Geraldo Mesquita Junior SF 09-04-2008
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como V. Exª disse, estou falando aqui por uma deferência especial do Senador Mão Santa, meu irmão mais velho aqui neste Senado Federal, pessoa por quem tenho um carinho e um apreço especial e a quem agradeço a cessão do tempo.
O que me traz aqui hoje, Senadora, é registrar os 17 anos da fundação do Mercosul.
No último dia 26 de março, celebramos exatamente 17 anos da fundação do Mercosul, ocorrida em 1991, quando Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai firmaram o Tratado de Assunção.
Muito se tem falado, na imprensa, nas universidades e mesmo aqui, no Congresso, sobre os erros e os acertos do Mercosul.
Hoje, desta tribuna, como Presidente da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, desejo fazer um breve retrospecto do que tem sido o Mercado Comum do Sul ao longo desses anos. Isso porque considero fundamental aproveitar essas datas comemorativas não apenas para lembrá-las solenemente, mas, sobretudo, para refletir sobre o passado, com os olhos mirando os horizontes do futuro.
Começaria por citar aqui as palavras proferidas pelo Presidente Lula durante a abertura da XXXII Cúpula do Mercosul, ocorrida em 19 de janeiro de 2007, na cidade do Rio de Janeiro. Naquela ocasião, Sua Excelência lembrou muito bem que "o Mercosul surgiu da convicção de que, no mundo complexo e desigual em que vivíamos e vivemos, era fundamental que países como os nossos se associassem para enfrentar as dificuldades impostas por uma globalização assimétrica do ponto de vista econômico, político e social".
Foi justamente dentro desse entendimento que, no já distante ano de 1985, os então Presidentes do Brasil e da Argentina, José Sarney e Raúl Alfonsín, assinaram a Declaração de Iguaçu, pedra angular do Mercosul, após décadas de tentativas bem intencionadas, mas relativamente infrutíferas, sob o ponto de vista da integração regional.
No período entre 1985 e 1990, as iniciativas no âmbito do Mercosul se caracterizaram por um relativo "dirigismo", digamos assim, baseado em protocolos setoriais, em setores chaves, que constituíam o núcleo do Programa de Integração e Cooperação entre Argentina e Brasil.
A fase seguinte inicia-se justamente com a assinatura do Tratado de Assunção, em 26 de março de 1991, e se estende até 17 de dezembro de 1994, quando é assinado o Protocolo de Ouro Preto, que confere personalidade jurídica ao Bloco. Esse período foi marcado pela ascensão de duas novas administrações - no Brasil, o Governo de Fernando Collor; na Argentina, o Governo de Carlos Menem - comprometidas com a visão liberal da economia e do mundo. Por isso, decidiram acelerar e aprofundar o processo de integração, que passou a assumir características fundamentalmente livre-cambistas. Assim, os prazos foram reduzidos praticamente à metade; pensava-se em chegar a um mercado único até o início de 1995. A liberação comercial caminhou de forma mais ou menos rápida, estimulando o aumento do comércio bilateral entre Brasil e Argentina.
Contudo, não foram corrigidas algumas das chamadas "assimetrias estruturais", que conduziram o Brasil a uma crescente especialização industrial e a Argentina a uma ênfase nas indústrias ligadas ao setor primário da economia.
Convém lembrar também que essa foi uma fase marcada por sucessivos processos de estabilização macroeconômica, tanto no Brasil como na Argentina, na tentativa de conter a espiral hiperinflacionária que corroía os salários e inviabilizava o desenvolvimento econômico.
A partir daí, iniciamos uma terceira fase no Mercosul, que vai de 1996 até os dias de hoje, período em que foram assinados importantes documentos sob o ponto de vista institucional, como a Declaração Presidencial sobre Compromisso Democrático no Mercosul, que assinala o inarredável compromisso de seus membros com a democracia; a Declaração Sociolaboral, que estabelece os direitos dos trabalhadores do Bloco, e o Protocolo de Olivos, que cria o Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul. Também nesse período foram criados a Comissão de Representantes Permanentes do MERCOSUL (CRPM) e o Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (Focem). Além disso, foram assinados o Protocolo de Assunção sobre os Direitos Humanos no Mercosul e a Declaração de Cuzco, que lançou as bases para a chamada Comunidade Sul Americana de Nações. Finalmente, em 14 de dezembro de 2006, temos a instalação do Parlamento do Mercosul, ocorrida neste plenário com a presença de Sua Excelência o Senhor Presidente da República.
