Legislação Informatizada - DECRETO LEGISLATIVO Nº 49, DE 1972 - Exposição de Motivos

DECRETO LEGISLATIVO Nº 49, DE 1972

Aprova o texto do Acordo de Cooperação entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América referente aos Usos Civis da Energia Atômica, celebrado em Washington, a 17 de julho de 1972, e o texto da Emenda ao Acordo entre a Agência Internacional de Energia Atômica, o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América para a Aplicação de Salvaguardas, firmado em Viena, a 27 de julho de 1972.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DO MINISTÉRIO DAS
RELAÇÕES EXTERIORES

     Em 7 de agosto de 1972.

     A Sua Excelência o Senhor General-de-Exército Emílio Garrastazu Médici, Presidente da República.

     Senhor Presidente,

     Em aditamento à exposição de motivos nº DOA-DAS-48-592.30 (22), de 29 de fevereiro último, e à exposição de motivos nº DOA-DAS-DNU-28-592.30 (22), de 4 do mesmo mês, tenho a honra de submeter à alta consideração de Vossa Excelência, para o devido encaminhamento ao Congresso Nacional, os textos, tal como assinados, do novo "Acordo de Cooperação entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América referente aos Usos Civis da Energia Atômica" e do acordo de emenda ao "Acordo entre o Governo das Estados Unidos do Brasil, o Governo dos Estados Unidos da América e a Agência Internacional de Energia Atômica para aplicação de salvaguardas."

     2. O novo acordo de cooperação com os Estados Unidos da América nos usos civis da energia atômica foi assinado em Washington, no dia 17 de julho último, pelo Embaixador João Augusto de Araujo Castro e pelo Sub-secretário de Estado Alexis Johnson. Destina-se o texto do novo acordo a substituir o acordo atualmente em vigor entre os dois países, sobre a mesma matéria, e que foi assinado em Washington, a 8 de julho de 1965, aprovado pelo Decreto Legislativo número 48, de 4 de outubro de 1966, conforme publicação no Diário Oficial de 10 do mesmo mês, objeto de troca de instrumentos de ratificação em 9 de novembro de 1966, e promulgado pelo Decreto n.º 61.517, publicado no Diário Oficial de 17 dos mesmos mês e ano.

     3. Para maior facilidade no exame comparativo dos dois textos, o vigente e o que o amplia, encaminho em anexo, ao lado do novo acordo, o acordo de 1965.

     4. Como é do conhecimento de Vossa Excelência, a proposta original do texto que ora dhe submeto para envio ao Congresso foi, redigida pelos setores brasileiros competentes no domínio da energia nuclear, com fundamento em modelos de acordos similares firmados pelos Estados Unidos da América com terceiras potências (Espanha, Suécia e Japão, por exemplo). A iniciativa nasceu especificamente da necessidade de garantir-se para o reator de potência de Angra dos Reis, que é um reator a água pressurizada (PWR), e que, portanto, utiliza como combustível o urânio enriquecido no isótopo U-235, quantidades desse material superiores às que estabelece o acordo vigente. O acordo vigente, além disso, prevê transferências de urânio enriquecido apenas para reatores de pesquisa (artigo II do acordo em vigor).

     5. O artigo VII do novo acordo dispõe que a Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos se compromete a fornecer, no prazo de vigência do acordo, ou seja, 30 anos, as necessidades do Brasil em urânio enriquecido no isótopo U-235 para utilização como combustível no programa de reatores de potência descrito no apêndice. O apêndice limita-se a mencionar o reator "Angra I", cuja construção já foi iniciada, e cuja criticalidade está prevista para 1976. O prazo de vigência do acordo (30 anos) corresponda à vida útil prevista da central nuclear.

     6. Tal garantia de fornecimento é indispensável ao reator de potência de Angra, urna vez que, atualmente, no mundo ocidental, os serviços de enriquecimento são feitos, em bases comerciais, apenas pelos Estados Unidos da América. A capacidade instalada atualmente nos Estados Unidos, acrescida da expansão projetada das instalações norte-americanas, deverá atender à demanda prevista no âmbito interno e externo até 1980. Em ambos os casos, a demanda só poderá ser satisfeita se houver um contrato que defina previamente as necessidades de cada consumidor, de maneira a possibilitar ao Governo norte-americano projetar e executar novas instalações.

     7. A Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos, segundo o novo acordo, fornecerá urânio enriquecido no isótopo U-235 - seja produzindo-o totalmente, seja enriquecendo o urânio brasileiro - aos mesmos preços estabelecidos para os consumidores internos. Nos termos do acordo de 1965, a transferência do urânio far-se-ia pelos preços que fossem mutuamente acordados para cada caso, e que ficariam sujeitos, portanto, a eventuais discriminações com relação aos consumidores internos.

     8. Pelo artigo II, alínea "e", do acordo de 1965, qualquer fonte ou material nuclear especial recebido dos Estados Unidos da América, que necessitasse reprocessamento, deveria ser enviado aos Estados Unidos da América para sofrer tal operação em instalações norte-americanas. Já no acordo que deve ser submetido ao Congresso, o reprocessamento ou qualquer operação do elemento combustível de procedência americana poderá ser realizada em instalações brasileiras (artigo VIII "f.").

     9. Pelo acordo ainda em vigor (artigo II "f") o material nuclear especial produzido em qualquer parte do combustível como resultado dos processos de irradiação pertenceria ao Brasil, ou seria restituído ao Brasil, após reprocessamento. A propriedade dos materiais passaria ao Governo brasileiro na ocasião da restituição. No entanto, o Governo norte-americano reservava-se a opção de reter, mediante justa indenização, qualquer parte de tal material que excedesse as necessidades do Brasil em seu programa de energia nuclear. O Governo americano teria ainda a primeira opção de compra de materiais nucleares especiais, a preços correntes nos Estados Unidos da América. E' vantajoso o fato de que disposições similares não constam do acordo agora assinado.

