Geraldo Mesquita Junior SF 13-03-2008
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Senador Alvaro Dias, que preside esta sessão, boa tarde, Srªs e Srs. Senadores, na última reunião da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, ocorrida nesta semana, a qual tenho a honra de presidir, realizamos uma audiência sobre "Tráfico de Pessoas", um assunto absolutamente preocupante. Para debater conosco o tema e subsidiar a representação de informações, contamos com a presença da representante da OIT, a advogada Thais Faria. Experiente e competente em sua função, ela é coordenadora do Projeto de Combate ao Tráfico de Pessoas, da Organização Internacional do Trabalho, em sua sede brasileira.
Segundo dados da OIT, cerca de 250 mil pessoas por ano são vítimas do tráfico na América Latina, o que dimensiona a gravidade do problema. Segundo a coordenadora da OIT, neste infame "mercado", uma mulher ou adolescente traficada para a prostituição rende cerca de US$18 mil anuais para os traficantes. As pessoas - crianças, jovens e adultos - traficadas para exploração em trabalho escravo rendem cerca de US$3 mil anuais.
Na semana passada, apenas como exemplo pontual, o jornal Folha de S.Paulo informava que a Polícia Rodoviária do Paraná havia detido 50 bolivianos, em um ônibus, nas proximidades de Foz do Iguaçu. Segundo o jornal, na vistoria, os policiais descobriram que as pessoas, portando inclusive passaportes falsos, seriam deixadas em São Paulo para trabalhar. Entre os detidos, acompanhados ou não de familiares, estavam 11 crianças de até 13 anos de idade.
Atualmente, entre 1.200 e 1.500 bolivianos chegam por mês ao Brasil em busca de emprego, a maioria explorada em pequenas confecções e oficinas clandestinas de costura na Grande São Paulo e em Municípios do interior paulista. Essas pessoas são submetidas a jornadas de trabalho de até 18 horas diárias, ganhando centavos, que mal pagam o alojamento e a alimentação. Na maioria dos casos, como escravos modernos, vivem alojadas em um mesmo cômodo, no próprio local de trabalho, de onde são praticamente proibidas de sair.
No debate, a advogada da OIT também trouxe a público uma realidade vivida, particularmente, no norte do País, que é o tráfico por meio dos rios da região. Segundo ela, as rodovias e os aeroportos contam com mais fiscalização, enquanto o transporte aquaviário enfrenta dificuldades por conta do grande número de rios e embarcações. Uma situação que levou a OIT a desenvolver um programa com os trabalhadores do setor em países da América do Sul, incluindo o Brasil, para que denunciem a situação.
A essa realidade ainda devemos agregar a situação vivida atualmente por povos da região que abandonam seus países, como no caso da Colômbia, para fugir de situações de guerra. No Brasil, também pela região amazônica, adentraram no País, nos últimos anos, cerca de 20 mil colombianos, espremidos pelo conflito aberto entre as forças militares do governo, e as Farc e os grupos paramilitares. Apesar de, inicialmente, na maioria dos casos, tratar-se da busca por melhores condições de vida, muitos deles, frustrados em seu intento, acabam sendo recrutados para o tráfico de drogas.
Na representação brasileira no Parlamento do Mercosul, adotamos a iniciativa de realizar o debate e também trazemos as informações a este plenário, com o objetivo de destacar a urgência que esse tema exige, tanto do ponto de vista criminal quanto, e talvez mais ainda, econômico e trabalhista. O Brasil, por exemplo, é signatário do Tratado de Palermo, que trata do tráfico de pessoas, mas ainda não contamos com uma legislação interna sobre o tema. Por outro lado, também é fundamental avançar na construção de uma legislação trabalhista comum aos países do Mercosul, o que protegeria seus trabalhadores.
A bem da verdade, na base dessa triste situação está a desigualdade social e econômica que marca a vida dos povos das nações sul-americanas, resultado de séculos de exploração e espoliação interna e externa. Uma desigualdade que hoje também se verifica entre os países da América do Sul, e que faz do Brasil, por exemplo, pela sua dimensão econômica e estabilidade política, um pólo de atração para as populações de outros países da região.
Portanto, é preciso adotar um conjunto de medidas que, necessariamente, e antes de mais nada, precisam contar com um compromisso claro de integração de governos, parlamentos e da sociedade civil. O ambiente de paz, de respeito entre esses países, de desenvolvimento econômico, de solidariedade entre os povos é o caldo de cultura fundamental para debelar situações como o tráfico de pessoas.
O clima de confronto, a desestabilização política, a ingerência externa, clara ou sub-reptícia, a fragilização dos mecanismos de Estado, isso tudo só contribui para o crescimento do crime organizado, em todos os setores.
Entre as medidas que identificamos em conjunto com a OIT, em nossa audiência pública, estão harmonizar as leis entre os países do Mercosul, promover uma campanha comum de combate ao tráfico de pessoas, que inclui aí a adoção generalizada do Disque 100 - um mecanismo de certa eficiência - e ainda adequar tratados já ratificados pelo Brasil. O Parlamento do Mercosul, pela sua condição de porta-voz das populações, é um instrumento fundamental para promover esse debate e contribuir para encontrar as soluções, ideais ou possíveis.
Nós temos um compromisso claro com a integração, com a unidade dos povos sul-americanos e, por meio de iniciativas como essa, queremos levar esse debate para o conjunto da população, especialmente aquela mais necessitada e, portanto, mais aberta a somar-se nessa missão.
