Legislação Informatizada - DECRETO-LEI Nº 1.561, DE 2 DE SETEMBRO DE 1939 - Publicação Original

Veja também:

DECRETO-LEI Nº 1.561, DE 2 DE SETEMBRO DE 1939

Aprova as regras de neutralidade no caso de guerra entre potências estrangeiras, não americanas.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere a Constituição:

CONSIDERANDO a conveniência de estabelecer regras gerais que devem ser observadas no território nacional para resguardar a neutralidade do Brasil no caso de guerra entre potências estrangeiras, não americanas;

DECRETA:

     Artigo único. Ficam aprovadas e devem ser cumpridas rigorosamente, sempre que o Governo Federal decretar a sua aplicação, as regras constantes da circular que a este acompanha, expedida pelo Ministério das Relações Exteriores.

Rio de Janeiro, 2 de setembro de 1939, 118º da Independência e 51º da República.

GETULIO VARGAS
Osvaldo Aranha.
Francisco Campos.
A. de Souza Costa.
Eurico G. Dutra.
Henrique A. Guilhem.
João de Mendonça Lima.
Fernando Costa.
Gustavo Capanema.
Waldemar Falcão.


 

CIRCULAR

    Regras Gerais de neutralidade

    Art. 1º O Govêrno do Brasil abster-se-á de qualquer ato que, direta ou indiretamente, facilite, auxilie ou hostilize a ação dos beligerantes. Não permitirá também que os nacionais ou estrangeiros, residentes no país, pratiquem ato algum que possa ser considerado incompatível com os deveres de neutralidade do Brasil.

    Parágrafo único. Entre os auxílios proibidos não se inclue a assistência sanitária, dada a qualquer dos beligerantes, e constante do concurso efetivo de pessoal, ou de pessoal e material, das formações sanitárias brasileiras. Mas, seja a assistência prestada, ou simplesmente autorizada, pelo Govêrno brasileiro, êste num e noutro caso, nela dará sempre conhecimento a todos os beligerantes.

    Art. 2º No território do Brasil, compreendendo as águas interiores e as territoriais, com seus respectivos fundos fluviais, lacustre e marinho, e o espaço aéreo correspondente, não será tolerado ato algum dos beligerantes que possa ser tido como ofensivo da neutralidade brasileira.

    Art. 3º Não constitue infração da neutralidade a simples passagem por águas territoriais brasileiras de navios de guerra e prêsas dos beligerantes.

    Art. 4º É vedada a formação, em território brasileiro, de corpos de combatentes para servirem a qualquer dos beligerantes, e bem assim a instalação de escritórios, agencias ou ofícios de alistamento, quer dos próprias racionais dos beligerantes, quer de brasileiros ou de naturais de outros países. É vedada também a arrecadação de donativos ou remessa de fundos para as nações beligerantes, excepto para o serviço da Cruz Vermelha.

    Artigo 5º Aos agentes dos Govêrnos da União e dos Estados, é proibido exportar, para ser entregue aos beligerantes, toda a espécie de material de guerra, bem como favorecer, de modo direto ou indireto, qualquer remessa do referido material.

    Artigo 6º Não é permitida a exportação de artigos bélicos, dos portos do Brasil para os de qualquer das potências beligerantes.

    Artigo 7º O Govêrno do Brasil não consente se equipem ou armem corsários em águas de sua jurisdição, e usará dos meios ao seu alcance para impedir o equipamento ou armamento de todo navio que êle tenha motivos para crêr destinado a cruzar, ou a tomar parte em operações de guerra, contra qualquer dos beligerantes. A mesma vigilância empregará para obstar também a que, de águas brasileiras, parta, com aqueles objetivos, algum navio que, nas referidas águas, tenha sido no todo ou em parte, adaptado aos usos da guerra.

    Artigo 8º E' absolutamente interdito aos beligerantes fazerem do litoral e das águas territoriais brasileiras base de operações navais contra os adversários. E' igualmente vedado aos beligerantes receber nos portos do Brasil gêneros vindos diretamente para êles em navios de qualquer nacionalidade.

    Artigo 9º E' interdito aos beligerantes instalar ou manter em território brasileiro, compreendidas as águas territoriais, estações radiotelegráficas, ou qualquer aparelho que venha a servir de meio de comunicação com forças beligerantes, terrestres, marítimas ou aéreas. Outrossim, os navios mercantes das nações beligerantes, desde que entrarem e enquanto permanecerem em águas brasileiras, estarão proibidos de fazer uso de seus aparelhos de radiotelegrafia para se dirigirem às estações do litoral, salvo em caso de perigo ou quando houver necessidade de piloto.

    Artigo 10. Somente com estrita observância das condições estabelecidas nas presentes regras, navios de guerra beligerantes poderão ser admitidos nos portos, baías, ancoradouros e águas territoriais do Brasil.

