro de 1886 que mandou aposentar obrigatoriamente (§ 2º, art. 1º) o magistrado que completar 75 annos de idade, abriu em sua execução diversas vagas no Supremo Tribunal de Justiça, para preenchimento das quaes baixaram os seguintes actos do Poder Executivo: Decretos de 27 de Novembro e 4 de Dezembro, ambos do mesmo anno, fazendo as seguintes nomeações: pelo primeiro, além do reclamante, foram nomeados o Desembargador Silverio Fernandes de Araujo Jorge, tirados da Relação de Pernambuco, e mais os Desembargadores Tristão de Alencar Araripe e João José de Andrade Pinto, tirados da Relação desta Côrte.

    As nomeações feitas pelo segundo recahiram nos Desembargadores Viriato Bandeira Duarte e Olegario Herculano de Aquino e Castro, ambos tirados da Relação desta Côrte, e no Desembargador Francisco de Brito Guerra.

    Dos papais que foram presentes á Secção consta que desses nomeados prestaram juramento e tomaram posse no 1º de Dezembro do referido anno os Desembargadores Alencar Araripe e Andrade Pinto, e no dia 4 os Desembargadores Bandeira Duarte e Aquino e Castro, tirados da Relação da Côrte.

    Vantagem igual não podia caber ao reclamante que, sendo tirado da Relação de Pernambuco, tanto pela distancia como por seguirem-se logo áquella nomeação as ferias do Natal, sómente no dia 3 de Fevereiro do anno subsequente, isto é, dous mezes e seis dias depois de nomeado, pôde comparecer no Tribunal para entrar em funcção.

    Não obstante ser dentre os nomeados o Desembargador mais antigo, e por isso caber-lhe por direito a precedencia na mesa do Tribunal, como nessa occasião judiciosamente observou um dos Ministros daquelle Tribunal, o reclamante, occupando a cadeira que achou vaga, ficou em relação áquelles collocado no quinto logar.

    Assim correram as cousas até que pelo ingresso de um novo Juiz, o Conselheiro Leal, na sessão de 28 de Outubro daquelle mesmo anno, se levantou a questão.

    Com intuito de reivindicar seu direito de precedencia, invocou o reclamante a autoridade do Presidente do Tribunal. Foi-lhe contraria a decisão, sendo ella dada nos seguintes termos:

    «Em face dos precedentes e praxe do Tribunal, se conservem nos mesmos logares como os respectivos Srs. Ministros têm estado até hoje.»

    Não se conformando com esta decisão, appellou o reclamante para o Governo Imperial em petição datada de 28 de Novembro de 1887, sendo esta petição acompanhada de informação do Presidente do respectivo Tribunal datada de 1 de Fevereiro de 1888, peças estas que se acham annexas ao recurso.

    Do que em resumo fica, exposto vê-se que o ponto sobre que versa a consulta é o seguinte:

    Sendo o Conselheiro João Antonio de Araujo Freitas Henriques o Desembargador mais antigo dentre os que com elle foram nomeados Ministros do Supremo Tribunal de Justiça por virtude dos Decretos de 27 de Novembro e 4 de Dezembro de 1886, perde elle o direito de precedencia na mesa do Tribunal pelo facto de o terem aquelles precedido no exercicio das respectivas funcções?

    Este é o ponto da questão, e sobre o qual passa a Secção a consultar com seu parecer.

    A precedencia entre os membros que compoem os Tribunaes de Justiça, ou se trate do Supremo Tribunal de Justiça ou das Relações, é sempre regulada pelo principio de antiguidade.

    Com relação aos membros dos Tribunaes judiciarios, o nosso Direito não reconhece predicamentos ou prerogativas pessoaes ou honorificas que sirvam de fundamento á precedencia, como acontecia no antigo regimen.

    E' ponto liquido que não póde entrar em duvida.

    A questão a ventilar é a de saber como se determina a antiguidade para o dito effeito, si pela data da posse e exercicio no Tribunal para o qual o Juiz foi promovido, si da data e posse do logar da magistratura de que foi tirado para o Tribunal.

    Nas Relações a antiguidade e evidentemente regulada pela data da posse e exercicio do cargo de Desembargador; nem podia deixar de assim ser. Com effeito, sendo a nomeação de Desembargador livremente feita pelo Poder Executivo dentre uma lista de 15 dos Juizes de Direito mais antigos, bem póde o Governo, como todos os dias está acontecendo, escolher algum que não seja o mais antigo, donde resulta que entram para as Relações Juizes de Direito que não são os mais antigos da sua classe e que não raro vão encontrar no mesmo Tribunal membros que são mais novos na carreira da magistratura.

    Não fôra, pois, justo nem razoavel tomar como principio regulador da antiguidade nas Relações, a antiguidade na carreira, porque daria logar a constantes mutações é perturbações, tendo de se alterar precipitadamente a ordem das precedencias, sempre que occorresse a entrada de um novo Desembargador que encontrasse no Tribunal membros que lhe fossem inferiores em antiguidade de carreira.

