Legislação Informatizada - DECRETO LEGISLATIVO Nº 1, DE 1961 - Exposição de Motivos

DECRETO LEGISLATIVO Nº 1, DE 1961

Aprova o Tratado que estabelece uma zona de livre comércio, firmado pela Argentina, Brasil, Chile, México, Peru e Uruguai (Tratado de Montevidéu).

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DO
MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES
EXTERIORES

Em 12 de abril de 1960

     A Sua Excelência o Senhor Doutor Juscelino Kubitschek de Oliveira, Presidente da República.

     Senhor Presidente,

     Tenho a honra de submeter à alta apreciação de Vossa Excelência o incluso "Tratado que Estabelece uma Zona de Livre Comércio e Institui a Associação Latino-Americana de Livre Comércio" (Tratada de Montevidéu), formado no dia 18 de fevereiro do ano em curso, pelos representantes de Argentina, do Brasil, do Chile, do México, do Paraguai, do Peru e do Uruguai.

     2. Permito-me ressaltar que a assinatura dêste Tratado marca o início de uma nova fase nas relações econômicas do Brasil com países do Continente, criando um sistema multilateral dentro do qual os Governos latino-americanos procurarão superar as dificuldades que tem entravado até agora, o crescimento do comércio regional num esfôrço conjunto para encontrar novos caminhos que lhes permita acelerar o ritmo do desenvolvimento econômico da região.

     3. A decisão tomada pelos países latino-americanos decorreu de uma série de reuniões internacionais, de caráter informal e de cunho diplomático, bem como de gestões e sondagens junto a organismos internacionais, que culminaram com a solene assinatura do Tratado ao encerrar-se a II Reunião da Conferência Intergovernamental para o Estabelecimento de uma Zona de Livre Comércio entre Países da América Latina realizada em Montevidéu em fevereiro último.

     4. A escolha da fórmula jurídica de Zona de Livre Comércio para configurar os entendimentos a que chegaram os países latino-americanos foi, assim, o resultado de uma série de esforços exploratórios que remotam a agôsto de 1958, quando a Secretaria Executiva da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) promoveu uma reunião de consultas com altos funcionários dos Governos da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai para examinar as causas que vinham determinando a contração do intercâmbio comercial na região meridional do continente.

     5. Recomendou-se, nessa ocasião, a adoção de uma política de liberação gradativa do intercâmbio - mediante a abolição das barreiras de ordem tarifária, cambial, monetária ou de outra natureza - a fim de criar condições favoráveis à expansão e diversificação do comércio elemento de importância fundamental para os programas de desenvolvimento em curso na região.

     6. Com as vantagens resultantes de tal política, se estenderiam a países de fora da área, por fôrça do tratamento da nação mais favorecida consubstanciado no Acôrdo Geral sôbre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT) e em acôrdos bilaterais,  examinou se também, a possibilidade da instituição de um regime tarifário especial que restringisse à região os favores a serem negociados.

     7. Acolhendo favorávelmente as recomendações da referida reunião de consultas, os Governos da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai decidiram convocar uma reunião dos Embaixadores latino-americanos acreditados no Rio de Janeiro (outubro de 1959) na qual foi examinado o assunto e aprovada uma Declaração Conjunta, pela qual os países signatários manifestaram, a intenção de promover o "estabelecimento de um regime de preferências tarifárias regionais interlatino-americanas".

     8. Seguindo esta linha de ação, as Delegações do Brasil, Chile e Uruguai à XIII Sessão do GATT em Genebra, receberam instruções para fazer sondagens a respeito do tratamento que seria dispensado pelas Partes Contratantes a iniciativas em favor do estabelecimento de tal regime de preferências.

     9. Verificou-se, porém, que as Partes Contratantes do GATT não dariam aprovação a um regime de preferências tarifárias para a América Latina, na forma pretendida. Resolveu, então, a Delegação brasileira examinar a possibilidade do estabelecimento de uma zona de livre comércio, fórmula prevista expressamente nas disposições do Acôrdo Geral, a qual provávelmente substituiria, com vantagem, os acôrdos de comércio vigentes na área, bem como a idéia original de um regime especial de preferências.

