Legislação Informatizada - DECRETO-LEI Nº 7.666, DE 22 DE JUNHO DE 1945 - Publicação Original
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DECRETO-LEI Nº 7.666, DE 22 DE JUNHO DE 1945
Dispõe sobre os atos contrários à ordem moral e econômica.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o art. 180 da Constituição,
DECRETA:
DOS ATOS CONTRÁRIOS A ECONOMIA NACIONAL
Art. 1º Consideram-se contrários aos interêsses da economia nacional:
I - os entendimentos, ajustes ou acordos entre emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas, ou entre pessoas ou grupo de pessoas vinculadas a tais emprêsas ou interessadas no objeto de seus negócios, que tenham por efeito:
a) elevar o preço de venda dos respectivos produtos;
b) restringir, cercear ou suprimir a liberdade econômica de outras emprêsas;
c) influenciar no mercado de modo favorável ao estabelecimento de um monopólio, ainda que regional;
II - os atos de compra e venda de acervos de emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas, ou de cessão e transferência das respectivas cotas, ações, títulos ou direitos, ou de retenção de estoques de mercadorias, desde que de tais atos resulte ou possa resultar qualquer dos feitos previstos nas alíneas a, b e c do item I;
III - os atos de aquisição ou detenção, a qualquer título, de terras, por parte de emprêsas industriais ou agrícolas, em proporção superior às necessidades de sua produção, desde que daí resulte ou possa resultar a supressão ou redução das pequenas propriedades ou culturas circunvizinhas;
IV - a paralisação, total ou parcial, de emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas desde que de tal fato resulte ou possa resultar a elevação dos preços das mercadorias ou o desemprêgo em massa de empregados, trabalhadores ou operários;
V - a incorporacão, fusão, transformação, associação ou agrupamento de emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas, ou a concentração das respectivas cota, ações ou administrações nas mãos de uma emprêsa ou grupo de empresas ou nas mãos de uma pessoa ou grupo de pessoas, desde que de tais atos resulte ou possa resultar qualquer dos efeitos previstos nas alíneas a, b e c do item I.
Parágrafo único. Para os efeitos dêste Decreto-lei a palavra "emprêsa",abrange as pessoas físicas ou jurídicas de natureza comercial ou civil que disponham de organização destinada à exploração de qualquer atividade com fins lucrativos.
Art. 2º Verificada a existência de qualquer dos atos referidos no art. lº,a C.A.D.E. notificará as emprêsas faltosas ou comprometidas no ato ou fato contrário aos interêsses da economia nacional para, dentro de prszo certo, fixado de acôrdo com as circunstâncias, cessarem a prática dos atos incriminados.
Art. 3º Se as emprêsas notificadas não cumprirem a determinação da C.A.D.E. dentro do prazo fixado, ou se, dentro dêsse prazo, não cessarem os efeitos prejudiciais aos interêsses da economia nacicnal, a C.A.D.E. decretará a intervenção em tôdas emprêsas envolvidas nos atos ou fatos julgados contrários à economia nacional.
§ 1º A intervenção terá caráter provisório e se limitará às gestões necessárias ao restabelecimento da situação conforme aos interêsses da economia nacional.
§ 2º A partir da data da decretação da intervenção, os administradores da emprêsa visada ficarão impedidos de praticar quaisquer atos de disposição de bens ou direitos integrantes do acervo da emprêsa.
§ 3º Os atos eventualmente praticados pelos administradores de emprêsas com infração do disposto no parágrafo anterior, serão nulos de pleno direito.
Art. 4º A intervenção será executada pela C.A.D.E., através da nomeação de interventor que praticará todos os atos necessários ao cumprimento da decisão proferida.
Parágrafo único. As despesas com a intervenção correrão por conta da emprêsa que a sofrer.
DOS ATOS NOCIVOS AO INTERÊSSE PÚBLICO
Art. 5º Os atos referidos no art. 1º serão considerados nocivos ao interêsse público quando :
a) envolverem indústrias bélicas, indústrias básicas, emprêsas editôras,jornalísticas, de rádio e teledifusão ou de divulgação e publicidade;
b) deles participarem emprêsas estrangeiras;
c) resultarem da ação de emprêsas nacionais ou estrangeiras, notòriamente vinculadas a coalizões, "trusts" ou cartéis, ajustados no estrangeiro.
Art. 6º Serão desapropriadas pela União as emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas comprometidas ou envolvida em atos nocivos ao interêsse público.
