Legislação Informatizada - ALVARÁ DE 10 DE ABRIL DE 1821 - Publicação Original
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ALVARÁ DE 10 DE ABRIL DE 1821
Restitue ao Senado da Camara do Rio de Janeiro o gozo de senhorio das terras suas primitivas sesmarias do qual fora desapossado por um Acordão do Juizo dos Feitos da Corôa e Fazenda que fica nullo e cassado.
Eu El-Rei Faço saber aos que o presente Alvará com força de Lei virem: Que em Consulta da Mesa do Desembargo do Paço, a que mandei proceder, sobre os requerimentos que dirigiram á Minha Real Presença os Officiaes da Camara, e alguns moradores desta Côrte, Me foi presente que era justificada, e fundada em razão e justiça a queixa que uns e outros faziam do Acordão de 20 de Junho de 1812, proferido no Juizo dos Feitos da Minha Corôa e Fazenda, pelo qual se julgaram nullos todos os aforamentos, que a Camara fizera dos terrenos comprehendidos nas primitivas sesmarias, concedidas pelo Capitão-Mór Governador Estacio de sá, em 1565, ampliadas, e augmentadas com mais seis leguas em quadra na éra de 1567, pelo Governador Geral Mem de Sá, e todos os mais, que os emphyteutas, e arrendatarios da Camara fizeram depois, pelo único fundamento, de que sendo dadas para pastos, rocios, cultura, e logradouros desta Cidade, em proveito commum dos seus povoadores e habitantes, sem fôro, pensão, ou outro tributo, salvo o dizimo a Deos, á Camara, emphyteutas, e sub-emphyteutas, obraram contra direito, emprazando, e arrendando os sobreditos terrenos com pensões, que arbitraram, o que envolvendo nullidade insanavel nos primordiaes contratos, celebrados contra as expressas condições das mencionadas sesmarias, não só os tornava nullos na raiz, mas todos os que se fizeram depois, como dimanados de origem reprovada por direito, ordenando-se por estes fundamentos, que a Comarca perdesse os fôros, e que os actuaes possuidores ficassem retendo os terrenos como seus, conseguindo dos Officiaes da Camara titulos respectivos livres de pensão alguma: propondo-se-Me na referida Consulta, que se devia mandar cassar e annullar aquelle sobredito Acordão, como proferido contra a razão e direito e com manifesto prejuizo da Camara, e dos mais emphyteutas e arrendatarios: por quanto, se deviam entender valiosos os aforamentos primitivos, ou porque a clausula de ser livre de pensão, ou fôro, o terreno das sesmarias era relativa só aos Officiaes da Camara, que representavam os moradores da Cidade, para que o houvessem sem pagar cousa alguma, como parecia colher-se da letra das mesmas sesmarias, e nunca se podia entender das alheações, que a Camara houvesse de fazer desses terrenos, em virtude da adiministração que lhe confere a Lei do Reino, e que é permittido a qualquer sesmeiro; ou porque se deve presumir que ella teve faculdade expressa para isto, posterior ás sesmarias, segundo se colhia do silencio dos Povos, que nunca requereram; e das Autoridades, que nunca vedaram, nem estorvaram taes aforamentos, e de muitas confirmações destes, e outras resoluções dos senhores Reis Meus Augustos predecessores, expedidas pelo Conselho Ultramarino, e principalmente das Provisões de 12 de Julho, e de 26 de Janeiro de 1728, em que se diz, que os Officiaes da Camara allegaram, que por mercê, que lhes fôra concedida, tinham faculdade para aforar as terras desta Cidade, e uma legua ao redor, e que as Cartas ou Provisões, que a outorgaram, se queimaram no incendio, que soffreu o Archivo da Camara no anno de 1790, além da presumpção de direito ácerca das cousas antigas, que se suppõe feitas com legalidade; ou porque estava prescripto o direito de requerer contra os referidos aforamentos, pela posse de mais de dous seculos, em que estava a Camara, de os fazer com justos titulo, que é o que dá em geral a lei do Reino a estas corporações sobre administração dos bens