    A permanência de cada um não excederá de 24 horas, excepto se:

    a) dentro desse prazo, não tendo sido possível efetuar os consertos indispensáveis, para que novamente se exponham ao mar, correrem risco de se perder;

    b) igual risco houver em razão de mau tempo, a juízo da autoridade naval brasileira;

    c) estiverem ameaçados por inimigo cruzando nas proximidades do lugar de refúgio;

    d) ocorrer algum dos casos indicados nos três parágrafos seguintes, nos quais, ficará ao arbítrio do Govêrno determinar o tempo de demora.

    § 1º Quando por motivo de força maior, o abastecimento de víveres ou de combustível, permitido pelas autoridades brasileiras, não tiver terminado dentro em 24 horas, êste prazo poderá ser prorrogado pelo tempo estritamente necessário para que se ultime.

    § 2º Quando navios de guerra beligerantes dos adversários se acharem simultaneamente em porto, baía ou ancoradouro brasileiros, deverá mediar o espaço de 24 horas, pelo menos, entre a partida de um deles e a do navio inimigo. A ordem das partidas será regulada pela das chegadas, salvo se o navio que primeiro tiver chegado, se achar nalgum dos casos em que é permitido prolongar a permanência.

    § 3º Nenhum navio de guerra beligerante poderá deixar o pôrto, a baía ou o ancoradouro brasileiros, em que estiver, senão 24 horas, pelo menos, após a partida do navio mercante que arvore pavilhão inimigo. Se fôr navio de vela o que sair e a vapor o que ficar, não poderá êste partir senão três dias depois.

    Art. 11. Não passará de três o número máximo de návios de guerra de uma potência beligerante, ou de várias potências beligerantes aliadas, que poderão estacionar ao mesmo tempo, nalgum pôrto, baía ou ancoradouro brasileiros.

    Art. 12. Aos navios-hospitais e aos vasos de guerra exclusivamente empregados em missão cientifica, religiosa ou filantrópica não se aplicam as disposições dos precedentes artigos 9 e 10.

    Art. 13. A nenhum submarino armado em guerra, pertencente a qualquer dos beligerantes, permitir-se-á quer o acesso aos portos, baías ou ancoradouros, quer a permanência no mar territorial brasileiro. A proibição, todavia, não é extensiva aos submarinos que, em consequência do estado do mar, ou por motivo de avarias, forem forçados a penetrar em águas brasileiras. Em tal emergência, deverão êles indicar, por meio de um sinal internacional, a causa de sua presença nas referidas águas, as quais terão de deixar logo que cesse o motivo que a justificava. Enquanto permanecerem em águas brasileiras os submarinos navegarão à superfície e conservarão o vespectivo pavilhão constantemente içado.

    Art. 14. Se notificado a sair, pela autoridade local competente, algum navio de guerra beligerante conservar-se no pôrto, ba'a ou ancoradouro brasileiros em que já não lhe é mais permitido permanecer, o Govêrno Federal tomará as medidas que julgar convenientes para tornar o navio incapaz de se fazer ao mar, enquanto durar a guerra. Não atendendo o comandante, o Governo Federal ordenará as autoridades brasileiras o emprêgo da fôrça para que a sua determinação seja cumprida e a neutralidade do país não fique comprometida.

    Art. 15. Quando um navio de guerra beligerante tiver que ser retido no Brasil, os oficiais e a guarnição serão igualmente retidos, embora, a juízo das autoridades brasileiras, possam ser alojadas noutra embarcação ou em terra, sujeitos às medidas restritivas que forem necessárias. Em qualquer caso, permanecerão a bordo do navio retido os homens necessários à conservação do mesmo. Os oficiais poderão ficar em liberdade, desde que tomem e assinem o compromisso, sob palavra de honra, de não sairem do lugar que em território nacional lhes fôr designado, sem autorização do Ministro da Marinha do Brasil.

    Art. 16. As presas, feitas pelos beligerantes, poderão ser trazidas aos portos, baías e ancoradouros brasileiros somente por causa de inavegabilidade, mau estado do mar, falta de combustível ou de provisões, e para descarregar mercadorias destinadas ao Brasil. Deverão partir dentro em 24 horas, ou logo que haja cessado o motivo da sua entrada. Se tal não se der, as autoridades brasileiras, após aviso, usarão dos meios ao seu alcance a-fim-de serem relaxadas as presas, com os respectivos oficiais e tripulação, e internada a guarnição posta a bordo pelo captor. Excepcionalmente serão admitidas presas trazidas para ficarem, sob sequestro, à espera do tribunal de presas competente. Em qualquer hipótese o Governo brasileiro se reserva o direito de reclamar o desembarque de mercadoria destinada ao Brasil.