§ 1º O valor das desapropriações de que cuida êste artigo será pago aos desapropriados em títulos do Tesouro, de emissão especial, amortizáveis em quarenta anos.
§ 2º Para os efeitos do que dispõe o parágrafo único do art. 15 do Decreto-lei nº 3.365, de 21-6-1941 (Decreto-lei nº 4.152, de 6-3-1942), o depósito será feito nos títulos a que se refere o parágrafo anterior e em montante correspondente ao capital registrado das emprêsas desapropriadas.
§ 3º Na avaliação para fixação da indenização devida pela desapropriação, tomar-se-á por base o valor do ativo líquido da ernprêsa.
Art. 7º Julgada indispensável a desapropriação a C.A.D.E. transmitirá ao Presidente da República o inteiro teor de sua decisão, acompanhado dos elementos necessários à lavratura do decreto de desapropriação.
DA FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DO PODER ECONÔMICO
Art. 8º Não se poderão fundir, incorporar, transformar, agrupar de qualquer modo, ou dissolver, sem prévia autorizacão da C.A.D.E.:
a) os estabelecimentos bancários;
b) as emprêsas que tenham por objeto a produção ou distribuição de gêneros alimentícios;
c) as emprêsas que operem em seguros e capitalização;
d) as emprêsas de trensportes ferroviário, rodoviário e as de navegação marítima, fluvial ou aérea;
e) as emprêsas editôras, jornalísticas, de rádio e teledifusão, de divulgação e publicidade;
f) as indústrias bélicas, básicas, de interêsse nacional e as emprêsas distribuidoras dos respectivos produtos;
g)as indústrias químicas, de especialidades farmacêuticas ou de laboratório e de materiais odontológicos;
h) as indústrias de tecidos e calçados;
i) as emprêsas de mineração;
j) a produção e distribuição de instrumentos de trabalho, de um modo geral;
k) as emprêsas de eletricidade, gás, telefone e transportes urbanos e, em geral, os concessionários de serviços de utilidade pública.
Art. 9º A partir da data da publicação dêste decreto-lei, o Departamento Nacional da Indústria e Comércio e as Juntas Comerciais não poderão registrar alterações nos contratos ou estatutos de quaisquer firmas ou sociedades das espécies referidas no art. 8º, nem atos relativos à fusão, transformação ou incorporação das mesmas, sem a prévia audiência e autorização da C.A.D.E.
Parágrafo único. São nulos de pleno direito os registros feitos com inobservância dêste dispositivo.
Art. 10. As emprêsas a que se refere o art. 8º quando organizadas sob a forma de sociedades anônimas, terão o respectivo capital dividido obrigatóriamente em ações nominativas.
§ 1º Às emprêsas a que alude êste artigo, que tenham o respectivo capital dividido, total ou parcialmente, em ações ao portador, fica ccncedido o prazo de noventa dias para a conversão de suas ações ao portador em ações nominativas.
§ 2º Na hipótese de falta de cumprirnento do disposto no parágrafo interior, dentro do prazo fixado, a C. A.D.E. intervirá, provisòriarnente, na administração da emprêsa faltosa a fim de promover a observância do citado preceito.
Art. 11. Não terão validade, senão depois de aprovados e registrados pela C.A.D.E. os atos, ajustes, acôrdos ou convenções entre emprêsas comerciais, industriais ou agrícolas, de qualquer natureza ou entre pessoas ou grupo de pessoas vinculadas a tais emprêsas ou interessadas no objeto de seus negócios, que tenham efeito :
a) equilibrar a produção com o consumo;
b) regular o mercado;
c) estabilizar preços;
d) padronizar ou racionalizar a produção;
e) estabelecer uma exclusividade de distribuição em detrimento de outras mercadorias do mesmo gênero ou destinadas à satisfação de necessidades conexas.
§ 1º Os atos da categoria referida neste artigo, já vigente na data dada publicação dêste decreto-lei, deverão ser submetidos à aprovação da C.A.D.E. dentro do prazo de trinta dias.
§ 2º Os atos a que se refere o parágrafo anterior que não forem aprovados pela C.A.D.E. ou não lhe forem apresentados no prazo regulamentar, tornar-se-ão nulos e de nenhum efeito.
Art. 12. Independerão da aprovação de que cuidam as letras a, b e c do artigo anterior, os atos das autarquias federais incumbidas da direção,organização e defesa de determinados setores econômicos.
