Legislação Informatizada - DECRETO LEGISLATIVO Nº 1, DE 1996 - Exposição de Motivos

DECRETO LEGISLATIVO Nº 1, DE 1996

Aprova o texto da Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar, concluída em Montevidéu, em 15 de julho de 1989.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

     Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

     Elevo a consideração de Vossa Excelência o anexo projeto de mensagem pelo qual se submete ao referendo do Congresso Nacional o texto da Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar, celebrada em Montevidéu em 15.05.89, na IV Conferência Especializada Interamericana sobre Direito Internacional Privado (CIDIP-IV), com base em projeto elaborado pela Comissão Judiciária Interamericana.

     2. O referido instrumento foi assinado por outros dez países latino-americanos, mas ainda não entrou em vigor internacionalmente por só haver obtido, até hoje, uma ratificação (México) das duas referidas para tanto, de conformidade com o art. 11. O Brasil não figurou entre os signatários originais, por não ter, naquela ocasião, considerando urgente sua celebração, face a nossa participação na Convenção sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro (Nova York, 1996), que tem caráter universal e vinha funcionando satisfatoriamente. Optou-se, assim, por diferir a decisão de firma-la, pendente uma cuidadora análise do texto adotado.

     3. No ano passado, no âmbito dos dois encontros realizados em Brasília pela Comissão Técnica incumbida de preparar as Reuniões de Ministros da Justiça dos países integrantes do MERCOSUL, considerou-se importante, tendo em vista a intensificação das relações jurídicas em geral e a necessidade de estabelecer forma mais ágeis de cooperação judiciária no quadro de integração regional preconizada pelo Tratado de Assunção, que todos quatro países ratificassem a Convenção Interamericana, já que, dos outros três membros do MERCOSUL, somente a Argentina também é parte na Convenção de Nova York mas, entre eles, o assunto está regulado por acordos bilaterais. Assim, só o Brasil não dispõe, atualmente, de instrumentos que disciplinem a matéria em suas relações com o Paraguai e o Uruguai. Seja como for, ainda será necessário que a Argentina assine e ratifique a Convenção Interamericana, e que o Paraguai e o Uruguai, que já a assinaturas, a ratifiquem, para que a mesma possa entrar em vigor. Ás delegações dos três países informaras, no ultimo encontro da referida Comissão Técnica, que estavam sendo tomadas as providências nesse sentido. Em alguns aspectos, a Convenção de Montevidéu e mais avançada que a homologa de Nova York.

     4. Diante do exposto, os integrantes brasileiros da Comissão elaboraram Nota Indicativa a favor da subscrição, pelo Brasil, da Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar, a qual foi aprovada pelo senhor Ministro da Justiça que, por sua vez, solicitou ao Itamaraty a adoção das providências cabíveis. Antes de encaminhar o assunto a Vossa Excelência, com proposta de sua submissão à aprovação do Congresso Nacional, era necessário providenciar a assinatura do ato pelo Brasil, nos termos de seu artigo 23, o que foi feito no dia 15 de janeiro deste ano, pelo Representante Permanente junto à Organização dos Estados Americanos.

     5. A Convenção em apreço tem por objeto:

a) a determinação do direito aplicável à obrigação alimentar;
b) a competência para conhecer da demanda; e
c) a cooperação processual internacional, quando o credor de alimentos tiver seu domicilio ou residência habitual, bens ou rendas em outro Estado-Partes.

     O âmbito da cooperação abrange obrigações alimentares para menores e derivadas das relações matrimoniais.

     6. A adoção de seu texto implica inovar o ordenamento jurídico na medida em que permite:

a) aplicar a legislação estrangeira, no Brasil, se mais favorável ao credor (faculdade conferida ao Juiz);
b) a possibilidade de execução provisória (alimentos provisionais) e;
c) competência na esfera internacional, a critério do credor.

     7. Quanto a aplicação da legislação estrangeira no Brasil, sua viabilidade resulta das disposições do artigo 7º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro:

"A Lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família" (grifo acrescentado).     Para Franzen de Lima:

"A aplicação extraterritorial da lei, isto é, a eficácia da lei de um país em território de outro, está condicionada ao reconhecimento da extraterritorialidade, pelos princípios e convenções internacionais. Só quando admitida a extraterritorial é que a lei de um país pode ser aplicada no território do outro, pelas autoridades deste, com o fim de proteger certos direitos dos forasteiros, direitos esses que, por motivo de interesses do Estado e dos indivíduos e para atender a relação que se forma no seio da sociedade internacional, ficam submetidos à lei pessoal dos forasteiros, ou, para usar da expressão tradicional, ao seu estatuto pessoal. Lei pessoal ou estatuto pessoal é, portanto, a lei que tem aplicação extraterritorial, isto é, a lei que acompanha os súditos de uma soberania, para reger-lhes certos direitos, quando se acharem em outros países". (Curso de Direito Civil Brasileiro, parágrafo 96).     Ainda sobre a eficácia da lei no espaço, Clovis Bevilaqua, in Teoria geral do Direito Civil, parágrafo 28, observa:

"As leis são feitas para regular as ações e proteger os interesses dos indivíduos dentro de cada Estado, porque são emanações de soberania, que se acham em contato com outras. Mas essa função comum da lei, dada e existência das relações consideráveis dos indivíduos pertencentes a nações diversas, adquire uma extensão maior. Por outros termos a existência da sociedade internacional dos indivíduos exige que as leis tenham, em certas circunstâncias, uma função internacional, para regular as relações, que no seio dela se travaram".

      8. O Brasil, fundado das idéias de justiça, de utilidade e de soberania e em se tratando de matéria vinculada ao estatuto pessoal, poderá firmar regras para a aplicação das leis de um país em outro, quando regularem direitos de família.

     9. No tocante à competência para conhecer da demanda, a Convenção deixa a escolha a critério do credor, assim:

     - domicilio ou residência habitual do credor; e
     - domicilio ou residência habitual do devedor.

     Torna, ademais, preventa a competência daquela autoridade perante a qual o demandado comparecer sem objeção. Só em relação à cessão ou redução da pensão alimentícia a competência de autoridade que fixou a pensão se torna preventa.

     10. O Ministério da Justiça não vê inconveniência em se adotar tais regras, com o que estou de acordo, inclusive porque o art. 27 da Convenção, como de praxe em instrumentos do gênero faz a devida ressalva dos princípios fundamentais da ordem pública.

     11. De igual forma, a execução provisória de alimentos provisionais tem alcance social inquestionável, de modo que sua adoção derroga, em parte, a exigência do trânsito em julgado de uma sentença para fins de homologação.

     12. Finalmente, considera do referido Ministério desnecessário por parte do Brasil, as declarações a que se referem o parágrafo 1 do artigo 1 e o artigo 3 inversamente, julga conveniente que se faça, no momento da ratificação, aquela a que alude o artigo 18, de modo a deixar claro que será adotado, no Brasil, o seu direito processual para reger a competência de seus juízes e tribunais, bem como o processo de reconhecimento da sentença estrangeira.

     Respeitosamente,

LUIZ FELIPE PALMEIRA LAMPREIA
Ministro de Estado, interino, das Relações Exteriores


Este texto não substitui o original publicado no Diário do Congresso Nacional - Seção 1 de 12/04/1995


Publicação:
  • Diário do Congresso Nacional - Seção 1 - 12/4/1995, Página 6193 (Exposição de Motivos)