     10. Em novembro de 1958, quando da Reunião de Peritos, de Bancos Centrais do Rio de Janeiro, o assunto foi debatido com o Diretor Principal da Secretaria Executiva da CEPAL, o qual ofereceu os serviços daquela Secretaria para os trabalhos preliminares. Como consequência dêsses entendimentos, técnicos da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, reuniram-se em Santiago do Chile, sob os auspícios da CEPAL, no mês de abril de 1959, e aprovaram um anteprojeto de acõrdo de zona de livre comércio que seria levado à consideração dos Governos dos quatros países.

     11. Julgou-se oportuno, porém, examinar atentamente as características do anteprojeto de zona livre comércio à luz das disposições do Acôrdo Geral sôbre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT). Para êsse fim, reuniram-se informalmente no Rio de Janeiro, em junho de1959, consultores dos Governos argentino, brasileiro, chileno e uruguaio com o Secretário Executivo do GATT.

     12. Concluiu-se dessa reunião que o anteprojeto, de modo geral, era compatível com as regras do GATT e poderia ser considerado como ponto de partida para o exame do assunto no plano governamental.

     13. Decidiram então os consultores dos quatro países recomendar a seus Governos que iniciassem, em setembro de 1959, as negociações do acôrdo de zona livre comércio e aceitassem o convite formulado pelo Govêrno do Peru para uma reunião informativa a ser efetuada em Lima, na qual técnicos da Argentina, Brasil, Chile, Uruguai e CEPAL prestariam a autoridades bolivianas, paraguaias e peruanas esclarecimentos sôbre o assunto.

     14. Na reunião de Lima, realizada em junho de 1959, foram prestados amplos esclarecimentos sôbre os trabalhos até então empreendidos sobre a criação de uma zona de livre comércio na América Latina e introduzidas alterações no anteprojeto que vinha sendo examinado, com a finalidade de adequá-lo aos entendimentos alcançados nas conversações do Executivo do GATT.

     15. Aceitando oferecimento feito pelo Govêrno do Uruguai, realizou-se de 16 a 30 de setembro de 1959, a I Reunião da Conferência Intergovernamental para o Estabelecimento de uma Zona de Livre Comércio entre Países da América Latina, com a Bolívia, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai e com a presença de observadores do México, Peru e Uruguai, e com a presença de observadores do Mexico, Venezuela, da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), do Conselho Interamericano Econômico e Social (CIS), da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e do Fundo Monetário Internacional (FMI).

     16. Tomando por base o anteprojeto elaborado pelos peritos reunidos em Santiago, Rio de Janeiro e Lima, a Conferência de Montevidéu elaborou um projeto de acôrdo de zona de livre comércio, e vários Protocolos e Resoluções, que foram enfeixados numa Ata Final, redigida em Português e espanhol, e assinada pelos chefes das delegações dos sete países participantes.

     17. De conformidade com a resolução nº 1 da Conferência, resolveu-se adotar as seguintes providências para o encaminhamento posterior do assunto:

     a) convocar uma segunda reunião da Conferência, a se realizar, na mesma cidade de Montevidéu, na primeira quinzena de fevereiro de 1960;
     b) submeter o projeto de acôrdo a amplo debate entre os diversos setores da opinião pública de cada país;
     c) solicitar aos Governos interessados que apresentassem até 15 de janeiro de 1960, as emendas que julgassem oportuno introduzir no projeto de acôrdo;
     d) recomendar que o texto final do acôrdo que viesse a ser aprovado pela II Reunião da Conferência fosse firmado pelos Ministros das Relações Exteriores dos países participantes.

     18. Essa resolução foi baseada em proposta da Delegação brasileira, que entendia ser necessário um amplo debate do projeto de acôrdo entre os órgãos governamentais e as entidades de classe brasileiras, antes da assinatura do acôrdo.