Art. 13. A C.A.D.E. poderá, reservada a competência que lhe é privativa, delegar às autarquias referidas no artigo anterior, a fiscalização ou execução do presente decreto-lei.
Art. 14. Nos setores econômicos a que se refere o art. 15. 50% das cotas de aumento de produção que venham a ser eventualmente concedidas, deverão ser reservadas para novos produtores mediante concorrência pública.
Parágrafo único. Os proprietários, sócios ou acionistas de emprêsas do mesmo gênero, já existentes, não poderão ser beneficiados com as novas cotas de aumento, senão no caso em que se não apresentern candidatos capazes à primeira concorrência.
Art. 15. As autoridades federais, estaduais ou municipais são obrigadas a prestar, sob pena de responsabilidade, tôda a assistência e colaboração que lhes fôr solicitada pela C.A.D.E.
Parágrafo único. Os funcionários públicos federais, estaduais, municipais ou de autarquias que dificultarem, retardarem ou embaraçarem a ação da C.A.D.E. ou de seus funcionários, ficarão sujeitos à penalidade de demissão a bem do serviço público, iniciando-se o processo administrativo competente mediante representação do Diretor Geral da C.A.D.E.
Art. 16. As empresas compreendidas neste decreto-lei são obrigadas a exibir aos funcionários da C.A.D.E. todos os seus livros, documentos, papéis e arquivos.
Parágrafo único. O Diretor Geral da C.A.D.E. poderá determinar a apreenção de quaisquer livros, documentos ou papéis sempre que esta providência lhe parecer necessária à segurança dos mesmos.
Art. 17. As empresas são obrigadas a prestar à C.A.D.E., por escrito e devidamente autenticadas, tôdas as informações que lhes forem solicitadas.
Parágrafo único. As empresas que se recusarem a prestar informações, na forma dêste artigo, ou que fornecerem informações inexatas ou falsas, ou embaraçarem de qualquer modo, a ação da C.A.D.E., ou de seus funcionários, ficarão sujeitas à pena de detenção por um a três meses, sem prejuízo das penalidades previstas no Regulamento do Impôsto sôbre a Renda.
Art. 18. A ação e processo fiscais da C.A.D.E. regular-se-ão por êste decreto-lei e pela legislacão relativa ao Impôsto sôbre a Renda, em tudo quanto lhes fôr aplicável.
DA COMISSÃO ADMINISTRATIVA DE DEFESA ECONÔMICA
Art. 19. A fim de dar cumprimento ao disposto neste decreto-lei, fica criada a Comissão Administrativa de Defesa Econômica (C.A.D.E. ), órgão autônomo, corn personalidade jurídica própria, diretamente subordinado ao Presidente da República.
Parágrafo único. A C.A.D.E. terá sede e fôro na Capital da República e será representada, nos atos judiciais ou extra-judiciais, pelo seu Presidente.
Art. 20. A C.A.D.E. será presidida pelo Ministro da Justiça e Negócios Interiores e compor-se-á:
a) do Procurador Geral da República;
b) do Diretor Geral da C.A.D.E.;
c) de um representante do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio;
d) de um representante do Ministério da Fazenda;
e) de um representante das classes produtora e distribuidoras;
f) de um técnico em economia de comprovada idoneidade e competência.
§ 1º Os representantes dos Ministérios serão nomeados pelo Presidente da República, mediante indicação dos respectivos Ministros.
§ 2º O representante das classes e o técnico a que se referem as letras f e g serão nomeados pelo Presidente da República.
§ 3º Sòmente poderão ser nomeados para constituirem a comissão de que trata êste artigo, brasileiros natos, maiores de trinta anos, de reputação ilibada.
Art. 21. Compete privativamente à C.A.D.E.:
a) julgar a existência ou inexistência, em cada caso concreto que lhe fôr presente de atos ou práticas contrários aos interesses da economia nacional, ou nocivos ao interêsser público, ou da coletividade;
b) delimitar as áreas de terra para aplicação do art. 1º, III;
c) decretar e executar a intervenção em empresas, nos têrmos dêste decreto-lei;
d) organizar a lista das indústrias bélicas, básicas e de interêsse nacional para os efeitos do disposto neste decreto-lei;
e) conceder ou negar as autorizações de que cogitam os artigos 8º e 11, bem como as apravações a que se refere o art. 14;
f) fiscalizar a realização do capital das emprêsas a que se refere o artigo 8º;
g) receber. processar e julgar tôdas as representações que lhe sejam feitas por qualquer pessoa denunciando atos contrários ou nocivos aos interêsses públicos ou da economia nacional;
h) fiscalizar a execução dos serviços públicos concedidos pelo Estado, bem como aplicar as penalidades previstas nos respectivos contratos.
