Legislação Informatizada - ALVARÁ DE 22 DE JANEIRO DE 1810 - Publicação Original
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ALVARÁ DE 22 DE JANEIRO DE 1810
Dá Regimento ao Provedor Mór da Saude.
Eu o Principe Regente faço saber aos que este Alvará de Regimento com força de lei virem, que havendo tomado em consideração quanto cumpria ao bem geral, e á felicidade particular dos meus fieis vassalos a conservação da saude publica, e o zelar-se que ella se não estrague por contagio communicado por embarcações, passageiros e mercadorias, que entrem neste porto e nos demais deste Estado, contaminados de peste, e de molestias contagiosas, e por meio de mantimentos e viveres tocados de podridão, ou já corrompidos: fui servido por Decreto de 28 de julho do anno próximo passado crear o logar de Provedor Mór da Saude da Còrte e Estado do Brazil, e encarregar-lhe o cuidado e vigilancia deste objecto de tanta importancia, e em que muito vai o interesse publico, e o augmento da população: e convindo que para a prosperidade e segurança deste estabelecimento praticado na maior parte das nações cultas e civilisadas da Europa, e no porto de Lisboa, que se determine a jurisdicção do Provedor Mór, e das mais pessoas empregadas nos negocios desta Repartição, quaes são os objectos da sua incumbencia, e as maneiras com que se devem pór em pratica as providencias necessarias para conseguir-se o fim util de conservar-se illesa de contagio, molestias epidemicas e peste, a saude publica: tendo ouvido o parecer do Provedor Mor da Saude, e o de outras pessoas doutas, e mui zelosas do bem do meu real serviço; hei por bem determinar o seguinte.
I. Estando proximamente abertos pelas minhas reaes ordens os portos deste Estado ao commercio das nações Estrangeiras, que estão em paz com a Portugueza; para que sernão communiquem enfermidades contagiosas das suas embarcações, equipagens e mercadorias, deverá construir-se um Lazareto, onde façam quatentena, quando houver suspeita, ou certeza de infecção.
E emquanto se não edifica e estabelece com a regularidade e fórma que convem, far-se-há a quarentena no sitio da Boa-viagem, onde provisoriamente se farão as accommodações precisas, e ahi deverão ancorar as embarcações impedidas pelos Officiaes da Saude.
II. Deverão observar-se a respeito destas embarcações ancionaes ou estrangeiras, suas equipagens e mercadoria, as regras estabelecidas para semelhantes casos, e praticadas reciprocamente pelas nações a que pertencem, quando não houver decisão propria no regimento do provimento da saude do porto de Belem de 7 de fevereiro de 1695, que mando se observe, e as mais ordens determinadas para o porto de Lisboa em tudo que for applicavel, assim ácerca da jurisdicção economica, como da coactiva.
III. Os navios deverão esperar a visita dos Officiaes da Saude no ancouradorouro chamado do Poço, ou no sobredito da Boa-viagem, e ahi se irá fazer a averiguação determinada pelo Regimento, estando o Guarda-Mór e Escrivão da Saude sempre promptos; para o que deverão os Guardas assistir no sitio mais apropriado ao mesmo fim, e feitas as diligencias estabelecidas no Regimento, darão dellas parte ao Provedor Mór da Saude.
IV. As sobreditas embarcações nacionaes e estrangeiras, que forem do commercio, pagarão por entrada para o Lazareto, a saber: os navios, corvetas e bergantins 2$000; as sumacas 1$200; e os barcos da Costa 400 réis; o que será arrecadado na Alfandega na occasião em que se cobram os mais direitos do porto, remettendo-se todos os mezes para o cofre da Saude: e do producto desta imposição se pagarão os ordenados, e farão as mais despezas deste estabelecimento. Quando porém estiverem em quarentena pessoas e mercadorias, deverão pagar as despezas, que com ellas se fizerem, como é pratica nos mais Lazaretos; o que se regulará e taxará no Regimento particular, que se há de fazer para o sobredito Lazareto.
V. Os navios, que trouxerem carregação de escravos, esperarão no ancoradouro do Poço, ou no da Boaviagem, até que se faça a visita da Saude pelo Guarda-Mór e mais Officiaes; e feita ella, irão ancorar, e ter quarentena no ancoradouro da Ilha de Jesus.
