Legislação Informatizada - CARTA RÉGIA DE 20 DE JULHO DE 1810 - Publicação Original

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CARTA RÉGIA DE 20 DE JULHO DE 1810

Sobre terrenos baldios na Ilha da Madeira.

        Pedro Fernandes Bacellar d'Antas e Menezes, Governador e Capitão General da Ilha da Madeira. Amigo. Eu o Principe Regente vos envio muito saudar. Tendo tomado na minha real consideração a representação, que vos dirigio o Governador da Ilha de Porto Santo, Manoel Ignacio de Avellar, na data de 19 de Maio de 1808, relativa á divisão de um baldio, existente naquella Ilha, que o sobredito Governador havia repartido entre varios habitantes da referida Ilha, que o reduziram a cultura; e constando pela mesma representação que se haviam excitado questões sobre a legalidade daquella divisão, que punham os propietários dos terrenos divididos em duvida sobre a segurança de taes acquisições; incerteza, que não podia deixar de prejudicar a cultura; o que determinou o sobredito Governador a propor-vos quanto era conveniente por termo aquellas perturbações, mandando ouvir a Camara, e procedento a dar posse aos interessados, quando a mesma Camara assim o julgasse util, e proveitoso áquelles possuidores. Tendo eu tomado igualmente em consideração a resposta da Camara da sobredita Ilha em data de 28 de Maio de 1808, que se conforma inteiramente á representação do Governador Manoel Ignacio de Avellar, sendo sobre esta representação, e resposta da Camara, que vos determinastes a tomar a Resolução de 26 de Março do presente anno de 1810, pela qual ordenastes no meu real nome á referida Camara, que individualmente fizesse entrar de posse dos terrenos as pessoas que haviam sido contempladas na repartição dos baldios, afim de que estas daqui em diante podessem livre e pacificamente desfructal-os, tanto elles como seus successores, havendo primeiro preenchidoas condições prescriptas no edital, que precedeo a divisão daquelles terrenos, e habilitando-se para aquelle effeito, sendo-lhes com tudo prohibida qualquer venda, ou alieanação dos ditos terenos, debaixo das penas de perdimento delles, no caso de contravenção, e de serem taes predios transferidos a outros por escolha da mesma Camara; o que tendo sido por mim ponderado, determinei participar-vos, que não se conformando o proposto expediente á legislação do Reino, por isso, que contraria e viola as regras, presciptas na Ord. Do liv. 4º tit. 43, e que priva os novos proprietarios de um dos principaes effeitos do dominio, que consiste na faculdade de vender, alhear e escambar livremente, e por tal prejudica o patrimonio real das sizas, contrariando alem disto o sobredito expediente as particularíssimas determinações, dadas áquelle respeito pelo Alvará de 3 de Julho de 1766, se devem considerar por injustas, e nullas as divizões, ou partilhas, e aforamentos do baldio contencioso, que deve reverter immediatamente para o Conselho, na fórma do § 3º do mesmo Alvará. Mas consultando os meus paternaes sentimentos, e dirigindo-me pelos constantes desejos, que me animam, de beneficiar os meus vassallos, para o que tanto concorre o augmento e melhoramento da agricultura, primeira base da prosperidade publica, e attendendo por outra parte, a que o referido baldio foi reduzido a cultura, em grande parte, por aquelles provos de boa fé, e afiançados nas promessas de autoridades constituidas, tendo os mesmos povos feito negocio util á minha real Fazenda, com o augmento de trinta moios de pão, que tanto cabem da total producção, a bem dos dizimos pertencentes ao Gram Mestrado da Ordem de Christo: sou servido por estes motivos, e em attenção a distancia em que se acha aquelles meus vassallos, habitantes na Ilha de Porto Santo, que lhes difficulta o recurso á Mesa do Desembargo do Paço, faltando-lhes além disso os meios para as despezas indispensaveis para ot rato de taes dependencias, dispensar, a veneficios dos sobreditos meus fieis vassallos, no Alvará de 3 de Julho de 1766, que hei por supprido, dando as seguintes providencias. 1º ordeno que o Corregedor da Ilha da Madeira haja de passar á custa da minha Real Fazenda, á Ilha de Porto Santo, e que juntamente com os officiaes da Camara e Governador da terra, ouvindo o povo em Concelho, entre na averiguação e exame de todos os baldios do interior da Ilha, e proceda na repartição delles, com o foro, que pelos louvados se achar proprio, e dominio ou laudemio de quarentena nas vendas, preferindo nas partilhas os pobres, pelos quaes deverão ser repartidas as terras de mais facil cultura, depois os menos agazendados, e enfim as pessoas ricas e abandonadas. 2º attendendo a que nas partilhas anteriormente feitas, haviam de ser attendidos com preferencia os ricos e mais poderosos, nos quaes não aproveitam nem podem aproveitar factos contrarios á lei: ordeno, que succedendo, que na nova repartição, a que mando proceder venham alguns destes a não ficar na posse dos quinhões, que se lhes adjudicarão, sejam os novos possuidores obrigados ao pagamento das bemfeitorias uteis, e necessarias, que se devem avaliar logo; isto é, consistindo em paredes, arvores, vallados, palheiros e arribanas apra se recolherem os gados, que, não sendo necessarios para a continuação da lavoura, poderão ser levantados pelos antigos possuidores, aos quaes não competirá o direito de pedirem as despezas da cultura, na abertura das terras, por isso, que se devem julgar compensadas pela percepção e colheita dos futos. 