Art. 22. Os atos praticados pela C. A.D.E. no exercício de sua competência primitiva são equiparados aos dos Ministros de Estado para os efeitos do disposto no art. 319 do Código de Processo Civil.
Art. 23. Contra os atos praticados pela C. A.D.E., em conseqüencia de decisões proferidas nas matérias de sua competência privativa, não poderão ser concedidos interditos possessórios.
Art. 24. Além das as atribuições constantes do art. 24, compete, ainda,à C.AD.E.:
a) promover as investigações e inquéritos que julgar necessários ao cumprimento dêste decreto-lei;
b) organizar os seus serviços e o quadro do seu pessoal, bem como fixar os vencimentos de seus funcionários;
c) elaborar o seu orçamento e o seu Regimento Interno;
d) propor ao Presidente da República as medidas e providências que lhe parecem indispensáveis à defesa da economia nacional;
e) resolver sôbre a desapropriação do acervo de emprêsas, grupos ou associações de qualquer natureza, nos casos previstos neste decreto-lei;
f) manter um serviço completo de informações sôbre a vida econômica e financeira do país;
g) fiscalizar a administração das emprêsas de economia mista ou das que constituam patrimônio nacional;
h) examinar os balanços e relatórios anuais das emprêsas a que se refere o item anterior,propondo ao Presidente da República as providências que lhe parecerem necessárias.
Art. 25. A C. A.D.E. será dirigida pelo seu Diretor Geral, sob a orientação do Ministro da Justiça e Negócios Interiores.
Parágrafo único. O cargo de Diretor Geral será exercido, em comissão, por pessoa de confiança do Ministro da Justica e Negócios Interiores e por êste nomeada.
Art. 26. Compete ao Diretor Geral:
a) cumprir e fazer cumprir as decisões ou recomendações da C.A.D.E.;
b) promover, diretamente ou através dos funcionários da C.A.D.E. a instrução dos processos que devam ser julgados pela Comissão, determinando as diligências que lhe parecerem necessárias;
c) organizar, orientar e fiscalizar os diversos serviços da C.A.D.E.;
d) nomear e demitir todos os funcionários da C.A.D.E., excetuados os Chefes de Serviço que serão nomeados pelo Presidente;
e) convocar, por ordem do Presidente, as sessões da Comissão e organizar a respectiva pauta;
f)subscrever tôda a correspondência da C.A.D.E.;
g) requisitar a quaisquer autoridades federais, estaduais ou municipais as informações ou providências que se tornarem indispensáveis ao cumprimento dêste decreto-lei, ou das decisões da C.A.D.E.
Art. 27. O pessoal da C.A.D.E. será equiparado, para efeito de vencimentos, ao pessoal do Banco do Brasil.
Art. 28. Os funcionários efetivos serão escolhidos mediante concurso, competindo à C.A.D.E. excluir da lista de concorrentes os candidatos inidôneos.
Parágrafo único. O Presidente da Comissão poderá requisitar, a quaisquer repartições ou autarquias federais, estaduais ou municipais, os funcionários especializados de que carecer.
Art. 29. As decisões e atos da C.A.D.E. serão publicados no Diário Oficial da União.
Art. 30. A fim de cobrir os gastos derivados da organização, manutenção e funcionamento da C.A.D.E., o Govêrno da União porá à disposição da mesma, anualrnente, a quantia necessária.
Art. 31. O Regulamento para execução dêste decreto-lei será organizado dentro do prazo de trinta dias pelo Ministério da Justiça e Negócios Interiores e aprovado por decreto do Poder Executivo.
Art. 32. O presente decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 22 de Junho de 1945, 124º da Independência e 57º da República.
GETÚLIO VARGAS
Agamemnon Magalhães
Henrique A. Guilhen
Eurico G. Dutra
José Roberto de Macedo Soares
A. de Sousa Costa
João de Mendonça Lima
Apolonio Salles
Gustavo Capanema
Alexandre Marcondes Filho
Joaquim Pedro Salgado Filho
- Diário Oficial da União - Seção 1 - 22/6/1945, Página 11033 (Publicação Original)