VI. No acto da visita se determinarão os dias que cada um destes navios deve ter de quarentena, conforme as molestias que trouxer, mortandade que tenha havido, e mais circumstancias que occorrerem; porem nunca terão de quarentena menos de oito dias, em que os negros estejam desembarcados, e em terra na referida Ilha para ahi serem tratados, fazendo-os lavar, vestir de roupas novas, e sustentar de alimentos frescos; depois do que se lhes dará o bilhete da Saude e poderão entrar na Cidade para se exporem á venda no sítio estabelecido do Valongo.
VII. O referido tratamento deverá ser feito debaixo da inspecção do Guarda da Saude que ahi deve assistir; ou do Guarda-Mór, que deve cuidar tambem deste estabelecimento, o qual constrangerá os donos a praticar estas providencias; e no caso em que tenham omissão nas primeiras 24 horas, o mandará fazer a custa delles; e para pagamento das despezas requererá ás minhas Justiças mandados executivos, para penhorar e fazer arrematar bens que bastem para o mencionado pagamento, e para as custas respectivas.
VIII. Pelo livro da carga, certidão da matrícula das equipagens, e da arqueação do navio, e tambem por vistoria a que deve proceder na aguardente e mantimentos que restarem, averiguará o Guarda-Mór se foram observadas as ordens que se acham estabelecidas sobre o numero de escravos que sómente deve trazer, segundo a lotação; qualidades e quantidade da aguada e mantimentos com que foram tratados na viagem.; se as molestias se declararam no mar, ou já as trouxeram de terra; e se os que adoeceram foram tratados durante a viagem como cumpria: e ácerca disto procederá tambem a inquirir os Officiaes do navio e aquellas pessoas da equipagem que lhe parecer que convem; e resultado culpa, remetterá o auto e inquirição ás minhas Justiças, para procederem contra os culpados como for direito, dando parte com a cópia de tudo ao Provedor-Mór; e não resultando culpa, lh'os remetterá tambem, para que achando que se procedeu em fórma, o mande gurardar no Cartorio do Escrivão da Saude.
IX. Da visita em cada um destes navios se levarão os mesmos emolumentos que até agora se levavam, mas além delles pagará cada escravo para o cofre da Saude 200 réis, e sendo menores de dez annos 100 réis; que se cobrarão na Alfandega com os outros direitos; e desta contribuição deverão sahir as despezas do edificio e reparo do Lazareto, e os ordenados das pessoas em pregadas para o cuidado, e manutenção delle.
X. Quando constar ao Provedor-Mór, que os trigos ou farinhas, milhos, carnes seccas ou verdes, ou outros quaesquer comestíveis, ou bebidas se acham com corrupção, e em estado de prejudicar a saude dos habitantes, e que não obstante isto são destinados á venda, os mandará examinar, e proceder nelles a vistoria em qualquer parte, onde se achem; ou estejam nas Alfandegas ou em armazens da minha Real Fazenda, ou em armazens e trapiches de particulares, ou nas mesmas lojas em que costumam vender-se; e os encarregados de qualquer das ditas Repartições, a quem por officios do Provedor-Mór constar que precisa mandar proceder nos ditos generos a exame, lhe franquearão e apromptarão as casas e armazens em que estiverem, sem demora alguma, prestando-lhe todo o auxílio que pedir e for necessario.
XI. E quando estes encarregados de quaesquer Repartições e Juízes das Alfandegas acharem que existem debaixo da sua inspecção generos em semelhante estado, deverão por officios seus deprecar ao Provedor Mór, que mande fazer os exames necessarios, o que elle logo fará executar; porque hei por bem que a este respeito seja da obrigação de qualquer o cuidado de prevenir o mal que por semelhante causa póde vir a resultar ao Estado, pelo consumo de taes generos.