     19. De conformidade com essa orientação foram tomadas, no Brasil, as seguintes providências:

     a) criação no Departamento Econômico e Comercial do Itamarati de uma Comissão integrada por representantes das Confederações Rural, da Indústria e do Comércio, e dos órgãos federais diretamente interessados com a incumbência específica de analisar o projeto de Acôrdo, examinar as sugestões recebidas de pessoas ou instituições de todo o país e preparar, se assim julgasse indicado, emendas ao referido projeto;
     b) publicação do projeto no Diário Oficial, acompanhado de solicitação de remessa de criticas e sugestões à Comissão;
     c) elaboração e ampla distribuição de publicação em que se contenha pormenorizada exposição sôbre os antecedentes, natureza e objetivos do projeto de acôrdo de zona de livre comércio;
     d) exposições e debates sôbre o projeto, realizados por membros daquela Comissão na Comissão de Economia da Câmara dos Deputados, assim como no seio de associações públicas e privadas especialmente as representativas do comércio, indústria e agricultura, no Distrito Federal e nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Ceará.

     20. Ao cabo de três meses de trabalho, a Comissão preparou uma série de emendas que cobriam quase tôdas as disposições do projeto, as quais foram incorporadas em um substitutivo, encaminhado à Mesa da Conferência de Montevidéu, dentro do prazo previsto na Resolução acima mencionada.

     21. Entrementes, a questão dos pagamentos entre os países que possivelmente comportam a Zona de Livre Comércio mereceria a atenção necessária; foi ela objeto de exame pela Reunião de Peritos de Bancos Centrais, em janeiro último, na qual se concluiu que os regimes cambiais em vigor não obstariam a implantação de mecanismo tarifário que se tinha em vista com a criação da Zona.

     22. A II Reunião da Conferência instalou-se em Montevidéu no dia 4 de fevereiro último, com a presença de delegações dos sete países participantes da I Reunião e mais a do México. Compareceram, na qualidade de observadores representantes da Venezuela, Colômbia e Panamá, assim como da CEPAL, do Conselho Econômico e Social da Organização dos Estados Americanos, do Fundo Monetário Internacional e da Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) das Nações Unidas.

     23. A Delegação brasileira, chefiada pelo Ministro Paulo Leão de Moura, do Ministério das Relações Exteriores, foi integrada por representantes de vários órgãos governamentais e das três Confederações de classe, aos quais se juntou uma representação especial do Estado do Rio Grande do Sul.

     24. Os trabalhos da reunião tomaram por base de discussão o projeto elaborado na I Reunião. O texto definitivo do Tratado incorporou, em sua maior parte, o substitutivo enviado pelo Brasil, acrescido de várias emendas propostas no curso das deliberações, a maioria das quais pela própria Delegação Brasileira.

     25. Ao tomar a decisão de substituir os acôrdos bilaterais de comércio com alguns países vizinhos por um Tratado multilateral de Zona de Livre Comércio, o Govêrno brasileiro teve como objetivo fundamental assegurar a progressiva expansão do seu intercâmbio com os demais países latino-americanos, especialmente os da região meridional do continente com os quais existe um comércio tradicional de grande importância.

     26. As grandes distâncias que separam centros de produção e exportação, de um lado, e, de outro, mercados de importação e consumo, as dificuldades de transporte e de outros meios de comunicação entre países, que cobrindo vasta área geográfica, ainda contam, apenas com economias relativamente pouco desenvolvidas, a falta de rêde comercial adequada, levantam obstáculos, dificilmente removíveis a curto prazo, a expansão do comércio regional. A êsses se junta todo um sistema de restrições - representadas por tarifas aduaneiras, depósitos prévios, sobretaxas cambiais de caráter tarifário, contrôles quantitativos e tantas outras - instituídas geralmente seja como mecanismos de defesa do balanço de pagamentos seja como instrumentos de seleção das importações as quais, entretanto, frequentemente atuam como obicer necessários a expansão do comércio intra-regional.

     27. Se, como acima foi dito, alguns dos obstáculos naturais à exportação do intercâmbio regional só muito lentamente poderão ser eliminados, o mesmo, não ocorre com as restrições decorrentes de legislação aduaneira e de práticas cambiais, uma vez que essas restrições não resultam senão excepcionalmente, de problemas relacionados com a concorrência comercial entre os países da região.

     28. O Tratado de Montevidéu foi concebido com o objetivo precípuo de eliminar êsse fator restritivo do comércio da região, através de um programa gradual de redução dos direitos aduaneiros e demais restrições - a ser realizado mediante negociações multilaterais periódicas - até que os mesmos sejam integralmente abolidos, ao final de um período de doze anos para o essencial do comércio entre os países membros.