do Conselho, e com boa fé, pois que não podia jamais considerar-se má em uma corporação publica, que possue e administra em nome, e em proveito do publico; ou porque se devem reputar taes contratos bem e regularmente feitos e legalisados em virtude dos Alvaras de 10 de Fevereiro de 1654, de 15 de Julho de 1744, declarados pelos de 26 de Outubro de 1745, e 23 de Julho de 1745, e de 23 de Julho de 1766, e de 27 de Novembro de 1804, principalmente pelo 1745, em que expressadamente se ordenou que ficassem vigorando taes contratos feitos pelas Camaras, ainda sem os requisitos da lei, e subsistindo as pensões, e fôros ajustados; accrescentando-se na mencionada consulta, que ainda quando não houvessem todos estes motivos tão ponderosos, se deviam sustentar ostes fôros por pouco gravosos aos possuidores, e por muito uteis á Causa Publica; pois que se applicavam estes rendimentos, que fazem parte das rendas do Conselho, ás obras publicas delle; e pelo que tocava ao julgado no Acordão do Juizo da Corôa a respeito dos emphyteutas, e sub-emphyteutas da Camara, era sobremaneira injusto que, sendo licito os sesmeiros depois de empossados, alhear por qualquer maneira os terrenos, não pudesse a Camara emphyteuticar, e os emphyteutas sub-emprezar e celebrar quaesquer outros contratos licitos por direito, e que viessem os possuidores sem titulo valioso a ser senhores de ambos os dominios directo e util, sem consolidação juridica, e os perdessem sem facto seu, e sem os alienarem os senhores dos terrenos que os houverem por herança, dotes, partilhas, compras, e outros titulos onerosos, para irem haver os preços daquelles, de quem os tinham, com renhidos e porfiosos pleitos, de que se originariam prejuizos, dissenções, e disturbios prejudiciaes ao socego e tranquillidade publica; convindo, por tão justificados motivos, que Eu Provesse este negocio de prompto e efficaz remedio, mandando annullar o referido Acordão do Juizo dos Feitos da Corôa, dando providencias legislativas que terminassem esta contenda, e dessem socego e tranquillidade ao Povo: E Tomando em consideração este importante negocio, e todo o referido na sobredita Consulta, e o quanto convém ao interesse publico e certeza e estabilidade dos dominios e do direito da propriedade, base de toda a legislação civil, e de que nascem immediatamente o augmento e progressos da agricultura e povoação: Querendo desde já evitar as pertubações, excessos, e demasias, que têm praticado alguns dos foreiros e arrendatadios allucinados com a arbitraria jurisprudencia estabelecida no Acordão que fez o objecto das justas representações, que subiram á Minha Real presença, e que constinuariam outros a praticar si por mais tempo não houvesse prompta e ultima decisão deste importante negocio, prosseguindo-se nos embargos, e outros recursos ordinarios: usando a estes fins do dominio eminente que Me compete, como Soberano, para regular o dos Meus fieis vassalos, firmando-o, e segurando-o em bases firmes e estaveis, e unindo o seu particular interesse com o do bem publico, estabelecendo ao mesmo tempo regras fixas da legislação da emphyteusis para o augmento da agricultura, e povoação, unido com a estabilidade e segurança da estabilidade e segurança do direito de propriedade tão recomendavel na sociedade civil: conformando-Me com o parecer da dita Consulta, em que foi ouvido o Procurador de Minha Corôa e Fazenda: Sou servido determinar o seguinte:
I O Acordão proferido no Juizo dos Feitos da Minha Corôa e Fazenda em 20 de Junho de 1812 nos Autos, entre partes, os moradores, e Officiaes da Camara desta Côrte, se deve entender nullo, cassado, e de nenhum effeito, como se nunca fosse proferido, pondo-se perpetuo silencio na causa, e guardando-se a este fim os Autos na Secretaria da Mesa do Desembargo do Paço, para nunca mais se fazer uso algum delles.