XII. Dos exames que em qualquer destes casos se fizerem se formalisarão processos verbaes e summaríssimos, nos quaes declarando-se a quem pertencem os generos, as marcas, signaes, ou confrontações que mostrem a sua identidade e o estado em que se acham, ou de total ruina, ou de princípio della, se ajuntará o juizo dos peritos que ao mesmo exame devem concorrer; e declarar se merecem os sobreditos generos ser condemnados, ou se podem ainda ser beneficiados, e porque maneira o devem ser e se apresentarão ao Provedor-Mór, o qual nelles dará a sua determinação final, com a comminação daquellas penas que lhe parecerem conformes á disposição das leis; e do que prover se formarão precatorios para as Justiças competentes, ou para as Repartições a quem tocar, a requerimento do Guarda-Mór como Fiscal da Saude, para serem cumpridos e executados por ellas, sem que posssam admittir embargos, ou recurso algum com suspensão da execução, salvo se esta suspensão lhe for novamente deprecada pelo mesmo Juízo da Provedoria-Mór. E estas providencias aqui ordenadas quero que se cumpram como nellas expressamente se contém, emquanto se não põe em execução a que ordeno no paragrapho seguinte.
XIII. Sendo uma das obrigações das Camaras o cuidado do provimento dos viveres necessarios aso habitantes das terras, para que haja abastança, maiormente dos generos de primeira necessidade; e devendo evitar-se o escandaloso prejuízo que os trigos conduzidos em surrões aos portos desta Côrte soffrem com tanto damno dos seus donos, como da saude publica, ficando expostos ao tempo no caes de desembarque, por não haver armazens em que se recolham: sou servido ordenar, que a Camara desta Côrte faça construir no sitio que parecer mais proporcionando, uma casa com accomodações necessarias apra arrecadação dos trigos e farinhas fabricadas delles que entrarem pela barra, par aque nella se faça a visita da Saude, e se examine se estão em estado de se porem á vendagem; o que deverá constar de um bilhete que depois de feito o competente exame, passará o Escrivão da Saude, e assignará o Provedor-Mór, ou o seu Delegado, para o que lhe concedo faculdade. E os trigos que entrarem pagarão um vintem por cada alqueire, cujo producto pertencerá todo á Camara até se pagar das despezas que fizer com a construcção da casa e findo que seja este pagamento, se dividirá em duas partes iguaes, das quaes lhe ficará pertencendo uma para as obras de publica utilidade, e a outra pertencerá ao cofre da Saude, remettendo-se ao Thesoureiro delle, sendo primeiro deduzidas do total rendimento as despezas da conservação do edificio, e das pessoas empregadas na arrecadação.
XIV. Competirá tambem ao Provedor-Mór o poder mandar fazer exames e vistorias nos matadouros e açougues publicos, e não sómente poderá providenciar nos casos occurrentes o que os Juízes, Almotacés e Camaras não tiverem acautelado e prevenido, mas poderá determinar tambem os concertos, mudanças e obras que, nelles se devam fazer, para que, occorrendo-se, ou á incuria, ou aos antigos abusos, a saude publica, tanto pelo consumo das carnes que ahi se cortam, como pela visinhança destes logares, não seja prejudicada: e de tudo mandará fazer pela mesma maneira processos verbaes, e com a sua determinação final deprecará ao Magistrado a quem competir que a cumpra e execute; e se farão as despezas pelos rendimentos dos Conselhos; e, não os havendo, pelo cofre da Saude; e na falta de um e outro me darão parte, para eu ordenar que se faça pelo meu Erario Regio em beneficio publico.
XV. E porquanto a falta de pastagens que soffrem os gados que são conduzidos para esta Capital, os atormenta de modo que quando são cortados nos açougues, estão incapazes de servir de bom alimento: hei por bem que ao Provedor-Mór fique competindo o conhecimento, e jurisdicção necessaria para designar pastagens nos sitios proporcionados dos caminhos por onde passem as boiadas, nos quaes hajam de descançar os gados, e refazer-se até serem conduzidos aos matadouros da Cidade.
XVI. Para verificar-se esta util providencia, procurará o Provedor as instrucções necessarias das Camaras dos Districtos e dos Commandantes delles; e com sua dudiencia estabelecerá em distancias proporcionadas terrenos para descanço e pastagem dos gados que se conduzem para o abastecimento desta Capital; tanto nesta Provincia, como nas Capitanias visinhas, donde elles constumam descer.