     29. A execução dêsse programa de liberação proporcionará maior estabilidade às correntes tradicionais do comércio intra-regional, bem como a criação e desenvolvimento de novas correntes de intercâmbio. Essas serão geradas principalmente pela superação - mediante a preferência tarifária inerente à Zona de Livre Comércio - das dificuldades que enfrentam os países menos desenvolvidos de comerciarem entre si produtos, de sua industrialização nascente, devido à concorrência de similares provenientes das nações altamente industrializadas.

     30. A criação e desenvolvimento do intercâmbio de manufaturas, constituirá o elemento dinâmico básico da Zona de Livre Comércio, através da qual se dará novo impulso ao processo de desenvolvimento econômico de cada um dos membros da Associação, permitindo eliminar desnecessárias duplicações de esforços e consequentemente, aumentar a probabilidade de mais rápidos resultados na luta que êsses países empreendem para a elevação progressiva dos padrões de vida de suas populações.

     31. Entre outras prováveis vantagens decorrentes da associação econômica criada pelo Tratado de Montevidéu, convém ainda ressaltar as seguintes:

     a) substituir gradativamente, no âmbito da Zona, importações procedentes de terceiros países, com a consequente liberação de divisas da área de moedas fortes, de maneira  a atender à crescente demanda global de importações que decorre do crescimento da renda real da região;
     b) possibilitar, dentro da Zona, o desenvolvimento de novas atividades de produção, assim como a expansão das já existentes, graças ao estímulo da ampliação multinacional dos mercados;
     c) contribuir, em consequência, para o acréscimo da produtividade, por meio da melhor utilização dos fatores de produção disponíveis na área.

     32. Para consecução de seus objetivos, o Tratado apoia-se em três elementos básicos:

     a) a implantação, no âmbito da Zona, de um tratamento tarifário pelo qual as concessões recíprocas, outorgadas em cumprimento ao programa de liberação, não se estendem a terceiros países;
     b) o estabelecimento de um sistema flexível de negociações para cumprimento do programa de liberação, de forma a possibilitar perfeita harmonização dos interêsses nacionais, abrindo, ao mesmo tempo, largas perspectivas à ampliação do intercâmbio e à crescente complementação das economias da Zona;
     c) a criação dos organismos necessários a imprimir o máximo de dinamismo na efetivação da política econômica concebida pelo Tratado.

     33. Permito-me, Senhor Presidente, fazer neste ponto uma breve análise dêsses três elementos básicos do Tratado - tratamento tarifário, flexibilidade de ação e função dinamizadora dos órgãos da Associação - pois a perfeita compreensão dos mesmos facilitará de muito o julgamento das vantagens que decorrem da criação da Zona de Livre Comércio.

     34. Com as reformas introduzidas no Brasil e nos demais países do Continente caracterizadas pela substituição dos contrôles direitos à importação por mecanismos indiretos e automáticos e pela restauração da Tarifa Aduaneira como instrumento básico de política comercial, viu-se desaparecer, a pouco e pouco, a possibilidade de estimular o comércio intra-regional através de favores específicos para as importações da área. Tal fato importou, não apenas a eliminação de poderoso fator promocional do intercâmbio, mas, também, grave risco para a própria manutenção de seus níveis tradicionais.

     35. Foi após criterioso exame dessas dificuldades e de possíveis opções para superá-las que os técnicos dos países da área chegarem à conclusão de que o estabelecimento de uma Zona de Livre Comércio constituiria a solução mais adequada, pois além de expressamente prevista pelo GATT e de assegurar ao intercâmbio da área o tratamento tarifário mais favorável possível, obedeceria inúmeros outros fatores de estimulo ao comércio intra-regional.

     36. A Zona de Livre Comércio constitui uma forma elementar de complementação econômica, caracterizada pelo compromisso de eliminação, em determinado prazo, das restrições tarifárias e de outra natureza para o essencial do comércio recíproco, assegurada a cada país membro liberdade de ação quanto ao tratamento aduaneiro a ser concedido a terceiros países.

