Inacio Arruda-SF 10-05-2007

SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer um registro que considero de importância histórica.
Na segunda-feira passada, já à noite, o juiz da 43ª Vara Cível do Rio de Janeiro, Jaime Dias Pinheiro, prolatou uma sentença dizendo que a UNE é um verdadeiro patrimônio do povo brasileiro e julgando improcedente um pedido de reintegração de posse formulado por um estacionamento clandestino, que invadiu um terreno, e ainda o condenou a pagar todos os encargos referentes ao processo.
O terreno da UNE foi invadido por um estacionamento clandestino, que quis se apropriar daquela sede da União Nacional dos Estudantes, talvez a organização mais importante da sociedade civil brasileira.
Em seguida, os estudantes festejaram naquela que é a casa dos estudantes, que desbravaram e levantaram bandeiras fabulosas de luta do povo brasileiro, entre elas, podemos citar, a famosa luta que tinha como lema "O petróleo é nosso". Esses estudantes estavam à frente das lutas democráticas do nosso povo e da resistência ao autoritarismo e à ditadura militar. E foi a ditadura militar que fechou a sede da UNE e depois a incendiou. Chegaram a esse ponto.
Sr. Presidente, peço a V. Exª que recepcione nos Anais do Senado Federal o inteiro teor da sentença do Juiz Jaime Pinheiro Filho que está em minhas mãos e que passarei à Mesa dos trabalhos, porque é muito importante essa decisão que corrige esse infortúnio histórico do nosso País.
Sr. Presidente, em seguida, quero mencionar a primeira entrevista do Presidente Lula ao portal Terra Magazine, ao jornalista Bob Fernandes. Foi uma entrevista importante, exclusiva. Faço essa menção porque Sua Excelência trata da nossa inserção ainda maior na América do Sul, da integração ainda maior do maior país da América do Sul com os seus vizinhos, e registra que, durante décadas, senão séculos, vivemos de costas uns para os outros. Não foi por causa da distância da língua, pois são línguas latinas, próximas.
A nossa raiz lingüística é fácil, o entendimento seria mais do que razoável, mas ficamos distantes. Agora, porém, podemos dizer que o Estado brasileiro, com a política externa patrocinada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, busca uma aproximação forte.
Faço referência a essa entrevista, porque instalamos nesta semana o Parlamento do Mercosul, também um momento histórico para os países que o integram: Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela - com a possibilidade da vinda do Chile e da Bolívia. Será um Parlamento com grandes responsabilidades e capacidade para tomar importantes iniciativas.
Faço menção ao pronunciamento do Presidente, porque ele trata de uma discussão importantíssima. Fala, primeiramente, das possíveis negociações no âmbito do Mercado Comum do Sul com as nossas moedas - o Brasil com o real e a Argentina com o peso -, fazendo trocas comerciais sem depender da chamada moeda forte, que é o dólar. Isso tem altíssimo significado, tem peso, e pode transformar-se numa realidade - peso argentino e realidade do nosso real. Se juntarmos esses dois fatores, poderemos ter um novo ambiente de comércio entre as nações sul-americanas.
Uma moeda única para o bloco econômico seria um passo largo, algo que temos de maturar no tempo evidentemente. Não obstante isso, ressalto que se trata da menção de um Chefe de Estado que tem sido discutida e debatida pelas outras nações. É um tema que devemos discutir no Parlamento brasileiro e também no âmbito do Parlamento do Mercosul para que todo esse debate não se restrinja a um debate entre executivos, mas seja um debate da sociedade, e o Parlamento é a casa da sociedade, da representação do povo da região como um todo.
Trata-se da criação de um banco para essa região. É claro, ainda temos ressalvas quanto a isso, quanto a seu papel e seu significado, mas é alentador ver o Presidente do Brasil se referir à criação de um banco sul-americano, um banco de países do Mercosul, no âmbito do Mercosul. Isso tem papel estratégico para o desenvolvimento e para a integração da região. Um banco como esse poderá garantir o financiamento de fundos para resgatar a dívida histórica do ponto de vista social que temos nos países que formam o bloco do Mercado Comum do Sul, uma dívida muito grande que temos de resgatar.
O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Inácio...
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB - CE) - E trata da integração energética, meu caro Senador Sibá, que tem alcance mais do que estratégico, mesmo que possamos fazer ressalvas a uma tirada ou outra de um Presidente, um discurso ou outro direcionado mais a seu público interno - o próprio Presidente faz essa observação -, uma bravata aqui outra acolá.
A integração energética dos nossos povos seria algo importantíssimo. Imaginem a união entre o Brasil, com as hidrelétricas, com o ferro, com os minérios, com o etanol, com o biodiesel, com o petróleo - nossas reservas estão aumentando, estão surgindo possibilidades -; a Bolívia, com o gás; e a Venezuela, com o gás e com o petróleo! São riquezas fabulosas, é energia. Se tivermos capacidade para levar a cabo essa integração - e o nosso povo já mostrou que tem, pois já fizemos de tudo neste País, aqui no Brasil -, teremos condições de dar um passo no sentido da elevação da qualidade de vida do povo de nossa região.
Meu caro Senador Sibá Machado, concedo o aparte a V. Exª.