XVII. Se estes terrenos forem devolutos, serão demarcados, ficando com o tamanho de meia legoa em quadro cada um delles e pertencerão aos Conselhos respectivos que os conservarão para o uso dos passageiros e pastagem dos gados, sem que em tempo algum se possam aforar, arrendar, vender, ou por qualquer maneira alienar, ou dar de sesmaria, pena de nullidade. Poderá porém o Provedor-Mór com audiencia da Cara respectiva permittir que se edifiquem na frente, e ao longo da estrada ranchos para os guardas e commodidade dos tropeiros e passageiros que não terão mais de 10 braças de frente e 20 de fundo; e terão cercas que os gados não possam romper, e um pequeno toro que será cobrado pela Camara em seu proveito.
XVIII. E sendo de particulares, se lhes pagará pelo cofre da Saude a renda que se arbitrar por louvados, escolhendo-se neste caso os que menos prejuizo causarem ao proprietario; evitando-se com muito cuidado, que se não cortem por este meio as grandes fazendas, para se não inutilisarem assim; preferindo-se sempre os baldios, ainda em alguma distancia; e devendo haver no valor do arrendamento toda a consideração ao damno, e prejuizo de seu dono, e a ser forçado. E poderá tambem o proprietario aforar terreno para os ranchos com permissão e faculdade do Provedor-Mór, com as mesmas condições acima referidas á cerca dos terrenos publicos.
XIX. Uma legoa distante desta Capital, ou mais proximo, se puder ser, se estabelecerá pela mesma causa uma pastagem, em que ultimamente se recolhão e descancem as rezes, que vierem para o abastecimento dos matadouros da Cidade; e providenciando-se de modo, que não se demorem mais de 24 horas nos curraes dos matadouros; e que na referida pastagem entrem os gados dos tropeiros e marchantes sem preferencia ou fraude, que venha occasionar algum monopolio; e em caso de contravenção a este respeito terá o Provedor-Mór a jurisdicção de mandar proceder a prisão por um mez contra a marchante que for achado em culpa. Sendo esta pastagem de algum particular, será paga a renda pelo cofre da Saude; e de cada cabeça de gado vaccum, que se matar e cortar nos açougues, se pagará 200 reis para o referido cofre; cobrando-se com os mais direitos, e remettendo-se todos os mezes, donde se pagará a renda de pastagem, jornaes dos Guardas, e mais despezas, que para isto se fizerem. E a respeitodas outras pastagens de transito tanto nesta Provincia, como nas Capitanias visinhas, serão gratuitas, quando a demora dos gados não exceder de tres dias; e para aquelles, que tiverem maior demora, se regulará pelo Provedor-Mór com accordo das Camaras o que deverão pagar por cada cabeça, além do que constumam em algumas partes pagar para a factura do caminho, no que por este motivo não haverá innovação,
XX. Deverá ficar entendendo, que por estas novas determinações, com que mando providenciar o bem dos povos, não ficam escusos os Juízes, Camaras, Almotaces, e mais empregados publicos de fazerem o seu dever, como pelos seus respectivos Regimentos são obrigados; pois que nesta materia de tanto interesse publico, quero e ordeno, que hajam todos de concorrer pela parte que lhes toca, com a vigilancia devida para o bem do serviço do Estado, prohibindo qualquer conflicto de jurisdicção, ou que se escusem uns com a obrigação dos outros.
XXI. Do Provedor-Mór ficará neste Estado do Brazil competindo o recurso para a Mesa do Desembargo do Paço, por não Ter logar o intermedio para o Senado da Camara, que competia em Portugal pelos antigos Regimentos, que nesta parte hei por derogados. E havendo peste (o que Deus não permitta) o Provedor-Mór me fará saber pelo sobredito Tribunal, que me consultará a Junta temporaria que cumpre crear com aquella extensão de jurisdicção que se tem praticado, e que em taes casos extraordinarios se faz necessaria, para eu a nomear, como convier ao bem do meu real serviço.
XXII. Os Officiaes para o Porto serão os mesmos, que estão estabelecidos pelo Regimento da Saude do Porto de Belém, e os da Provedoria-Mór serão um Escrivão, um Meirinho, e um Thesoureiro. E pelo que respeita ao Lazareto, no seu Regimento particular, quando fôr concluido, se designarão os Officiaes que deverá haver.