    Artigo 17. Nenhum tribunal de prêsas poderá ser constituído por qualquer beligerante em território brasileiro, ou em navio que esteja em águas territoriais brasileiras, e nos seus portos, baías e ancoradouros não será permitida a venda de prêsas.

    Artigo 18. Os navios beligerantes admitidos em pôrtos, baias, ancoradouros brasileiros, permanecerão, nos pontos que lhes forem designados pelas autoridades locais, em perfeita tranquilidade e completa paz com todos os demais navios que alí estiverem, ainda que sejam os de guerra, ou armados em guerra, de outra potência beligerante

    Artigo 19. Nos portos, baías ou ancoradouros brasileiros, os navios de guerra beligerantes não poderão aumentar, por forma alguma a força bélica, renovar as provisões militares ou armamento completar a guarnição, sendo-lhes, apenas, permitido reparar as avarias na medida indispensável à segurança da navegação. As autoridades navais brasileiras verificarão a natureza dos consertos necessários, que deverão ser feitos com a maior celeridade possível.

    Artigo 20. Os navios de guerra beligerantes só poderão abastecer-se, nos portos, baías e ancoradouros brasileiros, do que fôr necessário para completar a respectiva provisão normal de víveres, em tempo de paz, e a quantidade de combustível suficiente para que possam alcançar o porto mais próximo do seu país.

    Artigo 21. Os navios de guerra beligerantes que tomarem, combustível em portos, baías ou ancoradouros brasileiros não poderão renovar a provisão, nos mesmos ou em quaisquer outros portos, baías e ancoradouros, senão três meses depois da anterior.

    Artigo 22. Os navios de guerra beligerantes que, perseguidos pelo inimigo, e para evitar ataque iminente, se refugiarem em portos, baías e ancoradouros brasileiros, serão retidos e desarmados onde o Govêrno brasileiro determinar.

    Artigo 23. Todo ato de hostilidade, inclusive a captura e o exercício do direito de visita, praticado por navio ou aeronave beligerante, em águas territoriais brasileiras ou no espaço aérea correspondente, constitue violação da neutralidade brasileira e ofende a soberania da nação. O Govêrno Federal pedirá ao Govêrno beligerante, a que pertencer o navio ou a aeronave, além da satisfação pela ofensa recebida, as providências tendentes à anulação dos efeitos do abuso praticado ou à reparação do dano causado.

    Artigo 24. O navio beligerante que houver violado a neutralidade brasileira ficará impedido, durante a guerra, de penetrar em pôrto, baía ou aneoradouro brasileiros. A aeronave beligerante nas mesmas condições não terá autorização para voar sôbre território brasileiro.

    Artigo 25. No tocante à aplicação das presentes regras, os navios mercantes armados, dos beligerantes, serão equiparados aos navios de guerra, se o seu armamento não se destinar a fins puramente defensivos. Entre outras provas, sujeitas à verificação das autoridades navais brasileiras, de que o armamento não terá fins ofensivos, devem concorrer as seguintes:

    - O navio não terá tubo lança-torpedos;

    - o calibre dos canhões não será superior a seis polegadas;

    - as armas e munições de guerra serão em pequena quantidade, a tripulação a normal e a carga consistirá em artigos impróprios para a guerra.

    Artigo 26. É proíbido aos beligerantes estabelecer depósitos de combustível em território, ou a bordo de navios estacionados em águas territoriais brasileiras.

    Artigo 27. As aeronaves militares dos beligerantes não terão autorização para voar sôbre território brasileiro. As que penetrarem em zona sob a jurisdição brasileira serão, depois da conveniente intimação, obrigadas a pousar, em terra ou no mar. Os aparelhos serão retidos e desarmados; as tripulações serão internadas.

    Parágrafo único. As aeronaves militares transportadas a bordo de navios de guerra serão consideradas como fazendo parte dêles, mas não deverão levantar vôo enquanto o navio se encontrar em águas territoriais brasileiras.

    Artigo 28. As aeronaves não militares, dos beligerantes só poderão voar sôbre o território e águas brasileiras, mediante prévia permissão das autoridades competentes.

    Artigo 29. O Govêrno Federal não permitirá:

    a) a partida, do território ou águas brasileiras, de aeronave convenientemente aparelhada e que se tenha motivos de acreditar destinada a exercer atos de hostilidade contra qualquer dos beligerantes;

    b) a partida de aeronave de cuja tripulação faça parte qualquer membro de força combatente de algum dos beligerantes.

    Artigo 30. Nos casos omissos, serão observados os princípios de neutralidade geralmente reconhecidos pelo direito internacional.

 


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 04/09/1939


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 4/9/1939, Página 21265 (Publicação Original)