     37. De conformidade com o Artigo XXIV do GATT, as reduções de tarifa e quaisquer outras restrições, que constituam etapas de um programa para a formação de uma Zona de Livre Comércio, encontram-se expressamente excluídas do tratamento incondicional da nação mais favorecida. Nessas condições, a substituição dos acôrdos bilaterais por um tratado multilateral dêste tipo assegura o tratamento tarifário necessário à intensificação das correntes de comércio entre os países da área.

     38. Por outro lado, ao contrário do que ocorre com os Tratados de Roma e Estocolmo, que estabeleceram sistema rígidos e automáticos de eliminação de tarifas e outras restrições, para a formação, respectivamente, de uma União Aduaneira (Comunidade Econômica Européia) e de uma Zona de Livre Comércio (Associação Europeia de Livre Comércio), o Tratado de Montevidéu prevê um mecanismo bastante flexível para o cumprimento do programa de liberação em consonância com o que requer a realidade econômica da região.

     39. Pelas disposições do Artigo 5 do Tratado, as Partes Contratantes deverão outorgar entre si reduções de gravames, de forma que da comparação entre a média ponderada dos direitos aplicados aos países da Zona e a média ponderada dos direitos vigentes para terceiros países resulte uma diferença não inferior a 8%, no primeiro ano, 16% no segundo, 24% no terceiro e assim por diante, até que, ao cabo de doze anos, a diferença, aproximando-se de 100%, assegure a liberação do essencial do comércio da área.

     40. A redução gradual da média ponderada dos gravames a serem aplicados às importações de procedência da Zona se fará por meio de negociações anuais, que envolverão a escolha dos produtos a serem negociados e a determinação da margem de redução de gravames sôbre cada um dêles.

     41. No que toca à escolha de produtos, as negociações terão que distinguir, de um lado, aquêles que já participam do comércio entre as Partes Contratantes, e, de outro, os novos produtos que se pretende incorporar a esse comércio.

     42. O programa de liberação deverá abranger, necessariamente, os produtos que sejam objeto de comércio na Zona, no triênio anterior ao ano em que se realizam as negociações. Tanto acarreta sacrifícios de monta, uma vez que, em decorrências dos acôrdos bilaterais ainda vigentes uma parte essencial do atual comércio já se encontra praticamente liberada.

     43. Quanto aos produtos que ainda não participam do intercâmbio regional, sua inclusão não é compulsória, mas resultará de um ato de opção a ser exercido no momento das negociações. É evidente que ao se decidir incorporar um novo produto no programa de liberação, levar-se-ão em conta não só o valor das concessões recebidas em contrapartida, mas também as consequências dessa decisão sôbre a econômica nacional. Além de não ser compulsória a outorga de concessões sôbre produtos não tradicionais no intercâmbio, o artigo 3 do Tratado ainda prevê a possibilidade de ser negociada a retirada de produto anteriormente incluído nas Listas Nacionais.

     44. Outro aspecto da flexibilidade do Tratado se relaciona com a determinação da margem das reduções a serem outorgadas aos produtos incorporados no programa de liberação.

     45. Dos produtos que são objeto de intercâmbio ou que vierem a sê-lo posteriormente, parte substancial deverá estar liberada ao fim do período de doze anos. No entanto, a decisão sôbre os que terão o seu comércio totalmente liberado, assim como a escolha da oportunidade e do ritmo em que se processará essa liberação, serão objeto de negociações anuais, com base no princípio da reciprocidade de vantagens e sacrifícios.

     46. As preocupações ligadas à harmonização dos interêsses econômicos de cada um dos países membros face às obrigações decorrentes do Tratado são ainda contemplados, de modo particular nos capítulos referentes a cláusula de salvaguarda, assim como às medidas especiais em favor da agricultura e dos países de menor desenvolvimento relativo dentro da Zona.

     47. O Programa de liberação, estabelecido no Capítulo II, envolve compromissos de pequena magnitude. Não obstante, a flexibilidade das demais disposições do Tratado abre perspectivas amplas à expansão do intercâmbio e a progressiva complementação das economias da Zona.

     48. O tratamento favorável que resulta, automaticamente de processo de formação de uma Zona de Livre Comércio, assim como a flexibilidade geral do Tratado, são condições básicas, porém não suficientes, para assegurar a expansão do comércio regional de modo compatível com os requisitos de crescimento econômico da área.