XXIII. O Thesoureiro do cofre da Saude será eleito e afiançado pela Camara. Poderá com tudo o Provedor-Mór nomear para este officio, que será triennal, a qualquer dos Thesoureiros dos outros cofres publicos que estiverem em exercicio e afiançados competentemente: receberá elle á boca do cofre as quantias que alli deverm ser entrgues pelas diversas Estações, onde muito cobrar as imposições acima declaradas, e á boca do cofre fará tambem os pagamentos dos ordenados e mais despezas por folhas que devem ser processadas pelo Escrivão e assignadas pelo Provedor-Mór: e todos os annos se tomarão, pelo mesmo Provedor-Mór, contas ao Thesoureiro, dando balanço ao cofre, do qual deverá remetter uma copia, por elle assignada, ao meu Erario Regio; observando-se mais as regras que se acham estabelecidas pelos Regimentos e Ordenações da Fazenda.
XXIV. Acontecendo aportar na Capitania da Bahia e nos mais portos deste Estado do Brazil alguma embarcação que tenha sahido de porto onde haja notícia ou suspeita de peste, não poderá alli fundear, mas será constragida a vir fazer quarentena ao Lazareto da Boaviagem desta Corte: dever-se-lhe-há porém prestar todos soccorros e refrescos que precisar para poder seguir viagem, como a humanidade exige, e com as cautelas praticadas em semelhantes casos.
XXV. Na referida Cidade da Bahia, em Pernambuco, e nos outros portos onde se faz maior commercio, haverão Guardas-Mores da Saude, que serão nomeados pelo Provedor como seus Delegados obsrvarão o que por este Regimento vai declarado incumbir ao dito emprego: examinarão as Cartas de Saude dos navios nacionaes e estrangeiros, farão as visitas competentes aos navios de negros, tirarão as inquirições que vão ordenadas sobre o seu transporte, e estarão promptos para as mais diligencias relativas a este objecto que pelo Provedor-Mor lhe forem encarregadas, passando tambem as Cartas de Saude que lhes forem requeridas por aquelles que sahirem das respectivas Capitanias para fóra. Os referidos Guardas-Mores da Saude arrecadarão as propinas que segundo este Regimento pertencem ao Provedor-Mor, e lh'as remetterão como por elle for determinado.
XXVI. A jurisdicção porém do Provedor-Mor pela maior extensão e importancia que tem, e que por este Regimento lhe fica conferida, será exercitada ex-officio pela Magistrado do logar e onde houver Ouvidor Geral da Comarca, será annexa ao dito cargo; nas Villas, onde o não houver, ao juiz de Fóra, e na sua falta ao Juiz Ordinario, inquirindo-se em residencia e nas devassas de Correição, do desempenho de um tão sagrado dever. O recurso será em cada Capitania para o Governador, e deste para a Mesa do Desembargo do Paço, onde semelhantes negocios se decidirão finalmente, informando primeiro com o seu parecer o Provedor-Mor deste Estado.
XXVII. Em cada uma das referidas terras os Governadores, ouvindo ao Ouvidor da Comarca e ao Guarda-Mor respectivo, destinarão o sítio e logar proporcionando para servir de Lazareto para os negros, e mandarão fazer as accommodações precisas para o seu desembarque e agasalho em terra, onde se deverá praticar o que se ordena neste Regimento, antes de entrarem nas povoações, pargando-se as despezas pelo cofre das contribuições que ficam declaradas, cujas sommas se poderão adiantar pela minha Real Fazenda. E os Guardas-Mores assistirão no sitio conveniente que pelos sobreditos lhes for determinado, assim como os mais Officiaes da Saude, para com promptidão cumprirem com as suas obrigações; e executarão o que neste Regimento se lhes determina, dando as partes, e remettendo ex-officio os processos ao Magistrado que servir de Provedor-Mór.