    E' esta a razão por que nas Relações a antiguidade dos membros é regulada pela data da posse e exercicio do cargo de Desembargador.

    E um tal principio, pela mesma razão, prevaleceu sempre, como regra geral, nos antigos Tribunaes portuguezes e ainda na Casa da Supplicação, como se vê de differentes assentos da dita Casa; porquanto as promoções para as Relações do Reino e do Ultramar, bem como para a Supplicação, se faziam a livre arbitrio do Governo pelo predicamento de classes, e não pela antiguidade absoluta.

    Com relação ao nosso Supremo Tribunal de Justiça, não póde vigorar a mesma regra, attenta a maneira por que elle se constitue.

    A promoção de Desembargador a Ministro do Supremo Tribunal de Justiça é feita absoluta e exclusivamente pela acção do principio de antiguidade.

    «Na capital do Imperio, diz o art. 163 da Constituição, haverá tambem um Tribunal com a denominação de - Supremo Tribunal de Justiça - composto de Juizes lettrados tirados das Relações por suas antiguidades.»

    A Lei organica do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 1828, no art. 1º, reproduz o texto constitucional.

    Destas disposições resulta:

    1º Que o Ministro do Supremo Tribunal adquire o seu logar tão sómente pelo principio da antiguidade que tem como Desembargador;

    2º Que, dada a vaga, o logar vago pertence de direito e em termos absolutos o incondicionaes ao Desembargador mais antigo;

    3º Que, em consequencia, é uma pura formalidade para a investidura o decreto de nomeação expedido pelo Poder Executivo, ao qual não é livre nomear a outro que não seja o Desembargador mais antigo.

    Desde que o Ministro adquire o seu logar absolutamente por sua antiguidade, é manifesto que, por uma necessidade logica e invencivel, elle a conserva no Tribunal; porque, o que vem depois delle não podia ser nomeado sinão depois de haver elle passado a ser membro do Supremo Tribunal e deixado a esse outro seu immediato o logar de Desembargador mais antigo. Evidentemente o que vem depois delle não póde ser considerado mais antigo no Supremo Tribunal; porque então dar-se-hia o absurdo de que Desembargador, inferior em antiguidade, teria occupado, primeiro que o mais antigo, a vaga occurrente que de direito a este pertence.

    Assim, pois, attentas as disposições da Constituição e da Lei de 18 de Setembro de 1828, é innegavel que a antiguidade do Ministro do Supremo Tribunal se determina pela antiguidade que o mesmo Ministro tinha como Desembargador, e que, em consequencia, é por essa antiguidade que deve ser regulada a precedencia ou prioridade de ordem entre os membros do Tribunal.

    E ainda dos termos em que se exprimem os arts. 1º e 2º da Lei de 1828 póde-se deduzir argumento em favor da doutrina exposta.

    O art. 1º diz: «composto de Juizes lettrados, tirados das Relações por suas antiguidades.»

    O art. 2º: «no impedimento ou falta do Presidente, fará suas vezes o mais antigo.»

    Não tendo a lei feito restricção ou declaração alguma, não soffre duvida que a palavra - o mais antigo - de que falla o art. 2º allude à mesma antiguidade de que falla o artigo anterior.

    Importa observar que não se podem invocar para o caso os assentos da Casa da Supplicação relativos à antiguidade e precedencia nos antigos Tribunaes portuguezes, pela razão já dada, que para composição de taes Tribunaes não prevalecia, como com relação ao nosso Supremo Tribunal de Justiça, o principio absoluto da antiguidade.

    A competencia do Poder Executivo para solver a difficuldade pratica occurrente, por meio de decreto ou regulamento, não póde ser posta em duvida em presença do art. 102, § 12, da Constituição.

    Trata-se de questão de direito publico que só respeita a ordem do serviço no Supremo Tribunal e que não entende com direito de partes, nem com as attribuições civis ou criminaes do mesmo Tribunal. E' materia por sua natureza regulamentar.

    Em vista do expendido, é a Secção do Conselho de Estado do parecer:

    1º Que é procedente a reclamação do Ministro do Supremo Tribunal, Conselheiro João Antonio de Araujo Freitas Henriques;

    2º Que convem que o Governo Imperial fixe a verdadeira doutrina por decreto ou regulamento.

    Vossa Magestade Imperial, Senhor, Mandará como mais acertado for.

    Sala das conferencias da Secção do Conselho de Estado em 28 de Junho de 1889. - João Lins Vieira Cansansão de Sinimbú. - Visconde de S. Luiz do Maranhão. - Marquez de Paranaguá.

    RESOLUÇÃO. - Como parece. - Paço, 24 de Agosto de 1889. - Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador. - Candido Luiz Maria de Oliveira.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1889


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1889, Página 287 Vol. 2 pt II (Publicação Original)