II Todos os aforamentos dos terrenos desmembrados das mencionadas sesmarias, feitos pelos Officiaes da Camara antes e depois de dos Alvarás de 26 de Outubro de 1745, e de 23 de Julho de 1766, até ao presente, se entenderão legitimos, validos e procedentes com os foros que se acham estipulados, e com o laudemio da quarentena, na fórma da Lei do Reino, ainda quando não estejam feitos com as solemnidades que em direito se requerem, reduzindo-se todos os aforamentos perpetuos, posto que se achem de facto celebrados em vidas.
III Igualmente ficarão sendo valiosas, legitimas e procedentes todas as sub-emphyteuticações, locações e arrendamentos, que os respectivos emphyteutas, e sub-emphyteutas tiverem feito, e celebrado com quaesquer outras pessoas, das ditas porções desmembradas dos mencionados aforamentos, ou prazos, para nellas se edificarem casas, e para formarem quintas ou chacaras, ou fazerem qualquer genero de cultura, ficando, porem, todos estes contratos, qualquer que seja o seu nome ou natureza, reduzidos a aforamentos perpetuos com os mesmos fôros, ou pensões estipuladas na pessoa de cada um dos actuaes possuidores e seus futuros successores; afim de estabelecer-se solida e regular jurisprudencia nesta materia, e evitar os abusos, e depostimos, que se tem praticado, despejando-se os locatarios, que se deviam reputar perpetuos, por meio de lesivos pagamentos de bemfeitorias.
IV Não querendo os actuaes emphyteutas, ou arrendatarios conservar-se na posse dos referidos terrenos por estes Titulos de aforamentos perpetuos, com o motivo de lhes parecerem excessivos os fôros estipulados, ou por qualquer outro, podel-os-hão largar e demittir os Officiaes da Camara, ou aos outros proprietarios, de quem os houveram, para estes livremente os aforarem a quem quizerem, e com os fôros, que ajustarem, sem que os actuaes possuidores se reputem ter direito para intentarem em Juizo qualquer acção, afim de se reduzirem a menos os ditos fôros, evitando-se assim novos litigios, e pertubações a este respeito: poderão porém os proprietarios, diminuil-os, si de sua livre vontade o quizerem fazer a bem de algum foreiro.
V Os terrenos, que ainda estiverem por aforar, e em poder dos Officiaes da Camara, serão daqui em diante aforados com as clausulas acima prescriptas, e na conformidade do Alvará de 23 de Julho de 1766, e debaixo das penas do § 2º delle, que Sou servido ordenar se pratique por todas as Camaras do Reino Unido de Portugal, e do Brazil, e Algarves, e os que já estiverem em poder de qualquer outro emphyteuta poderão ser sub-emprazados em foro perpetuo e fateosim, na fórma acima ordenada.
Pelo que Mando á Mesa do Desembargo do Paço; Presidente do Meu Real Erario; Regedor da Justiça, e a todos os Tribunaes, Ministros de Justiça, e mais quem o conhecimento deste Alvará pertencer, o cumpram, e guardem, como nelle se contém, não obstante quaesquer Leis, ou disposições em contrario, que todas Hei por derrogadas, como se de cada uma fizesse expressa e indivudual menção. E valerá como Carta passada pela Chancellaria, posto que por ella não há de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação emcontrario. Dada no Rio de Janeiro aos 10 de Abril de 1821.
REI com guarda.
Conde de Palma, Presidente.
Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Magestade há por bem mandar annullar e cassar, para que se tenha por improcedente, e como se nunca fôra, o Acordão do Juizo dos Feitos da Corôa e Fazenda de 20 de Junho de 1812, entre partes, os Officiaes da Camara, e alguns moradores desta Côrte; e Ordena, que sejam valiosos os aforamentos feitos até agora dos terrenos desmembrados das primordiaes sesmarias pelos Officiaes da Camara, e que se reduzam a prazos perpetuos estes, e os arrecadamentos feitos pelos emphyteutas e sub-emphyteutas: na fórma acima exposta.
Para Vossa Magestade Ver.
Bernardo José de Souza Lobato o fez escrever.- Henrique Anastacio de Novaes o fez.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1821, Página 57 Vol. 1pt. II (Publicação Original)