XXVIII. Será nomeado Escrivão da Saude qualquer dos Escrivães, preferindo os das Camaras pelo haverem sido até agora, ou Tabelliães dos que nas ditas terras houver que mais apto seja, e mais expedito para o cumprimento destas obrigações: podendo ser nomeado como Officio separado naquellas terras, onde pela extensão das suas occupações for mais conveniente que constitua um Officio diverso livre de outros encargos; e para Thesoureiro se nomeará qualquer dos que houver eleitos pela Camara; as quaes nomeações serão feitas como dos mais officios, na fórma das minhas reaes Ordenações. Vencerão pelas visitas os mesmos salarios que até agorase costumavam levar, e aquelles que deverem Ter odenados, se me consultarão, ouvindo-se o Provedor-Mor, ou a quem sua jurisdicção exercer.
XXIX. Os sobreditos Magistrados, como Provedores-Mores, farão os exames e vistorias nos mantimentos, e nos açougues e matadouros, como vai determinado ao Provedor-Mor; deverão porém chamar sempre ao Guarda-Mor para assistir e votar, ou como perito, no caso de ser da Faculdade Medica, ou como Fiscal e Delegado que é do Provedor-Mor, e seguirão os mais termos acima prescriptos para os processos e determinações que se fizerem.
XXX. As mesmas providencias que acima determino ácerca das pastagens dos gados, serão observadas nas Capitanias da Bahia, Pernambuco, Pará e Maranhão. Os Governadores, ouvindo aos Ouvidores, como Provedores-Mores, e com audiencia das Camaras, determinarão os terrenos para pastagens, e darão as mais providencias que forem accommodadas ao local, conformando-se, quanto for possível com o que se estabelecer nesta Provincia, e com as disposições deste Regimento; e darão parte do que a este respeito executarem pela Secretaria de Estado dos Negocios do Brazil; pela qual se fará a competente participação ao Provedor-Mor para ficar na intelligencia do que se estabeleceu, ou me representar o que for necessario que haja de innovar-se; fazendo conservar no Cartorio da Saude a copia de todos os papeis, para ahi constar de tudo o que a este fim se estabeleceu nas demais Capitanias deste Estado.
XXXI. Por todos os navios que sahirem dos referidos Protos para esta Corte remetterão os Guardas Móres ao Provedor-Mór as partes de todos os processos e diligencias que tiverem praticado, em mappas, referindo-se aos numeros dos processos que nos Cartorios dos seus respectivos Escrivães deverm ficar. Os Ouvidores, ou os outros Magistrados ou Juízes que exercitarem esta jurisdicção, tambem lhe remetterão as partes das diligencias, que lhes toca fazer por este Regimento; e todos os annos enviarão igualmente ao sobredito Provedor-Mór nesta Côrte a copia do auto das contas que devem tomar ao Thesoureiro, e do balanço do cofre da Saude com a demonstração da receita e despeza, que tiver havido; e as sobras que houver serão tambem remettidas ao cofre da Saude desta Corte a entregar ao seu respectivo Thesoureiro.
XXXII. Dos referidos mappas e balanços, o Provedor-Mór nesta Corte fará um extracto geral, que todos os seis mezes subirá á minha real presença pelo Tribunal competente; e quando houver cousa extraordinaria de que me deva dar parte, me poderá fazer presente pela Secretaria de Estado dos Negocios do Brazil.
Pelo que mando á Mesa do Desembargador do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erario; Conselho da minha Real Fazenda: Regedor da Casa da Supplicação do Brazil; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes; e mais Governadores do Brazil e dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça em ais pessoas, a quem pertencer o conhecimento deste Alvará, o cumpram e guardem, não obstante qualquer decisão em contrario, que hei por derogada para este effeito sómente: e valerá como carta passada pela Chancellaria, posto que por ella não há de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da lei em contrario. Dado no Palacio do Rio de janeiro em 22 de janeiro de 1810.
PRINCIPE com guarda
Conde de Aguiar.
Alvará de Regimento pelo qual Vossa Alteza Real há por bem estabelecer um Juizo de Provedoria-Mór da Saude, para regular as quarentenas, que devem fazer os navios, que vem dos diversos Portos, e os que trazem carregação de negros; determinado as averiguações que se devem fazer sobre os mantimentos e generos, que podem offender a saude, tanto nesta Provincia, como nas mais Capitanias; tudo na fórma acima declarada.
Para Vossa Alteza Real ver.
João Alvares de Miranda Varejão o fez.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1810, Página 17 Vol. 1 (Publicação Original)