Legislação Informatizada - ALVARÁ DE 24 DE OUTUBRO DE 1814 - Publicação Original
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ALVARÁ DE 24 DE OUTUBRO DE 1814
Dá providencias a bem dos orphãos desamparados.
Eu o Principe Regente faço saber aos que o presente alvará com força de lei virem, que tendo-me sido presente, em consulta da Mesa do Desembargo do Paço, tomada sobre outra do Senado da Camara de Lisboa, quanto era necessario, conveniente e util ao bem do meu real serviço, e conforme a causa da humanidade, socorrer as pessoas miseraveis dos Orphãos daquella Capital, que viviam desamparados por falta de providencias capazes de se lhes dar por meio dellas uma boa educação, afim de que chegados á maioridade pudessem ser uteis a si e ao Estado, e não viessem por falta de cuidado e amparo de suas pessoas, na idade em que são mais perigosas as paixões e mais proximos os perigos, a ser cidadãos não só inuteis a si, mas até perniciosos á sociedade: representando-se-me outrosim nas mesmas consultas, que tendo-se procedido a averiguações e informações que subiram tambem a minha real presença, constára que não havia fundos nenhuns publicos destinados á manutenção dos Orphãos desamparados, nem casa ou collegio publico onde se doutrinassem; e de todas as providencias de que se lembraram os informantes, nenhumas eram tão sabias e apropriadas como as que se achavam estabelecidas no Regimento dos Juizes dos Orphãos, no qual se acautelou e preveniu o que podia ser conducente a tão util fim, e que pondo-se em pratica as sobreditas disposições, e as que estavam estabelecidas na Ordenação do liv. 4° tit. 102 e 103, confiando-se a um Magistrado de consideração a inspecção da causados Orphãos, o qual fizesse pôr em effectiva execução as maximas tão acertadas de que a experiencia de longos annos mostrou serem as mais adequadas, e erigindo-se de novo o estabelecimento da Casa Pia, que tão proveitoso tinha sido, se conseguiria melhor arranjamento, commodidade e educação dos Orphãos desamparados: e tomando em consideração todo o referido, e importancia desta materia de tão serias consequencias para a felicidade individual destes miseraveis privados do abrigo e educação paterna, e para a prosperidade geral do Estado que em grande parte depende da moral e costumes, e instrucção publica e particular de cada um de seus membros; e desejando dar providencias adaptadas a objecto de tanta consideração, conformando-me com a sobredita consulta, e com o parecer do Governadores do Reino, e d outras pessoas doutas e zelosas do meu real serviço, sou servido determinar o seguinte:
- Por-se-há em effectiva execução pelas autoridades competentes, e a quem toca a determinação do Regimento dos Orphãos em geral, e muito especialmente no que diz respeito ao cuidado de suas pessoas, e applicando-se a disposição do § 12 delle ao que se acha disposto na Ordenação do liv. 4° tit. 102 e 103, compensando-se aos tutores as despezas que fizerem com os Orphãos, de que não levaram paga.
- Instaurar-se-há a Casa da Pia do Castello, destinando-se-lhes as rendas que antigamente tinha, sendo possivel, e ajuntando-se as do Collegio dos meninos Orphãos da Mouraria, que é o único estabelecimento desta natureza que se póde unir, tendo os outros certas e apropriadas applicações, para ser tudo regido afim de recolher, manter e educar os orphãos miseraveis, conforme as suas qualidades e aptidão que tiverem.
- Para cuidar na inspecção de todos os Orphãos ricos e pobres, e para fazer executar prompta e exactamente o Regimento e mais ordens relativas a este objecto com as providencias competentes: sou servido nomear Provedor-Mór dos Orphãos, um dos Desembargadores do Paço, que eu houver por bem designar, o qual proporá em Mesa tudo o que julgar conveniente a bem da manutenção, ensino, accommodação, administração e segurança dos bens dos mesmos Orphãos, e dos estabelecimentos publicos acima referidos, pondo-se logo em execução as providencias que forem approvadas, ou consultando-se-me, sendo necessario, as que de novo occorrerem e se julgarem uteis, a fim não só de se fazerem executara s disposições já estabelecidas, mas tambem quanto de novo puder melhorar a sorte e condição dos Orphãos desamparados, a que mais quadrar ás circumstancias.
- Para conseguir-se tão util fim se dirigirão ao dito Desembargador do Paço os Ministros respectivos, recebendo delle as insinuações e determinações que convierem a melhorar a sorte destes desamparados cidadãos; e os juizes dos Orphãos lhes remetterão até ao fim de cada um anno, á vista do livro determinado pelo § 3° da Ordenação do liv. 1°, tit. 88, e das averiguações que devem fazer, relações individuaes do estado da pessoa, bens, e de tudo o mais que pertencer aos Orphãos do seu Districto, com as observações que parecerem necessarias e convenientes.
- Sendo summamente prejudical á honestidade e bom comportamento das Orphãs, o serem depositadas em Cadeias publicas: prohibo que daqui em diante os Juizes dos Orphãos prendam as desacommodações com o pretexto de estarem recatadas nestes depositos até se tornarem a acommodar, devendo entretanto serem recolhidas na Casa Pia, onde se darão áquelle trabalho que for proporcionado á sua idade, forças e comprehensão.
- Nas Cidades, Villas e Conselhos em que não houver deposito publico como em Lisboa e no Porto, o cofre de tres chaves, determinado pela Ordenação do liv. 1°, tit. 88, § 31, se guardará aqui em diante não em poder dos Depositarios, mas no logar mais forte e seguro que houver, para evitar os descaminhos a que de outro modo ficará sujeito.
- Para animar a caridade e humanidade daquelles dos meus vassallos que se propuzeram a criar e amparar algum Orphão ou Orphãos sem vencer estipendio, e o mandar ensinar a ler e escrever nas Villas e Cidades: hei por bem que o possa conservar até a idade de 16 annos, sem pagar-lhe soldada, sendo-lhe tambem licito offerecer no alistamento e sorteamento em logar de algum seu filho sorteado, observando os Capitães-Móres este privilegio religiosamente.
- Convindo que os Juizes dos Orphãos dessa Cidade e Terreno tenham idade, estado e experiencia para bem reger a pessoa e bens dos Orphãos sem os prejuizos e descaminhos que do contrario se seguem: sou servido que daqui em diante sejam nomeados para Juizes dos Orphãos de Lisboa e seu Termo, por tres annos, Desembargadores da Casa da Supplicação, aptos e zelosos entre os extravagantes modernos, sendo-me propostos em consulta do Senado da Camara, como até agora eram os Bachareis.
Pelo que mando á Mesa do Desembargo do Paço: Presidente do meu Real Erario; Senado da Comarca; e a todos os outros Tribunaes; Ministros da Justiça; e mais pessoas a quem o conhecimento deste alvará pertencer; o cumpram e guardem não obstante quaesquer leis ou disposições em contrario, que todas hei por derogadas para este effeitos sómente, como se de cada uma fizesse expressa e individual menção: E valerá com Carta passada pela Chancellaria, posto que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação em contrario. Dado no Palacio do Rio de Janeiro em 24 de Outubro de 1814.
PRINCIPE com guarda.
Marquez de Aguiar.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1814, Página 32 Vol. 1 (Publicação Original)