Aliás, quanto a isso, nós, que somos políticos e, sobretudo parlamentares, sabemos muito bem da importância de tornar o Mercosul permeável à voz do povo. É lógico que o Parlamento regional não será uma entidade supranacional, que substituirá os parlamentos nacionais. Longe disso! Seu objetivo maior é o de harmonizar as legislações dos países membros nas diversas áreas que desejamos integrar. Ele representa um marco histórico, porque aprofunda a dimensão política do Bloco na exata medida em que o aproxima mais dos nossos cidadãos. Hoje, para a grande maioria deles, o Mercado Comum do Sul é algo muito distante, do qual muito se fala, mas pouco se conhece. A partir da primeira eleição para o Parlamento do Mercosul, os temas que hoje discutimos apenas em gabinetes passarão a ser discutidos nas ruas, nas escolas, nas praças, contribuindo para o fortalecimento do pluralismo político, da diversidade cultural e da democracia representativa.
Todos esses desenvolvimentos que aqui mencionei, de forma muito breve, mostram que as atividades do Mercosul vêm se desenvolvendo em um crescendo. Começamos com uma iniciativa tímida, porém revestida de profundo significado, que foi a Declaração do Iguaçu; e chegamos até a constituição do Parlamento do Mercosul, para o qual se prevê que haja eleições específicas e simultâneas já em 2014, Senadora Rosalba.
Muito já foi realizado: aumentamos nosso poder de barganha no cenário internacional, sobretudo com a União Européia e com os Estados Unidos; e incrementamos o comércio regional de forma bastante significativa. Para se ter uma idéia disso, no início dos anos 90, o total de exportações e importações entre os membros do Bloco era de cerca de US$15 bilhões anuais. No final de 2006, essa cifra havia saltado para US$26 bilhões, de acordo com dados da Aladi, Associação Latino-Americana de Integração.
Se, do ponto de vista econômico, os dados são significativos, sob o prisma político eles são ainda mais evidentes. Ao longo desses 17 anos, logramos a estabilidade, a paz e a eliminação das desconfianças mútuas. Quem pensaria, por exemplo, há 20 anos, que seria possível estabelecer um acordo nuclear entre Brasil e Argentina? A própria criação do Parlamento do Mercosul é um inegável exemplo de amizade entre nossos povos e de avanços no campo político.
É óbvio, Srªs e Srs. Senadores, que existem algumas dificuldades, mas não podemos colocar a perder tudo o que conquistamos até agora apenas porque nos vemos diante dos desafios. Nós que militamos na política sabemos que são justamente os desafios que nos motivam a continuar na vida pública, trabalhando pelos ideais em que acreditamos e em prol da melhoria das condições de vida do nosso povo.
Os principais óbices que enfrentamos hoje para que o Mercosul seja ainda mais fortalecido são, sobretudo, as chamadas "assimetrias regionais". As evidentes diferenças quanto aos tamanhos das economias dos países membros fazem com que os nossos parceiros menores muitas vezes nos acusem injustamente de assumir atitudes "imperialistas". Para assim procederem, Uruguai e Paraguai se baseiam em alguns números expressivos. De acordo com a Aladi, o Brasil fechou o ano de 2006 com um saldo comercial de US$1,3 bilhão com esses dois parceiros menores do Mercosul; já a Argentina teve, naquele mesmo ano, um saldo de US$900 milhões em suas relações comerciais com aqueles dois países. Por outro lado, o comércio bilateral entre Brasil e Argentina situa-se na casa dos US$20 bilhões anuais, enquanto com o Paraguai e o Uruguai juntos não ultrapassa os US$3,5 bilhões. Por isso, esses países estão sempre insistindo numa maior abertura de nossas economias aos seus produtos e na assinatura de tratados bilaterais de livre comércio com países de fora do Bloco, como forma de combater as assimetrias.