     49. A consecução dêsse objetivo depende fundamentalmente, da ação dinamizadora dos órgãos através dos quais irá atuar a Associação Latino-americana de Livre Comércio. A Conferência das Partes Contratantes e o Comitê Executivo Permanente são órgãos dotados de todos os elementos indispensáveis para assegurar condições altamente dinâmicas ao funcionamento dos mecanismos aceleradores do comércio, previstos no Tratado.

     50. As sessões anuais da Conferência, além de ensejarem as negociações para o cumprimento do programa de liberação, constituirão do programa de liberação, constituirão excelente oportunidade para o encontro de delegações de técnicos e representantes dos setores privados do comércio e da produção, estreitando relações, harmonizando interêsses e buscando, permanentemente, utilizar as oportunidades e superar as dificuldades que tem prejudicado ou que venham a dificultar, no futuro, a expansão do comércio regional em bases de sadia concorrência.

     51. Além disso, os esforços realizados anualmente em cada país no preparo das negociações concorrerão para mobilizar os interêsses nacionais ligados à exportação, promoverão um mais amplo conhecimento das economias de cada país e servirão de forte estímulo à exploração de tôdas as possibilidades de intercâmbio que devem surgir em escala crescente com a formação da Zona de Livre Comércio.

     52. As tarefas atribuídas ao Comitê são da mais alta magnitude. Por sua composição de aparelhamento técnico, disporá de elementos valiosos para imprimir elevado grau de dinamismo à formação da Zona de Livre Comércio. Em colaboração com as Secretarias Executiva da Comissão Econômica para a América Latina das Nações Unidas e do Conselho Interamericano Econômico e Social da Organização dos Estados Americanos, o Comitê Executivo Permanente, sediado em Montevideo, deverá exercer papel decisivo na consecução dos objetivos do Tratado.

     53. Demais, a organização das Comissões Consultivas integradas por representantes dos setores privados da Indústria, Comércio, Agricultura, Transporte, Mineração, etc., previstas no Tratado, propiciará condições altamente benéficas no sentido do equacionamento e solução de uma série de problemas marginais ao processo de formação da Zona de Livre Comércio, mas de excepcional importância para a expansão do comércio regional.

     54. Ao concluir, Senhor Presidente, esta exposição, em largos traços, dos objetivos e das principais características do Tratado recém-firmado em Montevidéu, faz-se mister assinalar a necessidade de dirigir ao Congresso Nacional um veemente apêlo no sentido de dar urgência à ratificação pelo Poder Legislativo.

     55. Tendo sido firmado inicialmente por sete países, aos quais se espera venha a juntar-se, brevemente, a Bolívia, o Tratado de Montevidéu entrará em vigor trinta dias após o depósito do terceiro instrumento de ratificação (Artigo 57). O Artigo 45 estabelece, por sua vez, que o Comitê Executivo deverá instalar-se dentro de 60 dias da entrada em vigor do Tratado.

     56. Daí resulta que, caso não seja o Brasil um dos principais ratificantes correrá o grave risco de vir a fazê-lo com o Tratado já em vigor e com todos os seus órgãos já em pleno funcionamento, sem ter podido participar quer da elaboração dos respectivos regulamentos internos, quer da formulação de critérios e normas orientadores da ação dêsses órgãos. Dado o vulto do nosso comércio com os demais países da área, assim como a magnitude de nossas responsabilidades na elaboração do Tratado de Montevidéu, tal eventualidade seria altamente prejudicial aos interêsses do Brasil no plano da política continental.

     57.  São essas, Senhor Presidente, as considerações que julguei oportuno transmitir a Vossa Excelência a respeito do Tratado de Montevidéu, cujo encaminhamento ao Congresso solicito a Vossa Excelência, juntando para êste fim, à presente Exposição de Motivos, sete cópias autenticadas do texto do referido Tratado e projeto de Mensagem ao Poder Legislativo.

     Aproveito a oportunidade para apresentar a Vossa Excelência, Senhor Presidente, os protestos do meu mais profundo respeito. - Horácio Later.


Este texto não substitui o original publicado no Diário do Congresso Nacional - Seção 1 de 14/12/1960


Publicação:
  • Diário do Congresso Nacional - Seção 1 - 14/12/1960, Página 9261 (Exposição de Motivos)