     10. O novo acordo atende melhor às necessidades de combustível nuclear dos reatores de pesquisa para os quais destina 500 quilogramos de urânio enriquecido e 20 quilos de plutônio, enquanto o acordo de 1965 limitava a transferência a 15 quilogramos de urânio e a 260 gramas de plutônio.

     11. O novo acordo atende perfeitamente aos interesses nacionais sem contrariar acordos ou compromissos internacionais firmados ou assumidos pelo Brasil. Não faz menção ao Tratado de Não Proliferação. Apenas, durante a sua assinatura, foi lida uma nota pela qual o Governo norte-americano declara entender que o material, recebido pelo Governo brasileiro no âmbito do acordo firmado naquele momento não seria utilizado para explosões nucleares, quaisquer que fossem suas finalidades. Tal declaração foi também feita pelo delegado norte-americano na reunião da Junta de Governadores da Agência Internacional de Energia Atômica em fevereiro último, quando os países interessados e o secretariado da AIEA solicitaram que aquele órgão concedesse ao Diretor-Geral da Agência poderes necessários para a negociação de acordos de transferência de salvaguardas decorrentes dos acordos bilaterais a serem concluídos entre a Suécia e os Estados Unidos e o Brasil e os Estados Unidos. Não se trata, portanto, de uma medida tomada apenas em relação ao Brasil, mas de uma reserva de posição coerente com a política norte-americana em relação ao Tratado de Não Proliferação. A parte brasileira, por sua vez, aceitou tacitamente a nota - sem prejudicar sua posição de princípio, contrário ao Tratado de Não Proliferação - por julgar que o urânio enriquecido a ser transferido no âmbito do novo acordo estava em grande parte precipuamente destinado ao funcionamento de uma central geradora de energia elétrica e a pesquisas desvinculadas de explosões nucleares. Em termos qualitativos, tanto o urânio, quanto o plutônio a ser arrendado ou comprado pelo Brasil não são utilizáveis para a fabricação de explosivos, pelo seu baixo teor de isótopos físseis adequados para tal fim.

     12. Tal como no acordo de 1965, o novo acordo prevê a aplicação de salvaguardas pela própria Comissão norte-americana de energia atômica, ou, alternativamente, pela Agência Internacional de Energia Atômica, desde que entre em vigor o Acordo de emenda ao "Acordo entre o Governo dos Estados Unidos da América e a Agência Internacional de Energia Atômica para aplicação de salvaguardas", de 10 de março de 1967. Como e de nosso interesse, assim como é do interesse do Governo norte-americano, que a Agência, órgão multinacional em que os dois países estão representados, e cujas salvaguardas já têm sido aplicadas no Brasil, se encarregue tão pronto quanto possível das salvaguardas estabelecidas pelo novo Acordo de cooperação, promovemos com urgência a assinatura das emendas o que se realizou em Viena, em 27 de julho último, e estou enviando o seu texto a Vossa Excelência para que, juntamente com o acordo de cooperação, possa ser submetido ao Congresso.

     13. Em essência, as emendas se limitam a atualizar o texto do Acordo trilateral de salvaguardas vigentes, em face do fato de que, depois de assinado, em março de 1967, o Acordo trilateral de salvaguardas atualmente em vigor, o documento de salvaguardas da Agência (referido no texto do Acordo como "documento de salvaguardas") foi reformulado para conter disposições aprovadas pela Junta de Governadores da Agência não só em 28 de setembro de 1965, e 17 de junho de 1966, mas também em 13 de junho de 1968. Tais disposições acrescentadas ao documento básico já incorporado ao Acordo trilateral de salvaguardas vigentes entre o Brasil, os Estados Unidos da América e a Agência, e, portanto, já aplicado no Brasil consistem em especificações de caráter técnico dos procedimentos a serem usados no exercício das salvaguardas, no caso de "usinas de reprocessamento" e de "usinas para fabricação de material nuclear." Entre as usinas dos dois tipos não se incluem reatores, conforme esclarecimento expresso no texto do documento pertinente (INFCIRC-66-Rev. 2'). O caráter técnico das disposições adicionais do "Documento de salvaguardas" não levantou objeção de parte da Comissão Nacional de Energia Nuclear, e também não suscitou oposição de nossa parte quando aprovado pela Junta de Governadores da Agência em 1968, Junta de que fazíamos parte na época, como o fazemos agora.

     14. Permito-me acentuar a importância de que os dois acordos recentemente assinados e que encaminho em anexo sejam examinados pelo Congresso Nacional com a possível urgência, dado que o acordo assinado entre o Eximbank e "Furnas Centrais Elétricas S. A." para o funcionamento da compra de equipamentos importados e aquisição de combustíveis do reator condiciona o seu vigor à ratificação do acordo bilateral à cooperação num prazo de nove meses após a assinatura do contrato, ou seja, até setembro próximo. As mesmas disposições encontram-se no acordo entre "Furnas" e a "Westinghouse" para compra propriamente dita  do equipamento e dos elementos combustíveis. Esses dois contratos de "Furnas S.A." estão relacionados com a instalação do reator de potência em Angra dos Reis.

     15. Remeto também, em anexo, o texto do Acordo de Salvaguardas vigente e que, será emendado.

     Aproveito a oportunidade para renovar a Vossa Excelência, Senhor Presidente, os protestos do meu mais profundo respeito.

Mário Gibson Barboza.


Este texto não substitui o original publicado no Diário do Congresso Nacional - Seção 1 de 25/08/1972


Publicação:
  • Diário do Congresso Nacional - Seção 1 - 25/8/1972, Página 2935 (Exposição de Motivos)