Ora, é natural que haja assimetrias. Afinal, são economias diferentes, com pesos diferentes. Precisamos evidentemente trabalhar para reduzi-las, mas não é enfraquecendo os mecanismos constitutivos do Mercosul que conseguiremos isso. Assim, com o objetivo de reduzir as desigualdades que se apresentam, foram criados recentemente o Instituto Social, o Instituto de Formação e o Fundo para Convergência Estrutural do MERCOSUL (Focem), com o propósito de financiar projetos, desenvolver a competitividade e promover a coesão social. Nesse sentido, já aprovamos os primeiros 11 projetos no âmbito do Focem, no valor de aproximadamente US$70 milhões, cujos maiores beneficiários são o Uruguai e o Paraguai.
Outro problema que precisamos superar, e com celeridade, tem a ver com a integração física do continente, sobretudo quando falamos de obras de infra-estrutura. Devemos trabalhar com afinco, para que nossos países estejam ligados por todos os meios de transporte disponíveis, redes de telefonia e de transmissão de energia elétrica. À medida que isso for sendo processado, a integração será cada vez mais irreversível. Talvez a criação de um banco de desenvolvimento para essa finalidade, nos moldes do BNDES, como, aliás, já se chegou a propor, seja uma solução para se viabilizarem esses empreendimentos.
Quais as lições que podemos tirar desses 17 anos de Mercosul, Srª Presidente?
A primeira é, sem dúvida, que precisamos ter atitudes mais amadurecidas perante os desafios que temos de enfrentar. Não faremos a integração plena com ataques mútuos, semeando a discórdia entre nós e apontando para os eventuais fracassos do Mercado Comum.
Em segundo lugar, é inegável o peso econômico do Mercosul, que constitui um forte componente das negociações multilaterais que o Brasil enfrenta no cenário internacional.
Estou concluindo, Srª Presidente.
Afinal, não somos nada desprezíveis do ponto de vista econômico e social. De acordo com dados do Banco Mundial, se considerarmos o bloco com a adesão da Venezuela, passamos a possuir um PIB equivalente a 2 trilhões e 236 bilhões de dólares para uma população de 267 milhões de pessoas. Se agregarmos a esses dados os países com status de "Estados Associados", passamos a representar um PIB de quase três trilhões de dólares para uma população de 365 milhões de habitantes. Os países associados são Colômbia, Chile, Equador, Peru e Bolívia. Então, sem dúvida, esses são dados que são levados em conta quando nos sentamos à mesa de negociações internacionais.
Em terceiro lugar e por último...
(Interrupção do som.)
A SRª PRESIDENTE (Rosalba Ciarlini. DEM - RN) - Senador, vou conceder mais dois minutos para V. Exª concluir o seu pronunciamento.
O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Em terceiro lugar, mas não menos importante, Srª Presidente, vemos que as realizações políticas do Mercosul, com vistas à estabilidade regional e ao fortalecimento da democracia, são mais do que evidentes. Sem nenhuma dúvida, elas nos permitem dizer que a situação na América do Sul seria muito mais complicada se não tivéssemos o Mercosul.
Finalizo este discurso como comecei, citando o Presidente Lula em pronunciamento que proferiu na XXXII Cúpula do Mercosul, realizada em janeiro do ano passado.
Já disse aqui: faço críticas pontuais ao Governo do Presidente Lula, mas devo destacar a sua atuação forte e decisiva com relação à consolidação do bloco regional Mercosul.
Dizia ele naquela ocasião:
"As razões que estiveram presentes na origem de nossa associação persistem e talvez sejam hoje muito mais evidentes. Nossa união é necessária. Nem os mais fortes dentre nós serão capazes de resolver sozinhos as contradições em que estão mergulhados nossos países. Nossa articulação é fundamental para promover o desenvolvimento com trabalho decente, justiça e inclusão social."
Como Presidente da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, assumo o compromisso de atuar nesse sentido.
Que nos 17 anos vindouros, Srª Presidente, possamos celebrar a união e o irmanamento definitivo de nossos povos.
Era o que tinha a dizer.
Agradeço a tolerância de V. Exª.