Fernando Collor-SF 19-06-2007
SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, quero aqui saudar uma boa nova. Quando a Presidenta do Chile, Cristina Kirchner, visitou ontem o Presidente Lula, ambos anunciaram algo muito positivo. Ficou acertado que o comércio entre os países, Brasil e Argentina, será feito em moeda local a partir do início do ano que vem.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Houve um equívoco, talvez pelo encantamento da presidência, mas Cristina Kirchner é da Argentina; V. Exª disse que era do Chile.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Cristina Kirchner, da Argentina. Eu agradeço a atenção de V. Exª.
Felizmente, temos hoje duas mulheres presidentas na América Latina. A Presidenta Michelle Bachelet, do Chile, e a Presidenta Cristina Kirchner, que acaba de ser eleita pelos argentinos, com uma votação tão significativa.
E é muito importante que a Presidenta Cristina Kirchner, logo após a sua eleição, tenha resolvido fazer uma visita ao Brasil, ao Presidente Lula, o que significa que o governo argentino, liderado pela Srª Cristina Kirchner, avaliou como muito importante e prioritário desenvolver, aprimorar suas relações com o Brasil. Tanto é que resolveram os Presidentes Cristina Kirchner e Luiz Inácio Lula da Silva realizar pelo menos dois encontros a cada ano.
Mas a boa notícia que eu quero ressaltar é que ficou acertado que o comércio entre o Brasil e a Argentina será feito em moeda local, o peso argentino e o real brasileiro, a partir de 2008, eliminando o dólar das importações e exportações. A medida, obviamente, reduzirá os custos das relações comerciais e, ao menos em um primeiro momento, será até mais benéfica para a Argentina.
Pelo que o Ministro Guido Mantega da Fazenda explicou dos avanços e a resolução de alguns problemas técnicos, no início de 2008 isso já estará em curso. "Seguramente vai dar uma nova qualidade à relação comercial", afirmou o Assessor Internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia.
Pela primeira vez, a corrente de comércio entre Argentina e Brasil atingirá US$20 bilhões, com superávit para o Brasil. De janeiro a outubro deste ano, o Brasil vendeu US$11,82 bilhões e comprou US$8,28 bilhões da Argentina, um superávit de US$3,58 bilhões. É justamente esse superávit que o Brasil acumula hoje em dólares que será feito em moeda local.
Durante aproximadamente uma hora, a Presidenta Cristina Kirchner teve uma conversa reservada com o Presidente Lula. Eles decidiram criar uma comissão bilateral para discutir projetos nas áreas de energia, economia, defesa e ciência e tecnologia. Essa comissão se reunirá duas vezes por ano - uma em Brasília, outra em Buenos Aires - e será coordenada pelos próprios Presidentes Lula e Cristina. A primeira reunião será realizada em fevereiro na Argentina, em Buenos Aires.
Segundo a Presidenta Cristina Kirchner, essa comissão deverá ter metas, objetivos e prazos, de tal modo que a integração ou as discussões não sejam somente um exercício de "reunionismo", mas, precisamente, de resultados concretos.
Na área de energia, os dois países demonstraram interesse em parceria no campo nuclear. Os ministros da área ficaram de inventariar suas iniciativas nucleares e conversar sobre o que pode ser feito em conjunto. Obviamente, trataram de questões relativas ao interesse das principais empresas de energia, como a Petrobras e as empresas de petróleo da Argentina.
Os governos também querem uma definição sobre o projeto da usina de Garabi, em Garruchos, no Rio Grande do Sul. É importante que ambos os países acertem a sua relação com a Bolívia, como país fornecedor de gás. No próximo dia 12 de dezembro, o Presidente Lula estará na Bolívia, em La Paz, visitando o Presidente Evo Morales, e deverá tratar desse assunto.
Acho muito importante, Sr. Presidente, que tenham participado das reuniões tanto o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, como o futuro Ministro da Economia e Produção da Argentina, Martin Lousteau, que é um jovem de 37 anos, conforme a imprensa tem dito.