Antes de encerrar, Senador Alvaro Dias, quero fazer referência a uma importante audiência pública ocorrida hoje, no âmbito da Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo Senador Paim. Discutiu-se ali a questão do exame da Ordem, exigido para os bacharéis de Direito de maneira geral.
O debate foi acalorado, como não poderia deixar de ser, porque envolve a situação de um conjunto enorme de pessoas, de bacharéis de Direito, estudantes das escolas do nosso País, que, em regra - não estou aqui generalizando - se constituem hoje em um negócios. A ponto de eu ter sugerido, inclusive, que as escolas deveriam se registrar nas juntas comerciais, e não no MEC, porque educação em nosso País deixou de ser um bem imaterial para se tornar uma mercadoria, lastimavelmente. E a confusão está instalada. Ou seja, pode-se criticar a OAB pela instituição desse exame? Não se pode, Senador Gerson Camata. A OAB colocou o dedo no dique, ou colocou uma porteira, para não permitir o estouro da boiada.
Agora, é uma situação com a qual convivemos nesses últimos doze anos e que precisa de uma revisão, tal é a contestação que é oposta a essa situação. Mas não podemos ir do céu para o inferno ou adotar situações radicais de parte a parte. Creio que devemos examinar essa situação com muita tranqüilidade e evoluir para soluções que possam contemplar os interesses que estão em jogo.
Hoje, durante e depois da audiência, não tivemos tempo de colocar todas as nossas considerações a respeito do fato. E louvo inclusive a iniciativa do nosso querido Senador Gilvam Borges. Não concordo integralmente com os termos de sua iniciativa. A proposta do Senador Gilvam Borges é a de acabarmos com o exame da Ordem. Creio que é uma situação que devemos repensar. Mas a iniciativa dele teve e está tendo o mérito de nos levar ao debate, de levar toda a sociedade brasileira ao debate. Esse é o grande mérito da proposta formulada pelo Senador Gilvam Borges, a quem parabenizo.
Agora, acho que essa não é a solução, Senador Gilvam Borges. Creio que devemos pensar em muitas alternativas. Exemplo: uma avaliação seriada, feita ao longo do curso, com a participação efetiva do MEC, da OAB e das escolas. Mas participação séria, Senador Buarque. Não é para fazer de conta. Uma avaliação seriada ao longo do curso. Outra coisa: a OAB poderia imaginar esse conjunto de bacharéis que estão aí impactados pela questão do exame da Ordem. Tenho certeza absoluta de que a grande maioria deles o que pretende mesmo é o registro da Ordem para se habilitarem a concursos públicos no nosso País, na área do Direito, logicamente - procurador federal, procurador da Fazenda, defensor público etc.
Uma sugestão a mais que eu queria deixar aqui para o debate era que a OAB adotasse um registro provisório...
(Interrupção do som.)
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Estou concluindo, Senador Alvaro.
Que a OAB adotasse um registro provisório de dois anos, durante os quais seria permitido a esses bacharéis que conseguiram o registro provisório habilitar-se a concursos públicos na área do Direito, e, sendo aprovados, esse registro seria efetivado pela Ordem. Creio que seria uma tentativa de fazer com que esse grande volume de bacharéis no País, que está absolutamente represado, possa vir ao mercado de trabalho com o seu registro provisório na Ordem, podendo habilitar-se a concurso público. Aprovado num concurso público, imediatamente a Ordem efetivaria seus registros.
Essas e outras idéias e sugestões estão aí permeando a cabeça de todos. Creio que o debate deve prosseguir, continuar, para que encontremos uma solução, ou várias, para o conjunto de preocupações que cerca esse fato. Porém, soluções absolutamente radicais, como, por exemplo, acabar com o exame da Ordem talvez não seja a solução ideal ou, então, escancarar e dar registro para todo mundo talvez também não seja.
Então, procuremos a ponderação, o bom-senso, o equilíbrio, no sentido de buscarmos soluções para esse problema que é extremamente...
Senador Buarque, perdoe-me, concedo o aparte rapidamente a V. Exª.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Se o Presidente permite, apenas para parabenizá-lo pela sugestão dos exames parciais, com duas solicitações: uma de que não seja a Ordem que faça...
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Com a participação da Ordem.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Isso, exatamente. E a segunda, de que não seja só para os estudantes de Direito, que as outras profissões também façam esse exame. Isso seria bom para os cursos...
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Com certeza.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - E, finalmente, lembrar um projeto do Senador Antero, que esteve conosco até a legislatura passada, em que diz que, no caso de um aluno não passar no exame da Ordem, a faculdade onde ele estudou tem de assegurar que ele volte a estudar de graça. Então, ele volta a estudar. É um projeto do Senador Antero que está circulando em algum lugar nesta Casa, e vou procurar saber onde. Eu diria mais, deveria pagar uma multa ao aluno. Não, não ao aluno, porque aí o aluno é capaz de ser reprovado na Ordem para receber a multa. Paga-se uma multa para o próprio MEC, se for o caso. Nós temos de fazer isso. Agora, não pode ser só para os estudantes de Direito.
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - É verdade. V. Exª tem razão, generalizar. Olha, sugestões e idéias não faltam. O que precisamos fazer é sentar, equacionar a questão com bom-senso, com equilíbrio, para resolvermos esse imbróglio todo.
Senador Alvaro Dias, agradeço pela tolerância do tempo.
Srªs e Srs. Senadores, muito obrigado.