O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Em primeiro lugar, parabenizo V. Exª pelo pronunciamento que faz. Em segundo lugar, gostaria de dizer da grande diferença que há entre os blocos econômicos no que diz respeito a seus funcionamentos, a seus prazos e às barreiras enfrentadas para sua constituição. É sabido que a idéia de bloco econômico nasceu com o esforço, em primeiro lugar, dos alemães, que, tão logo se concluiu a 2ª Guerra Mundial, ainda em 1946, trabalharam em dois cenários. O primeiro foi a criação do plano de abastecimento coletivo - seria o PAC daquela época -, firmado entre franceses, ingleses e alemães. O segundo, logo em seguida, delineou-se com o Ceca, o Conselho Econômico do Carvão e do Aço, que se transformou em um bloco econômico, o Mercado Comum Europeu, na década de 70 - só veio a se transformar na União Européia, tal como a conhecemos hoje, na década de 90.
Foram muitos anos para se vencer as barreiras - as diferenças das guerras e tantos outros problemas entre os paises mais industrializados. No caso da América do Sul, do Mercado Comum do Sul, que é formado por Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina, foram necessários cerca de vinte anos para chegar a patamares que a Europa levou muito tempo para chegar. São países não assolados por guerras, mas por dificuldades tecnológicas, dependência financeira com alto endividamento, instabilidade política, baixa industrialização e tudo mais. Apesar disso tudo, em vinte anos, o Mercado Comum do Sul já chega aos indicadores que V. Exª está aqui apresentando. Haveremos de dar a volta por cima. Já temos um PIB de um trilhão de dólares e, se avançarmos para o conjunto da América do Sul - o próximo a integrar o bloco deve ser o Chile -, haveremos de superar dificuldades gritantes de relacionamento, dificuldades decorrentes muito mais de uma ocupação histórica por parte de portugueses e espanhóis que nos fez ficar de costas um para o outro, um olhando para o Atlântico e os outros olhando para o Pacifico. Haveremos, agora, de nos olhar de frente, de respeitar as nossas diferenças. Uma data marcante para o Governo Lula será 2022, quando será possível gritar a verdadeira independência não só do Brasil, mas de toda a América do Sul. Então, mais uma vez, parabéns pelo pronunciamento.
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PcdoB - CE) - Agradeço a contribuição de V. Exª, que reforça esses aspectos do papel estratégico do Mercosul, um papel de unidade da América do Sul, algo que nos permite sonhar. Isso é muito significativo, pois em parte a história é feita pelos sonhadores.
Esses homens todos que citamos - ontem fiz referência a Tiradentes, a Bolívar, a San Martín e a José Martí - eram sonhadores, eles desejavam essa integração sul-americana. Eles sabiam que essa integração criaria possibilidades maiores...
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco/PSB - SE) - Vou conceder a V. Exª mais dois minutos para encerrar seu discurso.
O SR. INÁCIO ARRUDA (PCdoB - CE) - Obrigado, Sr. Presidente.
Eles sabiam que essa integração criava possibilidades de melhoria da qualidade de vida de seus povos. O Uruguai sabe que, unido com o Brasil, Argentina, Paraguai e Chile, ele ganha. O Paraguai também sabe que, unido, ganha mais. A Argentina sabe que a sua unidade com o Brasil lhe é favorável, assim como é favorável ao Brasil. O Chile tem essa consciência. A Venezuela sabe que, sozinha, mesmo tendo uma riqueza fabulosa, como o petróleo, se isola. E nós temos de compreender a importância dessa integração, principalmente nós, brasileiros, principalmente nós que estamos no Mercosul.
Muitas vezes, quando ouvimos um discurso de um presidente ou uma frase de outro, ficamos com a idéia de reagir, de atirar logo uma pedra. Não, somos da unidade, queremos atrair essas nações para essa grande unidade sul-americana.
O Mercosul é esse espaço fabuloso que se abre para que possamos elevar o capital humano, que é mais significativo, para que o povo possa transitar e para que possamos ter uma elevação do ponto de vista cultural.
Há pouco, debatíamos, discutíamos esse assunto na Comissão de Educação. Lembro-me que, na primeira sessão do Mercosul, o Senador Cristovam Buarque fez esta observação: "Puxa vida, não falamos ainda em educação". Poucos segundos depois, um Deputado uruguaio levantou-se e abordou a cultura como uma das questões centrais do Mercosul, bem como a unidade cultural. Mesmo nós, preservando as nossas diferenças, não vamos retirá-las. Aqui é o Brasil. Nós somos brasileiros. Nós não vamos perder a nossa identidade...
(Interrupção do som.)
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB - CE) -...os chilenos também não; os argentinos também não; os uruguaios não perderão, nem os venezuelanos. Nós temos os guaranis que ocupam duas nações praticamente inteiras, como o Paraguai e a Bolívia; na nossa fronteira também com esses países, há várias etnias. Dentro do Brasil, quantas etnias com características próprias. Nós não vamos perder essas características que fazem parte da formação cultural dos nossos povos.
Mas a nossa integração cria uma fortaleza sem igual para o futuro. E é esse o sonho que nós estamos buscando transformar em realidade. Sonho de alguns há duzentos; de outros, há cento e cinqüenta anos, dos que resistiram no século XX, e de nós que temos que construir agora para as gerações futuras. Pensando, agora, já materializando, mas pensando o futuro das nossas nações e dos nossos povos.
Muito obrigado, Sr. Presidente