Essa desdolarização implica a criação de um sistema de pagamentos entre os dois países. Obviamente, isso tem uma complexidade e ambos os países aprenderão com esse processo.
Mas quero saudar essa decisão, Sr. Presidente, porque constitui um passo na direção da possível criação, um dia, de uma moeda comum no âmbito dos países do Mercosul.
Sr. Presidente, reitero aqui a minha posição favorável a que a Venezuela possa também ser aceita no Mercosul. Precisamos olhar a Venezuela como um país que tem na sua Constituição o propósito de participar da integração dos países da América Latina, o que o Brasil tem como um dos seus objetivos fundamentais. E, portanto, se há alguns Parlamentares na Câmara dos Deputados e aqui no Senado Federal que têm expressado suas críticas a alguns dos passos dados pelo Presidente Hugo Chávez, precisamos olhar além, olhar que constitui um propósito da nação venezuelana, do povo venezuelano, expresso em sua Constituição, participar da integração da América do Sul, da América Latina.
Assim, Sr. Presidente, avalio como muito significativo que o Presidente Lula e a Presidenta Cristina Kirchner tenham tomado essa decisão. Isso vai facilitar enormemente o comércio entre Brasil e Argentina e pode ser um passo importante para que também o Uruguai, o Paraguai, os países que têm interesse em se associar a nós, como a Bolívia, o Peru, o Chile, a Venezuela, venhamos todos a ter a perspectiva de, dentro de algum tempo, compartilharmos uma mesma moeda, ainda mais diante dos problemas que tem havido com o dólar - o real tem-se valorizado em relação ao dólar nesses últimos tempos. Acho importante, até para a perspectiva de estabilidade no comércio bilateral Brasil-Argentina, possa haver a utilização da moeda comum, da moeda local, no caso, o real ou o peso.
A complexidade dessas operações será logo superada pela prática desse entendimento tão importante visando a uma aproximação de nossos países. Sabe V. Exª, Senador Mão Santa, que tenho muito propugnado para que a integração dos países da América Latina se faça não apenas do ponto de vista do comércio ou da livre movimentação dos capitais, dos bens e dos serviços, mas que, sobretudo, venha a significar também a livre movimentação do que é mais importante, dos seres humanos, para que possamos um dia ter - argentinos, brasileiros, uruguaios, paraguaios, as pessoas de todas as nacionalidades na América do Sul, progressivamente na América Latina e nas Américas - a liberdade de escolher onde estudar, trabalhar e viver.
Ressalto também que, para a melhor cooperação possível entre Brasil e Argentina, é preciso que comecemos a pensar na integração dos próprios programas sociais. Na Argentina, existe o programa social Jefes de Hogar, ou Chefes do Lar. No Brasil, existe o programa social Bolsa-Família. Ambos podem ser vistos como passos na direção de um dia termos uma renda básica de cidadania como um direito de todas as pessoas partilharem da riqueza de nossas nações.
Quero transmitir à Presidenta Cristina Kirchner, ao Embaixador da Argentina no Brasil e do Brasil na Argentina que há, na Argentina, como no Brasil, pessoas que muito acreditam nisso. Economistas como Rubén Lo Vuolo e Alberto Barbeito, autores de livros sobre o Ingreso Básico Ciudadano na Argentina, têm, como muitos brasileiros - e eu próprio - participado da Rede Mundial da Renda Básica - The Basic Income Earth Network -, em que temos interagido sobre o propósito de, logo, em países como os nossos, na América Latina, criarmos a renda básica como um direito à cidadania universal e incondicional.
Assim, Sr. Presidente, concluo o meu pronunciamento, saudando que Brasil e Argentina venham a realizar o seu comércio com uma moeda comum.
Disponho-me, caso V. Exª deseje usar da palavra, a ocupar a Presidência, para que isso se concretize