3º: Ordeno, que, depois de feitas as divisões ou partilhas e aforamentos dos baldios da sobredita Ilha, sejam estas partilhas e aforamentos vistos examinados e confirmados em uma Junta, que por esta mando estabelecer, a qual deverá ser composta pelo Corregedor da Comarca, pelo Provedor das Capellas, pelo Juiz de Fóra do Civil, e pelo Juiz de Orphãos da Cidade do Funchal, debaixo da Presidencia do Governador e Capitão General, com voto decisivo,e competindo aos membros da mesma Junta o voto consultivo, e o decisivo pela pluralidade de votos: e faltando alguns dos membros da referida Junta o voto consultivo, e o decisivo pela pluralidade de votos: e faltando alguns dos membros da referida Junta, supprirá aquelle que suas vezes fizer no logar da magistratura que exercite. E para que não succeda que, por algum legitimo impedimento de qualquer dos membros, se susspendam as sessões da Junta: determino, que ellas hajam de Ter lugar, e se possa fazer obra, achando-se presente o Presidente, e dous dos membros acima nomeados. 4º determino, que todos os aforamentos se lancem em tres livros do mesmo theor, um dos quaes deverá existir na Camara de Porto Santo, o segundo na Secretaria do Gvoerno Geral, e o terceiro no Cartorio da Correição da Comarca, sendo rubricados cada um por qualquer dos Deputados da Junta indistinctamente, e todos escriptos pelo Escrivão da Correição, fazendo as vezes de Secretario, para que com facilidade se possam decidir para o futuro as duvidas occorrentes. E ordeno, que se dê a cada um dos foreiros o seu titulo ou carta particular com designação do foro, que deve pagar na conformidade da verba, que o respeitar, sendo o dito titulo ou cara assignada pelo Presidente e Deputados da Junta sem emolumento algum, e sómente ao Escrivão da Correição pagará cada foreiro a quantia de 800 réis para satisfação dos títulos, e livros: e authorizo além disto a mesma Junta, para que, no caso que algum ou alguns dos novos foreiros se ache por motivo de falta de meios, nas circumstancias de não poder cultivar o terreno que lhe for distribuido, o possa a mesma Junta alliviar da prestação do dizimo por tres ou cinco annos, segundo a qualidade do terreno e o calculo da maior ou menor despeza em o pôr em estado de cultura. 5º deverá convocar-se a junta todas as vezes, que ao Presidente parecer necessario. E recommendo á mesma Junta, que se occupe de promover as arêas immediatas ás praias do Sul de Porto Santo, por me ser presente, que ellas são capazes de produzir com abundaancia em toda a sua extensão, procucçãos tuberozas; e aquellas se farão tambem repartir, ou com foro ou sem elle, pelas pessoas que quizerem embardar as mesmas arêas com plantação de arvores proprias do terreno, e sem prejuizo da servidão geral das ditas praias; e sendo estes terrenos arenosos os hei por dispensados da prestação dos dizimos pelo espaço de cinco annos, a contar do dia, em que delles for dada a posse, declarando, que em todos os casos de se não cultivarem os terrenos adjudicados ficarão devolutos ao Concelho, para que com a determinação da Junta, que mando estabelecer, sejam novamente repartidos por quem os haja de cultivar, na fórma que se acha disposto pelas leis do Reino. E querendo eu facilitar aos meus fieis vassallos novos meios conducentes a promover a prosperidade de todos e cada um delles: sou servido determinar, além das providencias já indicadas, que o montante dos foros provenientes dos territorios repartidos seja recolhido nos cofres da Camara, para ser applicado a destino de publica utilidade; devendo entre estes Ter a preferencia os que respeitarem o melhoramento da agricultura, construcção de moinhos, facturas de salinas, que alli se podem praticar, como me e constante. E determino outrosim, que para se proceder a estes e outros melhoramentos em beneficio publico, seja ouvida a Junta, para que com o seu consentimento, reconhecida que seja a tulidade, se possa começar e proseguir a obra, que se propozer, havendo por muito recommendado ao Corregedor da Comarca a fiscalisação das despezs feitas por esta parte do rendimento publico, como lhe é prescripto pelo seu regimento. Com o mesmo intento de promover a felicidade dos meus vassallo, que faz o constante objecto dos meus desejos; authorizo a Camara para que precedendo a approvação da Junta, forme Associações Pecatorias, emprestando-lhes os fundos necessarios, para construirem barcos e redes, proprias para se estabelecer uma pescaria regular e em grande, que podendo estender-se até a contracosta das Ilhas Canarias, enriquecerá os povos de Porto Santo, com grande proveito delles, e da minha Real Coroa, advertindo, que as sommas que a Camara deverá emprestar para aquelles importantes objectos, hajam de ser isentas de juro e cobraveis por modicas prestações. Portanto mando que assim hajais de cumprir estas minhas paternaes providencias com toda a promptidão, zelo e efficacia, que de vós espero, não obstante quaesquer leis, e ordenações em contrário, que todas hei por derogads, como se dellas fizesse especial menção, na parte que se oppozerem a estas minhas reaes disposições; e de como as cumpristes, como vos mando, e ordeno, me dareis conta pela Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Domínios Ultramarinos. Escrita no Palacio do Rio de Janeiro em 20 de Julho de 1810.

PRINCIPE.

Para Pedro Fagundes Bacellar d'Antas e Menezes.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1810


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1810, Página 127 Vol. 1 (Publicação Original)